CPI: Bolsonaro pede para que filho de Renan Calheiros seja investigado
Presidente afirmou que houve desvio de recursos em Alagoas, governada por Renan Filho. Calheiros disse que Bolsonaro 'gasta tempo enquanto brasileiros morrem'
Estado de Minas
06/05/2021 21:00 - Atualizado em 06/05/2021 21:26
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O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse, em sua live semanal nesta quinta-feira (06/05), para que o filho do senador Renan Calheiros (MDB-AL), o governador de Alagoas, Renan Filho (MDB), seja investigado na CPI da COVID, da qual Calheiros é relator.
Bolsonaro afirmou que houve desvio de recursos no estado chefiado por Filho.
Sem citar o nome de Renan Calheiros, Bolsonaro disse que suas frases “não matam ninguém” e que o que tira vidas é “desvio de recurso público, que seu estado desviou”, se referindo à Alagoas. O presidente também pediu que Renan Filho fosse investigado pela CPI.
“Sabe o que eu diria para o senador? Prezado senador, frase não mata ninguém. O que mata é desvio de recurso público, que seu estado desviou. Vamos investigar seu filho que a gente resolve o problema. Desvio mata. Frase não mata”, afirmou Bolsonaro.
A resposta de Renan Calheiros veio durante a parte final da sessão da CPI desta quinta-feira, que ouviu o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga. Calheiros disse que o que mata pessoas é a inércia do Brasil na tomada de atitudes. O senador também afirmou que Bolsonaro “gasta tempo enquanto brasileiros morrem”.
“Com todo respeito ao presidente, o que mata é a pandemia, pela inércia que eu torço que não seja dele (Bolsonaro). Não queremos fulanizar isso. Com relação ao estado de Alagoas, que ele não gaste seu tempo ociosamente como tem gasto seu tempo enquanto os brasileiros estão morrendo. Aqui nesta CPI, se houver necessidade, todos serão investigados, sem exceção”, disse Renan.
Acusação de parcialidade
Após a fala de Renan Calheiros, o senador Eduardo Girão (Podemos-CE) acusou o relator da CPI de agir com parcialidade. Girão disse que Calheiros teve um tratamento “cordial” com o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, ouvido na terça-feira (4/5), e que foi “afrontoso” com o também ex-ministro Nelson Teich e com o atual, Marcelo Queiroga, que falaram ontem e hoje.
O que é uma CPI?
As comissões parlamentares de inquérito (CPIs) são instrumentos usados por integrantes do Poder Legislativo (vereadores, deputados estaduais, deputados federais e senadores) para investigar fato determinado de grande relevância ligado à vida econômica, social ou legal do país, de um estado ou de um município. Embora tenham poderes de Justiça e uma série de prerrogativas, comitês do tipo não podem estabelecer condenações a pessoas.
Para ser instalado no Senado Federal, uma CPI precisa do aval de, ao menos, 27 senadores; um terço dos 81 parlamentares. Na Câmara dos Deputados, também é preciso aval de ao menos uma terceira parte dos componentes (171 deputados).
Há a possibilidade de criar comissões parlamentares mistas de inquérito (CPMIs), compostas por senadores e deputados. Nesses casos, é preciso obter assinaturas de um terço dos integrantes das duas casas legislativas que compõem o Congresso Nacional.
Após a coleta de assinaturas, o pedido de CPI é apresentado ao presidente da respectiva casa Legislativa. O grupo é oficialmente criado após a leitura em sessão plenária do requerimento que justifica a abertura de inquérito. Os integrantes da comissão são definidos levando em consideração a proporcionalidade partidária — as legendas ou blocos parlamentares com mais representantes arrebatam mais assentos. As lideranças de cada agremiação são responsáveis por indicar os componentes.
Na primeira reunião do colegiado, os componentes elegem presidente e vice. Cabe ao presidente a tarefa de escolher o relator da CPI. O ocupante do posto é responsável por conduzir as investigações e apresentar o cronograma de trabalho. Ele precisa escrever o relatório final do inquérito, contendo as conclusões obtidas ao longo dos trabalhos.
Em determinados casos, o texto pode ter recomendações para evitar que as ilicitudes apuradas não voltem a ocorrer, como projetos de lei. O documento deve ser encaminhado a órgãos como o Ministério Público e a Advocacia-Geral da União (AGE), na esfera federal.
Conforme as investigações avançam, o relator começa a aprimorar a linha de investigação a ser seguida. No Congresso, sub-relatores podem ser designados para agilizar o processo.
As CPIs precisam terminar em prazo pré-fixado, embora possam ser prorrogadas por mais um período, se houver aval de parte dos parlamentares
O que a CPI pode fazer?
chamar testemunhas para oitivas, com o compromisso de dizer a verdade
convocar suspeitos para prestar depoimentos (há direito ao silêncio)
executar prisões em caso de flagrante
solicitar documentos e informações a órgãos ligados à administração pública
convocar autoridades, como ministros de Estado — ou secretários, no caso de CPIs estaduais — para depor
ir a qualquer ponto do país — ou do estado, no caso de CPIs criadas por assembleias legislativas — para audiências e diligências
quebrar sigilos fiscais, bancários e de dados se houver fundamentação
solicitar a colaboração de servidores de outros poderes
elaborar relatório final contendo conclusões obtidas pela investigação e recomendações para evitar novas ocorrências como a apurada
pedir buscas e apreensões (exceto a domicílios)
solicitar o indiciamento de envolvidos nos casos apurados
O que a CPI não pode fazer?
Embora tenham poderes de Justiça, as CPIs não podem:
julgar ou punir investigados
autorizar grampos telefônicos
solicitar prisões preventivas ou outras medidas cautelares
declarar a indisponibilidade de bens
autorizar buscas e apreensões em domicílios
impedir que advogados de depoentes compareçam às oitivas e acessem
documentos relativos à CPI
determinar a apreensão de passaportes
A história das CPIs no Brasil
A primeira Constituição Federal a prever a possibilidade de CPI foi editada em 1934, mas dava tal prerrogativa apenas à Câmara dos Deputados. Treze anos depois, o Senado também passou a poder instaurar investigações. Em 1967, as CPMIs passaram a ser previstas.
Segundo a Câmara dos Deputados, a primeira CPI instalada pelo Legislativo federal brasileiro começou a funcionar em 1935, para investigar as condições de vida dos trabalhadores do campo e das cidades. No Senado, comitê similar foi criado em 1952, quando a preocupação era a situação da indústria de comércio e cimento.
As CPIs ganharam estofo e passaram a ser recorrentes a partir de 1988, quando nova Constituição foi redigida. O texto máximo da nação passou a atribuir poderes de Justiça a grupos investigativos formados por parlamentares.
CPIs famosas no Brasil
1975: CPI do Mobral (Senado) - investigar a atuação do sistema de alfabetização adotado pelo governo militar
1992: CPMI do Esquema PC Farias - culminou no impeachment de Fernando Collor
1993: CPI dos Anões do Orçamento (Câmara) - apurou desvios do Orçamento da União
2000: CPIs do Futebol - (Senado e Câmara, separadamente) - relações entre CBF, clubes e patrocinadores
2001: CPI do Preço do Leite (Assembleia de MG e outros Legislativos estaduais, separadamente) - apurar os valores cobrados pelo produto e as diretrizes para a formulação dos valores
2005: CPMI dos Correios - investigar denúncias de corrupção na empresa estatal
2005: CPMI do Mensalão - apurar possíveis vantagens recebidas por parlamentares para votar a favor de projetos do governo
2006: CPI dos Bingos (Câmara) - apurar o uso de casas de jogo do bicho para crimes como lavagem de dinheiro
2006: CPI dos Sanguessugas (Câmara) - apurou possível desvio de verbas destinadas à Saúde
2015: CPI da Petrobras (Senado) - apurar possível corrupção na estatal de petróleo
2015: Nova CPI do Futebol (Senado) - Investigar a CBF e o comitê organizador da Copa do Mundo de 2014
2019: CPMI das Fake News - disseminação de notícias falsas na disputa eleitoral de 2018
2019: CPI de Brumadinho (Assembleia de MG) - apurar as responsabilidades pelo rompimento da barragem do Córrego do Feijão
“O senhor fazer colocação, como o senhor tem feito desde a primeira sessão com o Mandetta, que o senhor teve um tratamento extremamente cordial. Parecia um jogo de perguntas e respostas que já sabiam. Ontem, o Teich, e agora, o Queiroga, foi uma afronta que eu me sinto constrangido como senador. A sua parcialidade o Brasil todo está vendo”, disparou Girão.
Calheiros respondeu, novamente, que torce para que Bolsonaro não seja culpado pela inércia do Brasil no combate à pandemia.