
A proposta de emenda constitucional (PEC) do voto impresso dever� ser votada pelo plen�rio da C�mara dos Deputados na ter�a-feira (10/8), no mesmo dia em que um desfile militar sem precedentes ocorreu em Bras�lia.
A expectativa � que o presidente da C�mara, Arthur Lira (PP-AL), paute a mat�ria mesmo ap�s ela ter sido derrotada em uma comiss�o especial, como ele j� havia prometido fazer.
Foi em parte um afago de Lira a Jair Bolsonaro (sem partido) — os dois s�o aliados, e a proposta do voto impresso � uma pauta especialmente cara ao presidente da Rep�blica — e em parte tamb�m um c�lculo pol�tico do presidente da C�mara.
No entanto, a PEC enfrenta a oposi��o da maioria dos partidos e, por isso, a expectativa � que seja rejeitada mais uma vez.
Caso se confirme, esse resultado pode por um lado evidenciar ainda mais a fragilidade pol�tica do governo federal, segundo cientistas pol�ticos ouvidos pela BBC News Brasil.
Um eventual rev�s evidenciaria os limites da alian�a que Bolsonaro vem costurando com o Centr�o, bloco informal de partidos que garante sua sustenta��o pol�tica e do qual Lira e o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PI-PP), s�o dois expoentes.
Mas, ao mesmo tempo, o saldo pode ser positivo para o presidente junto � sua base, porque o veto do Congresso ao voto impresso poderia ser usado por ele para refor�ar seu discurso de que ele est� sendo perseguido e impedido de promover as mudan�as que prometeu.
Bolsonaro quer mudar vota��o, mas n�o tem apoio no Congresso
Bolsonaro vem lan�ando d�vidas sobre a lisura da vota��o eletr�nica, sem apresentar provas de que elei��es passadas tenham sido fraudadas.
Na verdade, como mostrou a BBC News Brasil, an�lises matem�ticas da vota��o em 2014 afastam a hip�tese de que tenha ocorrido uma suposta manipula��o, como alega o presidente.
Bolsonaro tem usado esse argumento para fazer campanha pelo voto impresso, alegando que um comprovante em papel permitiria que o resultado fosse auditado.
Mas o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) j� se manifestou mais de uma vez contra esse discurso, afirmando que uma s�rie de procedimentos e verifica��es garantem a seguran�a e revis�o do pleito.
Alguns analistas indicam que Bolsonaro tem feito essa campanha como uma forma de preparar o terreno para contestar a elei��o caso seja derrotado, como fez o ex-presidente americano Donald Trump.
Mas a proposta de mudan�a na vota��o n�o tem encontrado apoio no Congresso. Presidentes de 11 partidos (PP, DEM, PL, Republicanos, Solidariedade, PSL, Cidadania, MDB, PSD, PSDB e Avante) assinaram uma nota conjunta contra a mudan�a. Legendas de esquerda, como PT, PSB e PSOL, tamb�m s�o contr�rias.
Um levantamento feito pelo jornal O Globo apontou que 15 dos 24 partidos com representantes na C�mara hoje s�o contra a PEC. Eles somam 330 deputados. S�o necess�rios ao menos 308 votos dos 513 deputados para aprovar uma proposta que altere a Constitui��o.

A PEC j� foi rejeitada em uma comiss�o especial criada para analisar o tema. Por 23 votos a favor e 11 contra, ela foi rejeitada na quinta-feira passada (5/8).
O presidente da C�mara fugiu � regra — em casos assim, as propostas normalmente n�o v�o ao plen�rio — e usou sua prerrogativa de levar o tema para ser apreciado por todos os deputados.
No entanto, a PEC enfrenta resist�ncias, porque os pr�prios deputados foram eleitos com base nesse mesmo sistema. Questionar o voto eletr�nico abre um precedente perigoso, diz a cientista pol�tica Lara Mesquita, da Funda��o Get�lio Vargas (FGV).
"Os l�deres partid�rios t�m mais compromisso com a democracia do que o presidente e n�o querem gerar caos ou uma desconfian�a na democracia. Quem garante que depois n�o vai ser questionada a legitimidade do pr�prio Congresso?", diz Mesquita, que � pesquisadora do Centro de Estudos em Pol�tica e Economia do Setor P�blico (Cepesp).
Apesar disso, Mesquita ressalta que, embora a perspectiva seja ruim para a PEC, � preciso esperar para ver qual texto ser� apresentado no plen�rio, porque pode ser apresentada uma nova proposta.
"Se eles mudarem a previs�o da apura��o manual dos votos, que foi um ponto muito pol�mico, e a ideia de implementar isso j� em 2022, pode reduzir a resist�ncia", diz Mesquita.
Presidente e aliados esperam derrota
O cientista pol�tico Geraldo Tadeu Monteiro, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), avalia que a iniciativa de Lira, um dos l�deres do Centr�o, de levar a proposta ao plen�rio mesmo sem a garantia do apoio necess�rio � parte de um c�lculo pol�tico do deputado.
Desta forma, Lira demonstra solidariedade ao presidente, dando uma segunda oportunidade � PEC. "E, se ela for derrotada, ele n�o sai como vil�o e compartilha com todo o Congresso esse �nus, sem sofrer sozinho a carga vinda dos bolsonaristas", diz Monteiro.
O cientista pol�tico Rafael Cortez, da consultoria Tend�ncias, avalia que esse movimento tem ainda outro prop�sito. Isso abriria um caminho para dar uma "vit�ria simb�lica" ao presidente com a negocia��o de alguma mudan�a no processo eleitoral que n�o seja o voto impresso, como ampliar o n�mero de urnas que ser�o vistoriadas, por exemplo.
Ao mesmo tempo, seria uma tentativa de evitar uma escalada ainda maior na tens�o na rela��o do Planalto com os outros poderes.
"Mas acreditar nisso me parece ing�nuo se olhamos o hist�rico do presidente, que n�o opera bem quando h� uma acionamento do sistema de freios e contrapesos e fica inseguro quando percebe que tem menos poder do que gostaria", diz Cortez.

O pr�prio presidente da C�mara disse em entrevista � r�dio CBN que as chances de aprova��o s�o pequenas e afirmou Bolsonaro respeitar� o resultado da vota��o no plen�rio.
"Eu falei com todos os chefes de poderes, com Bolsonaro. Eu relatei que, embora n�o usual, para ter um ponto final, traria a PEC para o plen�rio. Depois de ouvir algumas pessoas e refletir sobre o assunto, eu me convenci de que era a decis�o mais acertada", afirmou Lira.
"O presidente Bolsonaro, numa liga��o telef�nica, me garantiu que respeitaria o resultado. Eu confio na palavra do presidente da Rep�blica ao presidente da C�mara."
Mesmo Bolsonaro j� admitiu que a proposta deve ser derrotada e apontou o dedo para Lu�s Roberto Barroso, ministro do Supremo Tribunal Federal e presidente do TSE.
"Se n�o tiver uma negocia��o antes, um acordo, vai ser derrotada a proposta, porque o ministro Barroso apavorou alguns parlamentares. E tem parlamentar que deve alguma coisa na Justi�a, deve no Supremo, n�. Ent�o, o Barroso apavorou", disse o presidente em entrevista � Brado R�dio, de Salvador.
"Ele foi para dentro do Parlamento fazer reuni�es com lideran�as e praticamente exigindo que o Congresso n�o aprovasse o voto impresso."
Para ser aprovada, a PEC teria que passar por duas vota��es na C�mara e duas no Senado, sem altera��es no texto.
A cientista pol�tica Camila Rocha, pesquisadora do Centro Brasileiro de An�lise e Planejamento (Cebrap), avalia que, embora a tend�ncia seja a rejei��o da proposta, n�o d� para cravar isso antes da hora.
"N�o colocaria minha m�o no fogo pelos posicionamentos que v�m sendo anunciados publicamente, porque isso muda muito r�pido a depender das circunst�ncias do jogo pol�tico", afirma Rocha.
"Mas a avalia��o geral � que o voto impresso representa um retrocesso grande. � uma proposta que est� fora dos marcos que v�m balizando a elei��o desde 1996 e fortalecendo a confian�a no processo eleitoral, ent�o, � algo muito delicado e que enfraquece a democracia."
O que esperar?

Uma derrota da PEC, caso se confirme, deixaria evidente os limites da recente aproxima��o do governo com o Legislativo, por meio da alian�a com o Centr�o, na avalia��o de Rafael Cortez.
"Confirma que, nessa barganha entre os poderes, o lado mais fraco � o governo e que a base de sustenta��o que se tenta construir � mais negativa, para evitar o impeachment, do que positiva, para a aprova��o de propostas", diz o cientista pol�tico.
Um rev�s nesta vota��o deixa claro que o Centr�o n�o est� aderindo ao bolsonarismo, diz Geraldo Tadeu Monteiro, da Uerj: "S�o governistas a depender da pauta. N�o v�o aderir se n�o tiver conex�o com seus interesses".
Camila Rocha aponta que uma eventual derrota do voto impresso no Congresso seria um desgaste principalmente para o presidente. Isso porque foi uma pauta encampada com tanta for�a por ele e em torno da qual ele fez forte campanha, tentando mobilizar seus apoiadores.
"Mas n�o diria que � um teste para o governo, porque o governo tem outras quest�es mais importantes, e essa � facilmente super�vel como foi a queda do [Sergio] Moro e dos ministros, a tend�ncia � que o foco migre para outras pautas", diz Rocha.
Geraldo Tadeu Monteiro diz ser dif�cil dissociar os dois e que uma derrota de Bolsonaro n�o deixa de ser uma derrota do governo. No entanto, ele afirma que mesmo uma rejei��o da PEC poderia ser usada por Bolsonaro a seu favor.
Isso porque o presidente teria um novo argumentos par continuar mobilizando seus apoiadores, ao afirmar que est� sendo impedido de promover as mudan�as que disse que faria durante a campanha.
"Ele vai dizer que fez sua parte e que n�o conseguiu por causa das elites e seus interesses. Bolsonaro pode ter um ganho pol�tico com sua milit�ncia", diz Tadeu.
Lara Mesquita concorda, mas ressalta que a derrota da PEC n�o sinalizaria uma fragilidade do governo. Ela argumenta que h� v�rios outros projetos de lei e medidas provis�rias de autoria do Planalto que est�o engavetados no Congresso.
A dificuldade enfrentada pela proposta do voto apenas � mais uma evid�ncia de um governo fragilizado e que o rumo do voto impresso n�o alteraria a balan�a a favor ou contra outras propostas do Planalto em discuss�o hoje.
Mesquita acredita ainda que uma eventual rejei��o da PEC n�o teria um grande significado para Bolsonaro, porque o presidente n�o estaria, na sua opini�o, realmente interessado na aprova��o da mudan�a, mas em semear a desconfian�a sobre o processo eleitoral.
Estrat�gia que vem surtindo efeito, de acordo com as pesquisas que apontam que os receios em rela��o � urna eletr�nica crescem nos eleitores conforme o presidente trata disso em p�blico.
"Perdendo ou ganhando nessa vota��o, o jogo dele n�o vai mudar. Ele vai continuar a mobilizar uma parcela da popula��o para gerar um caos suficiente e, para isso, ele n�o precisa ter o apoio de muita gente, como mostrou a invas�o do Capit�lio nos Estados Unidos."
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