
''Quando o personagem n�o tem g�nero definido pelo texto ou pelo projeto, minha tend�ncia � ilustrar menina ou mulher. Acho que j� instintivamente fa�o disso um trabalho pol�tico''
Anna Cunha, escritora e ilustradora
Um concurso ganho e um pr�mio perdido por causa de min�cia acabaram fazendo com que a ilustradora mineira Anna Cunha, de 37 anos, ganhasse o Jabuti 2022, mais tradicional premia��o liter�ria do Brasil. Esta � a hist�ria de “Origem”, vencedor na categoria Ilustra��o da 64ª edi��o do pr�mio.
Corria o ano de 2018 e Anna, com dezenas de hist�rias (dos outros) ilustradas, decidiu fazer a sua pr�pria. Seu objetivo naquele ano era se inscrever no Concurso Jo�o de Barro, criado h� quase quatro d�cadas pela Prefeitura de Belo Horizonte e voltado exclusivamente para a literatura infantojuvenil.
Anna escreveu e ilustrou “Origem”. Venceu o Jo�o de Barro. S� que o documento de atestado de d�bito trabalhista faltou em sua ficha de inscri��o. “No edital n�o ficava claro, o pedido (do atestado) estava escondido. Consegui o documento, entrei com o recurso, mas n�o adiantou.” O Jo�o de Barro foi perdido.

O Jabuti, Anna comenta, � um incentivo e tanto “para acreditar no meu trabalho autoral”. Ela admite que pensou em desistir no meio do caminho. “Fiz um livro (‘Cisco’) em 2013, ganhei men��o honrosa no Jo�o de Barro. Mas ele nunca foi publicado. Estava bastante desanimada.”
Tanto “Origem” quanto “Cisco” fogem do comum. “S�o livros que escapam de defini��es, um pouco sem lugar. N�o t�m texto infantil, mas, ao mesmo tempo, s�o ilustrados. S�o ou n�o para crian�as? Para mim, isso n�o importa, pois os bons livros infantis s�o para todas as idades. Comercialmente, no entanto, acaba sendo dif�cil encontrar editoras que se interessem.”
“Origem” nasceu da viagem que Anna fez pela �frica, em 2017. Durante dois meses, a bordo de um caminh�o, ela percorreu oito pa�ses.
“Comecei a ficar muito tomada por algumas imagens. A brincadeira das crian�as me marcou ao longo da viagem. Elas n�o tinham objetos, brinquedos, ent�o brincavam com coisas da terra, sementes, galhos, o que achavam dispon�vel na natureza. E tamb�m com o corpo de uma forma potente, o que me emocionou muito.”
Jornada africana
Ao retornar a Belo Horizonte, Anna levou um tempo at� se sentar para escrever e ilustrar, ainda impactada pela viagem. “Foi meio desordenado, ca�tico. Imagens no livro, como de crian�as embaixo de uma �rvore, era o que eu via o tempo todo, a cada vilarejo. Ao mesmo tempo, certas frases come�aram a chegar e, de maneira pouco planejada, imagem e palavras foram sendo constru�das juntas. No final, ficou uma esp�cie de prosa po�tica.”

Graduada em artes pl�sticas pela Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg) – tamb�m se formou em ci�ncias biol�gicas pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mas nunca atuou no meio –, Anna trabalha com ilustra��o desde a juventude. Aos 18 anos, come�ou pelas pr�prias produ��es: cart�es, caderninhos e agendas, que passaram a ser comercializados.
No meio profissional, ilustrou para revistas, atuou no segmento do design gr�fico e da publicidade, at� que em 2011 estreou no mercado editorial. Depois do primeiro livro ilustrado, “Vestido de menina” (Peir�polis), de Tatiana Felinto, n�o parou mais. Com rar�ssimas exce��es, como o conto “A instrumentalina” (Peir�polis), da autora portuguesa L�dia Jorge, todos os t�tulos s�o voltados para o p�blico infantojuvenil.
As figuras femininas s�o muito presentes. “Quando o personagem n�o tem g�nero definido pelo texto ou pelo projeto, minha tend�ncia � ilustrar menina ou mulher. Acho que j� instintivamente fa�o disso um trabalho pol�tico”, comenta.

Imagens de pessoas negras tamb�m s�o uma constante. “Isso faz parte do meu trabalho desde o princ�pio. Parte do interesse de olhar para a cultura brasileira, para a diversidade, e de estar atenta ao que nos diz respeito.”
Mesmo com a demanda para o mercado editorial, Anna continua produzindo sua linha em papelaria. Al�m de cart�es e cadernos, h� p�steres, azulejos, porta-copos, carimbos e roupas para beb�s comercializados em lojas de museus, livrarias e no site annacunha.com.

Atualmente, o papel, o l�pis e a tinta perderam espa�o para o meio digital, no qual ela faz a maior parte de suas ilustra��es.
“A ilustra��o digital vem da pesquisa de linguagem pict�rica. Para mim, n�o tem diferen�a se eu tivesse pintado � m�o. O processo, semelhante ao da pintura anal�gica, me instiga, pois tive que desenvolver a minha linguagem para trabalhar”, finaliza.

“ORIGEM”
• De Anna Cunha
• Maralto
• 40 p�ginas
• R$ 44,90
• � venda em www.annacunha.com