Exagero, inclus�o? Disney realiza desfiles nos Parques com Papai Noel negro

Ao mostrar a manchete 'Disney realiza primeiros desfiles com Papais No�is negros' � minha filhota de 15 anos, perguntei a ela o que achava. A resposta: 'acho muito exagerado'.

Dando continuidade, perguntei por que ela achava exagerado, e assim me respondeu: 'eles ficam querendo que a gente n�o seja racista e tal, o que � certo, mas eles exageram, ficam falando disso o tempo todo, como se s� os negros pudessem ter privil�gios. E os brancos? N�o t�m os mesmos direitos, se somos todos iguais?'

Pronto. Foi a deixa para uma conversa maravilhosa, que terminou com o entendimento correto e com minha miss�o de pai (civilizado) cumprida com extremo louvor. 

Expliquei a ela que estes 'exageros' (no caso, nenhum!) s�o fruto de algo muito pior e extremamente mal�fico, que � o preconceito, a discrimina��o, seja �tnica, religiosa, de g�nero ou meramente pol�tica. Movimentos identit�rios exageram, sim, muitas vezes, mas como defesa, ou at� desespero, diante da selvageria inaceit�vel em pleno s�culo XXI.

Expliquei tamb�m que brancos n�o precisam de prote��o - ou de exageros!! - porque n�o s�o discriminados, assim como heterossexuais ou crist�os (em pa�ses majoritariamente crist�os, � claro). E que pol�ticas e campanhas de inclus�o, como a da Disney, n�o s�o privil�gios. Ao contr�rio! Se h� algo que os negros n�o conhecem, chama-se privil�gio. E novamente: h� exagero, sim. Que irrita muito �s vezes! Mas jamais podemos condenar, pois trata-se da mais pura e leg�tima defesa, ainda que 'exagerada'.

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Aproveitei a oportunidade e lhe perguntei: quem s�o 'eles'? Ela me disse: 'as pessoas que exageram; a sociedade'. Eis a� a face mais perversa das tais 'narrativas'. Idiotas cretinos, sejam de extrema direita ou esquerda, s�o useiros e vezeiros em atribuir a 'eles' (o inimigo oculto ou identific�vel) a culpa por todos os males do mundo. 'Eles', no caso, s�o todos que defendem e praticam ideias opostas. Minha filha agora sabe que n�o existem 'eles', mas pessoas de carne e osso, com nome e sobrenome.

Recentemente, um caso ruidoso de homofobia expl�cita praticado e ratificado pelo jogador de v�lei Maur�cio Souza, ex-atleta do Minas T�nis Clube de Belo Horizonte, desnudou a ignor�ncia e o odiento preconceito em rela��o � sexualidade humana. Ele e milh�es de ignorantes que passaram a lhe seguir e defender acreditam que o filho de um super her�i heterossexual n�o pode ser gay. Por qu�? Bem, Freud explica. Mas tamb�m imaginam que um adolescente se torna homossexual por estar exposto � homossexualidade.

Papai Noel, Superman e seu filho s�o personagens de fic��o. Seus criadores ou detentores de seus direitos t�m a prerrogativa legal de fazer o que quiserem (Papai Noel, claro, � de dom�nio p�blico) com suas imagens. O p�blico consumidor, por sua vez, sejam os leitores de quadrinhos ou os frequentadores dos parques da Disney, t�m o direito de gostar ou n�o, e, o mais importante, de consumir ou n�o seus produtos. Mas n�o t�m o direito legal - e deveriam ter sabedoria, equil�brio emocional, amor ao pr�ximo, toler�ncia e dec�ncia - de insurgir contra ou de recriminar atitudes inclusivas.

Ora, crian�as negras se identificar�o melhor com um Papai Noel branco ou negro? Qual o problema em coexistir 'bons velhinhos' brancos, pretos, amarelos, pardos ou vermelhos? Gays se identificar�o melhor com um super her�i homossexual ou heterossexual? Novamente: qual o problema da coexist�ncia? Por que negros e gays, apenas para ficar nos exemplos mais crassos, s�o obrigados a aceitar as diferen�as, mas a rec�proca n�o � verdadeira?

� falsa a defesa da moralidade e dos bons costumes (ainda que fosse algo real e comum, o que n�o � e nem jamais foi) que os Maur�cios da vida e seus semelhantes pregam para disfar�ar o repugnante preconceito que sentem. Como eu disse, Freud explica o �dio que certas pessoas t�m por determinadas coisas. O atleta atribui � sua 'cria��o na ro�a' sua homofobia. Bobagem. A ro�a ficou para tr�s. Hoje, ele � movido por seu entendimento de mundo, baseado em suas emo��es mais profundas. Sua ojeriza aos gays fundamenta-se em si mesmo, n�o em seu pai, por mais que este tenha lhe influenciado no passado.

� igualmente falso e profundamente hip�crita o uso da religi�o para atacar grupos. Deus jamais disse algo contra ou a favor de algu�m ou de alguma coisa. Primeiro porque o Criador, salvo prova em contr�rio, jamais bateu papo com homem algum (isso, � claro, na hip�tese da pr�pria exist�ncia), e segundo porque qualquer livro sagrado, de qualquer religi�o, n�o reflete o pensamento divino, mas, sim, de seus autores (fala aqui um judeu profundamente ligado ao juda�smo e seus valores, mas de igual sorte c�tico quanto aos escritos). Ali�s, se Deus � misericordioso e criou o homem � sua imagem e semelhan�a, por que raios odiaria gays, negros, judeus, �ndios, etc.?

Est� de parab�ns a Disney! Como est� a DC Comics e como esteve o Burger King, dias atr�s, e como est�o todas as empresas e pessoas que trabalham, ensinam, brigam e at� mesmo se indisp�em com amigos, parentes e consumidores em busca de um mundo mais civilizado, e de respeito irrestrito e incondicional pelo ser humano - qualquer ser humano! Que bom que tive essa conversa com minha filhotinha amada. Rogo para que tenham com os seus. Acreditem, certas coisas dependem apenas disso: uma boa conversa.