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Estado de Minas 50 ANOS DE HIST�RIA/ESPECIAL

"Clube da Esquina": sonho vira realidade nos est�dios da Odeon

Na terceira parte da s�rie, Toninho Horta, Robertinho Silva, Nelson Angelo, Luiz Alves e Wagner Tiso contam como foram as grava��es no Rio de Janeiro


08/03/2022 04:00 - atualizado 11/03/2022 09:20

Show do Som Imaginário nos anos 1970
Show do Som Imagin�rio nos anos 1970, com Wagner Tiso (teclado), Nivaldo Ornelas (sax), Jamil Joanes (baixo), Fredera (guitarra), Paulinho Braga (bateria) e Toninho Horta (guitarra) (foto: Arquivo EM/D.A Press )

Para al�m da criatividade de Milton Nascimento e L� Borges, muito do �xito do disco “Clube da Esquina” se deve ao artesanato da sonoridade �nica que come�ou a ser gestada poucos anos antes, quando o grupo Som Imagin�rio foi arregimentado para acompanhar Milton nos palcos. Foi ali pelo fim da d�cada de 1960, no Rio de Janeiro, que os m�sicos Wagner Tiso, Robertinho Silva, Luiz Alves, Tavito, Z� Rodrix e Laudir de Oliveira foram recrutados pelo produtor Z� Minssen para participar do show que ficou conhecido como “Milton Nascimento, ah, e o Som Imagin�rio”.
 
  
“Fizemos a estreia no Teatro Opini�o, no Rio, e foi um sucesso impressionante”, recorda o contrabaixista Luiz Alves, em entrevista ao Estado de Minas para a s�rie de reportagens “Nada foi como antes – Clube da Esquina 50 anos”. “Tinha fila na porta e toda a cultura da �poca ficou de queixo ca�do”.
“O Milton precisava de um grupo que desse peso � carreira dele”, conta o pianista e tecladista Wagner Tiso, esp�cie de diretor musical do Som Imagin�rio. Tiso, Robertinho Silva e Luiz Alves j� tocavam juntos em trio no fim dos anos 1960, com influ�ncias do jazz e da bossa nova, e participaram da funda��o do grupo. Logo, juntaram-se a eles Tavito e Z� Rodrix.

Depois dos primeiros shows, Tiso sentiu que, para ser “mais moderno”, faltava uma guitarra solo. Foi a� que entrou o carioca Frederico Mendon�a de Oliveira, o Fredera, trazendo verve ainda mais roqueira � trupe. “Ele deu um novo impacto no grupo”, observa Tiso. “Antes disso, eu tinha at� um pouco de preconceito com o rock”, assume Robertinho.

arte de girassol mostra todos os participantes do disco Clube da Esquina
(foto: Arte: Soraia Piva)


O Som Imagin�rio teve diversas forma��es e contou ainda com Toninho Horta, Nelson Angelo, Nan� Vasconcellos, Novelli, Jamil Joanes, Nivaldo Ornelas e Paulinho Braga. 

Com pegada jazz�stica e virtuosa, que mesclava psicodelia e rock progressivo ao som de Bituca, o grupo gravou o antol�gico “Milton”, lan�ado em 1970, quarto �lbum de est�dio do artista e considerado um dos mais arrojados de sua discografia. Foi um caminho natural, ent�o, que em 1971 os instrumentistas do Som Imagin�rio participassem das grava��es do “Clube da Esquina”. Wagner Tiso, Toninho Horta, Luiz Alves, Tavito, Robertinho Silva e Nelson Angelo emprestaram seus talentos para que as composi��es da trupe ganhassem vida.

As grava��es de “Clube da Esquina” representam muitas estreias para os que delas participaram: a primeira vez de L� e Beto Guedes no est�dio, o primeiro solo de Toninho Horta, o primeiro arranjo de Wagner Tiso para orquestra, a primeira aventura de Nelson Angelo no piano.

“Eu era o mais novo de toda a turma, um estreante, e o pessoal me recebeu com o maior carinho e solidariedade. Eles n�o me deixaram ficar inseguro, foram muito generosos”, diz L� Borges sobre a rela��o com os m�sicos, que, apesar de tamb�m jovens, eram mais tarimbados do que ele e Beto Guedes.

Lô Borges, Milton Nascimento e Beto Guedes no estúdio de gravação
L� Borges, Milton Nascimento e Beto Guedes no est�dio (foto: Odeon/reprodu��o)


Wagner Tiso j� havia percorrido longa estrada musical, mas viveu nova experi�ncia em “Clube da Esquina”. Ele e L� foram apresentar para Eumir Deodato a can��o “Nuvem cigana” para que o pianista criasse o arranjo para orquestra. Tiso tocou, L� cantou e Deodato avisou que estava indo para os Estados Unidos dali a dois dias. “Deixa que o Wagner faz isso, ele sabe escrever para orquestra”, disse Deodato.

L� comunicou o ocorrido a Bituca e ele acatou a sugest�o. “Embora j� tivesse feito arranjos para Johnny Alf, Agostinho dos Santos e Maysa, foi a primeira vez que escrevi para orquestra. Depois disso, embalei e fiz orquestra��o para todo o pessoal de Minas”, detalha Tiso, que marca presen�a em praticamente todas as faixas de “Clube da Esquina” tocando �rg�o, piano el�trico e ac�stico, al�m de fazer backing vocal em “Estrelas”.

“Foi o Wagner Tiso quem me fez entrar na m�sica mineira”, conta o baterista carioca Robertinho Silva, que, ent�o com 30 anos, tocou em
12 faixas de “Clube da Esquina”. “Eu j� era um craque”, brinca ele.

Robertinho inventou de levar um tambor de folia de reis e toc�-lo em “San Vicente”, para surpresa de Milton, que aprovou a interven��o. Essa can��o, ali�s, parceria de Milton com Fernando Brant, � a preferida de Robertinho no disco.  “A m�sica mineira me deu uma liberdade de cria��o que eu n�o tinha em nenhuma outra m�sica”, nota ele. “Quando vi a liberdade que eu tinha, fui apresentando o que sabia. Tocar com os mineiros foi um pr�mio na minha vida.”

Milton diz que, muitas vezes, os m�sicos escolhidos para determinadas fun��es eram os que estavam no est�dio no momento. “Pode ver que tem m�sica ali com Toninho Horta e o L� na percuss�o, o Beto Guedes no baixo. Era um clima de muita cria��o o tempo todo”, comenta.

O carioca Luiz Alves emprestou a sonoridade marcante de seu contrabaixo, ac�stico e el�trico, para 10 faixas do “Clube da Esquina”, al�m de tocar percuss�o em outras quatro. 
“Foi nesse disco que conheci L� e Beto Guedes. Fiquei ainda mais conhecido depois desse acontecimento que foi o ‘Clube da Esquina’”, diz ele. Participa��o que ele guarda com orgulho na mem�ria � o baixo el�trico que conduziu em “Clube da Esquina nº2”, ainda em vers�o instrumental. “O disco � moderno at� hoje”, analisa.

Wagner Tiso conta que as composi��es chegaram praticamente prontas ao est�dio. A partir dos arranjos de base, ele repassou as coordenadas para o Som Imagin�rio e todos trabalharam juntos. “Os arranjos desse disco foram coletivos”, diz.

Destaque tamb�m para os arranjos de orquestra criados pelo pianista Eumir Deodato em “Um girassol da cor do seu cabelo”, “Clube da Esquina nº2” e “Um gosto de sol”, sob reg�ncia do maestro Paulo Moura, morto em 2010.

“Foi uma conspira��o divina que aconteceu e juntou essa galera. De repente, Milton estava com um time muito especial de m�sicos para gravar o �lbum duplo”, observa Toninho Horta, que, com mais experi�ncia, atuou como arranjador nas grava��es de base de v�rias can��es, ajudando a formatar introdu��es, repeti��es e solos. 

Toninho Horta est� presente em 15 das 21 faixas de “Clube da Esquina”, tocando guitarra, viol�o, baixo e percuss�o, e tamb�m participando dos backing vocals.

João Bosco, cantor e compositor,sorri e olha para a câmera
(foto: T�lio Santos/EM/D.A Press)

'Esse �lbum � fascinante, um cl�ssico na hist�ria da m�sica brasileira. Quanto mais o tempo passa, mais prazeroso � explorar as ideias que l� est�o. Percebe-se que os grandes m�sicos que participaram o fizeram de v�rias formas, tocando instrumentos diferentes de uma faixa pra outra, induzindo ao ouvinte uma sensa��o de 'estar � vontade e livre', ao mesmo tempo em que h� um comprometimento. � um �lbum em que uma can��o dialoga ou tem afinidade com a seguinte, por isso n�o h� como escolher a preferida'

Jo�o Bosco, cantor e compositor


O solo inesquec�vel e “O trem azul”

A contribui��o mais marcante de Toninho Horta � o solo inesquec�vel em “O trem azul”, de L� e Ronaldo Bastos, feito a pedido de Wagner Tiso. Na primeira tentativa, o solo n�o saiu conforme o esperado. “Nunca tinha me considerado um solista, n�o tinha estudo aprofundado de escalas e m�dulos que o pessoal domina para ser bom improvisador”, explica.

“Wagner falou que na segunda eu tinha que acertar, porque grav�vamos tudo em dois canais, e eu fiz esse solo hist�rico”, diz o guitarrista, �s gargalhadas. Com poucas notas, Toninho deu ao solo a roupagem inusitada reproduzida por Tom Jobim quando o “maestro soberano” regravou a can��o em 1994, com letra em ingl�s. “O solo acaba deixando o autor em destaque, por ocupar o lugar do cantor na melodia”, diz Toninho.

“Essa reuni�o de talentos que o Bituca comandou, com a tend�ncia ao jazz, ao rock e ao cl�ssico do Som Imagin�rio, e a admira��o de L� Borges e Beto Guedes pelos Beatles deram um cunho popular ao projeto”, acredita Wagner Tiso. A preferida do pianista? Justamente “O trem azul”. “� uma m�sica que Tom Jobim e Elis Regina gravaram e o mundo todo canta: simples, bonita e comunicativa”.

Lô Borges e Toninho Horta na esquina de ruas Divinópolis e Paraisópolis, em Santa Tereza, em BH
L� Borges, autor da melodia de 'O trem azul", e Toninho Horta, que criou o solo inesquec�vel da can��o, na esquina mais famosa da MPB, em Santa Tereza, quando o disco Clube da Esquina completou 40 anos (foto: Juliana Flister/EM/7/3/12)


A liberdade criativa � citada tamb�m pelo compositor e guitarrista Nelson Angelo. “O est�dio � que era a casa de onde surgiam as ideias de arranjos e a participa��o dos m�sicos”, comenta. Al�m da guitarra, ele tocou percuss�o em algumas faixas. E piano, pela primeira vez na vida, em “Pelo amor de Deus”, de Milton e Fernando Brant.

“Nem aprendiz de feiticeiro eu era. Todo mundo tocou tudo”, diz. Criador talentoso, Nelson teve sua parceria com Ronaldo Bastos, “Quatro luas”, gravada por Bituca em seu terceiro LP, “Milton Nascimento”, de 1969. O amigo cantaria outras de suas can��es ao longo da carreira, como “Fazenda” e “Canoa, canoa” (escrita com Brant).

Nelson Angelo defende que a cria��o do “Clube da Esquina” tamb�m foi impulsionada pelas limita��es tecnol�gicas da �poca. Com apenas dois canais de grava��o dispon�veis no est�dio, eram exigidas organiza��o e criatividade musical fora do comum.

“Coisas inusitadas que aconteciam n�o eram poss�veis de tirar”, diz Nelson. “Todos sabiam muito bem o que queriam e desempenharam suas fun��es sem questionamento.” Ele diz que, durante as grava��es, ningu�m agia como “dono” daquilo que estava ocorrendo. “As pessoas mergulharam de corpo e alma nesse disco e todos ficaram extremamente satisfeitos de ter participado. Tudo era muito novo, fervendo e cheio de energia. Isso gerava um fogo bonito.”

O outro novato do grupo, Beto Guedes acompanhou todo o processo de elabora��o do �lbum. O multi-instrumentista de Montes Claros tocou baixo, guitarra, percuss�o, viol�o de 12 cordas e ainda dividiu com Milton Nascimento os vocais de “Nada ser� como antes” e “Sa�das e bandeiras nº 1” e “2”, al�m de backing vocals em outras faixas. Tamb�m participaram das grava��es o baterista Rubinho e o trombonista Raul de Souza.

Ronaldo Bastos diz que, com tantos instrumentistas excepcionais no est�dio, a parte musical dispensava os pitacos dele. “Nem mesmo na hora de colocar as vozes – coisa que eu, por ser compositor de letras, prezo muito na hora de produzir –  precisei fazer grandes observa��es”, comenta o letrista de “Cais”. (GS)

“Sa�das e bandeiras nº1”

Milton Nascimento e Fernando Brant

O que voc�s diriam dessa coisa que n�o d� mais p�?
O que voc�s fariam pra sair dessa mar�?
O que era sonho vira terra
Quem vai ser o primeiro a me responder?


>> Leia amanh�: A contribui��o de Ronaldo Bastos e M�rcio Borges nas letras do disco e a lembran�a de Fernando Brant 


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