S�o Paulo, 14 - Palhares, o canalha honesto criado por Nelson Rodrigues, nos anos de chumbo da ditadura, desconfiaria de que algo deixou de ser dito �sobre o famoso apartamento do Guaruj� pelo ex-presidente Luiz In�cio Lula da Silva ao juiz federal S�rgio Moro, nesta quarta-feira, 10, quando foi interrogado pela primeira vez como r�u dos processos da Opera��o Lava Jato, em Curitiba.
O Minist�rio P�blico Federal imputa pr�tica de crimes de corrup��o e lavagem de dinheiro - pena prevista de at� 22 anos de pris�o, se condenado - a Lula na amplia��o, reforma e decora��o de um tr�plex 164-A, do Edif�cio Solaris, no Guaruj� (SP). As �benesses� seriam propina paga ao petista pela OAS, em troca de neg�cios na Petrobr�s.
Frente a frente com Moro pela primeira vez, a vers�o de Lula � que s� soube da exist�ncia do apartamento triplex, que admitiu que a falecida Dona Marisa Let�cia negociava com a OAS, na praia das Ast�rias, em 2013.
Por 5 horas, Lula falou ao juiz S�rgio Moro e repetiu mais de uma vez que esteve alheio �s negocia��es de Dona Marisa, que morreu em fevereiro, com a OAS e que visitou o im�vel em fevereiro de 2014 com o ent�o presidente da empreiteira, Jos� Aldem�rio Pinheiro, que � chamado pelo ex-presidente L�o. N�mero um de uma das maiores empreiteiras do Pa�s, ele estaria tentando vender o apartamento, de 250 metros quadrados, segundo conta o r�u.
Lula repetiu a mesma vers�o de que s� em 2013 foi saber da exist�ncia do triplex em pelo menos quatro vezes ao responder quest�es do Minist�rio P�blico Federal. A for�a-tarefa da Lava Jato avalia que as provas reunidas no processo mostram que ele mentiu, ao tentar negar �o �bvio ululante�.
A express�o usada por um dos investigadores da for�a-tarefa � de Nelson Rodrigues, o pai do Palhares, o canalha que n�o respeitava nem cunhada, e imortalizado no livro O �bvio Ululante e na coluna que publicou no jornal O Globo, durante a ditadura.
V�deo 15 - 4min48seg. �O procurador, deixa eu dizer uma coisa pro c�. Eu vou apenas repetir aqui um dado que eu j� disse para o juiz. A minha rela��o com o triplex, com o apartamento 141, o normal. A do triplex foi em 2013, quando o L�o me procurou em setembro, n�o sei se foi em setembro, para falar que tinha que ir visitar, e eu s� fui em 2014. E a Dona Marisa quando me disse que tinha comprado uma cota da Bancoop�, explicou Lula, ao ser interrogado pelo procurador da Rep�blica Roberson Pozzobon.
�� a minha rela��o com esse famoso apartamento.�
V�deo 15 - 5min58seg. �Eu vou repetir, at� para economizar tempo. A minha rela��o com o famoso apartamento da Bancoop � de quando a minha mulher comprou, que foi feito pelo Imposto de Renda, � primeira visita do L�o para me falar que tinha que visitar o apartamento que estava acabando o pr�dio�, voltou a falar Lula.
V�deo 15 - 8min27seg. �Eu vou repetir. Eu s� tive contato sobre o famoso apartamento l� no Guaruj� no ato da compra da cota, � importante lembrar, e em 2013 quando o L�o me procurou, quando eu tinha que cuidar de ver o apartamento. S�.�
V�deo 16 - 3min17seg. �A minha afirma��o � categ�rica: eu discuti o apartamento duas vezes�, garantiu, reiteradas vezes, o presidente mais popular que o Brasil j� teve.
Lula n�o explicou como o apartamento simples, referente a cota de uma unidade no pr�dio adquirida em 2005 por Dona Marisa, virou, a partir de 2009 uma das coberturas triplex. A mudan�a coincide com a compra pela OAS do empreendimento Solaris, da falida Bancoop, junto com outras unidades em constru��o na capital.
R�u confesso, L�o Pinheiro afirmou no dia 20 de abril ao juiz S�rgio Moro que o custo da reforma do triplex foi abatida de um acerto de R$ 15 milh�es da OAS com o PT e que era benesse concedida ao petista.
Candidato a delator pela segunda vez, da Opera��o Lava Jato, L�o Pinheiro disse que o apartamento foi adquirido e reformado a pedido de Vaccari, autorizado por Paulo Okamoto, presidente do Instituto Lula, e sua propriedade e reforma discutidas diretamente com Lula.
Praia
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�O apartamento, n�o era meu. o apartamento A Dona Marisa comprou cota da Bancoop. Teoricamente o apartamento era resultado da compra das cotas. Eu quando fui l� eu perdi o interesse no apartamento pela situa��o do apartamento e depois eu vi que era humanamente imposs�vel um ex-presidente da Rep�blica ir naquela praia fora de uma segunda-feira, ou de uma quarta-feira de cinzas, ou de qualquer coisa.�
Lula explicou que o im�vel n�o atendia seus interesses: �o apartamento tinha muita escada, o apartamento era muito comprido, era muito apertado e tinha v�rias coisas�. Em outro ponto disse que colocou �500 defeitos� no im�vel, quando o chef�o da OAS foi lhe mostrar o tr�plex para �vend�-lo�.
O ex-presidente tamb�m n�o soube explicar o registro �praia� em uma caixa de seu acervo pessoal, retirado do Planalto e armazenado em S�o Paulo, com custos pagos pela OAS.
Hist�rico
A exist�ncia de um tr�plex no Guaruj�, no edif�cio que a OAS comprou da Bancoop, � fato p�blico desde 2010. Naquele ano, Lula elegeria sua sucessora, Dilma Rousseff. O jornal carioca O Globo publicou, na �poca, reportagem sobre a propriedade de um tr�plex da fam�lia Silva no Edif�cio Solaris. Um pr�dio comprado um ano antes pela OAS, dentro de um pacote de torres residenciais inacabadas da falida Bancoop (a cooperativa habitacional do Sindicato dos Banc�rios de S�o Paulo, j� dirigida por Jo�o Vaccari Neto e Ricardo Berzoini).
�Caso Bancoop: o tr�plex do casal Lula est� atrasado�, dizia a not�cia. Era 30 de janeiro de 2010.
O caso foi para as telas da TV, no Jornal Nacional. O apresentador William Bonner disse o �apartamento tr�plex do presidente Lula�, ao apresentar o drama dos cooperadores da Bancoop - entre eles, o petista - e as suspeitas de desvios na cooperativa. Na ocasi�o, o Planalto foi procurado - Lula ainda era presidente - e respondeu que por ser assunto familiar n�o iria se pronunciar.
O juiz S�rgio Moro tamb�m demonstrou, em sua inquiri��o, d�vidas em rela��o � poss�vel omiss�o de informa��o e questionou sobre a reportagem.
�Deve ter sido uma inven��o do Minist�rio P�blico�, justificou o petista.
�Mas em 2010 nem tinha processo�, lembrou Moro, ao r�u.
�Sei l� quando, fazer ila��o se faz em qualquer momento�, retrucou Lula.
Apontado como l�der do esquema de corrup��o na estatal petrol�fera, que desviou mais de R$ 40 bilh�es entre 2004 e 2014, o ex-presidente busca em sua defesa, desde o in�cio do processo, uma nulidade, que tire do juiz da Lava Jato a compet�ncia para julg�-lo, e inda arraste o caso penal para a arena pol�tica.
A a��o do tr�plex � a primeira aberta por Moro contra Lula, no dia 19 de setembro de 2016. Em tr�s anos de investiga��o, a Lava Jato descobriu que partidos da base aliada - PT, PMDB e PP - comandaria diretorias da Petrobras, por meio das quais, desviavam de 1% a 3% em propinas de contratos fechados com empreiteiras cartelizadas.
Nota p�blica
Em 30 de janeiro de 2016, o Instituto Lula e sua assessoria jur�dica e de imprensa levantou documentos e redigiu uma nota oficial distribu�da � televis�es, jornais e revistas, intitulada �Documentos do Guaruj�, desmontando a farsa�.
NOTA DO INSTITUTO LULA SOBRE TRIPLEX - 10/01/2010
Nela h� um item: �Por que a fam�lia desistiu de comprar o apartamento?�.
�Porque, mesmo tendo sido realizada reformas e modifica��es no im�vel. As not�cias infundadas, boatos e ila��es, romperam a privacidade necess�ria familiar ao uso do apartamento�, registrava o documento oficial feito pelos assessores mais pr�ximos de Lula.
O documento foi apresentado e lido duas vezes pelo procurador da Rep�blica Roberson Pozzobon. �O senhor foi consultado para que essa nota fosse feita?.�
�Eu n�o sou dirigente do Instituto, ponto. A nota, se ela � feita, � feita com a dire��o do Instituto em combina��o com os advogados que conhecem o projeto, o processo todo�, respondeu Lula. �Nem sempre quando a nota � feita eu estou no Instituto, nem sempre eu estou em S�o Paulo. �s vezes eu fico sabendo das notas pela imprensa.�
O procurador insistiu: �objetivamente senhor ex-presidente, o senhor foi consultado antes da emiss�o dessa nota?�.
�N�o, n�o�, respondeu Lula.
�Ent�o o Instituto falou sobre uma situa��o que envolvia a sua fam�lia sem consult�-lo?.�
�Deixa eu dizer uma coisa para o senhor. Voc�s est�o exigindo de mim uma objetividade que eu ainda n�o exigi de voc�s�, disse o ex-presidente. �Eu vou exigir de voc�s quando terminar a palavra de voc�s e eu puder falar � que voc�s me apresentem um documento que o apartamento � meu. Porque essa � a prova, o resto � conversa fiada.�
Minutos depois, quando o investigador da Lava Jato insistiu na pergunta sobre a pol�mica do tr�plex levantada publicamente em 2010, Lula deu sua vers�o sobre o conte�do da nota divulgada pelo Instituto Lula, que para o Minist�rio P�blico evidencia que o r�u desde 2010 sabia do neg�cio.
�Pelo que senti, o esp�rito da nota � dizer que mesmo que tivesse tudo certo, depois do carnaval feito em cima do tr�plex, mesmo que eu tomasse a decis�o�, n�o tinha como utilizar o apartamento, porque aquilo virou uma coisa bichada.�
O ex-presidente disse que a nota �certamente respondia ou uma mat�ria de imprensa, ou uma acusa��o de algu�m�.
(Ricardo Brandt, Fausto Macedo e Julia Affonso)