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Estado de Minas

'Eu n�o criminalizei a pol�tica. Criminalizei os bandidos', diz Janot

Na primeira entrevista depois de deixar o comando da Procuradoria-Geral da Rep�blica, Rodrigo Janot relata ao Correio Braziliense os bastidores dos momentos mais importantes da Lava-Jato


postado em 20/09/2017 10:34

(foto: Marcelo Ferreira/CB/DA Press)
(foto: Marcelo Ferreira/CB/DA Press)

No quarto andar da sede da Procuradoria-Geral da Rep�blica, funcion�rios trabalham para adaptar um amplo gabinete ao novo ocupante, que acaba de chegar. Um arco e flecha pendurado � parede divide o espa�o com uma escultura de tuiuiu e com uma cole��o de canetas — uma delas, em destaque, foi usada para assinar a dela��o premiada de executivos da Odebrecht.

De camisa polo e com visual despojado, Rodrigo Janot parece alheio ao bombardeio que vem recebendo h� meses. O mineiro, de Belo Horizonte, deixou o posto de procurador-geral da Rep�blica no mais conturbado momento de seus 33 anos de carreira. At� a transmiss�o de cargo � sucessora, Raquel Dodge, foi controversa: Janot n�o compareceu � cerim�nia de posse. Na entrevista exclusiva ao Correio, Janot explica a aus�ncia: “Quem vai em festa sem convite � penetra”.

O procurador revela que n�o foi convidado nem mesmo para transmitir o cargo. Se fosse ao audit�rio, teria de procurar um assento. Ele conta que n�o havia sequer uma cadeira reservada. Mas garante que n�o se sentiria constrangido em dividir a cena com pol�ticos que denunciou, como o presidente Michel Temer. “As pessoas que t�m de se sentir constrangidas”, aponta.

Em duas horas e 20 minutos de conversa, o ex-chefe do MP relata os bastidores de momentos importantes que marcaram a Lava-Jato: o pedido de pris�o do ent�o senador Delc�dio do Amaral, a morte do ministro Teori Zavascki, a “escolha de Sofia” na imunidade concedida ao empres�rio Joesley Batista em troca de provas contra Temer e as suspeitas envolvendo integrantes do pr�prio Minist�rio P�blico.

Janot deixou o cargo, mas n�o se afastou da turbul�ncia. Pelo contr�rio. Ele sabe que, agora, come�am de verdade os ataques, principalmente na CPI da JBS, comandada por aliados de Temer. “V�o tentar usar todo mundo e tudo contra mim… Tudo � poss�vel, v�o tentar desconstituir a figura do investigador”, diz. E j� se defende: “N�o levei dinheiro do Miller nem autorizei ningu�m a receber mala de dinheiro em meu nome. Nem tenho amigo com R$ 51 milh�es em apartamento”. Para quem acha que o ex-procurador-geral exagerou, ele rebate: "N�o criminalizei a pol�tica. Criminalizei os bandidos".


Por que o senhor n�o foi � posse da sua sucessora, Raquel Dodge?

Na minha terra, se diz o seguinte: a gente n�o vai a festa sem convite. Quem vai em festa sem convite � penetra.

O senhor n�o foi convidado?


Para a posse, definitivamente, n�o fui convidado. A gente tratou como seriam colocados os termos no convite. A primeira proposta foi com meu nome: “O procurador-geral da Rep�blica convida”. Mas o pessoal da transmiss�o pediu para sair em nome do Minist�rio P�blico da Uni�o, por e-mail. Eu � que expedi esse e-mail.  Mas n�o recebi convite nenhum. Os convites para chefes dos poderes pediram para que eu fizesse nominalmente. Mandei aos presidentes do Supremo, da C�mara, do Senado, da Rep�blica, a� sim, um of�cio meu, enquanto procurador-geral. Meu mandato terminou domingo, dia 17, at� l� eu era procurador-geral. Perguntei se queriam uma transmiss�o de cargo, mas me informaram que eu n�o posso transmitir aquilo que eu n�o tenho mais. Por isso que n�o fui, porque n�o fui convidado.
 
N�o seria constrangedor sentar � mesa com pessoas que denunciou?

N�o sentaria � mesa. Mas eu estou na minha casa, as pessoas que t�m que se sentir constrangidas, n�o sou eu. Fiz o meu trabalho. Se tivesse sido convidado, iria, com certeza. Outro detalhe: tamb�m n�o tinha lugar reservado para mim no audit�rio, n�o. Eu teria que chegar e bater cabe�a para achar uma cadeirinha.

Por que a rivalidade com Raquel Dodge chegou a esse ponto?

N�o sei. Nunca houve uma rivalidade a esse n�vel, claro que n�o.

Substitui��es de equipe podem comprometer o trabalho em andamento na Lava-Jato?

Em tese, todos est�o preparados para esse tipo de trabalho. � claro que as pessoas t�m que trabalhar com quem t�m afinidade. Isso � normal. Eu me espantei porque havia of�cio formal, com convite para que toda a equipe da Lava-Jato continuasse. Existia um ato formal dela. Houve uma conversa com o pessoal da equipe, em que ela disse novamente que todos estavam convidados. Depois, ela come�ou a desconvidar.

O que houve?

N�o sei. No s�bado, fiz uma feijoada para a despedida da minha turma. A turma dela ligou para dois colegas meus, o Fernando (Alencar) e o Rodrigo Telles, desconvidando-os. Com rela��o ao Rodrigo Telles (que auxiliou Janot na investiga��o contra Agripino Maia), o que disseram � que havia muita resist�ncia ao nome dele, n�o disseram de quem, e sobre o Fernando, disseram que ele ultrapassava o percentual que o Conselho (Superior do Minist�rio P�blico) estabeleceu para o recrutamento de pessoas. Esses foram desconvidados no s�bado.


Fora do MP, o senhor foi muito questionado, sobretudo por causa do processo relacionado � JBS. Saiu de uma posi��o de her�i e, de uma hora para outra, passou a ser apontado como vil�o...

Existem estrat�gias de defesa. Quando o fato � chapado, quando o fato � mala voando, s�o R$ 51 milh�es dentro de apartamento, gente carregando mala de dinheiro na rua de S�o Paulo, grava��o dizendo “tem que manter isso, viu?”, h� uma dificuldade natural para elaborar defesa t�cnica nesses questionamentos jur�dicos. E uma das estrat�gias de defesa � tentar desconstruir a figura do acusador. � assim que eu vejo. De repente, passo a ser o vil�o da hist�ria, o dito vil�o da hist�ria, porque h� necessidade de desconstituir a figura do acusador. O que fizeram comigo v�o fazer com outros. Tenha certeza absoluta.
 
Mas o senhor enfrenta cr�ticas de acusados desde o in�cio. O senador Collor, por exemplo, j� soltou improp�rios contra o senhor...

Mas numa propor��o muito menor… Ele s� xingou minha m�e v�rias vezes (risos). Mas agora cheguei ao poder real. No n�cleo de poder, no centro dessa Orcrim (organiza��o criminosa), e a rea��o � essa mesmo. Eu j� imaginava que isso aconteceria, mas n�o imaginava que seria nessa propor��o. N�o imaginava como viria o coice. A orquestra��o � vis�vel.

Ao se despedir, na sexta-feira, o senhor falou em sofrimento…

� um desgaste danado, voc� catalisar tudo sozinho… Eu tinha que manter a equipe funcionando at� 17 de setembro. Foi tudo muito intenso. Investiga��es importantes foram chegando maduras nas duas ou tr�s �ltimas semanas do meu trabalho. Essas investiga��es dependiam de atos de terceiros tamb�m. Para a den�ncia da organiza��o criminosa do PMDB da C�mara, tive que aguardar a conclus�o do inqu�rito. O delegado s� relatou o inqu�rito na segunda-feira, um excelente relat�rio, de mais de 400 p�ginas, que mostra um retrato da atua��o dessa organiza��o criminosa. De um lado, eu tinha que manter a equipe funcionando e tirando deles a press�o para que trabalhassem com efic�cia e efici�ncia. Eu tinha que absorver tudo isso sozinho, n�o � para crian�a, n�o. N�o � brinquedo, n�o. S� pancada. N�o � para amador.

Na dela��o de Joesley, houve questionamentos com rela��o ao fato de ele revelar crimes t�o graves e ir embora de avi�o particular para os EUA. Como lidou com a revolta que isso suscitou?

Eu tinha uma escolha de Sofia. Ele chega, nos traz uma demonstra��o, que foi um pequeno take do �udio, que revelava crimes em curso praticados pelo alto escal�o da Rep�blica. O presidente da Rep�blica, um senador importante que teve 50 milh�es de votos na elei��o anterior, um deputado federal, a prova fazia men��o a um colega meu infiltrado. Eram crimes grav�ssimos e em curso. Tomo conhecimento disso, vejo que tem indicativo de prova. Eles disseram: “A gente negocia qualquer outra coisa, menos a imunidade”. A minha escolha de Sofia era: se eu n�o pego o material que eles tinham, eu n�o poderia investigar, eu teria que ficar quieto vendo esses crimes acontecerem ou ent�o eu tinha que negociar a imunidade.

O fato de Joesley ir para a cadeia � de certa forma um al�vio para o MP depois de tantas cr�ticas?

Ele foi mais esperto que ele mesmo. A esperteza capturou ele pr�prio. A gente tem que deixar muito claro: a colabora��o premiada � um instituto novo para a gente, j� aprendemos muito. Quando a gente faz um acordo desse, � de natureza penal, a gente est� negociando com bandido, bandi-d�-�-d�. O cara, porque � colaborador da Justi�a, n�o deixa de ser bandido. As coisas t�m que ser muito claras. A mesa de negocia��o � um lugar muito duro, um ringue mesmo. O colaborador tem que vir de cora��o aberto, tem que vir para o lado do Estado. Tem que falar tudo. Quem faz ju�zo sobre a pr�tica ou n�o de delito � o MP, n�o o colaborador, ele tem que entregar tudo. A gente tem muito anexo que n�o tem nada de palp�vel, mas a gente recebe e analisa. O ju�zo n�s que fazemos. E o que eles fizeram? Eles esconderam fatos. Trouxeram “A” mas n�o nos trouxeram “B”. Porque n�o trouxeram “B”, est� contaminado todo o acordo. S� que o fato de ele n�o trazer o “B” n�o influencia nem tangencia o “A”. N�o contamina. A rescis�o me permite continuar usando a prova. Mas d� um gosto amargo, o sujeito n�o pulou o lado, continuou ao lado da bandidagem.

E as den�ncias envolvendo o ex-procurador Marcelo Miller? O fato de ele ter negociado com o grupo JBS quando ainda fazia parte da equipe da PGR compromete a validade das provas?


Existe uma investiga��o em curso, mas, se ele fez isso, foi sem o nosso conhecimento. E se fez sem o nosso conhecimento, ele n�o pode contaminar um ato que � nosso. Se ele fez, n�o est� comprovado ainda, vai ter que responder por isso.

O fato de ele ter abdicado de uma carreira como ao MP n�o despertou d�vidas na sua equipe?

No �ltimo um ano e meio, cinco colegas sa�ram.
(foto: Marcelo Ferreira/CB/DA Press)
(foto: Marcelo Ferreira/CB/DA Press)


� o sal�rio?

� dinheiro. Tamb�m � muita responsabilidade, muita restri��o. O fato de ele ter sa�do n�o suscita nenhuma suspeita. O Marcelo trabalhou forte na colabora��o da Odebrecht. Ele j� tinha voltado para o Rio de Janeiro havia um ano e continuou na for�a-tarefa como colaborador, eventualmente era chamado a fazer alguma colabora��o aqui. Mas n�o estava no n�cleo.

O senhor se sente tra�do?

Eu quero ver a conclus�o da investiga��o para fazer algum ju�zo. O caso do �ngelo (Goulart) est� investigado, ali eu me senti tra�do, com certeza.

O procurador �ngelo Goulart criticou sua forma de atua��o, disse que o senhor agia rapidamente para chegar ao presidente Temer…

� engra�ado isso, ele n�o trabalhou comigo. O �ngelo trabalhava no eleitoral, nem no mesmo pr�dio fic�vamos. Quando foi chegando ao fim do mandato, como tinha interesse de permanecer em Bras�lia, ele perguntou se poderia ser designado para a for�a-tarefa da Greenfield, da PRDF.

� verdade que o senhor vomitou quatro vezes ao tomar conhecimento desses fatos relacionados ao procurador �ngelo Goulart?

Sim. � muito triste isso de prender um colega. Tem um crime militar que a gente chama de perf�dia. Perf�dia � o sujeito que � do teu grupo e que vende esse grupo para o inimigo. Ele passa a ajudar o inimigo a te dar tiro. Esse � o sentimento que deu na gente. A situa��o � muito ruim, sentir que contaminou.


O procurador �ngelo alega que atuou para tentar encabe�ar as tratativas da eventual dela��o. Ele agiu motivado por dinheiro?

Essa linha de defesa ele j� adotou no processo administrativo disciplinar aqui dentro. Ele tentou se passar por her�i. Como se ele tivesse se oferecido a eles para poder derrub�-los. Como se fosse o mocinho, o super-homem. Mas como faz um trabalho desses de atua��o infiltrada sem falar com os russos? Ele faz isso sem falar com os colegas, com ningu�m? N�o falou com o Anselmo (Lopes, coordenador da Opera��o Greenfield). Agora vamos ver os fatos. Houve uma reuni�o em que o Anselmo fez um desenho � m�o da estrat�gia da investiga��o. Esse papel foi aparecer com um advogado da JBS. A troco do qu�? Ele foi pilhado numa a��o controlada em que conversa com desenvoltura. Depois, ele tem gravada a conversa com o advogado. Tudo isso ele bolou sem avisar ningu�m? � fantasioso. E acertou dinheiro, sim, R$ 50 mil por m�s.

H� provas de que ele recebeu dinheiro?

Tem relato do Francisco (de Assis, advogado), tem advogado acertando, dizendo que tinha dinheiro, tem o croquis do planejamento, tem grava��o, visitas. A express�o que a gente usa � “batom em certo lugar”.

Ainda citando o que ele diz, o senhor se referia a sua sucessora como a bruxa?

N�o. � aquela coisa, como se faz para desconstruir o acusador.

Essa campanha que o senhor menciona para tentar atacar o acusador como foi?

O n�vel � muito baixo, chegaram � minha fam�lia, � minha filha.

Saindo do cargo, acredita que vai diminuir?

Pelo contr�rio. A not�cia que tive �: vai aumentar. A press�o para cima de mim s� vai aumentar.

Teme que a CPI da JBS vire instrumento de vingan�a?

A CPI n�o � da JBS. O relator j� afirmou que o escopo da CPI � investigar os investigadores. O escopo da CPI n�o s�o os empr�stimos da JBS no BNDES. Ningu�m falou sobre isso. Est�o falando em convidar tamb�m o �ngelo, o Eug�nio Arag�o.

Em um texto divulgado na internet, o procurador Arag�o defendeu �ngelo, e disse que ele apenas atuava com m�todos heterodoxos para conseguir acordos de colabora��o...

Sabe por qu�? Quem trouxe o �ngelo para atuar no eleitoral foi o Dr. Eug�nio Arag�o.

Como vai se proteger desses ataques que o senhor j� prev�?

Primeiro, quero descansar, vou tirar 20 dias, viajar. Depois, vou ver as estrat�gias. A imprensa tem que ser muito atuante agora. Essa CPI n�o pode ser a CPI dos investigadores. Essa CPI tem que seguir o escopo dela. N�o � a CPI dos empr�stimos do BNDES? E querem investigar quem? Eu? Eu n�o participei de empr�stimo nenhum da JBS. O acordo da JBS foi judicial. Foi homologado pelo Supremo e foi reafirmado pelo Supremo. Como o Congresso pode querer desconstituir isso?

V�o tentar usar o Miller contra o senhor na CPI?

V�o tentar usar todo mundo e tudo contra mim… Tudo � poss�vel, v�o tentar desconstituir a figura do investigador. N�o levei dinheiro do Miller nem autorizei ningu�m a receber mala de dinheiro em meu nome. Nem tenho amigo com R$ 51 milh�es em apartamento.

Acredita que a popula��o vai aceitar uma atua��o como essa da CPI?


O brasileiro � honesto. Espero que a cidadania seja ativa para enxergar esse tipo de manobra. Outra estrat�gia tamb�m � usar a imprensa estrangeira, j� come�aram a falar l� fora, e a falar forte. Quando come�aram as altera��es no grupo de trabalho da Lava-Jato, saiu uma notinha com a chamada "It begins" (“Foi dada a largada”, em tradu��o livre). O t�tulo diz tudo.

O que achou do fato de Dodge n�o ter citado nenhuma vez a Lava-Jato no discurso de posse? Foi pelo fato de a opera��o ter se tornado a marca do senhor?

A Lava-Jato n�o pertence ao MP, pertence � sociedade, ao mundo. N�o � uma marca minha. Eu dei as condi��es necess�rias para que outros colegas pudessem trabalhar, em Curitiba, no Rio, em S�o Paulo. A Lava-Jato n�o pertence mais ao Minist�rio P�blico. � um patrim�nio da sociedade brasileira. Ela corre o mundo.

A Lava-Jato corre risco real?

Est� cedo para avaliar. � preciso aguardar para ver como a coisa evolui. Se houver risco, n�o acredito que isso contamine nem Curitiba, nem Rio, nem S�o Paulo, que j� t�m investiga��es com pernas pr�prias.

O senhor foi flagrado conversando com o advogado Pierpaolo Bottini, que representa Joesley, em um bar. N�o foi um encontro impr�prio, dadas as circunst�ncias?


N�o era um bar, era uma distribuidora de bebidas. Vou �quele lugar todo s�bado. Chego ali, tomo uma cerveja e vou embora para casa. Conhe�o todo mundo, conhe�o o dono, o C�sar, desde a �poca em que ele vendia minhocas, conhe�o todos os frequentadores. A gente conversa, passa ali meia hora, uma hora. Abriu uma feijoada ali do lado aos s�bados que � �tima.

Disseram at� que essa reuni�o era compar�vel ao encontro de Joesley com Temer no Pal�cio…

Meio dia, em um lugar p�blico, frequentado por um zilh�o de pessoas? A conversa n�o durou 10 minutos, n�o falamos de trabalho, de nada disso. Falamos de cerveja. Aconselho passearem por l�, tem tudo quanto � cerveja artesanal.

O advogado Willer Tomaz, tamb�m denunciado, recebia em sua casa  figuras importantes, inclusive o procurador-geral de Justi�a do DF, Leonardo Bessa. Causa suspei��o?

Relacionamento da gente com advogado � uma coisa normal. Dos meus amigos que fiz em Bras�lia quando cheguei h� 33 anos, a maioria � advogado. Todo mundo se conhece. E advogado de bandido n�o � bandido, a gente tem que ter esse relacionamento.

O senhor teve embates duros tamb�m com o ministro Gilmar Mendes. O STF vai enfrentar o tema da suspei��o do ministro?


V�o ter que enfrentar, claro. Quando algu�m argui suspei��o, esse � um termo t�cnico normal. A argui��o de suspei��o � para garantia da atividade da magistratura e dos jurisdicionados. O magistrado tem que ser isento. Eles v�o enfrentar, sim. O resultado, n�o sei.

Fazendo uma compara��o com a Opera��o M�os Limpas, na It�lia, o senhor teme pela sua vida?

Temer, n�o! (risos).

Acredita que o MP estar� com o senhor?

Acho que sim, n�o s� o federal, o Minist�rio P�blico do Brasil inteiro. O Minist�rio P�blico brasileiro hoje est� em outro patamar.

Durante sua gest�o, onde errou?

Com certeza, erros aconteceram, mas n�o consigo fazer esse ju�zo agora. Preciso de um afastamento para poder enxergar.

A Lava-Jato � uma sucess�o de dela��es. Como isso come�ou?


Tem um momento para mim que foi um divisor de �guas. O que deu impulso danado nas colabora��es foi a decis�o do STF, que disse: condenou em segundo grau, vai para a cadeia. Os caras come�aram a fazer conta. A estrat�gia era empurrar, agora n�o tem mais jeito. Esse foi, na minha leitura, um dos pontos que gerou essa mudan�a. Grandes dela��es tamb�m chamaram todas as outras.

O Supremo vai rever alguma delas?

N�o acredito que o STF vai recuar. Seria um preju�zo enorme.

A dela��o do Delc�dio, com a pris�o de um senador no exerc�cio do mandato, foi decisiva?


Sim. Divisor de �guas foi a colabora��o do senador. Ele gravou, os fatos eram grav�ssimos, e era um senador, l�der do governo. Quando fiz o pedido de pris�o, sabia que tinha cruzado o rubic�o e que tinha queimado a �nica ponte atr�s da tropa, que n�o tinha mais recuo. Era s� para a frente. Foi um momento de muita tens�o, era uma novidade e eu n�o sabia o que aconteceria.

Com a morte de Teori, temeu pelo fim das investiga��es?

Temi, sim. Eu sou agn�stico, eu creio muito pouco. Com a morte dele, eu passei a crer ainda menos. Eu dizia: n�o � poss�vel.

Suspeitou de assassinato?

No come�o, claro. Mas a investiga��o foi feita por n�s, pelo MPF, em Angra dos Reis, e estamos seguros de que foi acidente mesmo.

Foi o momento mais dif�cil?

Esse foi um dos mais dif�ceis, com certeza, foi devastador para todo mundo. Ele era muito firme. Ainda bem que o ministro Fachin tamb�m �.

Como avalia a atua��o de Moro?


A gente est� no meio de um lama�al, no meio de bandidos, cheiro de podre para todo lado, s� tem uma maneira de n�o se contaminar, a gente tem que ser reto. O Moro � duro, eu fui duro, e tem que ser mesmo.

O que foi essencial na Lava-Jato?

O grupo de Curitiba foi muito importante. O juiz foi muito importante. Uma parte que pouca gente fala, mas que permitiu chegar at� agora, o Tribunal Regional Federal da 4ª Regi�o, que manteve com firmeza todas as decis�es.

O Brasil mudou com a Lava-Jato?

Est� mudando. Na minha terra, quando a gente fazia muita traquinagem, apanhava com vara de marmelo, aquela bem flex�vel. Aquilo na perna d�i para caramba. N�s envergamos essa vara e temos que ter cuidado para ela n�o soltar, sen�o volta batendo em todo mundo e vai ficar em p�. Estamos nesse ponto de inflex�o, a vara foi dobrada, mas n�o foi quebrada. E essa vara tem que ser quebrada.
(foto: Marcelo Ferreira/CB/DA Press)
(foto: Marcelo Ferreira/CB/DA Press)


Ainda tinha muita flecha?

Sim, tenho ainda algumas ali (aponta para arco e flecha que recebeu de �ndios).

Mesmo depois do in�cio da Lava-Jato, muitos atos de corrup��o prosseguiram. Gim Argello, por exemplo, negociava convoca��es para a CPI da Petrobras…

Com tr�s anos e meio de Lava-Jato, vimos v�rias conversas n�o republicanas, malas para c�, malas para l�. Mas seria mais grave sem a Lava-Jato. A vara est� envergada, mas n�o foi quebrada. Tem que ser quebrada.

O senhor falou de ego�stas e escroques ousados. Eles est�o em todas as institui��es?

Sim, at� na minha tem.

Como ser� julgado pela hist�ria?


Quero ser julgado de maneira isenta. Se eu errei, que apontem os erros. Se eu acertei, que mostrem os acertos. S� isso.

Uma das cr�ticas � a forma como o MP consegue as dela��es, que os acusados falam s� para fugir da cadeia. Um dos casos levantados � o do ex-ministro Palocci...

Essa hist�ria de que a gente prende para ter colabora��o, muita gente falava isso, e a gente s� mostrava a estat�stica: 85% s�o com pessoas soltas. A pessoa s� tem medo de ser presa quando comete crime. � crime e castigo, tem at� um livrinho com esse nome. A lei diz que a colabora��o tem que ser espont�nea, volunt�ria, se n�o for assim, n�o pode ser homologada. A iniciativa tem que ser do colaborador, com advogado. N�o posso ter conversa escondida com colaborador. A negocia��o � dura. Conclu�do isso, a gente faz o contrato do acordo, o magistrado chama o colaborador, sem a nossa presen�a, e pergunta se foi instigado, incentivado, obrigado, amea�ado. Existe toda essa preocupa��o para que o colaborador possa falar. Quando ele fala, n�o basta imputar algo a algu�m, tem que dar o caminho da prova. Diziam que era coisa de X9, de dedo duro. Ele tem que dizer o crime que cometeu, o comparsa dele, como participou desse crime e revelar o caminho da prova. Se imputa falsamente, ele comete crime. E n�o acabou a colabora��o. Ela � homologada e, no fim do processo, o juiz analisa a efic�cia dessa colabora��o. O colaborador tem que ajudar a acusa��o na obten��o das provas. Se n�o fizer isso, ele perde a premia��o. Se o colaborador der causa � rescis�o, como acontece agora com Batista e Ricardo Saud, ele perde toda a premia��o, responde pelos crimes que cometeu e toda a prova que ele deu para a acusa��o � v�lida. � uma situa��o muito delicada a do r�u colaborador.

Como veio � tona esse novo �udio de Joesley?

Quando foi feito esse acordo, contrataram um grupo para fazer levantamentos dentro do grupo empresarial para identificar as provas para a orienta��o da colabora��o. E, aos poucos, iriam fazendo os novos anexos e indica��o dos fatos criminosos. Pediram 120 dias para fazer isso. No acordo, constaram aqueles anexos que trouxeram no primeiro momento e, no per�odo de 120 dias, trariam complementos. Um pouco antes, pediram a prorroga��o por mais 60 dias. A gente concordou com a prorroga��o. Com medo de perderem o prazo e ter rescindida a colabora��o, eles empurraram tudo para c�. Vieram muitos anexos e muitos �udios. Para agilizar, a gente dividiu tudo entre os colegas. No grupo da Lava-Jato, ficou todo mundo ouvindo os �udios. A Carol (procuradora Ana Carolina Rezende) ficou com um grupo de �udios. Tinha um anexo que envolvia uma pessoa cujo processo est� em sigilo, o codinome era Piau�, com quatro �udios. O maldito �udio Piau� 3 n�o tinha nada a ver com esse anexo. O Piau� 1, 2 e 4 tinham a ver, eram conversas com determinado senador. A Carol, domingo de manh�, manda mensagem no nosso grupo dizendo que tinha um �udio jabuti, contrabando, de quatro horas, falando de Miller, de v�rias coisas. Viemos para c�, passamos a tarde aqui. Era um jabuti, um anexo de contrabando colocado sem nenhuma remiss�o de que n�o tinha nada a ver com Piau�. A PF disse que tinha recuperado 7 �udios, que est�o sob sigilo, porque o advogado dos colaboradores disse que boa parte � conversa entre advogado e cliente. E que a per�cia da PF teria recuperado mais 11 �udios.

 Joesley tinha apagado e a PF conseguiu resgatar?

Isso. Na leitura que fizemos, isso n�o poderia ter sido um equ�voco, foi uma casca de banana mesmo. O ministro Fachin lacrou os 11 �udios, nem n�s conhecemos. Eles, com medo de um dos 11 �udios ser um dos que est�o recuperados pela pol�cia, colocaram um jabuti. L� na frente, quando estourasse o neg�cio, diriam que entregaram e n�s ficamos calados. � �bvio que foi uma armadilha. E como desarma uma armadilha? Coloca luz sobre ela. Santa Carol! Se ela n�o fosse t�o CDF, poderia ter passado.

H� alguma possibilidade de o desfecho da segunda den�ncia contra Temer ser diferente no Congresso?

Acho que n�o. Mas a solu��o pol�tica n�o me interessa. Tenho que fazer o meu trabalho. A C�mara n�o rejeita a den�ncia, ela autoriza ou n�o o processamento.

O senhor virou carrasco dos pol�ticos corruptos?

Cada um tem que fazer o seu trabalho. O corrupto tem que entender que acabou a era de que nada acontece com ele. Grandes empres�rios, o poder econ�mico e o poder pol�tico, est� todo mundo respondendo igualmente, n�o � mais a justi�a dos tr�s p�s.

Como v� as acusa��es de que age com interesses partid�rios?


Primeiro eu era petista, indicado pela Dilma. Quando viram o meu radar, virei perseguidor de pol�tico. N�o estou criminalizando a pol�tica, estou criminalizando bandido.

Como responde a cr�ticos que dizem que o MP sai menor?


O MP sai gigante, pois � reconhecido fora do Brasil. Aonde voc� vai, os colegas de fora reconhecem nossa atividade, na Fran�a, na Su��a, nos EUA, todos os minist�rios p�blicos do Mercosul reconhecem nossa atividade.

Depois dos 20 dias de descanso, como vai refazer a vida?

Tenho projetos que quero tocar, n�o quero sair dessa �rea de combate � corrup��o. As pessoas de fora me pedem para n�o sair dessa �rea. Nossa atividade virou paradigma. O Brasil deu um passo gigantesco no combate � corrup��o. Mas isso, para o bloco, n�o � suficiente. Se o Brasil continua esse caminho, e acho que vai continuar, pode come�ar a exportar corrup��o. O bloco tem que caminhar de forma harm�nica e as pessoas pedem que eu seja uma voz no combate � corrup��o. Na PGR, vou atuar na �rea criminal do STJ.

Na elei��o de 2018, como garantir renova��o?

A cidadania vem com for�a para 2018. Ningu�m aguenta mais ser enganado dessa forma. Agora, � importante tamb�m que a pol�tica fa�a a sua parte. Temos que ter reforma pol�tica profunda.

Como fazer isso com um Congresso contaminado?

Vamos imaginar que os novos pol�ticos de 2018 recebam da cidadania uma cobran�a muito forte para que haja essa mudan�a. N�o podemos ter senador que teve zero votos, um deputado federal que teve 15 votos, que ningu�m sabe quem �.

Com a sa�da de Dilma, a corrup��o ficou mais expl�cita?

A cada dia que passa, a gente est� jogando mais luz sobre a corrup��o. � isso.


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