
O projeto foi idealizado pela jornalista e produtora cultural Clarice Hoffmann, que entrou em contato com esse material pela primeira vez ainda em 2004, como pesquisadora contratada para colher material para o livro Hist�ria das mulheres guerreiras no Brasil. “Na �poca o acervo era fechado, mas foi a partir de uma indica��o que ouvi falar de um fich�rio do Dops que continha nomes de artistas. Tamb�m cresci ouvindo a hist�ria de que minha av�, cujo nome art�stico era Gusta Gamer, tinha sido fichada, no Rio de Janeiro, por ser atriz. Ocasionalmente, o fich�rio me vinha � cabe�a, mas s� recentemente decidi retom�-lo, pois queria estar em um projeto do qual realmente gostasse muito”.
O projeto tem quatro etapas e est�, atualmente, em sua primeira fase, que est� prevista inicialmente para durar at� o fim do ano: a de pesquisa e sistematiza��o do material presente no acervo do DOPS em Pernambuco, em cruzamento com consultas a jornais da �poca para obter mais informa��es sobre os fichados. A segunda etapa � o lan�amento do site, com previs�o para o in�cio do segundo semestre. A terceira etapa � uma convocat�ria para que artistas inscrevam projetos inspirados na documenta��o encontrada. A ideia � que esses trabalhos sejam feitos em m�dias digitais para alimentar o site, que tamb�m vai estar aberto a novas informa��es sobre os artistas fichados pelo DOPS. A quarta etapa compreende o lan�amento desses trabalhos art�sticos, duas palestras, uma em S�o Paulo e outra no Recife, al�m do lan�amento do cat�logo. O projeto tem como assessor hist�rico o professor Durval Muniz de Albuquerque J�nior, historiador da UFRN e como pesquisadores convidados o professor Alexandre Figueir�a, do curso de jornalismo da Universidade Cat�lica de Pernambuco (Unicap), e Marc�lia Gama, professora do departamento de Hist�ria da Universidade Federal Rural de Pernambuco (Ufrpe).
Uma das dificuldades da pesquisa, aprovada pelo Ita� Cultural e pelo Funcultura, � a incompletude das informa��es. O fich�rio tem apenas os nomes de artistas de M a Z. A parte que continha os verbetes de A a L, com mais de 700 fichas, se perdeu. “Primeiro, as pessoas eram classificadas somentes como artistas e, depois, come�ou uma especifica��o maior, registrando as pessoas como cantores e atores, por exemplo”, detalha Clarice. Para tentar recuperar mais informa��es, a equipe do projeto procurou os nomes dos c�njuges em outras fontes de informa��o. Esses dados tamb�m foram verificados em peri�dicos da �poca como o Di�rio da Manh�, o Jornal Pequeno e A Provincia. O Diario de Pernambuco tamb�m vai se tornar uma das fontes de material.
De acordo com Clarice, a inten��o, com o projeto, � fazer uma homenagem a esses artistas e mostrar como o acervo do Dops conta tanto a hist�ria da repress�o policial quanto da vida art�stica do Recife nos anos 30, 40 e 50. “O que nos interessa � que as pessoas acessem a documenta��o. O que se l� nas fichas e prontu�rios � a vers�o da pol�cia, n�o necessariamente a verdade. Queremos lembrar essas pessoas que estavam � margem do moral e do poder da �poca”.
DADOS
- Foram encontradas 404 fichas de artistas do per�odo entre 1934 e 1954. Ao todo, s�o 14 mil prontu�rios dessa �poca
- 60% das fichas s�o de mulheres
- Aproximadamente 40% dos fichados eram estrangeiros – argentinos, cubanos, russos, franceses, h�ngaros e mais uma dezena de outras nacionalidades
- A maioria dos artistas estava em tr�nsito. Nomes de hot�is, pens�es, endere�os de casas de c�modos e, muitas vezes, do pr�prio local de trabalho constam nas fichas como “local de resid�ncia"
- Em aproximadamente 25% das fichas, consta como proced�ncia o Rio de Janeiro, na �poca capital do pa�s
Sixto Argentino Gallo, o menor homem do mundo
“Fichado pela Delegacia de Ordem Social e Pol�tica de Pernambuco, Sixto Argentino Gallo era uma das 200 atra��es do Circo Hispano-Americano armado em 1950, no Parque 13 de Maio, no centro do Recife. De acordo com an�ncio e nota publicados no Di�rio da Manh�, o Circo Hispano-Americano, em turn� pelas Am�ricas, chegava para apresentar o mais moderno espet�culo circense j� visto na capital pernambucana. Entre n�meros inteiramente desconhecidos da plateia local estavam Richard e suas leoas africanas, o cavalo Sult�o, os 4 Diabos do Ar, realizando o cruzamento da morte, os bailarinos exc�ntricos Adolfo e Nat�lio e os Irm�os Gallo, os menores homens do mundo”.
Rita Gouillaux, bailarina e contorcionista
"A documenta��o encontrada no Fundo DOPS-PE sobre a bailarina e contorcionista Rita Helene Gouillaux revela uma das t�ticas usualmente adotadas por diversos personagens do Obscuro Fich�rio para escapar do controle das Delegacias de Ordem Pol�tica e Social existentes em diversos estados brasileiros. Entre os documentos analisados no prontu�rio criado para a artista, h� um of�cio enviado no dia 15 de junho de 1943 pelo delegado da DOPS de Minas Gerais solicitando com urg�ncia � pol�cia de Pernambuco informa��es a seu respeito. Nele, fica evidente as d�vidas sobre a real identidade de Rita, que nem sempre declarava aos investigadores os mesmos dados. Na documenta��o produzida pelas duas DOPS, ora ela aparece como francesa, ora como italiana, algumas vezes solteira, outras casada, em alguns momentos como dom�stica e em outros artista, sem falar no uso de diferentes nomes. Jacque Line Rolland foi um deles"
Dalva de Oliveira, cantora
"Entre as estrelas da m�sica brasileira fichadas pela Delegacia de Ordem Social e Pol�tica de Pernambuco, est� Dalva de Oliveira. Ao lado de Herivelto Martins e Nilo Chagas, a cantora formava o Trio de Ouro, contratado para se apresentar em mar�o de 1948 na R�dio Clube de Pernambuco, a famosa P.R.A. 8. Na ocasi�o, al�m de Dalva, Nilo tamb�m foi fichado pela DOPS/PE. Quanto a Herivelto, n�o � poss�vel afirmar o mesmo. O Obscuro Fich�rio � composto apenas por verbetes de artistas cujo primeiro nome se inicia entre as letras M e Z. Em algum momento dif�cil de precisar mais de 700 fichas foram perdidas"
+Curiosidades
A m�quina de repress�o do DOPS registrava coisas curiosas, como o card�pio bil�ngue do Restaurante Leite, na �poca, ainda batizado com o nome de seu fundador, o portugu�s Manoel Leite. Al�m disso, h� a tentativa de funda��o da Tamoio Filmes, empresa formada por oper�rios, entre 1944 e 1946. O prontu�rio conta com 12 documentos, entre ficha cadastral de associados e lista de presen�a de assembleias. Segundo os investigadores, o empreendimento estava fadado ao fracasso por “n�o dispor de elementos de n�vel intelectual ao menos med�ocre”.
+Contribui��o
A equipe do projeto Obscuro Fich�rio est� aberta ao envio de mais material sobre pessoas, locais ou atividades que tenham a ver com a pesquisa. Quem tiver mais informa��es, pode entrar em contato pelo blog www.obscurofichario.com.br, pelo email obscurofichario@gmail.com ou pelo Facebook, em www.facebook.com/obscurofichario. No blog, est� dispon�vel a lista com nomes pesquisados. Entre os estabelecimentos que precisam de mais dados, est�o o Cassino Imp�rio, o Cine Siri, o Cineclube Charles Chaplin, o Circo-Teatro S�, o Teatro de Variedades da Festa da Mocidade, o Taco de Ouro e o Imperial Cassino.
+Arquivo P�blico
O local onde os arquivos est�o � o Arquivo P�blico Estadual Jord�o Emerenciano, localizado no bairro de Santo Ant�nio e apoiador institucional do projeto. Os documentos referentes ao DOPS no Estado foram encaminhados para l� em 1991. “S�o aproximadamente 145 mil fichas e cerca de 70 mil prontu�rios. � o segundo maior acervo do pa�s. Se coloc�ssemos nossos documentos em linha reta, ter�amos 13 quil�metros”, afirma o coordenador geral do APEJE, Pedro Moura. Isso equivale � dist�ncia entre os centros de Recife e Camaragibe. Os itens se referem a documentos, peri�dicos, jornais, manuscritos, fotografias e � hemeroteca. O material est� dispon�vel totalmente ao p�blico desde a san��o da Lei de Acesso � Informa��o, em 2011.
