O procurador do Minist�rio P�blico Federal (MPF), Antonio Carlos Bigonha, coordenador da 6.� C�mara do �rg�o, disse nesta quarta-feira, 23, que as terras ind�genas que j� foram homologadas n�o ser�o alvos de revis�o pelo governo, pois j� cumpriram todas as etapas de reconhecimento prevista em lei.
"A revis�o do ato administrativo � uma doutrina antiga no Direito brasileiro. Todo ato administrativo pode ser revisado, se tiver uma nulidade, ou se houver um interesse p�blico relevante. Mas isso n�o pode significar que exista uma d�vida sobre os processos demarcat�rios que foram feitos at� agora", afirmou Bigonha durante evento sobre direitos constitucionais ind�genas, que acontece na sede do MPF, em Bras�lia. "N�o paira nenhuma d�vida sobre a legalidade e regularidade desse processo."
O presidente Jair Bolsonaro j� declarou que pretende rever processos de demarca��es de terras j� homologadas aos �ndios, a come�ar pela terra ind�gena Raposa Serra do Sol, em Roraima. O plano de rever processos foi confirmado pelo secret�rio da Secretaria Especial de Assuntos Fundi�rios, Nabhan Garcia, que deu in�cio a uma revis�o nos processos executados pelo Instituto Nacional de Coloniza��o e Reforma Agr�ria (Incra), Funda��o Nacional do �ndio (Funai) e Funda��o Palmares.
Segundo Bigonha, n�o h� o que se questionar em rela��o �s demarca��es j� realizadas. "� o imposs�vel jur�dico rever demarca��o de terras no Brasil. A n�o ser que se constatasse uma nulidade, um fato excepcional�ssimo. O que existe no Brasil hoje s�o terras demarcadas regularmente."
Nesta semana, o MPF pediu medidas urgentes ao Minist�rio da Justi�a para investigar as not�cias de invas�es em ao menos tr�s terras ind�genas pelo Pa�s.
O evento na sede do MPF foi aberto pela procuradora-geral da Rep�blica, Raquel Dogde, e contou com a presen�a da ministra da Mulher, Fam�lia e Direitos Humanos, Damares Alves. A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, foi convidada, mas n�o compareceu ao encontro.
Raquel Dodge lembrou que a Constitui��o rompeu a tutela do governo sobre quest�es ind�genas, assegurando aos �ndios o direito de falarem por si. Ela cobrou discernimento e clareza nas a��es planejadas pelo governo. Damares Alves disse que tinha comparecido ao evento "apenas para ouvir", que o governo Bolsonaro "veio buscar o di�logo". "Reafirmo meu compromisso e amor aos povos ind�genas", disse.
Deputada ind�gena questiona 'amor ao �ndio'
Tamb�m participante do evento no MPF, Joenia Wapichana (Rede-RR), a primeira mulher ind�gena eleita deputada federal no Pa�s, questionou a "declara��o de amor" que Damares fez. "Que tipo de amor ao �ndio � esse? Um amor que amea�a, que coloca vidas em risco com a retirada de compet�ncias, da fiscaliza��o? Os �ndios j� s�o vulner�veis, e hoje est�o mais expostos ainda. Que amor � esse?", questionou Joenia, durante o intervalo do encontro.
A deputada Joenia Wapichana criticou a edi��o da medida provis�ria 870, pela qual Bolsonaro retirou da Funai a atribui��o de delimitar e homologar terras ind�genas, al�m de suprimir a responsabilidade por licenciamentos ambientais que afetem essas �reas e comunidades. Essas fun��es passaram agora para o Minist�rio da Agricultura.
"A postura do governo � contradit�ria. Falar uma coisa, mas na pr�tica voc� editar uma medida provis�ria que desestrutura todo avan�o das consolida��es dos direitos constitucionais", comentou. "Como � que vai se dar a prote��o �s terras e povos ind�genas? N�o � simplesmente voc� retirar compet�ncias, colocar em outro �rg�o (Minist�rio da Agricultura), que tem outro interesse de fazer a predomin�ncia de seus entendimentos. Por outro lado, n�o d� nenhuma oportunidade de defesa."
Segundo Joenia, o �ndio tem sido tratado como uma amea�a ao Pa�s, quando est� completamente sozinho na defesa de suas comunidades e terras. "Dizer que n�s somos empecilho ao desenvolvimento econ�mico? Isso � uma amea�a. O que estamos vendo n�o � mais sinal, � a concretiza��o do que ouvimos nas campanhas eleitorais, de uma disputa sobre os direitos ind�genas e socioambientais. A edi��o dessa medida provis�ria � a revers�o de todas as conquistas que n�s j� tivemos. � uma invers�o dos preceitos constitucionais. Est�o mexendo em cl�usulas p�treas de nossos direitos, o que causa uma enorme inseguran�a jur�dica. Nossos direitos fundamentais est�o amea�ados."
Funai diz que manter� estrutura de sa�de ind�gena
O presidente da Funai, Franklimberg de Freitas, disse que o Minist�rio da Justi�a se comprometeu em manter em funcionamento a estrutura da Secretaria Especial de Sa�de Ind�gena (Sesai), bra�o de sa�de p�blica voltado, especificamente, �s necessidades, h�bitos e costumes dos povos tradicionais.
O novo ministro da Sa�de, Luiz Henrique Mandetta, disse no in�cio do ano que atual pol�tica de sa�de ind�gena opera com sistema "improvisado" e que buscaria outro modelo de atendimento aos ind�genas. Chegou-se a se especular se a inten��o seria acabar com a Sesai, fazendo com que os �ndios passassem a ser atendidos diretamente pelo Sistema �nico de Sa�de (SUS). Mandetta criticou ainda repasses envolvendo organiza��es n�o governamentais na �rea de sa�de.
"Eu acredito que n�o vai ocorrer isso (fim da Sesai). A convite da ministra Damares Alves, eu j� participei de uma reuni�o no Minist�rio da Sa�de. O ministro (Mandetta) foi muito enf�tico e, muito pelo contr�rio, ele quer melhorar, aperfei�oar o atendimento da sa�de ind�gena. Pelo o que observei, a Sesai prossegue", comentou Franklimberg de Freitas.
A Sesai recebe cerca de R$ 1,5 bilh�o por ano do Minist�rio da Sa�de para desempenhar suas fun��es. A popula��o ind�gena brasileira � de cerca de 818 mil pessoas, os quais est�o distribu�dos em 688 terras ind�genas. S�o 305 povos diferentes, que falam 274 l�nguas distintas.
A Sesai tem a fun��o de coordenar e executar a Pol�tica Nacional de Aten��o � Sa�de dos Povos Ind�genas. A secretaria atua com um novo modelo de gest�o e de aten��o no �mbito do Subsistema de Aten��o � Sa�de Ind�gena, articulado com o SUS (SasiSUS), mas de forma descentralizada, com autonomia administrativa, or�ament�ria e financeira. Sua responsabilidade sanit�ria envolve 34 distritos sanit�rios especiais ind�genas (Dseis).
As discuss�es sobre a tem�tica ind�gena prosseguem at� o fim do dia.
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