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Estado de Minas conex�o

Descoberta hist�rica: carta comprova amizade entre Zuzu Angel e Alceu Penna

A estilista e o artista gr�fico eram de Curvelo, viveram no Rio de Janeiro e trabalharam com moda, mas, at� ent�o, n�o havia prova de que eram pr�ximos


12/09/2021 04:00 - atualizado 13/09/2021 09:42

Na frente do cartão, está grifado Edgartown, cidade com o mesmo nome do filho de Zuzu
Na frente do cart�o, est� grifado Edgartown, cidade com o mesmo nome do filho de Zuzu (foto: Instituto Zuzu Angel/Divulga��o)

Em 16 anos de pesquisas sobre a vida e a obra de Alceu Penna, uma pergunta sempre rondou Gabriela Penna: ser� que ele e Zuzu Angel n�o eram amigos?. Os dois nasceram em Curvelo, no interior de Minas Gerais, moraram no Rio de Janeiro na mesma �poca e trabalhavam com moda. Dif�cil acreditar que n�o teriam, pelo menos, se encontrado alguma vez, mas isso nunca ficou provado. At� que a fam�lia do artista descobriu uma carta reveladora.
 
Gabriela � sobrinha-neta de Alceu e, como pesquisadora de moda, design e comunica��o, se interessou em estudar tudo o que ele criou como artista gr�fico, designer e figurinista.
 
'As Garotas do Alceu': o comportamento das personagens da coluna era à frente do tempo
'As Garotas do Alceu': o comportamento das personagens da coluna era � frente do tempo (foto: Arquivo EM/Divulga��o )
Nesse tempo, em toda palestra de que participava ela sempre era questionada se Alceu Penna e Zuzu Angel n�o tinham alguma rela��o, e partia o seu cora��o n�o conseguir responder � pergunta.
 
Imagina, ent�o, a felicidade ao ler a carta que Zuzu escreveu para Alceu, de Nova York, em 1971. “Quando voc� estuda uma pessoa tantos anos, tem muita informa��o que quer saber se foi verdade e n�o consegue confirmar. A carta joga luz nisso, � a prova da conex�o entre eles”, comenta.
 
A carta ficou guardada por d�cadas no apartamento onde Alceu passou a maior parte da sua vida, no Rio de Janeiro. Em 2007, quando Thereza, uma das irm�s dele, morreu, a fam�lia come�ou a catalogar o que havia l� dentro. Foram doados mais de dois mil desenhos do artista � Casa da Marquesa de Santos – Museu da Moda Brasileira. Mas o cart�o passou despercebido. “O apartamento ficou fechado por um tempo e tinha coisa guardada em todos os cantos”, conta a designer Mara Penna, sobrinha de Alceu.
 
A curvelana fez sucesso em Nova York, de onde escreveu a carta
A curvelana fez sucesso em Nova York, de onde escreveu a carta (foto: Arquivo EM/Divulga��o)
 
As caixas com fotografias, cartas, livros e recortes de jornal foram parar na casa de Nat�rcio Pereira, casado com Maria Carmen, outra irm� de Alceu, e ficaram esquecidas por algum tempo. At� que, no ano passado, quando ele morreu, Mara trouxe o material para Curvelo. Um dia, mexendo nos pap�is, ela encontrou um envelope com o nome de Zuzu Angel e se surpreendeu com o que leu. “Sabe quando voc� fica sem a��o? Fiquei muito emocionada com a hist�ria.”
 

Coincid�ncia ou destino?

Alguns podem dizer que � coincid�ncia, outros destino, mas Mara achou a carta em junho, m�s do centen�rio de Zuzu Angel. Ela e o irm�o Ivan, gestor do Centro Cultural de Curvelo, haviam organizado uma exposi��o para homenagear a estilista, e Hildegard Angel, uma de suas filhas, chegaria em dois dias para uma visita. “Estamos mexendo no apartamento do tio Alceu desde que a tia Thereza faleceu, h� mais de 10 anos, e por que fomos encontrar a carta s� este ano e no m�s do anivers�rio da Zuzu?”, aponta.
 
Mara Penna, sobrinha de Alceu, entregou a carta para Hildegard Angel, filha de Zuzu, em Curvelo
Mara Penna, sobrinha de Alceu, entregou a carta para Hildegard Angel, filha de Zuzu, em Curvelo (foto: Arquivo pessoal/Divulga��o)
 
A fam�lia de Alceu decidiu doar a carta para o Instituto Zuzu Angel, no Rio de Janeiro. Hildegard recebeu a carta no dia em que visitou a exposi��o em Curvelo . Mara foi quem fez a entrega e conta que a filha de Zuzu ficou muito emocionada. “Hildegard comentou que a m�e fazia roupas para elas, que eram desenhadas pelo tio Alceu, mas ela n�o sabe muitos detalhes, porque era menina”, revela a designer, dando mais uma prova da amizade entre Zuzu e Alceu.
 
Na carta, Zuzu chama Alceu de “querido amigo” e comenta que aquela seria “mais uma para a sua vasta cole��o”, sugerindo que eles teriam trocado muitas correspond�ncias enquanto viveram em pa�ses diferentes. Outro indicativo de que eram muito pr�ximos � que, no fim do texto, ela manda lembran�as a Thereza, uma das irm�s que morava com Alceu no Rio.
 
A carta foi escrita em 5 de outubro, poucos meses depois que o filho da estilista, Stuart Edgar, foi preso, torturado e assassinado pela ditadura militar. Zuzu estava nos Estados Unidos, onde buscava asilo pol�tico e um pouco de sossego para continuar a fazer moda. Mas suas palavras n�o deixam d�vida da dor que sentia pela trag�dia. “Ainda estou sob o terr�vel impacto do seu b�rbaro mart�rio e assassinato. Cada manh� levo o mesmo susto que levei no dia em que recebi a traumatizante not�cia”, ela escreveu.
 
Na ditadura militar, autoridades brasileiras proibiram a publicação de fotos de vestidos da estilista
Na ditadura militar, autoridades brasileiras proibiram a publica��o de fotos de vestidos da estilista (foto: Arquivo EM/Divulga��o)
 
Por coincid�ncia, ou “dolorosa surpresa”, como descreve, Zuzu acabou fugindo para uma pequena cidade (Edgartown) que tem o mesmo nome do filho (Stuart Edgar). Tocada por esse detalhe da hist�ria, ela at� grifou em vermelho o nome da cidade, que est� ilustrada na parte da frente do cart�o.
 

Trajet�rias parecidas

Zuzu e Alceu tiveram trajet�rias muito parecidas. Ambos nasceram em Curvelo, ele em 1915 e ela em 1921. Al�m disso, foram morar no Rio de Janeiro, mais ou menos na mesma �poca. Ele se mudou para a Cidade Maravilhosa em 1932, e ela, em 1939. L�, n�o faltaram oportunidades para os encontros, at� porque eles trabalhavam com moda. Um trecho da carta mostra que as roupas eram um interesse em comum. “Penso sempre em voc� quando vejo vitrines bonitas”, ela disse.
 
Os curvelanos combinavam na vontade de ousar e de se inspirar na cultura brasileira. Enquanto outros criadores se concentravam em refer�ncias internacionais, Zuzu Angel olhava para materiais e tem�ticas do seu pa�s. Tanto que usou chita e fez cole��o sobre o canga�o.
 
O artista gráfico sempre defendeu a busca de uma identidade brasileira na moda
O artista gr�fico sempre defendeu a busca de uma identidade brasileira na moda (foto: Museu da Moda Brasileira/Divulga��o)
 
Alceu tamb�m defendia a busca de uma identidade brasileira. Nas colunas de moda, costumava criticar mulheres que usavam casaco de pele em pleno ver�o no Rio. “Acho que os dois t�m isso em comum. Quando pensamos que, na �poca, todo mundo achava legal copiar o que se usava na Europa, isso era ser chique, Zuzu e Alceu chegam e falam que ser brasileiro � maravilhoso.”

Em outro trecho, Zuzu faz um desabafo ao amigo. Ela deixa transparecer uma m�goa por n�o ter sido reconhecida no seu pa�s. “Enquanto as autoridades brasileiras pro�bem publica��es das fotos dos vestidos da minha cole��o, considerados, n�o entendi por que, subversivos, os confeccionistas aqui n�o perdem tempo e j� fizeram as suas c�pias.”
 
Para fazer suas coleções, Zuzu Angel se inspirava na cultura brasileira
Para fazer suas cole��es, Zuzu Angel se inspirava na cultura brasileira (foto: Memorial Vale/Divulga��o)
 
Ao reler essa fala, Gabriela lamenta que a carta comprove que a estilista fez mais sucesso nos Estados Unidos do que no Brasil. Para a pesquisadora, isso se explica, em parte, pelo momento de repress�o militar, em parte porque ela propunha uma moda diferente, mas tamb�m por uma quest�o de g�nero. “Todos os costureiros dos anos 1950 e 1960, e que trabalhavam em grandes marcas, eram homens, como Dener e Clodovil. Zuzu era uma das �nicas mulheres entre eles”, analisa.
 

� frente do tempo

Como artista gr�fico, Alceu desenhava moda, mas nunca quis ser estilista. Assim como Zuzu, tinha um lado subversivo. N�o por acaso, a coluna “As garotas do Alceu”, publicada na revista O Cruzeiro, foram t�o impactantes. As ilustra��es seguiam o padr�o de beleza e de moda da �poca, mas o comportamento das personagens era ousado, � frente do tempo. “As garotas apareciam na praia paquerando tr�s garotos ao mesmo tempo, bebiam no baile do Copacabana e ficavam de ressaca. Era como se ele estivesse dizendo para as leitoras que estava tudo bem fazer isso”, comenta Gabriela.
 
Alceu Penna desenhava moda, mas nunca quis ser estilista
Alceu Penna desenhava moda, mas nunca quis ser estilista (foto: Museu da Moda Brasileira/Divulga��o)
 
Se pudesse voltar no tempo, a pesquisadora gostaria de ver um editoral de moda assinado por Zuzu e Alceu. Gabriela enxerga que a cole��o da estilista seria bem brasileira. “Gosto muito da tem�tica do canga�o. Acho a estamparia maravilhosa, os shapes lindos e atual�ssimos. Ainda hoje daria para usar.”
 
J� Alceu, pelo que a sua sobrinha-neta imagina, ficaria respons�vel pela concep��o de styling. Segundo Gabriela, apesar de ser um artista gr�fico, ele tinha voca��o para dire��o de arte e mostrou isso nos trabalhos como figurinista. Juntos, Zuzu e Alceu assinaram o texto do editorial, que falaria sobre a quest�o da identidade brasileira. “Seria um sonho ver isso acontecer”, diz a pesquisadora, que se sente realizada com a prova de amizade entre dois nomes t�o marcantes da moda brasileira.
 
At� o fechamento desta edi��o, Hildegard Angel, filha de Zuzu e fundadora do Instituto Zuzu Angel, permanecia internada no Rio de Janeiro com COVID-19 e n�o pode ser entrevistada.
 

A carta

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(foto: Instituto Zuzu Angel/Divulga��o)

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(foto: Instituto Zuzu Angel/Divulga��o)
 


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