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Estado de Minas entre linhas

"Adeus, L�nin", a s�tira se aplica a Cuba, Nicar�gua e Venezuela

� preciso aguardar as conclus�es do Foro de S�o Paulo para saber se o encontro, que deve reunir todas as tend�ncias de esquerda latino-americana


30/06/2023 04:00
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Lula voltou a defeder Nicolás Maduro dizendo que ele tem que deixar o poder pela via eleitoral
Lula voltou a defeder Nicol�s Maduro dizendo que ele tem que deixar o poder pela via eleitoral (foto: FILIPPO MONTEFORTE/AFP)


Em 1989, pouco antes da queda do muro de Berlim, a sra. Kerner (Katrin Sab) entra em coma e assim permanece durante o processo de unifica��o da Alemanha. Vivia no regime comunista da antiga Rep�blica Democr�tica Alem� (RDA), o lado oriental, e acorda na ordem democr�tica e capitalista da antiga Alemanha Ocidental. Berlim Oriental � outra cidade, muito diferente, o que preocupa seu filho, Alexander (Daniel Br�hl), que temia o impacto das mudan�as na sa�de da veterana militante do Partido Socialista Unificado Alem�o (PSUA), comunista. Isso faz com que procure esconder de sua m�e as mudan�as em curso, por�m, quando ela sai do coma, as coisas se complicam.

O filme “Adeus, L�nin”, o l�der comunista da Revolu��o Russa de 1917, � uma com�dia dram�tica alem� de 2003, dirigido por Wolfgang Becker, que fez muito sucesso nos cinemas e ainda hoje merece ser visto. Wolfgang Becker usa como plano de fundo personagens reais como Erich Honecker, l�der comunista que governou a RDA de 1971 a 1989; Mikhail Gorbatchov, protagonista da perestroika a partir de 1985 e da autodissolu��o da antiga Uni�o Sovi�tica (URSS), 1991; Helmut Kohl, chanceler da Alemanha reunificada. O anti-her�i � o primeiro astronauta alem�o, Sigmund J�hn, um dos tripulantes da espa�onave sovi�tica Soyuz 31, que se tornara motorista de taxis depois da reunifica��o, ou seja, um s�mbolo da derrocada do “socialismo real” no Leste europeu.

Em 1989, Alexander � um jovem de Berlim Oriental que vive com a m�e, a irm� e uma sobrinha, ap�s seu pai abandonar a fam�lia e fugir para o Ocidente. Christiane era uma professora dedicada � constru��o do “homem novo” e se considerava casada com o socialismo. Por essa raz�o, sofre um ataque card�aco quando seu filho � preso num protesto contra o regime comunista. Passa 8 meses em coma, quando acorda o mundo era outro. Como outra parada card�aca lhe seria fatal, o sentimento de culpa faz com o filho crie um mundo paralelo, cenogr�fico, no qual velhas embalagens de alimentos s�o exumadas e v�deos caseiros s�o produzidos para reviver as gl�rias do antigo regime. O diretor Wolfgang Becker faz a cr�tica aos que ficam prisioneiros do passado, mas ao mesmo tempo enaltece a lealdade do filho que tenta a todo custo evitar novos sofrimentos de sua m�e.

O apadrinhamento do Foro de S�o Paulo, que se re�ne em Bras�lia at� domingo, pelo presidente Luiz In�cio Lula da Silva, lembra um pouco o jovem Alexander de “Adeus, L�nin”. Esse paralelo n�o tem nada a ver com a narrativa da extrema-direita, que demoniza a esquerda e chama todo mundo de comunista. A reuni�o n�o ocorria h� tr�s anos, � legitima e pode ter um papel positivo na pol�tica latino-americana, dependendo de suas conclus�es. Com delega��es da entidade civil e de governos de 23 pa�ses da Am�rica Latina esperados em Bras�lia, o evento come�ou ontem e segue at� o domingo no Hotel San Marco, no Setor Hoteleiro Sul de Bras�lia.

O problema � que a pol�tica de boa vizinhan�a adotada por Lula em rela��o aos pa�ses do continente tamb�m representa o endosso de regimes autorit�rios de Cuba e da Nicar�gua, al�m da Venezuela, de Nicol�s Maduro, que Lula classificou como uma “democracia relativa”, ontem, durante entrevista para a R�dio Ga�cha. O presidente da Rep�blica atravessou a rua para escorregar numa casca de banana, porque esse conceito de democracia relativa foi utilizado pelo presidente Ernesto Geisel quando tentou institucionalizar o regime militar, por meio de uma abertura lenta, gradual e segura, durante a qual sofreu derrotas eleitorais desastrosas para o regime, mas endossou a repress�o � oposi��o.

D�j� vu pol�tico

Lula deu a declara��o ao ser questionado sobre o motivo de setores da esquerda insistirem em defender o regime de Nicol�s Maduro. Em maio, j� havia defendido o presidente venezuelano e seu regine “bolivariano”, com o argumento de que as acusa��es de que a Venezuela � uma ditadura fariam parte de uma “narrativa”. A declara��o repercutiu mal dentro do pr�prio encontro de presidentes, no qual os presidentes do Uruguai, Lacalle Pou, um conservador, e do Chile, Gabriel Boric, socialista.

“A Venezuela tem mais elei��es do que o Brasil. O conceito de democracia � relativo para voc� e para mim. Eu gosto de democracia, porque a democracia que me fez chegar � Presid�ncia da Rep�blica pela terceira vez”, disse Lula, para espanto generalizado. A frase � duplamente infeliz, porque revela, a� sim, uma narrativa falsa em rela��o � realidade pol�tica do regime de Maduro, que se mantem no poder por meio de fraudes eleitorais, e uma vis�o instrumental da democracia, como via de acesso ao poder pessoal, em vez de um valor universal.

� preciso aguardar as conclus�es do Foro de S�o Paulo para saber se o encontro, que deve reunir todas as tend�ncias de esquerda da Am�rica Latina, ser� um “aggiornamento” ou um “d�j� vu” politico. O galicismo tem tudo a ver com a situa��o, porque descreve a sensa��o desencadeada por um facto presente, que se parece estranhamente com uma situa��o espec�fica j� presenciada: j� li este livro? J� vi este filme?

O c�rebro possui a mem�ria imediata, que a gente logo esquece; a de curto prazo, que dura horas ou dias; e de longo prazo, que dura at� anos. O d�j� vu ocorre quando os fatos que est�o acontecendo s�o armazenados diretamente na mem�ria de longo ou m�dio prazo, sem passar pela mem�ria imediata, o que nos d� a sensa��o de j� terem ocorrido.

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