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Estado de Minas 300 anos

Eterna arte das Minas do Ouro

Antecessor de Aleijadinho, Vieira Servas (1720-1811), escultor portugu�s, � artista maior das igrejas do barroco mineiro


25/10/2020 04:00 - atualizado 25/10/2020 14:31

Adriano Ramos 
Pesquisador e restaurador de obras de arte da empresa Grupo Oficina de Restauro
 
ANJO - IGREJA DO ROSÁRIO, MARIANA(foto: Eugênio Sávio/ Arquivo: Instituto Cultural Flávio Gutierrez )
ANJO - IGREJA DO ROS�RIO, MARIANA (foto: Eug�nio S�vio/ Arquivo: Instituto Cultural Fl�vio Gutierrez�)
 


Neste ano de 2020, comemora-se o tricenten�rio de nascimento de Francisco Vieira Servas, renomado entalhador e escultor das artes produzidas no Barroco mineiro. 
 
Nascido em Portugal, em 1720, e estabelecido definitivamente nas Minas Gerais a partir de meados dos setecentos, Servas deixou um conjunto de ret�bulos e imagens tridimensionais que se tornaram parte integrante do conjunto art�stico daquele per�odo.
 
ORATÓRIO MUSEU DO ORATÓRIO OURO PRETO(foto: Eugênio Sávio/ Arquivo: Instituto Cultural Flávio Gutierrez )
ORAT�RIO MUSEU DO ORAT�RIO OURO PRETO (foto: Eug�nio S�vio/ Arquivo: Instituto Cultural Fl�vio Gutierrez�)
 
 
Sua obra, de imensa import�ncia para a compreens�o do universo das artes pl�sticas produzidas nas Alterosas nos s�culos 18 e 19, encontra-se espalhada por diversas localidades do estado, em suntuosos templos religiosos de cidades como Ouro Preto, Mariana, Sabar�, Catas Altas do Mato Dentro e Nova Era, entre outras. 
 
QUERUBINS - IGREJA DO ROSÁRIO, MARIAna(foto: Eugênio Sávio/ Arquivo: Instituto Cultural Flávio Gutierrez )
QUERUBINS - IGREJA DO ROS�RIO, MARIAna (foto: Eug�nio S�vio/ Arquivo: Instituto Cultural Fl�vio Gutierrez�)
 
 
Estudado e aclamado por diversos especialistas, seu legado excepcional foi reunido em um livro – Francisco Vieira Servas e o of�cio da escultura na capitania das Minas do Ouro, com pesquisa, organiza��o e texto meus, coordena��o editorial de Angela Gutierrez e publica��o do Instituto Cultural Fl�vio Gutierrez. Lan�ado em 2002, atu- almente encontra-se esgotado  e sua reedi��o est� prevista para o pr�ximo ano.
 
Sacrário com querubins - Igreja do Rosário, Mariana(foto: Eugênio Sávio/ Arquivo: Instituto Cultural Flávio Gutierrez )
Sacr�rio com querubins - Igreja do Ros�rio, Mariana (foto: Eug�nio S�vio/ Arquivo: Instituto Cultural Fl�vio Gutierrez�)
 
 
Francisco Vieira Servas nasceu na Freguesia de Sam Paio de Eira Vedra, Concelho de Vieira, Comarca de Guimar�es, Arcebispado de Braga, Portugal. Pelas consultas feitas no arquivo da arquidiocese na cidade de Braga, descobriu-se sua certid�o de batismo, inclusive com uma sugestiva refer�ncia a seu padrinho, Francisco Vieira da Torre, com quem veio a aprender o of�cio de entalhador, e que foi, comprovadamente, em 1729, o respons�vel pela execu��o de dois ret�bulos e da talha do arco-cruzeiro na Matriz de Torgueda, Concelho de Vila Real.
 
ANJO - SANTUÁRIO BOM JESUS DO MATOZINHOS (foto: Eugênio Sávio/ Arquivo: Instituto Cultural Flávio Gutierrez )
ANJO - SANTU�RIO BOM JESUS DO MATOZINHOS (foto: Eug�nio S�vio/ Arquivo: Instituto Cultural Fl�vio Gutierrez�)
 
 
As primeiras not�cias em terras brasileiras sobre Servas datam de 1753, em Catas Altas do Mato Dentro, onde, juntamente com Manoel Pinto, Martinho Gon�alves e Feliciano Pereira  XXXXX  todos na condi��o de oficiais entalhadores XXXXX, recebeu, da Irmandade do Sant�ssimo Sacramento, os honor�rios referentes a trabalhos j� executados na Matriz de Nossa Senhora da Concei��o daquela localidade. Sua trajet�ria, desde essa �poca, foi marcada por diversos contratos profissionais com in�meras irmandades religiosas da Capitania, e que vieram estabelecer definitivamente a sua condi��o de mestre do of�cio da arte da talha e da escultura.
 
Santa Efigênia(foto: Eugênio Sávio/ Arquivo: Instituto Cultural Flávio Gutierrez )
Santa Efig�nia (foto: Eug�nio S�vio/ Arquivo: Instituto Cultural Fl�vio Gutierrez�)
 
 
Em seu testamento, datado de 1809 e escrito por Joam Fernandes Rodrigues de Lima sob sua aquiesc�ncia, Francisco Vieira Servas se refere a seus pais, Domingos Vieira e Thereza Vieira, como cat�licos e j� falecidos, e a si mesmo na condi��o de solteiro e sem filho algum como herdeiro.
 
No ano de 1793, aos 73 anos, ainda de acordo com o seu testamento, Servas � citado como propriet�rio de uma ro�a situada no c�rrego de S�o Nicolau, em S�o Domingos do Prata. Juntamente com Juliana Maria d'Assump��o, casada com um parente do seu padrinho Francisco da Torre, requereu � Coroa portuguesa uma sesmaria de meia-l�gua de terra no citado c�rrego, Freguesia de S�o Miguel de Piracicaba, cujas terras devolutas compreendiam v�rios matos virgens e capoeiras. Alegava que os dois n�o tinham �rea de cultura para seu sustento e de seus escravos e que a terra almejada n�o estava pr�xima a nenhum arraial nem capela ou rio naveg�vel, como se fazia necess�rio para essa requisi��o. 
 
Retábulo da Matriz de São José da Lagoa, Nova Era (MG)(foto: Eugênio Sávio/ Arquivo: Instituto Cultural Flávio Gutierrez )
Ret�bulo da Matriz de S�o Jos� da Lagoa, Nova Era (MG) (foto: Eug�nio S�vio/ Arquivo: Instituto Cultural Fl�vio Gutierrez�)
 
 
O patrim�nio de Vieira Servas ainda era composto de uma fazenda de ro�a com seu engenho de bois no Ribeir�o do Ferreiro, Freguesia de S�o Miguel, hoje Rio Piracicaba, e de outros escravos al�m de Jos� Angola, oficial entalhador, e Ant�nio Macuco, ambos nomeados no testamento para receber carta de liberdade ap�s o seu falecimento.
 
Sua morte ocorreu em 1811, como consta em seu atestado de �bito, anexado ao testamento e registrado em Catas Altas do Mato Dentro:
“Aos dezesette de julho de mil oito centos e onze faleceu com todos os sacramentos Francisco Vieira Servas, homem branco, solteiro, natural de Portugal e com solemne testamento: foi enco- mendado e sepultado dentro da Capella de Sam Domingos da Prata, do arco-cruzeiro  para cima, e teve acompanhamento do coadjutor Manuel Roiz Souto”.
 
A produ��o art�stica de Francisco Vieira Servas, tanto no que concerne a seus ret�bulos quanto �s suas esculturas, tem forte personalidade autoral e traz em sua ess�ncia um leque de informa��es bastante peculiares. 
 
A postura mais cl�ssica dos seus ret�bulos, sem muitos entreveros figurativos e ornamentais, sempre foi pautada por uma disciplina est�tica em que os c�nones s�o fielmente respeitados. Os m�dulos s�o bem definidos e espa�ados, com destaque para as banquetas, nas quais se apoiam os seus inconfund�veis sacr�rios, que se apresentam centrados por cora��o com tr�s art�rias superiores, estando a do centro sempre encimada por cruz e l�rio. 
 
Quando vi�vel financeiramente para as irmandades, o ret�bulo contratado contava com a presen�a de pares de querubins e figuras de anjos distribu�dos simetricamente em pontos estrat�gicos da  composi��o. Tamb�m o mesmo ocorria com o coroamento, resolvido pela presen�a de uma arbaleta, que acabou por se tornar a sua marca registrada  no momento em que o estilo rococ� predominava na ent�o capitania das Minas. Muito comum ainda s�o as sequ�ncias em motivos fitomorfos usadas por Servas, que, geralmente, decoram os quartel�es dos seus ret�bulos, compostas por cam�lia, bugarim e flores mi�das. 
 
Nas composi��es escult�ricas que constituem a decora��o desses ret�bulos reside o maior n�mero de refer�ncias que, se bem observadas, oferecem ao estudioso os verdadeiros tra�os de um artista ou do ateli� por ele comandado. Esse exerc�cio inicia-se pela an�lise comparativa das imagens tridimensionais com as esculturas que comp�em os referidos ret�bulos, cujos autores s�o  nominalmente citados nos contratos celebrados com as irmandades religiosas. 
 
Com raras exce��es, praticamente n�o existia em Minas Gerais documenta��o relativa ao pagamento ou mesmo � contrata��o de santeiros, imagin�rios e/ou escultores para a confec��o das suas obras. Nesse contexto, as express�es faciais, a disposi��o dos panejamentos e o tratamento destinado �s cabeleiras das figuras que integram as decora��es desses ret�bulos, com autoria comprovada, s�o alguns dos importantes dados a serem utilizados pelos especialistas em suas an�lises atributivas.    
As imagens confeccionadas por Francisco Vieira Servas podem ser a ele confiantemente atribu�das por variados aspectos que lhe s�o inerentes e que demarcam de forma bastante clara os seus estilemas. Na indument�ria das suas figuras, observa-se a presen�a de significativos recortes geom�tricos nas extremidades dos mantos, com destaque para a resolu��o em formato retangular, principalmente no barrado das imagens femininas. 
 
Tamb�m bastante comum no seu trabalho � a triangula��o dos mantos na parte frontal da imagem, proporcionando-lhe acentuada movimenta��o. As solu��es anat�micas adotadas por Servas, igualmente, trazem, em sua composi��o, caracter�sticas marcantes traduzidas pela simetria da face, igualdade entre as larguras da boca, narinas e olhos, e pela termina��o do cabelo sobre a testa em pequena ponta semelhante a uma “v�rgula”. 
 
Ao completar 300 anos do seu nascimento, n�o poder�amos deixar de prestar uma singela homenagem a esse importante artista, que, ao lado de Aleijadinho e de outros renomados art�fices do per�odo, foi figura emblem�tica na cria��o desse legado das Alterosas. Seu talento para as artes foi constru�do ao longo de uma impec�vel trajet�ria, cuja produ��o se mescla � evolu��o estil�stica ocorrida nas ornamenta��es internas dos monumentos das Minas do Ouro. Seu nome, definitivamente, est� escrito no patamar mais elevado desse cen�rio art�stico, cujas singularidades levaram os estudiosos da arte brasileira � cria��o da exclusiva e inusitada designa��o “barroco mineiro”.


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