Dois ex-executivos da Odebrecht relataram com detalhes � for�a-tarefa da Lava Jato como negociaram pessoalmente com o senador Fernando Collor (PROS-AL) o pagamento de R$ 800 mil para a campanha dele ao governo de Alagoas em 2010 via caixa 2. Entregaram o plano de voo da aeronave com o qual foram de Salvador a Macei� e disseram que o encontro ocorreu no apartamento do pr�prio parlamentar no dia do anivers�rio dele: 12 de agosto. Essa hist�ria veio � tona em 2017, em meio � estrondosa dela��o da empreiteira. Na �ltima semana, por�m, teve um silente destino, cada vez mais comum entre os inqu�ritos que envolvem pol�ticos com foro no Supremo Tribunal Federal (STF).
Sem elementos adicionais que comprovassem a acusa��o feita pelos delatores da Odebrecht, a procuradora-geral da Rep�blica, Raquel Dodge, arquivou h� cinco dias o inqu�rito aberto h� mais de dois anos para investigar Collor pelos crimes de corrup��o ativa, passiva e lavagem de dinheiro, contrariando entendimento da Pol�cia Federal. "Diante desse cen�rio, a aus�ncia de evid�ncias de corrobora��o acerca da realiza��o dos pagamentos tal como descrito pelos colaboradores, torna ainda mais carente de suporte probat�rio a vers�o trazida inicialmente", escreveu Raquel na peti��o enviada ao ministro Luiz Fux, relator do inqu�rito que deve homologar ou n�o o arquivamento.
O caso de Collor retrata o que tem sido a t�nica das investiga��es decorrentes da dela��o da Odebrecht no Supremo. Levantamento feito pelo Estado nos autos dos inqu�ritos e das peti��es relacionadas ao acordo de colabora��o premiada fechado pela empreiteira com o Minist�rio P�blico Federal (MPF) - e homologado pelo STF desde janeiro de 2017 - mostra que 54 dos 80 procedimentos que permaneceram sob a guarda dos ministros da Corte j� foram arquivados (67%). Outros 24 inqu�ritos seguem em tramita��o e dois j� resultaram em a��o penal.
Escassez de provas � o motivo mais comum para que uma investiga��o v� para a gaveta. A pr�pria PGR consta como solicitante do arquivamento de ao menos 28 inqu�ritos ou peti��es, sendo que nove foram feitas ainda na gest�o do ex-procurador-geral Rodrigo Janot - que assinou o acordo com a Odebrecht - e 19 pela atual chefe do Minist�rio P�blico Federal. Alguns casos, como o deputado federal Roberto Freire (Cidadania-SP) e do senador Jarbas Vasconcelos (MDB-PE), por prescri��o do crime apontado na dela��o. Mas a maioria (53%) por insufici�ncia de provas, quando os investigadores n�o conseguem reunir provas materiais do que foi delatado pelos colaboradores.
Em maio deste ano, por exemplo, o ministro Ricardo Lewandowski arquivou, a pedido de Raquel Dodge, o inqu�rito que investigava a suspeita de caixa 2 nas campanhas da senadora Maria do Carmo Alves (DEM-SE) e do ex-senador Eduardo Amorim (PSDB-SE) em 2014. Na peti��o, a procuradora relatou que n�o havia como extrair novos elementos al�m dos depoimentos dos delatores e das planilhas da empreiteira porque os um dos intermedi�rios da propina havia morrido e outro foi acometido de Alzheimer. A investiga��o pode ser reaberta caso surjam fatos novos.
A car�ncia de provas tamb�m foi justificativa para o arquivamento parcial do inqu�rito que investigava suposto pagamento de propina ao presidente da C�mara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ao senador Renan Calheiros (MDB-AL), e ao ex-senador Eun�cio Oliveira (MDB-CE) para aprova��o de medidas provis�rias no Congresso em 2009 e de doa��o via caixa 2 ao ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM-RS), em 2006.
Os pol�ticos citados negam envolvimento em qualquer irregularidade ou crime relatado pelos colaboradores.
Modelo
Um advogado que trabalhou nos acordos de dela��o da Odebrecht e que aceitou falar com o Estado sob a condi��o de anonimato acredita que o �ndice de arquivamento dos casos ligados � construtora no Supremo se deve ao modelo de acordo usado pela PGR, que negociou a dela��o de 77 executivos do grupo ao mesmo tempo - o que dificultou uma an�lise mais apurada dos depoimentos e documentos dos colaboradores.
Quando um acordo � fechado, o delator deve dizer quais provas pode oferecer para corroborar seus relatos. Somente depois da an�lise desse conjunto o Minist�rio P�blico pode dizer o que pode oferecer em troca daquela colabora��o, observou o advogado. Segundo ele, como eram muitos os executivos envolvidos, a Procuradoria n�o teria conseguido avaliar corretamente todos os relatos fornecidos. Por isso, diz, "n�o foi poss�vel confirmar muita coisa".
Um farto material comprobat�rio usado pela Lava Jato no caso Odebrecht s� foi obtido depois da dela��o da empreiteira gra�as � colabora��o de outros operadores do esquema, como o doleiro �lvaro Jos� Novis, encarregado de coordenar os pagamentos aos pol�ticos em S�o Paulo e no Rio, e um ex-gerente da transportadora de valores que fazia as entregas de dinheiro. Parte desse material, que cont�m planilhas e grava��es telef�nicas, s� come�ou a chegar �s m�os de muitos investigadores nos �ltimos meses.
"Se a efic�cia da colabora��o depende de outra colabora��o � sinal de que aquela dela��o n�o era v�lida. Ou seja, se os doleiros n�o tivessem delatado n�o ter�amos prova. O instrumento n�o pode funcionar assim. A Odebrecht usava como prova da corrup��o um sistema interno que no fundo n�o prova nada", disse o criminalista Roberto Podval.
A PGR destacou que "se durante a investiga��o n�o se obteve provas para demonstrar que o crime ocorreu ou quem o praticou, � dever do �rg�o da acusa��o, o Minist�rio P�blico, promover o arquivamento".
Afirmou ainda que em rela��o aos de acordos homologados pelo Supremo "h� uma vasta variedade de situa��es" e "n�o h� como se exigir que todos os supostos crimes relatados tenham viabilidade apurat�ria". "Arquivamento n�o corresponde a insucesso de investiga��o, mas a uma atividade normal do Estado."
Ao todo, 320 procedimentos foram abertos a partir da dela��o da Odebrecht, mas 240 foram distribu�dos para a Justi�a Federal nos Estados por envolver pessoas sem prerrogativa de foro junto ao Supremo e para os Tribunais Eleitorais Regionais (TREs), porque est�o relacionadas ao crime de caixa 2.
Outros objetivos
Para a subprocuradora-geral da Rep�blica M�nica Nicida, uma dela��o n�o pode ser medida s� pelos total de inqu�ritos arquivados ou de den�ncias dos investigados. "Um dos objetivos principais de um acordo de colabora��o � revelar a estrutura, a hierarquia da organiza��o criminosa a fim de desmontar sua estrutura. E nisso a confiss�o simples � diferente da dela��o", disse a procuradora, que esteve a frente do processo de consolida��o das normas do Minist�rio P�blico Federal para os acordos de leni�ncia e de dela��o premiada - ela se aposentou h� ano.
Monica disse que � necess�rio verificar quantos dos arquivamentos aconteceram porque os crimes delatados eram antigos ou porque o tempo passado desde o delito tornou mais dif�cil obter provas que confirmassem as alega��es dos colaboradores. Segundo ela, mesmo arquivado um caso pode ser importante para fundamentar pedidos de coopera��o internacional e de recupera��o de ativos desviados. As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.S
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