
Dividido em tr�s volumes, o relat�rio final da Comiss�o da Verdade, entregue nesta quarta-feira, 10, � presidente Dilma Rousseff aponta uma lista com nomes de pessoas que, a servi�o do Estado, s�o respons�veis diretos e indiretos por casos de graves viola��es de direitos humanos praticadas entre 1946 e 1988, focalizando principalmente o per�odo da ditadura militar, entre 1964 e 1988. Dos 377 listados, cerca de 200 ainda est�o vivos.
Em suas conclus�es, a comiss�o recomenda ao Estado brasileiro que as pessoas apontadas sejam responsabilizadas juridicamente - do ponto de vista civil, criminal e administrativo. O texto afirma que elas n�o podem ser beneficiadas pela Lei n.º 6683, de 1979, mais conhecida como Lei da Anistia.
A recomenda��o - a �nica que n�o teve a unanimidade dos votos dos comissionados, numa lista de 29 - n�o prop�e diretamente a revis�o da lei de 1979. Mas afirma que o Brasil deveria se sujeitar � decis�o da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que em 2010 responsabilizou o Pa�s pelo desaparecimento de participantes da Guerrilha do Araguaia, na d�cada de 1970.
Segundo a comiss�o, a senten�a da corte deixou claro que "as disposi��es da Lei de Anistia de 1979 s�o manifestamente incompat�veis com a Conven��o Americana sobre Direitos Humanos, carecem de efeitos jur�dicos e n�o podem seguir representando um obst�culo para a investiga��o de graves viola��es de direitos humanos, nem para a identifica��o e puni��o dos respons�veis".
Foi uma forma indireta de propor a revis�o da lei
As graves viola��es de direitos humanos investigadas pela comiss�o e que n�o seriam pass�veis de anistia, pelas conven��es internacionais, envolvem pris�es sem base legal, a tortura e as mortes dela decorrentes, as viol�ncias sexuais, as execu��es e as oculta��es de cad�veres e desaparecimentos for�ados. Praticadas de forma massiva e sistem�tica contra a popula��o, essas viola��es tornam-se crime contra a humanidade.
O terceiro volume do relat�rio apresenta uma lista, com uma pequena biografia e o hist�rico das circunst�ncias em que morreram, de 434 mortos entre 1946 e 1988. Dessa lista, 210 continuam desaparecidos.
A comiss�o sugere que seja criado um �rg�o de governo para dar prosseguimento �s buscas de seus restos mortais.
Novidades
O relat�rio condensa em grande parte outros levantamentos j� feitos no Pa�s sobre graves viola��es de direitos humanos, mas tamb�m apresenta novidades. A lista de mortos e desaparecidos, com os nomes de 434 pessoas, das quais 210 continuam desaparecidas, � a mais extensa j� produzida por organismos oficiais. A Comiss�o Especial de Mortos e Desaparecidos Pol�ticos havia listado at� agora 362 v�timas.
Uma das causas da diferen�a nos n�meros � a mudan�a nos crit�rios de inclus�o dos nomes. A pedido de familiares de mortos e desaparecidos, foram inclu�das algumas v�timas da ditadura que n�o tinham liga��es comprovadas com organiza��es de esquerda.
A lista de agentes de Estado apontados como autores de graves viola��es de direitos humanos tamb�m � a maior j� produzida. As listas anteriores, que come�aram a ser produzidas na d�cada de 1970, quando ainda circulavam de maneira clandestina no Pa�s, continham na m�dia cerca de duzentos nomes. A da Comiss�o da Verdade chegou a 377.
Isso tamb�m est� relacionado a mudan�as de crit�rios. Al�m dos agentes de Estado que, segundo as investiga��es da comiss�o, seriam os autores diretos de crimes como tortura, sequestro, execu��o sum�ria e oculta��o de cad�ver, a lista inclui os seus superiores - numa escala de comando que chega � Presid�ncia da Rep�blica. A justificativa � que os crimes registrados em instala��es militares e em locais clandestinos de tortura, como a Casa da Morte, em Petr�polis, na regi�o serrana do Rio, faziam parte de uma pol�tica de Estado.
Chama a aten��o na lista a presen�a marcante de m�dicos que atuavam nos institutos m�dicos legais. Segundo as acusa��es da comiss�o, eles fraudavam laudos para dar cobertura �s a��es ilegais de agentes da repress�o. Um dos nomes listados � o de Harry Shibata, que assinou o laudo do jornalista Vladimir Herzog, em 1975, em S�o Paulo, corroborando a vers�o de suic�dio.
Voz �s v�timas
De quase quarenta comiss�es da verdade j� instaladas ao redor do mundo, a brasileira � uma das poucas que, al�m de dar voz �s v�timas e descrever detalhadamente os casos de graves viola��es de direitos humanos, aponta os nomes das pessoas que seriam juridicamente respons�veis. Um exemplo semelhante ocorreu na �frica do Sul, na apura��o dos crimes cometidos durante o regime de apartheid.
Outra diferen�a do relat�rio final � a �nfase dada a quest�es como viol�ncia sexual, viol�ncia de g�nero e viol�ncia contra crian�as e adolescentes na ditadura. Tratados de forma quase marginal em relat�rios anteriores, esses temas ganharam um longo cap�tulo � parte no relat�rio. O grupo de trabalho que investigou essas quest�es ouviu 41 crian�as e adolescentes que foram sequestradas, estiveram em pris�es com os pais, ou foram submetidas diretamente a torturas.
