
Ap�s os atos pela derrubada do presidente Jair Bolsonaro liderados por grupos de direita em 12 de setembro, partidos e movimentos predominantemente de esquerda convocaram novos protestos pelo impeachment neste s�bado (02/10) em dezenas de cidades do pa�s.
Desconfian�as de ambos os lados t�m dificultado unificar as mobiliza��es em uma frente ampla contra o presidente, o que, na leitura de alguns analistas pol�ticos, acaba reduzindo a capacidade desses atos de pressionar o Congresso Nacional — a decis�o de iniciar um processo depende do presidente da C�mara, Arthur Lira (PP-AL), que hoje lidera uma ampla base de deputados da centro-direita avessa ao impeachment de Bolsonaro, j� que tem sido beneficiada por cargos e verbas federais para seus redutos eleitorais.
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Rejei��o a Bolsonaro chega a 44,8% e a de Lula fica em 28,8%
Assim como o PT e movimentos historicamente ligados ao partido, a exemplo da Central �nica de Trabalhadores (CUT), n�o aderiram aos atos de setembro, os grupos de direita que lideraram aquela mobiliza��o, como Movimento Brasil Livre (MBL) e Livres, decidiram n�o ir �s ruas nesse s�bado.
Um dos motivos � a desconfian�a de parte destes grupos sobre o real compromisso do PT com a luta pelo impeachment. Como as pesquisas de inten��o de voto indicam hoje Lula como favorito para vencer a elei��o de 2022 em uma disputa direta contra Bolsonaro, cr�ticos do partido dizem de que a prefer�ncia dos petistas pode ser por manter o presidente na corrida eleitoral para evitar que outro candidato potencialmente mais agregador se cacife para chegar ao segundo turno contra Lula. Petistas refutam essas acusa��es.58714218
Outra justificativa dos grupos de direita para n�o participar dos protestos � um suposto risco de agress�o a seus apoiadores por parte de manifestantes da esquerda — a mesma preocupa��o foi levantada pela esquerda em rela��o aos grupos de direita nos atos de setembro.
"Eu n�o coloco o impeachment � frente da seguran�a de quem nos segue. E tb n�o acho que atos orquestrados pelo PT sejam favor�veis ao impeachment", escreveu no Twitter o l�der do MBL Renan dos Santos, ao justificar a aus�ncia do grupo nos atos desse s�bado.
Pesquisa Ipespe divulgada na quinta-feira (30/09) indica que, se a elei��o fosse hoje, Lula e Bolsonaro disputariam o segundo turno, sendo que o petista venceria com 50% dos votos contra 31% do atual presidente . A pesquisa ouviu mil pessoas por telefone e tem margem de erro de 3,2 pontos percentuais.
O resultado vai na mesma linha da �ltima pesquisa do Instituto Datafolha, divulgada duas semanas antes, que entrevistou 3.667 presencialmente e tem margem de erro de 2 pontos percentuais. Esse levantamento indica que, mantidas as condi��es atuais, o petista derrotaria Bolsonaro no segundo turno com 56% contra 31% dos votos.
Por outro lado, essas pesquisas tamb�m indicam que Lula venceria com larga vantagem outros poss�veis candidatos, como Jo�o D�ria (PSDB) e Ciro Gomes (PDT).
Lideran�as do PT ouvidas pela BBC News Brasil refutam as acusa��es de que o partido n�o esteja empenhado pelo impeachment, embora nos bastidores h� quem reconhe�a que a disputa contra Bolsonaro seria hoje o cen�rio mais confort�vel para Lula voltar ao Pal�cio do Planalto.
Parlamentares ou lideran�as petistas j� assinaram ao menos dez pedidos de impeachment ou aditamentos (acr�scimos a pedidos anteriores), o primeiro deles apresentado em maio de 2020 pelo ex-prefeito de S�o Paulo e candidato presidencial derrotado em 2018 Fernando Haddad.
Ao lado do deputado Rui Falc�o (PT-SP), Haddad tamb�m apresentou um mandado de seguran�a em julho deste ano ao Supremo Tribunal Federal (STF) solicitando que a Corte obrigue Arthur Lira a apreciar os mais de cem pedidos de impeachment que aguardam sua an�lise. A a��o ainda ser� julgada.
"O PT nunca tergiversou com esse assunto. N�s sempre achamos que para o Brasil � melhor o Bolsonaro sair. E n�s n�o escolhemos advers�rio (para a elei��o presidencial de 2022), n�o nos preocupamos com isso. Nosso foco � com o programa e o projeto de pa�s que n�s temos a oferecer para o Brasil", disse a presidente do partido, deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), em maio de 2020.

Ela ressalta que o PT, ao lado de PCdoB e PSOL, j� participou da convoca��o de outros quatro atos pelo impeachment, desde mar�o. Esses protestos t�m sido liderados pela Frente Povo Sem Medo, a Frente Brasil Popular e a Coaliz�o Negra por Direitos — as tr�s re�nem centenas de sindicatos, movimentos sociais e coletivos negros e de periferia, como Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, Central �nica dos Trabalhadores (CUT) e a UNEAfro.
Gradualmente, outros partidos aderiram, como PDT, PSB, Rede e Cidadania. Todos eles est�o apoiando os protestos deste s�bado tamb�m, assim como Solidariedade e PV. S�o aguardadas ainda lideran�as de PSL, MDB, PSDB, DEM e Novo, embora essas siglas n�o estejam institucionalmente convocando para a mobiliza��o.
Considerando os pr�-candidatos presidenciais, Ciro Gomes (PDT) confirmou que participar� das manifesta��es no Rio de Janeiro, pela manh�, e em S�o Paulo, na parte da tarde.
J� Lula n�o deve comparecer para evitar dar uma conota��o eleitoral aos atos, disse Hoffmann. Segundo ela, h� tamb�m preocupa��o com a sa�de do ex-presidente e dos manifestantes devido � pandemia de covid-19, j� que sua presen�a poderia causar focos aglomera��es.
'Bolsonaro combalido at� a elei��o'
Apesar da movimenta��o do PT pelo impeachment, dentro do partido existe uma leitura de que enfrentar Bolsonaro nas urnas tende a ser o cen�rio mais confort�vel para Lula, contou � BBC News Brasil o assessor parlamentar de um senador petista.
A compreens�o interna, diz, � que o presidente ter� dificuldades de se recuperar at� a elei��o porque as perspectivas para a economia t�m piorado muito.
"Com a atual pol�tica econ�mica, os pre�os dos combust�veis n�o v�o parar de subir, os empregos n�o v�o voltar. A ideia � que ele chegue combalido na elei��o", afirma.
Segundo esse assessor parlamentar, o partido reconhece que Bolsonaro segue tendo uma base fiel relevante, capaz de coloc�-lo no segundo turno, mas "n�o tem apoio suficiente para vencer". Ele ressalta ainda que ningu�m no PT espera que seja uma elei��o f�cil.
"Todo mundo sabe que Lula vai ser confrontado com muita coisa de corrup��o, de cadeia (per�odo em que ficou preso condenado em processos da Lava Jato posteriormente anulados), de governo Dilma, v�o dizer que ela destruiu o Brasil. Aquele velho discurso do antipetismo vai voltar forte", afirma.
"Mas projetam que um cen�rio de Bolsonaro acabado, e sem se viabilizar uma terceira via, seja menos dif�cil para Lula articular uma grande alian�a e chegar l�", acrescenta.
Por outro lado, parlamentares petistas ouvidos pela BBC News Brasil acreditam que a campanha pelo impeachment n�o � contradit�ria com os interesses eleitorais.
"Vamos admitir que se consiga fazer o impeachment do Bolsonaro. Voc� acha que o PT entraria mais fraco ou mais forte o ano que vem? A lideran�a que mais mobiliza gente nesse pa�s � o Lula. Ent�o, amanh�, acontecendo o impeachment, � o Ciro que vai ser o porta voz do impeachment? Claro que n�o", argumenta o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP).
"Ent�o, mesmo para quem tem o racioc�nio pequeno da conveni�ncia (eleitoral), se a gente derruba o Bolsonaro, a oposi��o entra muito mais forte ano que vem", disse ainda.
A deputada Maria do Ros�rio (PT-RS) tem vis�o semelhante: "� uma avalia��o equivocada e simpl�ria (dizer que o PT n�o quer o impeachment). O PT sabe que quanto mais for�a existir na luta pelo impeachment, mais claro vai estar para a popula��o que Bolsonaro n�o pode continuar", afirma.
Para ela, Bolsonaro continua sendo um advers�rio perigoso em 2022 e deve ser derrubado antes porque representa "uma amea�a � democracia".
"O PT n�o vai para a elei��o achando que j� ganhou de ningu�m. Vamos ter que trabalhar muito, mesmo o Lula nesse momento sendo o favorito. N�o avaliamos que Bolsonaro � o candidato mais fraco, nem que � invenc�vel. � um candidato que, se n�o for totalmente desmascarado at� a elei��o, continua sendo o candidato mais perigoso, porque mobiliza uma turba de fan�ticos, porque a direita internacional estar� mobilizada pelo Brasil, porque o fascismo tem m�todos que podem sempre atacar um processo democr�tico", disse ainda.

Cr�ticos de Bolsonaro consideram que ele seria uma amea�a para a democracia devido a suas declara��es contestando a legitimidade das elei��es de 2022 sem ado��o de um registro f�sico do voto. O presidente alega que sem esse mecanismo as elei��es podem ser fraudadas, o que � contestado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Na vis�o de advers�rios de Bolsonaro, o presidente pretende usar essa argumenta��o para n�o aceitar o resultado das urnas em 2022, caso n�o consiga se reeleger.
No feriado de 7 de setembro, ele mobilizou dezenas de minhas de apoiadores em Bras�lia e S�o Paulo para pressionar o Poder Judici�rio, no que foi visto como um escalada autorit�ria por parte do presidente. Depois, por�m, Bolsonaro divulgou uma carta recuando de seus ataques e amea�as ao STF.
Em entrevista recente � revista Veja, ele disse que n�o vai "melar" as elei��es e elogiou o convite do TSE para que as For�as Armadas participem da uma comiss�o externa para fiscalizar o processo eleitoral. Bolsonaro afirmou ainda que "a chance de um golpe (de sua parte) � zero". Para ele, a oposi��o que quer lhe dar um golpe com o processo de impeachment. Seu argumento � que n�o h� den�ncias de corrup��o que permitam cass�-lo.
Nos mais de cem pedidos de impeachment j� apresentados, os denunciantes acusam o presidente de cometer crimes de responsabilidade na condu��o da pandemia de coronav�rus (ao promover aglomera��es e demorar a comprar vacinas, por exemplo), assim como por ter participado em 2020 de atos que pediam o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF), ou ao supostamente interferir em institui��es de investiga��o, como a Pol�cia Federal (PF).
Pedidos recentes tamb�m defendem a cassa��o do presidente devido � den�ncias de poss�vel superfaturamento e corrup��o envolvendo compra de vacinas no Minist�rio da Sa�de.
Muito perto de 2022
Para o cientista pol�tico S�rgio Pra�a, professor da Escola de Ci�ncias Sociais da Funda��o Get�lio Vargas, n�o � uma boa estrat�gia pol�tica para o PT apostar em um impeachment que "j� � uma possibilidade tirada da mesa" por estarmos muito pr�ximos das elei��es de 2022".
"O impeachment n�o vai acontecer independentemente do que o PT fa�a. � um processo que demora, n�o faz sentido articular por isso hoje. Teria feito sentido antes, mas n�o aconteceu e agora ningu�m vai lutar s�rio por isso. A campanha presidencial j� come�ou", afirma Pra�a.
Segundo ele, os protestos contra Bolsonaro devem ir perdendo for�a pelo mesmo motivo.
"Na medida em que as elei��es se aproximam, eles t�m total irrelev�ncia. Para que eu vou sair pra rua se daqui a pouco eu j� vou votar?", afirma.
Sem frente ampla
Se esfor�ar por um impeachment n�o � a �nica ideia que vai ficando para tr�s conforme as elei��es se aproximam, segundo analistas pol�ticos.

A ideia, levantada por parte da oposi��o, de que seria necess�rio esquerda e direita se unirem em uma frente ampla contra Bolsonaro tamb�m � algo "que n�o tem a menor chance de acontecer", diz Pra�a.
Pra�a diz que as amea�as de Bolsonaro contra a democracia n�o se concretizaram at� agora de forma a fazer a esquerda e direita acreditarem que h� necessidade de se unir.
"A �nica chance de haver essa uni�o � se o presidente tentar dar um golpe de fato, caso perca a elei��o. Porque ningu�m quer uma ditadura de Bolsonaro. Mas no momento est� claro que ele n�o tem apoio estrat�gico para isso", afirma o professor da FGV.
Para o cientista pol�tico Claudio Couto, a vantagem de Lula nas pesquisas faz com que n�o fa�a sentido para o PT tentar uma chapa �nica de oposi��o com a direita, que tamb�m n�o tem interesse nisso.
"Nunca acreditei em uma frente ampla no sentido de uma chapa �nica com objetivo de derrubar Bolsonaro nas elei��es. Para o Lula n�o tem sentido, estando na frente, abrir m�o da sua candidatura ou do seu programa. E para os outros partidos, mesmo que uma chamada "terceira via" n�o se viabilize, vale mais a pena lan�ar sua pr�pria candidatura do que se unir ao Lula", diz Couto.
A exce��o, diz ele, s�o os partidos como o MBD e os partidos do centr�o que n�o costumam mesmo ter candidatura pr�pria para a presid�ncia e acabam se alinhando ao governo do momento.
Couto tamb�m diz que o fato de que uma chapa �nica n�o deva acontecer n�o impede que nomes como Lula, Eduardo Leite ou Jo�o D�ria fa�am uma alian�a em prol da democracia caso haja um movimento de natureza autorit�ria, mesma hip�tese apontada por Pra�a.
Isso seria poss�vel, segundo ele, porque at� o momento os candidatos de oposi��o t�m jogado limpo j� pr�-campanha, apesar das cr�ticas eventuais que fazem uns aos outros.
"As cr�ticas dentro da l�gica da competi��o democr�tica. Tem havido um fair play entre esses v�rios candidatos. Quem est� com atitude muito agressiva ao PT � o Ciro Gomes, mas isso � particular dele, que tenta pegar um p�blico de direita ao ver que perdeu espa�o na esquerda", diz Couto.
*Colaborou Let�cia Mori, da BBC News Brasil em S�o Paulo
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