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Estado de Minas

'Entreatos' e Lava Jato: do apogeu ao ocaso


postado em 12/05/2016 11:01

S�o Paulo, 12 - A��o do mito Lula deve passar, obrigatoriamente, pelo document�rio Entreatos, lan�ado em 2004. Qualquer tentativa de entender o ocaso desse mito com a interrup��o da era petista na Presid�ncia desemboca nos �ltimos tr�s meses da Opera��o Lava Jato. O salto temporal � de mais ou menos 12 anos. Os dois momentos, quando analisados lado a lado, em justaposi��o, trazem de maneira diversa a ess�ncia do homem e fornecem uma poderosa chave de leitura sobre o passado, o presente e o futuro de Luiz In�cio Lula da Silva.

Se no document�rio do diretor Jo�o Moreira Salles sobre a campanha eleitoral vitoriosa de Lula em 2002 temos o l�der conciliador, o articulador habilidoso e o oper�rio bonach�o, no conjunto da Lava Jato nos deparamos com o oper�rio ressentido, o pol�tico raivoso (e, por isso, desastrado), o l�der divisionista. Mais interessante e desafiante nesse exerc�cio anal�tico, por�m, � encontrar no Lula de Entreatos os tra�os do Lula atual. E os sinais est�o quase todos l�.

Assistir ao document�rio hoje, ap�s os �ltimos e intensos anos da pol�tica brasileira, � como projetar na mente um filme de fic��o policial cuja cena de abertura � a do mocinho com a arma fumegante na m�o diante do cad�ver fresco. A partir da�, rodamos a fita ao contr�rio, na busca de pistas que nos ajudem a compreender o prov�vel desfecho tr�gico do protagonista na Lava Jato. Como o Lula de Entreatos desembocou no Lula do conjunto de grampos e do depoimento � Pol�cia Federal?

As primeiras e mais evidentes pistas fornecidas por Entreatos formam um valoroso registro da pol�tica pr�-mensal�o e pr�-Lava Jato, o testemunho de um tempo em que candidatos nas campanhas eleitorais cruzavam o Brasil em jatinhos, hospedavam-se com comitivas enormes em hot�is cinco-estrelas, contratavam artistas caros para showm�cios e todo mundo, ou pelo menos muita gente, se perguntava de onde vinha o dinheiro para aquilo. A resposta come�ou a ser dada em 2005, com a revela��o do mensal�o.

Confian�a

Jos� Dirceu (o poderoso), Del�bio Soares (o tesoureiro) e S�lvio Pereira (o faz-tudo) foram abatidos pela revela��o da transfer�ncia de recursos oriundos do esquema montado ainda na campanha para parlamentares da base lulista. Os tr�s tamb�m s�o investigados pelo Minist�rio P�blico Federal na Lava Jato, sob suspeita de terem se beneficiado do esquema de desvios de recursos e de corrup��o na Petrobras. Dirceu, Del�bio e S�lvio Pereira gozam da confian�a de Lula, participam de discuss�es a portas fechadas e deixam claro no document�rio o poder que teriam no futuro governo. As investiga��es em curso em Curitiba nos revelam que eles participaram ativamente das nomea��es para as diretorias da Petrobr�s, base e origem do esquema. Mais ainda: a Lava Jato est� no caminho de provar o elo entre o mensal�o e o crime na estatal.

Assim, uma parte da resposta est� dada. O Lula de Entreatos estava amparado por operadores pol�ticos que se utilizavam da expectativa de poder do petista para continuar a fazer girar a engrenagem financeira que alimentaria a consolida��o do mito, embalado em ternos caros, palat�vel �s elites e aos mercados. Uma vez na Presid�ncia, esse grupo estreitou la�os com o publicit�rio Marcos Val�rio e com os operadores da Petrobr�s. "Pelo panorama dos elementos probat�rios colhidos at� aqui e descritos ao longo desta manifesta��o, essa organiza��o criminosa jamais poderia ter funcionado por tantos anos e de uma forma t�o ampla e agressiva no �mbito do governo federal sem que o ex-presidente Lula dela participasse", afirmou o procurador-geral da Rep�blica, Rodrigo Janot, em pe�a divulgada recentemente.

No document�rio, Lula � um democrata cordial, empunhando a bandeira do respeito �s institui��es. Mas, quando o juiz federal S�rgio Moro, de Curitiba, torna p�blico o conte�do dos di�logos telef�nicos de Lula interceptados pela Lava Jato, no dia 16 de mar�o deste ano, sai de cena o "Lulinha Paz e Amor" de Entreatos, criado pelo marqueteiro Duda Mendon�a, para entrar o raivoso e desastrado "Lula Jararaca", que conseguiu se indispor com o Minist�rio P�blico, os ju�zes federais e o Supremo.

A manifesta��o recente de Janot, talvez o �pice contra o ex-presidente at� agora na Lava Jato, ajuda a explicar frases como a coletada nos grampos da opera��o e que contradiz a vers�o cinematogr�fica do mito: "N�s temos uma Suprema Corte totalmente acovardada. N�s temos um Superior Tribunal de Justi�a totalmente acovardado. Um Parlamento totalmente acovardado� Somente nos �ltimos tempos � que o PT e o PC do B come�aram a acordar e come�aram a brigar� N�s temos um presidente da C�mara fodido, um presidente do Senado fodido, n�o sei quantos parlamentares amea�ados, sabe? E fica todo mundo no compasso de que vai acontecer um milagre e vai todo mundo se salvar". Em outro trecho, o ataque � tamb�m direto. "Eu acho que eles (autoridades da opera��o) t�m que ter em conta o seguinte, bicho, eles t�m que ter medo."

H� em Entreatos, tamb�m, as pistas pessoais fornecidas por Lula. Numa cena, � frente da entourage, ele diz ter passado 30 anos numa f�brica e n�o ter se acostumado com o macac�o de oper�rio; em contraponto, se despeja em elogios ao costume do palet�, da cal�a social e das belas gravatas. Falava dentro dele ali o germe do s�tio de Atibaia, do tr�plex de 215 metros quadrados no Guaruj�, o im�vel que ele chegaria a desdenhar como sendo padr�o "Minha Casa Minha Vida", o programa criado por Dilma Rousseff para a popula��o de baixa renda. "O pr�dio era inadequado porque, al�m de pequeno, um tr�plex de 215 metros � um tr�plex �Minha Casa Minha Vida�", diz relat�rio policial. Ainda nesse aspecto, em certo momento do document�rio, numa cena gravada na sala vip do aeroporto de Congonhas (S�o Paulo), Antonio Palocci, outro implicado na Lava Jato, l� um informe e diz: "Lula n�o ser� um presidente populista; Lula � um homem honesto e ser� um presidente racional". A declara��o � do banqueiro Roberto Set�bal e est� no notici�rio daquele dia. Todos comemoram e evidenciam certa rever�ncia ao personagem, o capitalista que outrora fora inimigo dos trabalhadores, conforme a l�gica tradicional do petismo. Mais de uma d�cada depois, a Lava Jato nos mostra que a rever�ncia aos empres�rios e ao capital virou amizade. Lula deixou o maior empreiteiro do Pa�s, Marcelo Odebrecht, reformar o s�tio que ele usou por longos quatro anos em Atibaia. Lula visitou o tr�plex com o executivo L�o Pinheiro, da empreiteira OAS. Mais uma vez, � dif�cil n�o escutar Janot: "Lula sabia de tudo".

Futuro

H� ainda passagens que se tornaram cl�ssicas no document�rio, como as alfinetadas no tucano Fernando Henrique Cardoso, as brincadeiras de organizar peladas de futebol nos gramados de Bras�lia e as refer�ncias (muitas) � inf�ncia sofrida e � luta pela sobreviv�ncia. E revela��es: "Quando a gente n�o tem responsabilidade, (quando) voc� n�o est� para ganhar nada, ent�o voc� n�o mede as palavras que voc� fala no discurso. Mas, agora, qual � o problema? � que eu tenho de medir cada palavra".

Mesmo elas, que soam despretensiosas, fornecem ind�cios sobre a maneira como tratar a oposi��o, o bem p�blico e, principalmente, como se vitimizar e se escorar no populismo para se defender. A compara��o entre o Lula de Entreatos e o Lula da Lava Jato n�o se esgota na s�ntese entre passado e presente do mito. Ela tamb�m diz muito sobre o futuro porque escancara a capacidade dele de se transmutar, de falar para diferentes plateias em v�rios ambientes. A sobreviv�ncia � sua grande virtude. Os tempos, por�m, s�o outros e os obst�culos para ele transpor est�o fora da esfera que Lula domina, a pol�tica. As informa��es s�o do jornal

O Estado de S. Paulo.


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