
Autor da grande trilogia sobre o S�culo 19 — Era das revolu��es (1789-1948), A Era do capital (1848-1875) e A Era dos imp�rios (1875-1914) —, Eric John Hobsbawm fez a cabe�a da esquerda brasileira sobre o mundo atual, com A Era dos extremos: o breve S�culo 20. O historiador nasceu em Alexandria, Egito, quando o pa�s se encontrava sob dom�nio brit�nico, passou a inf�ncia entre Viena e Berlim e migrou para Londres aos 14 anos. Quando jovem, ingressou no Partido Comunista brit�nico; durante a Segunda Guerra Mundial, cavou trincheiras no litoral do Canal da Mancha e fez parte da intelig�ncia do Ex�rcito brit�nico.
Ap�s a guerra, Hobsbawm voltou para Cambridge, onde se tornou um expoente da historiografia mundial, ao lado de Christopher Hill, Rodney Hilton e Edward Palmer Thompson. Sua Era dos extremos � o livro mais lido sobre a hist�ria recente da humanidade, e Tempos interessantes, de 2002, recebeu o Pr�mio Balzan para a Hist�ria da Europa. Membro da Academia Brit�nica e da Academia Americana de Artes e Ci�ncia, lecionou na Universidade de Londres e na New School for Social Research, de Nova Iorque. Morreu em Londres, em 2012.
Nascido em 1948, o londrino Tony Judt era neto de russos e rabinos lituanos. Aos 15 anos, aderiu ao sionismo e quis emigrar para Israel, contra a vontade dos pais. Em 1966, foi passar o ver�o num kibbutz machanaim e acabou servindo como motorista e tradutor no Ex�rcito de Israel, na Guerra dos Seis Dias. No final da guerra, por�m, voltou para Inglaterra. Judt graduou-se em hist�ria na Universidade de Cambridge (1969), mas realizou suas primeiras pesquisas em Paris, na �cole Normale Sup�rieure, onde completou seu Ph.D., em 1972.
Em outubro de 2003, publicou um artigo na New York Review of Books, no qual recriminou Israel por se tornar um Estado �tnico “beligerante, intolerante, orientado pela f�” e defendeu a transforma��o do Estado judeu num estado binacional, que deveria incluir toda a atual �rea de Israel, mais a Faixa de Gaza, Jerusal�m Oriental e a Cisjord�nia. Nesse novo Estado, segundo sua proposta, haveria direitos iguais para todos os judeus e �rabes residentes em Israel e nos Territ�rios Palestinos. Seu artigo causou um terremoto na comunidade judaica e lhe valeu a expuls�o do conselho editorial da revista.
Judt lecionou na Universidade de Nova York, na cadeira de Estudos Europeus. Seu livro P�s-Guerra – Uma Hist�ria da Europa desde 1945 � monumental. Em mar�o de 2008, foi diagnosticado com esclerose lateral amiotr�fica (ELA). Um ano depois, estava tetrapl�gico; faleceu em 2010, depois de um calv�rio no qual escreveu tr�s livros: O Mal Ronda a Terra, O Chal� da Mem�ria e Pensando o S�culo 20, baseado em conversa��es com Timothy Snyder. Judt fez parte do que chamou de “gera��o Hobsbawm”, homens e mulheres que come�aram a se ocupar do estudo do passado em algum momento da “longa d�cada de 1960” (entre 1959 e 1975), cujo interesse “foi marcado de forma indel�vel pelos escritos de Eric Hobsbawm, por mais que eles agora discordem de muitas de suas conclus�es”.
Autocr�tica
No ensaio Encosta abaixo at� o final (Quando os fatos mudam), editora Objetiva, publicado no New York Review of Books, em maio de 1995, como uma resenha de A Era dos extremos: O breve s�culo 20, 1914-1991, de Eric Hobsbawm), Judt criticou duramente o seu mestre: “Ainda que escreva sem nenhuma ilus�o a prop�sito da antiga Uni�o Sovi�tica, ele se mostra relutante em admitir que ela n�o tinha aspectos que a redimissem (inclusive o de desempenhar o papel de manter ou impor a estabilidade no mapa da Europa)”. Judt tamb�m critica Hobsbawm por justificar o terror stalinista e as coletiviza��es for�adas com o esfor�o de guerra.
Segundo Judt, era dif�cil para Hobsbawm fazer autocr�tica da pr�pria f�: “Contudo, h� duas ou tr�s mudan�as cruciais que tiveram lugar no mundo — a morte do comunismo, por exemplo, ou a relacionada perda de f� na hist�ria e nas fun��es terap�uticas do Estado a respeito da qual o autor nem sempre se mostra satisfeito. Isso � uma pena, j� que forma e �s vezes deforma seu relato de maneiras que podem diminuir seu impacto sobre aqueles que mais precisam l�-lo e aprender com ele. E senti falta, em sua vers�o do S�culo 20, do olhar impiedosamente cr�tico que fez dele um guia t�o indispens�vel para o S�culo 19”.
Em janeiro de 2018, o ex-senador Cristovam Buarque foi convidado a uma palestra em Oxford para falar sobre por que Bolsonaro venceu. Agora, voltou � universidade brit�nica para lan�ar a vers�o em ingl�s do pequeno livro Onde erramos: de Itamar a Temer, publicado como ebook pela Tema Editorial, no qual o ex-governador de Bras�lia e ex-reitor da UnB faz uma pol�mica autocr�tica a partir daquela palestra. N�o sei se Buarque se inspirou em Tony Judt, mas, com certeza, a esquerda brasileira tem as mesmas dificuldades de Hobsbawm para fazer autocr�tica. Persiste nos pr�prios erros.