
No �pice da fragmenta��o partid�ria brasileira, o artif�cio de negocia��o com o Executivo em blocos de partidos saltou de forma in�dita da arena legislativa para o palco pol�tico eleitoral. Se no Legislativo os agrupamentos de partidos m�dios e nanicos – em geral fisiol�gicos – ganham for�a para trocar com o Executivo a sustenta��o pol�tica e apoio �s pautas de interesse por cargos, recursos e favores; na v�spera do fim do prazo das conven��es partid�rias para a aprova��o de coliga��es e candidaturas, o escambo pol�tico muda de figura e agora envolve a aposta em torno da expectativa de poder.
Ap�s colocar em leil�o o seu tempo de propaganda eleitoral gratuita e negociar com o pr�-candidato Ciro Gomes (PDT), o DEM, o PP, o PR, o PRB e o Solidariedade fecharam o neg�cio com o tucano Geraldo Alckmin, n�o sem antes, e isoladamente, o PR, atrav�s de seu cacique Valdemar da Costa Neto – presidente de fato da legenda, mas n�o de direito – ter tamb�m feito incurs�es junto a Jair Bolsonaro (PSL). O bloc�o recupera o nome de Centr�o – hom�nimo da for�a suprapartid�ria formada na Assembleia Nacional Constituinte, e, d�cadas depois, ressuscitada com o n�cleo do PP e do PR sob o comando do ex-presidente da C�mara, atualmente preso, Eduardo Cunha (MDB).
“Formaram o cons�rcio dos partidos sem candidato a presidente, o cons�rcio do desespero”, avalia o cientista pol�tico e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Jairo Nicolau. Fechado o neg�cio, os cinco partidos que, para efeitos de c�lculo do tempo de propaganda eleitoral carregam uma bancada eleita de 129 deputados federais, entregaram ao PSDB um quinh�o 2,4 vezes maior do que teria sozinha a legenda, que em 2014 elegeu 54 parlamentares.
O Centr�o recebe em troca e de imediato, a indica��o do vice da chapa e participa��o da coordena��o da campanha. N�o entrar� com um tost�o de seu fundo eleitoral na campanha tucana, reservando-o para a elei��o de bancadas federais. Nos estados, os partidos-membro n�o t�m restri��es e est�o liberados para viabilizar as coliga��es segundo o melhor desempenho das proje��es para a elei��o das bancadas federais.
E se ganhar a aposta nacional eleitoral de muito mais risco do que as articula��es legislativas para apoio do Executivo, o Centr�o j� pediu a presid�ncia da C�mara dos Deputados e a do Senado Federal. Em resumo se vencer a elei��o presidencial com Alckmin, o Centr�o ter� poder para encurralar o futuro governo.
Mas, e se o Centr�o perder a aposta eleitoral? “Depender� das bancadas que conseguir eleger nestas elei��es”, afirma Jairo Nicolau. Na avalia��o do cientista pol�tico, as novas cl�usulas de desempenho previstas na legisla��o v�o for�ar partidos pequenos a se fundir com outros, com tend�ncia de enxugamento do quadro partid�rio a partir da pr�xima legislatura. Se assim n�o fizerem, deputados federais de partidos nanicos n�o ter�o acesso aos recursos do estado, como Fundo Partid�rio, o Fundo Eleitoral, al�m do tempo de propaganda gratuita.
O velho Centr�o Foi batizado em 1987. Era o primeiro ano da Assembleia Nacional Constituinte. Em comum com o rebatismo de 2015, n�o apenas o nome “Centr�o” – que remete � ideia do centro no tradicional espectro ideol�gico direita-esquerda para camuflar o forte vi�s conservador de direita. Mas sobretudo, a uni�o suprapartid�ria no Legislativo para aprovar pautas de interesse do Executivo, apoio recompensado com cargos, verbas e diversos favores.
Foi pelas m�os principalmente de grandes partidos como o PDS, o PFL, o PTB, mas tamb�m com a ades�o de legendas menores como o PL – atualmente PR – e do Partido Democrata Crist�o (PDC), que Jos� Sarney, peemedebista egresso da Arena e do PDS, trabalhou para rachar o ent�o PMDB, tentando isolar a sua ala progressista, de modo a assegurar na Constituinte a vit�ria nos principais temas de seu interesse: o sistema de governo presidencialista e, nas disposi��es transit�rias, o seu mandato de cinco anos.
Sarney “pagou” a d�vida: Roberto Cardoso Alves, o “Robert�o”, um dos l�deres desse grupo suprapartid�rio conservador, – que cunhou a reinterpreta��o do “� dando que se recebe” de Assis aplicada � pol�tica –, al�ou voo da C�mara dos Deputados para o Minist�rio da Ind�stria e Com�rcio e, deste, para o Minist�rio do Desenvolvimento Industrial, Ci�ncia e Tecnologia, cargo que ocupou at� o fim do governo, apesar de den�ncias de irregularidades.
O Centr�o da Constituinte – que n�o reunia apenas conservadores da direita fisiol�gica mas tamb�m conservadores formuladores como Delfim Netto e Roberto Campos, ambos operadores para implanta��o de uma concep��o de estado – dissolveu-se antes mesmo do fim dos trabalhos face ao fracasso dos Planos Cruzados de Sarney e da sua crescente impopularidade, com o aprofundamento das crises social e econ�mica e pelo surgimento de den�ncias de corrup��o.
O novo “Centr�o” A nomenclatura Centr�o hibernou por quase tr�s d�cadas no Congresso Nacional, com breves men��es durante o primeiro mandato do governo Lula, at� que, por volta de 2013, a ideia de um novo centr�o renasceu com for�a. O “novo” Centr�o foi gestado e acalentado pelo ent�o deputado federal Eduardo Cunha (RJ), quando al�ou � lideran�a do PMDB: assim como fez Sarney com o velho PMDB, ao mesmo tempo em que Cunha trabalhava para dividir a sua pr�pria bancada com o discurso de insatisfa��o em rela��o ao governo Dilma, passou a arregimentar deputados de siglas de pequeno e m�dio porte, de vi�s conservador e de direita, mas sem plataforma program�tica definida, com acenos de apoio financeiro para as campanhas eleitorais.
Ao fim do primeiro mandato de Dilma, Eduardo Cunha havia formatado uma bancada suprapartid�ria, que ajudou financeiramente a reeleger, e que reivindicava espa�os e vantagens do governo, potencializava insatisfa��es contra a presidente e tamb�m emplacava pautas conservadoras.
No in�cio do segundo mandato de Dilma, o novo Centr�o reunia informalmente 13 partidos – PP, PR, PSD, PRB, PSC, PTB, SD, PHS, Pros, PSL, PTN, PEN e PT do B – e contava com cerca de 200 parlamentares do chamado “baixo clero”, ou seja deputados de baixa influ�ncia, que n�o s�o articuladores –, a maioria apoiada financeiramente nas respectivas campanhas de 2014 por Cunha. Foi essa “bancada” que carregou Eduardo Cunha para a presid�ncia da C�mara dos Deputados.
Entre o impeachment de Dilma Rousseff e a sua atual configura��o, a “bancada” suprapartid�ria do Centr�o variou de 150 a 200 parlamentares, segundo as circunst�ncias pol�ticas. Mas ap�s a queda e pris�o de Eduardo Cunha, o Centr�o, que n�o chegou a se constituir como for�a org�nica, – mas antes uma for�a pol�tica fisiol�gica, da direita conservadora, operada por Eduardo Cunha – n�o apenas perdeu a sua lideran�a maior como tamb�m foi derrotada na sucess�o � presid�ncia da C�mara para o democrata Rodrigo Maia (RJ).

Repaginado e com poder de negocia��o
Uma vez no poder, o presidente da C�mara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ) tratou de rearticular o bloco de partidos �rf�os do deputado Eduardo Cunha (MDB-RJ). Bem mais enxuto, sob a lideran�a do DEM e de Valdemar da Costa Neto, – ex-presidente por mais de duas d�cadas, condenado no esc�ndalo do Mensal�o, que oficialmente nem filiado � ao PR, mas todos os movimentos da legenda dependem dele. Mas �s v�speras do fim do prazo das conven��es partid�rias para a escolha dos candidatos � presid�ncia da Rep�blica, longe de estar voltada para a aprova��o de mat�rias no Congresso, o Centr�o de Rodrigo Maia e Costa Neto ficou sem uma candidatura presidencial para chamar de sua.
“O fato de n�o haver um candidato competitivo do governo Michel Temer, esse n�cleo de partidos que atuou no impeachment e d� sustenta��o ao governo ficou sem ch�o”, avalia o cientista pol�tico e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Jairo Nicolau. “Esse grupo tem em comum uma posi��o de centro-direita no espectro pol�tico e pragmatismo no poder. Por que o PTB n�o est� no Centr�o? H� outros partidos com essas caracter�sticas”, considerou Jairo Nicolau, lembrando que PTB j� havia aderido a Alckmin e os partidos do Centr�o negociaram com Ciro Gomes (PDT) e, o PR, isoladamente, com Jair Bolsonaro (PSL).
Ao negociar em bloco, o Centr�o – que n�o est� organizado nos estados, onde as legendas est�o liberadas para buscar as coliga��es segundo o seu interesse regional, acenou a Alckmin com o seu tempo de antena na propaganda eleitoral gratuita. Para efeito de c�lculo, juntos, DEM, PP, PR, PRB e o Solidariedade elegeram em 2014 – bancada que de fato conta para a distribui��o do tempo de propaganda – 129 parlamentares – mais do que o dobro do tempo que o PSDB, com a sua bancada eleita de 54, ter�.
Considerando os dois blocos do hor�rio eleitoral na televis�o, de 12 minutos e 30 segundos cadas, �s ter�as, quintas e s�bados, o PSDB sozinho agrega 2min38s; o Centr�o lhe oferece 6min17s. J� nos 14 minutos di�rios de inser��es destinados �s campanhas para a Presid�ncia da Rep�blica, o PSDB conta com 1min20s e o Centr�o com 3min12s.
Para chegar � decis�o de apoio a Alckmin, Costa Neto teve papel preponderante, elaborando uma esp�cie de “quiz” apresentada aos l�deres do Centr�o, que questionava da estrutura que o candidato a presidente daria �s siglas do Centr�o, passando pela possibilidade de o PSDB abrir a m�o de candidaturas para deputados federais em coliga��es proporcionais nos estados para beneficiar as siglas do novo Centr�o. As principais indaga��es foram feitas no fim do “teste”: qual seria a participa��o do Centr�o nas tomadas de decis�o caso o candidato apoiado fosse eleito.
Por fim, a �ltima pergunta: olhando para o passado do candidato, ele tem o h�bito de cumprir compromissos pol�ticos? O teste direcionou o Centr�o para Alckmin. E como n�o poderia deixar de ser, o pre�o foi apresentado: al�m de indicar o vice-presidente na chapa, caso Alckmin venha a vencer as elei��es, o bloco reivindica a presid�ncia da C�mara dos Deputados e a presid�ncia do Senado Federal. Mas se Alckmin perder, na avalia��o do bloco, ele continuar� sendo necess�rio para a governabilidade. Ganhe quem ganhar, acredita o Centr�o, ser� procurado a exemplo do poder exercido pelo MDB – que nas elei��es de 1990 e 1994 elegeu um quinto do plen�rio e, a partir de 1998, manteve-se como a maior bancada que integrou, sem exce��o, todos os governos tucanos e petistas.
Mas para o cientista pol�tico Jairo Nicolau, contudo, a proje��o que o Centr�o faz de sua posi��o na futura pol�tica do Congresso poder� n�o se confirmar. “Nas elei��es de 2014, tivemos 28 partidos representados na C�mara dos Deputados (veja quadro). Chegamos ao �pice da fragmenta��o do sistema partid�rio brasileiro, um quadro de dispers�o nunca visto na hist�ria do pa�s. Mas com a nova regra provavelmente teremos um enxugamento dos partidos j� no come�o da nova legislatura”, afirma Jairo Nicolau.
Isso porque com os partidos fortemente dependentes do financiamento do estado, a tend�ncia, na avalia��o do cientista pol�tico, � de que deputados federais, principalmente de centro direita migrem para legendas maiores caso os respectivos partidos n�o alcancem o desempenho m�nimo. “Vamos assistir ao movimento inverso, de constru��o de bancadas maiores, fus�es, pois � mais vantajoso ser um parlamentar de um partido m�dio e grande do que ficar numa legenda sem acesso aos recursos p�blicos”, considera Jairo Nicolau. “Diante da nova legisla��o, a realidade para os pequenos ser� in�spita”, prev�. (BM)