(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas LITERATURA

Novo livro de Frei Betto tematiza massacre ind�gena

Livro escrito nos �ltimos cinco anos se baseia na hist�ria do povo Waimiri-Atroari na Amaz�nia durante o regime militar e chega �s livrarias neste m�s de julho


24/07/2022 04:00 - atualizado 24/07/2022 07:31

de camisa estampada e óculos, Frei Betto olha para o lado, em ambiente aberto
"A forma como o povo Waimiri-Atroari foi v�tima de um massacre � paradigm�tica. Quase 3 mil indiv�duos desapareceram num per�odo muito curto de tempo", afirma Frei Betto (foto: Jo�o Laet/ Divulga��o)
O novo livro de Frei Betto, o romance hist�rico “Tom vermelho do verde”, que chega �s livrarias f�sicas e virtuais no final deste m�s, come�ou a ser escrito h� cinco anos, e seu foco recai sobre fatos ocorridos na d�cada de 1970, em torno da constru��o da rodovia BR-174, que cruza a Floresta Amaz�nica. A narrativa, no entanto, reverbera de modo impactante nos dias atuais.

A trama � centrada no drama vivido pelo povo ind�gena Waimiri-Atroari, a partir do momento em que o governo militar brasileiro deu in�cio � constru��o da BR-174. Em nome de um suposto progresso, com vistas � explora��o dos recursos naturais e a implanta��o de iniciativas agropecu�rias, o coronel Luiz Fontoura, um dos personagens do livro, tem como maior ambi��o “retalhar a selva de estradas”.

Baseado em eventos hist�ricos, “Tom vermelho do verde” relata como os Waimiri-Atroari foram alvos de diversas invas�es. Seus integrantes foram encurralados, aprisionados, escravizados, queimados, assassinados. Frei Betto diz que a motiva��o para escrever o livro foi o desejo de revelar uma p�gina da hist�ria relacionada � ditadura militar que n�o foi suficientemente dada a conhecer: a forma como ela reprimiu os povos ind�genas e provocou verdadeiros massacres no Amazonas.

O autor observa que, por uma dram�tica coincid�ncia, a obra vem � luz no momento em que o assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista ingl�s Dom Phillips no Vale do Javari, no Oeste do estado do Amazonas, repercute mundialmente. Um grupo de 23 congressistas dos Estados Unidos acaba de escrever uma carta � Secretaria de Estado do pa�s (�rg�o equivalente ao Minist�rio de Rela��es Exteriores) para pedir, entre outras a��es, uma investiga��o imparcial e completa do caso e encontros com representantes dos povos ind�genas.

Ao mesmo tempo, garimpeiros, latifundi�rios, madeireiros e mineradoras seguem invadindo terras ind�genas de maneira indiscriminada, conforme aponta Frei Betto. “Esse livro � um projeto que eu acalentava h� 10 anos; comecei a trabalhar nele h� cinco, movido por essa vontade de revelar o que houve em 1970 e que, infelizmente, parece estar se repetindo agora, de outra forma, envolvendo outros mecanismos, mas com os mesmos efeitos devastadores”, diz.
 
Indígenas da tribo waimiri-atroari
Ind�genas da tribo waimiri-atroari comemoram, em 2003, o nascimento do mil�simo integrante da tribo, que esteve sob risco de extin��o (foto: Euzivaldo Queiroz / A Cr�tica / Ag�ncia O Globo)

Drama terr�vel 

Ele pontua que “Tom vermelho do verde” come�ou a ser escrito antes das elei��es de 2018, que levaram Jair Bolsonaro � presid�ncia e, assim, degeneraram na atual situa��o dos povos origin�rios.  “Eu n�o esperava que Bolsonaro ganhasse e n�o podia imaginar, portanto, que f�ssemos estar assistindo, atualmente, a esse drama terr�vel que os povos ind�genas est�o passando. H� cinco anos j� tinha ocorrido o golpe parlamentar que tirou Dilma Rousseff da presid�ncia, mas eu esperava sinceramente que Haddad ganhasse as elei��es”, diz.

Ele destaca que tinha em mente apenas o fato de que essa p�gina terr�vel de viol�ncia contra os ind�genas durante a ditadura militar nos anos 1970 sempre foi muito pouco falada, com apenas alguns escritores e jornalistas levantando a quest�o pontualmente ao longo das �ltimas d�cadas. “A forma como o povo Waimiri-Atroari foi v�tima de um massacre � paradigm�tica. Quase 3 mil indiv�duos desapareceram num per�odo muito curto de tempo”, diz.

O autor ressalta que o livro aborda a quest�o socioambiental para al�m do drama vivido pelos Waimiri-Atroari. “Tom vermelho do verde” abrange v�rios aspectos do que ocorreu na Amaz�nia, com a chegada e a invas�o das supostas miss�es protestantes, das madeireiras e das mineradoras, segundo Frei Betto.

Nome aos bois 

A narrativa chega at� 2021, quando o coronel Fontoura, nonagen�rio, visita o major reformado Paulo Cordeiro, presidente da Holos Global Investimentos, representante de empresas estrangeiras interessadas em explorar as riquezas da Amaz�nia. Frei Betto usa a conversa entre eles para dar nome aos bois: BlackRock, Citigroup, JP Morgan Chase, Vanguard, Bank of America e Dimensional Fund Advisors, que, juntas, investiram na regi�o, apenas nos �ltimos tr�s anos, U$ 18 bilh�es.

O di�logo explicita, ainda, que tais investimentos n�o s�o feitos de forma direta, mas por meio de empresas que atuam na Amaz�nia, como as mineradoras Vale, Pot�ssio do Brasil, Anglo American e Belo Sun; as do agroneg�cio, como Cargill, JBS e Cosan/Ra�zen; e empresas da �rea energ�tica, como a Energisa Mato Grosso, Equatorial Energia Maranh�o, Bom Futuro Energia e Eletronorte.

Frei Betto diz que demorou cinco anos para escrever “Tom vermelho do verde” n�o porque tenha havido no processo alguma interrup��o ou necessidade de revis�o � luz de fatos novos, mas por uma quest�o de cautela. “N�o s� revejo muitas vezes depois de escrito como tamb�m envio para pessoas que dominam o tema, indigenistas, historiadores, etn�logos, antrop�logos, estudiosos do tema”, diz.

Colaboradores 

Ao final do livro, ele lista alguns desses colaboradores, como o antrop�logo Stephen Grant Baines, professor da Universidade de Bras�lia; o pesquisador da hist�ria ind�gena Benedito Prezia; a escritora e tradutora Bhuvi Libanio; e principalmente o indigenista, fil�sofo, te�logo e ativista social Egydio Schwade, a quem “Tom vermelho do verde” � dedicado.

Frei Betto destaca que sua principal fonte de pesquisa para reconstruir o drama dos Waimiri-Atroari foram os documentos fornecidos por Schwade. “Ele mora no territ�rio deles e dedica a vida � causa ind�gena. Egydio foi quem me deu mais material para a escrita do livro. Ele tem uma documenta��o profunda e vasta a respeito. Foi ele, inclusive, quem dicionarizou o idioma dos Waimiri”, sublinha.

Em texto enviado ao autor em dezembro de 2020, Schwade escreve: “A hist�ria do desaparecimento de mais de 2 mil Waimiri-Atroari em menos de cinco anos ainda � um mist�rio para a sociedade brasileira. Al�m dos Kinja (palavra que para este povo ind�gena significa “gente de verdade”) sobreviventes, s� elementos do Comando Militar da Amaz�nia e da Funai s�o detentores de informa��es sobre os acontecimentos no per�odo em que essa trag�dia humana aconteceu”.

Import�ncia estrat�gica 

Com base nas pesquisas que realizou, Frei Betto exp�e, no livro, que a ditadura militar considerava de import�ncia estrat�gica a abertura da BR-174. O extremo Norte do subcontinente sul-americano se encontrava amea�ado por conflitos armados. Venezuela e Guiana disputavam, havia s�culos, a regi�o de Essequibo, �rea de 130 mil km², rica em recursos naturais.

A CIA (Ag�ncia Central de Intelig�ncia dos EUA) operava por tr�s, interessada em derrubar o governo esquerdista do primeiro-ministro Forbes Burnham, que chegara ao poder na Guiana em 1964. Caso o conflito se agravasse, o Brasil deveria intervir para se consolidar como pot�ncia hegem�nica regional. No entanto, conforme observa o autor, a opera��o poderia ser prejudicada pela falta de rodovias, o que dificultaria a mobiliza��o das for�as terrestres.

Soma-se � colabora��o externa para a feitura do livro o “profundo conhecimento da cultura ind�gena” de Frei Betto, conforme destaca o texto de orelha da obra. “Eu sempre tive muito contato com povos ind�genas; em v�rias ocasi�es estive com eles, em viagens ao Amazonas, ao Acre e assessorando encontros de comunidades eclesiais de base nos quais eles estavam presentes. Tamb�m pelo fato de o nosso convento em S�o Paulo ter abrigado a Uni�o das Na��es Ind�genas. Eles mantiveram a sede l� durante um tempo”, diz o frade dominicano.

Situa��o atual 

Ele observa que pouco se sabe da situa��o atual dos Waimiri-Atroari, porque seu territ�rio est� confinado pelo Programa Waimiri, desenvolvido por empresas que exploram suas terras, como a Usina Hidrel�trica Balbina e a mineradora Paranapanema. “Ningu�m consegue entrar l�, � dif�cil saber como est�o, porque o acesso ao territ�rio n�o � permitido. O que sabemos � que linhas de transmiss�o para ligar Roraima com o resto da conex�o el�trica do Brasil v�o passar pela terra deles, o que tamb�m vai ter um impacto grande, vai criar muitos problemas”, destaca.

Frei Betto considera que os povos ind�genas, no geral, continuam sofrendo, nos dias atuais, agress�es semelhantes �s que foram perpetradas contra os Waimiri-Atroari a partir de 1970. “Elas seguem acontecendo, de maneira menos sistem�tica, sobretudo pelos grileiros, madeireiros, pescadores ilegais, mineradoras e garimpeiros. N�o existe fiscaliza��o. A Funai virou Funer�ria Nacional dos �ndios, � c�mplice dos criminosos que est�o devastando a Amaz�nia e os povos ind�genas”, ressalta.

Frei Betto vem a Belo Horizonte participar do projeto Sempre um Papo para debate de lan�amento de “Tom vermelho do verde”, em conversa com Afonso Borges, no dia 24 de agosto. Antes, ele cumpre agenda de lan�amento, ao longo do m�s de agosto, no Rio de Janeiro (dia 8), em S�o Paulo (dia 15) e em Vit�ria (dia 17).

Capa do livro 'TOM VERMELHO DO VERDE'

“TOM VERMELHO DO VERDE”
• Frei Betto
• Editora Rocco (208 p�gs.)
• Em pr�-venda nas principais lojas on-line com pre�os variando entre R$ 44,95 
e R$ 59,90


receba nossa newsletter

Comece o dia com as not�cias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)