
Para o cientista pol�tico Creomar de Souza, fundador da consultoria pol�tica Dharma, que analisa risco pol�tico, o segundo turno das elei��es presidenciais entre Luiz In�cio Lula da Silva e Jair Bolsonaro (PL), que acontecer� no dia 30 de outubro, pode ter margem apertada, se tornando uma disputa "decidida no detalhe".
Com o pa�s fortemente dividido em suas prefer�ncias pol�ticas e uma diferen�a pequena no resultado do primeiro turno (de pouco mais de cinco pontos percentuais), a menor margem hist�rica entre dois candidatos � presid�ncia que foram para 2º turno, o cen�rio n�o parece imut�vel na percep��o do cientista, deixando espa�o para uma poss�vel virada in�dita em elei��es brasileiras.
"N�o se pode desprezar a capacidade do bolsonarismo de comparecer no dia 30 de outubro e nem o interesse do presidente da Rep�blica usar a m�quina p�blica para fazer campanha. Tamb�m n�o se pode ignorar o interesse de for�as pol�ticas que hoje apoiam o presidente da Rep�blica de criarem 'bondades' [an�ncios de pol�ticas p�blicas voltadas � conquista de eleitores] diversas nessas pr�ximas semanas para que eles tenham resultados favor�veis a eles", disse de Souza, que tamb�m � professor na Funda��o Dom CabralEntre as "bondades" citadas pelo analista, est� a estrat�gia adotada pelo governo de antecipar o calend�rio de pagamentos do Aux�lio Brasil em outubro. Os repasses estavam previstos entre o dia 18 e 31, conforme o N�mero de Identifica��o Social (NIS) dos benefici�rios. Agora os pagamentos ser�o feitos a partir do dia 11 e terminar�o no dia 25, cinco dias antes do segundo turno das elei��es.
Bolsonaro tamb�m prometeu pagar o 13º sal�rio a mulheres chefes de fam�lia e anunciou um programa de renegocia��o de d�vidas da Caixa. O banco tamb�m reduziu a taxa de juros a micro e pequenas empresas, o que, na vis�o do especialista, visa captar mais votos.
Ataques � imagem do advers�rio
A diferen�a de votos entre Bolsonaro e Lula foi de 6,2 milh�es no primeiro turno.
Para conseguir o que seria uma virada in�dita no segundo turno, Bolsonaro precisa aumentar sua vota��o — atraindo votos de eleitores que optaram por outros candidatos (como Ciro Gomes e Simone Tebet), dos que n�o votaram no primeiro turno e tamb�m de eleitores que votaram em Lula.
Uma das poss�veis estrat�gias de Bolsonaro no segundo turno � atrair votos dos eleitores que optaram por Simone Tebet.
Apesar de Tebet ter declarado apoio a Lula, o cientista pol�tico considera que parte da base de eleitores da candidata derrotada do MDB � de centro-direita — e que eles rejeitam Lula e o PT, podendo possivelmente votar em Bolsonaro no segundo turno.
Para Creomar de Souza, a pergunta decisiva do segundo turno �: "o Bolsonaro candidato � maior ou menor que o n�mero de eleitores de direita no Brasil?"
"Com os dados do primeiro turno, ficou claro que Bolsonaro � menor do que a direita [ou seja, n�o � o favorito de todos dentro desse espectro pol�tico], j� que tivemos a terceira colocada como uma candidata de centro-direita, a Simone Tebet, que levou 4,16% dos votos."
Mas Bolsonaro �, segundo o analista, o ponto de coes�o n�o s� de boa parte da direita, como tamb�m alcan�a parte dos eleitores do centro, que tamb�m rejeitam Lula.
"Creio que para conquistar o voto de eleitores que n�o optaram por Bolsonaro no primeiro turno, sua milit�ncia vai tentar estabelecer com o m�ximo de for�a poss�vel uma ideia de que o bolsonarismo � a �ltima barreira de conten��o a um retorno do petismo, e isso pode fazer com que eleitores conservadores que optaram por outros candidatos anteriormente engajem na campanha e deem votos a Bolsonaro nessa corrida final."
"As pesquisas mostram que eleitores de Ciro e Tebet, que s�o votos em disputa entre Lula e Bolsonaro, ainda est�o bastante divididos entre as duas campanhas. Para conquist�-los, a tentativa foca na desconstru��o do Lula em rela��o a valores morais. Isso trafega por um discurso que j� estamos vendo em uso pelos bolsonaristas - o de que � uma disputa daqueles que tem religi�o contra aqueles que n�o tem religi�o."
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Os pontos a favor de Lula
Como fatores que beneficiam Lula, de Souza avalia que o candidato do PT conseguiu romper uma barreira ideol�gica ao conseguir apoios de figuras consideradas da centro-direita.
"Nomes como Simone Tebet e Fernando Henrique Cardoso, que n�o votaram no PT, isso � uma novidade no quadro pol�tico. J� os apoios que o Bolsonaro recebeu at� agora s�o mais do mesmo. N�o h� ningu�m que entrou no palanque que possamos dizer 'esse eu n�o esperava'."

Mas o desafio para Lula, na an�lise de Creomar de Souza, � aumentar a taxa de transfer�ncia dos votos que Tebet recebeu para o candidato do PT — j� que parte desse eleitorado tende a votar nulo ou a at� a migrar sua escolha para Bolsonaro.
"A resposta para isso � quanto ela vai se engajar na campanha, j� que ela � a boa novidade dessa campanha eleitoral, mostrando-se articulada, corajosa e disposta a discutir temas importantes. Vai depender de o qu�o grande ser� seu poder de convencimento com o seu eleitor", afirma.
Votos em disputa
Entre os pontos que contribuem para deixar o resultado 'em aberto' at� este momento da disputa, est�, na opini�o de Creomar de Souza, a divulga��o intensa de conte�dos que pretender manchar a imagem de um ou de outro candidato.
"Segundos turnos s�o historicamente momentos de decis�es acirradas, mas este, especificamente, est� bastante intenso, o que gera uma tend�ncia de que a qualidade do debate caia", aponta o analista.
Discuss�es que colocam em pauta a religi�o, como o discurso feito por Bolsonaro em loja ma��nica, assim como uma declara��o antiga do presidente sobre o aborto ser uma decis�o do casal, foram muito compartilhadas pelo eleitorado da esquerda, o que na an�lise do cientista, � uma novidade no 'jogo pol�tico'.
"Durante a elei��o de 2018, a ala bolsonarista se sentiu muito confort�vel com a ideia de que s� ela podia jogar esse tipo de jogo, em adotar essa estrat�gia que tamb�m � muito usada pelo MBL (Movimento Brasil Livre) [movimento liberal de direita]. Mas nessa elei��o a esquerda tamb�m passou a compartilhar esse tipo de conte�do, embora ainda o fa�a menos."
Para ele, � poss�vel que os conte�dos contribuam para prejudicar a imagem principalmente de Bolsonaro, j� que grande parte do eleitorado do presidente tem perfil ou admira uma postura conversadora.
"Essa quest�o da ma�onaria, por exemplo, causou desconforto a ponto de Bolsonaro vir a p�blico dizer 'Sou presidente de todos.' H� alguns que s�o bolsonaristas ou petistas 'raiz', que n�o mudam de lado por nada. Agora, em um segundo turno t�o apertado, cada voto conta, e para isso, h� duas miss�es. Uma � fazer com que aquele que n�o votaria em voc�, vote, e a outra, � fazer com que mesmo que determinado eleitor n�o te escolha, ele tamb�m se desiluda com oponente -- e para isso os mensagens como essas, que prejudicam a imagem dos candidatos, podem criar um risco."
O analista aponta que os institutos de pesquisa acertaram, dentro da margem de erro, sobre a quantidade de votos que Lula poderia receber, mas tiveram dificuldade em medir o desempenho de Bolsonaro, que causou surpresa ao alcan�ar um resultado um tanto quanto mais expressivo do que as pesquisas indicavam.
- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63205895