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Estado de Minas POL�MICA E SUPERA��O

Por que perdoei o assassino do meu pai e transformei crime em com�dia

Pai de Chris McGlade, Terry, foi assassinado dentro de casa por um amigo que havia acolhido


30/06/2022 09:51 - atualizado 30/06/2022 10:54


Chris McGlade
Pai de Chris McGlade, Terry, foi assassinado dentro de casa por um amigo que havia acolhido (foto: Chris McGlade)

A com�dia muitas vezes � vista como uma forma �til de lidar com temas dif�ceis, mas Chris McGlade foi al�m com seu stand-up Forgiveness ("Perd�o") sobre o assassinato do seu pai, em 2011.

O pai de McGlade, Terry, foi assassinado aos 77 anos dentro de casa por um amigo que havia recebido para morar com ele.

"Lembro quando a pol�cia veio e disse que meu pai havia sido estrangulado at� a morte e queimado", afirma o comediante de sua casa em Redcar, no norte da Inglaterra. "Fiquei em choque porque achei que ele havia morrido queimado."

O homem que assassinou Terry foi condenado � pris�o perp�tua.

"O assassino era alco�latra e sem-teto", relembra McGlade. "Ele trabalhava entregando pizzas e perdeu o emprego. Foi assim que acabou morando com meu pai, porque queria um lugar para ficar e meu pai o acolheu."

Terry n�o deu �lcool ao homem, nem as chaves do carro. E isso acabou resultando na sua morte.


Chris e Terry McGlade
Tempos felizes: Chris e Terry McGlade (foto: Chris McGlade)

Muitas pessoas na mesma situa��o de Chris McGlade sentiriam apenas �dio do assassino do seu pai, mas ele seguiu um caminho diferente.

"� algo muito pessoal", diz ele. "Quando soubemos que meu pai havia sido assassinado, meu perd�o foi algo mais ou menos instintivo. Para algumas pessoas, leva um tempo. Para outras, � instant�neo. E existem ainda aqueles que n�o conseguem (perdoar)."

Ele se lembra de conversar em casa com os policiais que compartilharam a not�cia. "Eu disse 'bem, n�o sei o que fazer agora'", relembra McGlade. "E o detetive respondeu 'como assim, voc� n�o sabe o que fazer?'"

"Eu disse 'bem, n�o sei se vou enterr�-lo ou crem�-lo — porque isso � importante, voc� sabe. Sempre dizem que, se voc� cremar seus entes queridos, voc� deve espalhar as cinzas em algum lugar aonde eles gostavam de ir — e eu n�o acho que os funcion�rios do balc�o do a�ougue do supermercado ficariam muito felizes.'"


Chris e Terry McGlade com cachorro
Chris McGlade com pai e cachorro (foto: Chris McGlade)

McGlade estava "rindo na frente dos policiais, entre as l�grimas, uma coisa estranha", lembra ele.

"Minha esposa disse 'ele � assim, mesmo' e ela estava certa. Era o meu jeito — mas era tamb�m o jeito da minha fam�lia e o jeito do meu pai."

A fam�lia de McGlade sempre teve um "senso de humor muito irreverente", segundo ele, e "se voc� n�o rir, sua rea��o ser� chorar. Foi assim que fui criado."

E, no exato momento em que riu, optou pelo perd�o.

"Podia sentir meu pai � minha volta", afirma McGlade. "Apenas sentia. Estava simplesmente certo. Havia um fluxo simples em tudo."

"A raiva havia amea�ado me dominar. [Mas] em todo aquele riso e aquela luz, consegui erguer-me acima da raiva que estava batendo nos meus calcanhares", explica. "Senti que o certo era superar aquela for�a, aquela raiva que estava tentando me puxar para baixo. N�o queria ser aquele tipo de pessoa amarga ou ressentida."

Mas McGlade ficou, na verdade, profundamente abalado com a perda. Sete anos depois, enquanto se apresentava para um p�blico lotado na adega de um pequeno espa�o no Festival de Edimburgo, na Esc�cia, ele teve um ataque de p�nico, correu do palco, se isolou e escreveu um poema, chamado Blood Beneath Your Nails ("Sangue sob suas unhas", em tradu��o livre), sobre a evid�ncia que ajudou a provar que seu pai havia sido assassinado.

"Era sobre o julgamento do meu pai, no tribunal", conta.


Assentos em sala de teatro
Chris McGlade orgulha-se de reunir diversos grupos de pessoas no seu show (foto: BBC)

No dia seguinte, McGlade decidiu escrever o roteiro de um show sobre o assassinato, como forma de process�-lo.

No come�o, ele diz n�o ter certeza de como poderia fazer com�dia com um tema t�o perturbador. Mas, por ter come�ado a apresentar-se em clubes de trabalhadores por vezes violentos, ele tinha experi�ncia suficiente para servir como base. Por isso, decidiu tentar transformar parte desse "humor do clube de trabalhadores" em uma "com�dia de classe m�dia, de homens que pensam, provocadora".

O show tamb�m fala da inf�ncia de Chris McGlade no nordeste da Inglaterra. "� uma hist�ria bem da classe oper�ria e defende a vida dessa classe", segundo ele.

Engasgando de emo��o

O espet�culo recebeu cr�ticas positivas.

O jornal escoc�s The Scotsman chamou Forgiveness de "uma experi�ncia �nica", com "boas gargalhadas no estilo antigo", enquanto The Telegraph declarou que era "um dos momentos mais agrad�veis e inspiradores do Fringe [o Festival de Edimburgo]".

E um dos momentos de maior orgulho para McGlade aconteceu no in�cio de 2020: a apresenta��o do seu show no Teatro Soho, uma vitrine para novos talentos, "um dos teatros mais inovadores de Londres", diz ele.

O teatro descreveu o show como uma "tentativa [de McGlade] de enterrar os fantasmas que o assombravam". E ele sorri com orgulho, emocionando-se enquanto relembra a audi�ncia de "pessoas negras, brancas, asi�ticas, idosas, jovens, homens, mulheres, de classe m�dia e da classe oper�ria" — um legado que teria deixado seu pai orgulhoso.

Discrimina��o

Outro dos poemas de McGlade, The Right to Hate ("O direito de odiar", em tradu��o livre), diz:

"N�o deduza naturalmente que sou grosso e racista por que sou da classe oper�ria do norte. N�o sou assim. Sou articulado, perspicaz e inteligente."

"As pessoas da classe oper�ria sofrem terr�vel discrimina��o", afirma ele. "E agora sinto vontade de chorar, porque esta � a divis�o de que ningu�m quer falar neste pa�s. Falem sobre racismo, g�nero e a divis�o �... colocar um contra o outro."

"Toda essa quest�o do Brexit (sa�da do Reino Unido da Uni�o Europeia) realmente demonstrou a discrimina��o contra as pessoas da classe oper�ria... porque elas n�o se comportaram da forma que a cultura progressista da classe m�dia esperava", segundo McGlade.


Edimburgo
"Forgiveness" est� novamente em cartaz este ano no Festival de Edimburgo, na Esc�cia (foto: BBC)

O Teatro Soho pediu a McGlade que retirasse alguns "insultos raciais" de Forgiveness, que, segundo ele, eram "g�ria da classe oper�ria e n�o foram usados com mal�cia". E, embora ele tenha concordado com isso, uma refer�ncia "antissemita" no seu poema fez com que o espet�culo n�o voltasse � programa��o do teatro depois do confinamento.

McGlade conta que foi uma "jornada de descoberta". Depois de uma apresenta��o, dois membros do Movimento de Defesa Israelita disseram a ele: "voc� nos fez ver que as pessoas podem dizer coisas antissemitas sem que sejam antissemitas. Podem diz�-las por falta de informa��o."

"Ent�o chorei e abracei aqueles dois e eles tamb�m me abra�aram", relembra McGlade.

Ele acrescenta que conseguiu encontrar uma forma diferente de "dizer o que eu queria dizer no show, enquanto zoava o fato de ser censurado".

Forgiveness est� novamente em cartaz, viajando pelo Reino Unido.

'Adoro a aceita��o'

Chris McGlade considera toda a sua vida um processo de aprendizado e essa experi�ncia � parte desse processo.

"Espero aprender algo de novo no meu leito de morte", afirma ele. "Se estiver crescendo, evoluindo e ficando melhor todo o tempo, isso quer dizer que a minha vida — no dia em que eu bater as botas — serviu para alguma coisa."

Ele vai continuar fazendo com�dia: "adoro — adoro a aceita��o, porque adoro ver as pessoas rindo."

"Sofri bullying durante toda minha inf�ncia", diz McGlade. "E, sempre que consigo uma risada, aquele garoto que costumava levar uma bofetada no rosto leva um tapinha nas costas. E � isso que me faz seguir adiante."

- Este texto foi originalmente publicado em http://bbc.co.uk/portuguese/geral-61845148

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