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Estado de Minas ELEI��ES 2022

'Voto envergonhado'; em Lula ou Bolsonaro pode decidir o pleito?

Com proximidade das elei��es e em meio a pleito fortemente polarizado, tema vem despertando interesse dos especialistas e da imprensa


22/09/2022 15:18 - atualizado 22/09/2022 16:31


Bolsonaro x Lula
�ltimas pesquisas mostram Lula � frente de Bolsonaro nas inten��es de voto, com possibilidade de vit�ria do petista ainda em primeiro turno (foto: Reuters)

Com a proximidade das elei��es e em meio a um pleito fortemente polarizado, um tema em particular vem despertando interesse de especialistas e da imprensa: o voto nos candidatos mais bem cotados � presid�ncia — Jair Bolsonaro (PL) e Luiz In�cio Lula da Silva (PT) — poderia estar subnotificado?


Alguns passaram a descrever esse fen�meno como "voto envergonhado" ou at� "amedrontado", ou seja, eleitores deixariam de expressar sua prefer�ncia quando questionados em sondagens eleitorais por "vergonha" ou "medo" — em linha com uma teoria de comunica��o de massa conhecida como "espiral do sil�ncio" e usada para descrever a forma��o da opini�o p�blica.

Segundo essa teoria (leia mais no fim desta reportagem), o indiv�duo tende a omitir sua opini�o quando ela contraria a opini�o dominante, por medo de isolamento social.

As �ltimas pesquisas mostram Lula � frente de Bolsonaro nas inten��es de voto, com possibilidade de vit�ria do petista ainda em primeiro turno.


N�o h� consenso entre especialistas ouvidos pela BBC News Brasil sobre subnotifica��o de votos.


O cientista pol�tico Antonio Lavareda, que � presidente do Conselho Cient�fico do Ipespe (Instituto de Pesquisas Sociais, Pol�ticas e Econ�micas) e ligado � Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), foi o primeiro a levantar essa hip�tese, com vantagem para Bolsonaro.


J� Felipe Nunes, diretor do instituto de pesquisas Quaest, diz exatamente o contr�rio: que h� subnotifica��o de votos a favor de Lula. E que isso se d� por "vergonha" que parte do eleitorado sente ao votar no petista. Nunes diz que tr�s estudos realizados por ele e sua equipe comprovam esse voto "envergonhado ou amedrontrado".


Por outro lado, M�rcia Cavallari, do Ipec, e Luciana Chong, do Datafolha, embora reconhe�am a 'espiral do sil�ncio' como fen�meno da opini�o p�blica, sobre a qual dizem haver v�rios estudos, afirmaram que n�o encontraram evid�ncias de subnotifica��o de votos em nenhum dos candidatos.


Todos ressalvaram que isso s� poder� ser verificado com exatid�o depois das elei��es.


Tribunal Regional Eleitoral faz demonstrações da urna biométrica no fim de semana no Distrito Federal, para familiarizar o eleitor com a urna eletrônica
Institutos de pesquisa usam aplicativo que simula urna eletr�nica para permitir 'voto secreto' durante entrevistas para averiguar inten��o de voto (foto: Jos� Cruz/Ag�ncia Brasil)

Vantagem para Bolsonaro

Lavareda sugeriu a possibilidade de subnotifica��o de voto a favor de Bolsonaro como poss�vel explica��o para a discrep�ncia entre os resultados das recentes pesquisas de inten��o de voto presenciais e por telefone. Em ambas, Bolsonaro aparece atr�s de Lula, por�m, na primeira modalidade, a diferen�a entre os dois candidatos � maior.


Ele diz acreditar que eleitores do atual presidente, especialmente entre as camadas de menor renda e escolaridade, nas quais Lula tem inten��o de voto muito maior, estariam mais suscet�veis a omitir a prefer�ncia pelo atual presidente, quando questionados presencialmente sobre em quem votariam, diante de amigos ou vizinhos. Por outro lado, por telefone, ficariam mais "relaxados" para dizer a verdade.


"Alguns indiv�duos, quando t�m uma opini�o sobre um assunto relevante, mas discrepante da maioria do seu grupo social, omitem essa atitude ou prefer�ncias para evitar entrar em conflito e ficar apartado do respectivo grupo", explica, em entrevista � BBC News Brasil.


"Minha hip�tese � que isso pode acontecer entre pessoas de baixa renda, nas quais Lula tem tr�s vezes mais inten��o de voto do que Bolsonaro, sobretudo em pesquisas presenciais. Nas pesquisas telef�nicas, isso n�o ocorre ou se d� com muito menor intensidade. Esse eleitor que fica ressabiado em expressar sua prefer�ncia conflitante com a prefer�ncia do grupo tem que 'confessar' essa prefer�ncia em p�blico, e isso pode produzir algum constrangimento", acrescenta, refor�ando de que se trata apenas de uma "suposi��o" e que n�o h� dados concretos que a comprovem.


Mas se essa hip�tese realmente for verdadeira, o mesmo n�o poderia acontecer com eleitores de Lula entre os mais ricos, nos quais Bolsonaro tem inten��o de voto maior?


"Sim, claro. Mas a magnitude disso, em termos relativos, � muito menor. H� muito menos eleitores nas camadas mais altas da popula��o do que nas camadas mais baixas, portanto, o impacto porcentual nas pesquisas de inten��o de voto � bem menor", pondera.


Lavareda destaca ainda que n�o se trata de um "voto envergonhado".

"A minha hip�tese � que n�o � envergonhado. � um voto de um cidad�o em uma elei��o altamente polarizada como essa prefere resguardar suas opini�es e atitudes para si pr�prio, para evitar acentuar conflitos em seu grupo social. N�o � um voto envergonhado; o eleitor n�o tem vergonha de ter aquela prefer�ncia. Ele omite a prefer�ncia. � a espiral do sil�ncio e n�o espiral da vergonha", argumenta.


"Na percep��o desse eleitor, ele � minorit�rio demais e h� muita intoler�ncia para um comportamento discrepante do que � modal no grupo", acrescenta.

Lavareda diz ainda acreditar que as manifesta��es de 7 de setembro "podem ter eventualmente "liberado" esse voto oculto entre as pessoas de menor escolaridade e renda. Ao refor�arem uma percep��o de sua forte presen�a na sociedade".


"Mas esses 38% de pesquisa posterior a elas devem nos deixar alertas para essa hip�tese (de subnotifica��o)", ressalva.


O percentual citado por Lavareda consta em uma pesquisa recente do Ipespe que perguntou "quando o assunto � elei��o [voc�] evita dizer em quem vai votar, diz apenas se perguntado, ou fala abertamente quem � seu candidato?"


Do total de entrevistados, 38% responderam que evitam dizer quem vai votar; 19% dizem apenas se perguntados, 38% falam abertamente quem � seu candidato e 5% dizem n�o ter candidato ou n�o sabem ou n�o responderam.


E entre os que evitam dizer em quem v�o votar, a maior parte (41%) tem Ensino Fundamental e ganha at� dois sal�rios m�nimos (42%).


Stylised graphic of a hand holding a pen putting a ticket in a box on a ballot paper
(foto: BBC)

Vantagem para Lula

Felipe Nunes, da Qaest, pensa diferente.

"N�o haveria por que o eleitor de Bolsonaro confessar o voto numa dire��o em 2018 e agora ter motivo para escond�-lo", acrescenta.


"Fizemos estudos que mostram que o eleitor do Lula n�o tem a mesma facilidade que o eleitor do Bolsonaro de expressar sua prefer�ncia em seu candidato, o que explicaria porque vemos uma diferen�a t�o grande nas ruas, por exemplo, em rela��o a manifesta��es."


"Ele tem vergonha de votar no Lula, ou at� medo. Muito por causa dos esc�ndalos de corrup��o em que o PT esteve envolvido. J� o eleitor de Bolsonaro � muito mais verbal; ele 'aparece mais', o que d� a falsa impress�o de que as pesquisas de inten��o de voto n�o est�o captando a vontade do povo", explica.

Nunes ressalva que esse comportamento do eleitorado petista "n�o tem a ver com renda".


Ele lembra que numa pesquisa da Quaest de abril sobre quem o entrevistado preferia que vencesse as elei��es, 31% deles expressavam abertamente a prefer�ncia por Bolsonaro e que 30,7% preferiam o atual presidente como vencedor. Ou seja, n�o haveria voto "envergonhado" em Bolsonaro em 2022.


Mas a mesma pesquisa mostrou naquele momento que 41,8% dos entrevistaram expressaram abertamente prefer�ncia pela vit�ria de Lula, enquanto que 42,8% preferiam o candidato do PT fosse presidente outra vez.


"O aumento de 1 ponto percentual favorece a tese de que, se houver voto "envergonhado" nesta elei��o, ele tem mais chance de ser do eleitor de Lula do que de Bolsonaro", assinala Nunes em artigo desta quarta-feira (21/9) intitulado "Entre o voto envergonhado e o voto amedrontado" e publicado pela Revista Piau�.


No texto, Nunes recorre � teoria da "espiral do sil�ncio" para afirmar que, em sua vis�o, o "enquadramento moralista" adotado por eleitores de Bolsonaro ao falarem de Lula, "com �nfase sobretudo no tema da corrup��o, estaria incentivando apoiadores de Lula � autocensura".


"Tanto o medo quanto a propens�o � autocensura do voto s�o maiores entre eleitores de Lula do que entre os de Bolsonaro. Assim, al�m do voto "envergonhado" — em raz�o da incapacidade do eleitor de Lula de expressar sua prefer�ncia num ambiente de cobran�a por uma posi��o socialmente desej�vel contra a corrup��o -, identificamos uma autocensura causada tamb�m pelo medo de intimida��o social ou mesmo de viol�ncia", conclui Nunes no artigo, escrito em parceria com Frederico Batista, professor da Universidade da Carolina do Norte em Charlotte e pesquisador visitante da Quaest.


Urna eletrônica
Segundo teoria da 'espiral do sil�ncio', indiv�duo tende a omitir opini�o quando ela contraria opini�o dominante, por medo de isolamento, cr�tica ou chacota (foto: Reuters)

Sem subnotifica��o

No entanto, outras diretoras de institutos de pesquisa eleitorais ouvidas pela BBC News Brasil, embora reconhe�am a 'espiral do sil�ncio' como fen�meno da opini�o p�blica, sobre a qual dizem haver v�rios estudos, afirmaram que a hip�tese levantada por Lavareda n�o � corroborada, por enquanto, por dados concretos.

"Tenho colocado nos meus question�rios em quem voc� votou no segundo turno de 2018 e n�o h� subnotifica��o de eleitores bolsonaristas", diz M�rcia Cavallari, CEO do Ipec, instituto fundado por parte da equipe que atuava no antigo IBOPE.

Segundo ela, institutos de pesquisa normalmente usam m�todos para tentar minimizar a possibilidade de subnotifica��o de eleitores, ora por meio de "perguntas de controle, de comportamento eleitoral no passado" ou "pedindo ao entrevistado para votar secretamente, num tablet, sem ele ter que falar ao entrevistador em quem ele est� votando".

"Esse fen�meno ('espiral do sil�ncio') � muito antigo e sempre foi estudado; h� mecanismos de minimizar isso, mas isso n�o impede que aconte�a. Mas n�o sabemos se est� acontecendo agora".

Luciana Chong, diretora do Datafolha, acrescenta que, por enquanto, n�o h� dados que comprovem subnotifica��o de votos.

"Temos um aplicativo que simula a urna eletr�nica no qual o entrevistado pode reproduzir o voto dele. Realmente, n�o h� dados que me indiquem que isso (subnotifica��o) possa estar acontecendo. O que faz � sempre ter alguns mecanismos para tentar entender isso melhor", diz.

"Sempre fazemos esse controle e n�o percebemos isso em outras elei��es. Parece algo residual at� agora. Mas cada elei��o � diferente".

Ou seja, s� teremos a certeza sobre a subnotifica��o de votos ap�s as elei��es.


Elisabeth Noelle-Neumann
'Espiral do sil�ncio', aludida pelos especialistas, � uma teoria da ci�ncia pol�tica e comunica��o de massa desenvolvida nas d�cadas de 60 e 70 pela alem� Elisabeth Noelle-Neumann (foto: noelle-neumann.de)

'Espiral do sil�ncio': a teoria

A 'espiral do sil�ncio', aludida pelos especialistas, � uma teoria da ci�ncia pol�tica e comunica��o de massa desenvolvida nas d�cadas de 60 e 70 pela alem� Elisabeth Noelle-Neumann.

Segundo essa teoria, a vontade das pessoas de expressar suas opini�es sobre quest�es p�blicas controversas � afetada pela percep��o — amplamente inconsciente — que elas t�m dessas opini�es como populares ou impopulares.

Em outras palavras: a percep��o de que a opini�o de algu�m � impopular tende a inibir ou desencorajar sua express�o, enquanto a percep��o de que � popular tende a ter o efeito oposto.

Noelle-Neumann decidiu estudar o que levou � surpresa das elei��es federais alem�s de 1965. E fez uma descoberta surpreendente sobre a pesquisa eleitoral realizada durante a campanha daquela ocasi�o.

Meses antes do dia da elei��o em setembro de 1965, ela e sua equipe do Instituto Allensbach de Pesquisa de Opini�o P�blica lan�aram uma s�rie de pesquisas destinadas a analisar as opini�es pol�ticas do eleitorado durante a campanha.

De dezembro de 1964 at� pouco antes do dia das elei��es, os resultados da pesquisa sobre as inten��es de voto dos eleitores permaneceram praticamente inalterados. M�s ap�s m�s, os dois principais partidos, o governista Uni�o Democrata-Crist� - Uni�o Social-Crist� (CDU-CSU) e opositor Partido Social-Democrata da Alemanha (SDP), estavam empatados, com cerca de 45% da prefer�ncia do eleitorado cada um.

Sendo assim, seria imposs�vel prever qual partido tinha mais probabilidade de vencer a elei��o.

Por�m, nas �ltimas semanas da campanha, a situa��o mudou repentinamente, com os resultados da pesquisa mostrando uma virada de �ltima hora em favor da CDU-CSU. A porcentagem de entrevistados que disse que pretendia votar na CDU-CSU subiu de supet�o para quase 50%, enquanto a parcela que pretendia votar no SDP caiu para menos de 40%. No final, o resultado da elei��o confirmou o que as pesquisas haviam indicado: a CDU-CSU venceu com 48% dos votos, contra 39% do SDP.

Curiosamente, enquanto as inten��es dos eleitores permaneceram inalteradas ao longo de muitos meses, suas expectativas em rela��o ao resultado da elei��o mudaram drasticamente durante o mesmo per�odo. Em dezembro de 1964, a porcentagem de entrevistados que esperava a vit�ria do SDP era quase a mesma que a parcela que esperava uma vit�ria da CDU-CSU. Mas, ent�o, os resultados come�aram a mudar: a porcentagem de entrevistados que esperava uma vit�ria da CDU-CSU aumentou continuamente, enquanto o SDP perdeu terreno.

J� em julho de 1965, a CDU-CSU estava claramente na lideran�a em rela��o �s expectativas dos eleitores e, em agosto, quase 50% esperavam que o partido venceria. No final da campanha, um n�mero consider�vel de ex-apoiadores do SDP ou eleitores indecisos votaram no partido que acreditam que sairia vitorioso.

Noelle-Neumann investigou as causas sobre por que isso poderia ter acontecido. Ela suspeitou que uma visita da rainha Elizabeth 2ª � Alemanha em maio de 1965, durante a qual ela foi frequentemente acompanhada pelo chanceler alem�o democrata-crist�o, Ludwig Erhard, pode ter criado um clima otimista entre os partid�rios da CDU, levando-os a proclamar publicamente suas convic��es pol�ticas. Como resultado, os partid�rios do opositor SDP podem ter (erroneamente) conclu�do que as opini�es de seus oponentes eram mais populares do que as suas e que, portanto, a CDU venceria.

Os partid�rios do SDP foram, portanto, desencorajados a articular publicamente suas pr�prias opini�es, refor�ando a impress�o de que a CDU era mais popular e mais prov�vel de ser vitorioso.

Isolamento social

Segundo a teoria proposta por Noelle-Neumann, a maioria das pessoas tem um medo natural — e principalmente inconsciente — do isolamento social que as leva a monitorar constantemente o comportamento dos outros em busca de sinais de aprova��o ou desaprova��o.

Para a cientista pol�tica alem�, a fim de evitar esse isolamento, tendemos a nos abster de expor publicamente nossas opini�es sobre assuntos controversos quando percebemos que isso vai atrair cr�ticas, desprezo, chacota ou outros sinais de desaprova��o.

Por outro lado, quando sentimos que nossas opini�es ser�o bem-recebidas tendemos a express�-las sem medo e �s vezes de uma forma bastante intensa.

Come�a, assim, um processo em espiral: o campo dominante se tornando cada vez maior e mais autoconfiante, enquanto o outro campo se torna cada vez mais silenciado.

� a 'espiral do sil�ncio'.

Na vis�o de Noelle-Neumann, contudo, a popularidade real de uma opini�o n�o determina necessariamente se ela acabar� por predominar sobre opini�es opostas. Ou seja, uma opini�o pode ser dominante no discurso p�blico mesmo que a maioria da popula��o realmente discorde dela, desde que a maioria das pessoas acredite (falsamente) que essa opini�o � impopular e se abstenha de express�-la por medo de ficar isolada.

O objetivo de Neumann, com sua teoria, era descrever mais amplamente a forma��o de opini�o coletiva e a tomada de decis�es da sociedade em rela��o a quest�es controversas ou moralmente carregadas.

E entender como os meios de comunica��o de massa — e, por que n�o, as pesquisas de inten��o de voto — podem influenciar no comportamento da opini�o p�blica.

- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-62761829

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