
Ao arquivar o pedido apresentado por partidos de oposi��o ao governo para apreender o celular do presidente Jair Bolsonaro, o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), n�o deixou passar em branco a 'resist�ncia presidencial' em cumprir eventual ordem judicial adversa.
No �ltimo dia 22, Bolsonaro disse que, mesmo que houvesse uma decis�o neste sentido, n�o entregaria o aparelho. "No meu entender, com todo o respeito ao Supremo Tribunal Federal, nem deveria ter encaminhado ao Procurador-Geral da Rep�blica. T� na cara que eu jamais entregaria meu celular. A troco de qu�? Algu�m est� achando que eu sou um rato para entregar um telefone meu numa circunst�ncia como essa?", afirmou em entrevista � R�dio Jovem Pan.
Na decis�o desta ter�a, 2, o decano decidiu em favor de Bolsonaro, mas fez quest�o de observar que o desrespeito a decis�es judiciais 'por ato de puro arb�trio' � ilegal e, no caso do presidente, configuraria crime de responsabilidade. A tipifica��o � pr�-requisito para a abertura de um processo de impeachment.
O decano destacou que cabem aos magistrados os deveres de 'repelir condutas governamentais abusivas', 'neutralizar qualquer ensaio de opress�o estatal' e 'impedir a captura do Estado e de suas institui��es por agentes que desconhecem o significado da supremacia da Constitui��o'.
Em diferentes trechos do parecer, a postura de Bolsonaro foi classificada pelo ministro mais longevo do STF como um 'ato de insubordina��o' e 'gesto de frontal transgress�o � autoridade da pr�pria Constitui��o da Rep�blica'.
Diante da crescente de ataques dirigidos por apoiadores bolsonaristas e integrantes do pr�prio governo ao STF, Celso de Mello saiu em defesa da Corte e relembrou outros epis�dios de conflito entre os Poderes em raz�o de descumprimentos de decis�es judiciais pelos ocupantes da cadeira presidencial.
Apesar da similaridade, na vis�o do ministro, os momentos hist�ricos mencionados por ele na decis�o guardam entre si mais de um s�culo de dist�ncia. Os presidentes Floriano Peixoto, em setembro de 1894, e Hermes da Fonseca, em 1911, foram os �ltimos a se insubordinarem contra decis�es do Supremo Tribunal Federal.
"Tal rememora��o se faz necess�ria para que jamais se repitam comportamentos inconstitucionais de anteriores Presidentes da Rep�blica, que ousaram descumprir decis�es emanadas desta Corte Suprema", observou o ministro.
"A Constitui��o certamente n�o � perfeita. Ela pr�pria o confessa ao admitir a reforma. Quanto a ela, discordar, sim. Divergir, sim. Descumprir, jamais. Afront�-la, nunca. Traidor da Constitui��o � traidor da P�tria. Conhecemos o caminho maldito. Rasgar a Constitui��o, trancar as portas do Parlamento, garrotear a liberdade, mandar os patriotas para a cadeia, o ex�lio e o cemit�rio"
Trecho do discurso do deputado Ulysses Guimar�es, ent�o presidente do Congresso no encerramento da Assembleia Constituinte, em outubro de 1988
Para o decano, na democracia 'n�o h� espa�o para o volunt�rio e arbitr�rio desrespeito ao cumprimento das decis�es judiciais, pois a recusa de aceitar o comando emergente dos atos sentenciais, sem justa raz�o, fere o pr�prio n�cleo conformador e legitimador da separa��o de poderes, que traduz postulado essencial inerente � organiza��o do Estado no plano de nosso sistema constitucional'.
Parafraseando o ex-deputado federal, Ulysses Guimar�es (MDB), morto em 1992, Celso de Mello incluiu na decis�o um trecho do discurso do ent�o presidente do Congresso no encerramento da Assembleia Constituinte, em outubro de 1988:
"A Constitui��o certamente n�o � perfeita. Ela pr�pria o confessa ao admitir a reforma. Quanto a ela, discordar, sim. Divergir, sim. Descumprir, jamais. Afront�-la, nunca. Traidor da Constitui��o � traidor da P�tria. Conhecemos o caminho maldito. Rasgar a Constitui��o, trancar as portas do Parlamento, garrotear a liberdade, mandar os patriotas para a cadeia, o ex�lio e o cemit�rio".
O pedido
Os partidos PDT, PSB e PV haviam solicitado ao Supremo a apreens�o dos celulares do presidente e do seu filho, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), para que provas fossem colhidas no �mbito das investiga��es sobre interfer�ncia pol�tica do presidente na Pol�cia Federal. Os requerimentos foram encaminhados pelo ministro Celso de Mello para an�lise do procurador-geral da Rep�blica, Augusto Aras, que se manifestou contra o pedido.
O mero encaminhamento � PGR inflamou a milit�ncia bolsonarista e levou o ministro do Gabinete de Seguran�a Institucional (GSI), Augusto Heleno, a divulgar nota classificando como 'inconceb�vel' a requisi��o. Heleno afirmou ainda que, caso fosse aceita, a medida poderia ter 'consequ�ncias imprevis�veispara a estabilidade nacional'.