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Estado de Minas 'ARGENTINA 1985'

Promotor argentino:Crimes devem ser julgados, n�o importa apoio a Bolsonaro

Luis Moreno Ocampo foi respons�vel por colocar na pris�o generais da �ltima ditadura militar da Argentina, que durou de 1976 a 1983


14/01/2023 21:56 - atualizado 14/01/2023 21:57

Jair Bolsonaro
Ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ser� investigado ap�s ministro Alexandre de Moraes acatar pedido da PGR (foto: Pedro Ladeira/Folhapress)
Na posse do presidente Luiz In�cio Lula da Silva (PT) em 1º de janeiro, um coro gritava "sem anistia", pedindo que eventuais crimes cometidos pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) n�o fiquem impunes.

Como fazer isso em um cen�rio em que mais de 58 milh�es de pessoas votaram no candidato derrotado, ao mesmo tempo em que se promete reunificar um pa�s dividido politicamente? "� um grande desafio", responde um ex-promotor argentino com alguma experi�ncia nisso. "Mas crimes s�o crimes. E a Justi�a n�o pode ser uma ferramenta pol�tica."

Quem diz isso � Luis Moreno Ocampo, 70, respons�vel por colocar na pris�o generais da �ltima ditadura militar da Argentina, que durou de 1976 a 1983, em um tribunal hist�rico que ficou conhecido como "Julgamento das Juntas". O julgamento � o tema do filme "Argentina, 1985", vencedor do Globo de Ouro e indicado do pa�s na pr�-lista do Oscar.

Ocampo, primeiro promotor-chefe do Tribunal Penal Internacional, reconhece que "em um pa�s t�o dividido politicamente pode ser complicado" levar a cabo julgamentos, mas que "crimes s�o crimes, e � preciso ser criativo" para encontrar solu��es de modo a fazer justi�a. "Talvez uma comiss�o internacional que ajude a estabelecer os fatos de forma objetiva", sugere.

 

Leia mais: Lideran�as do PL apontam 'desconforto' em perman�ncia de Bolsonaro

 

O Julgamento das Juntas foi o primeiro e, por isso, o mais importante de sua carreira, afirma o argentino, que afirma ter tirado uma li��o importante do processo. "Um julgamento assim tem v�rias frentes. Uma � ganhar o caso diante dos ju�zes. Outra � a comunica��o, � preciso comunicar com o p�blico para obter apoio", diz, citando que uma comunica��o clara poderia ajudar em uma poss�vel apura��o no Brasil.

Ao lado de Julio Strassera (interpretado nos cinemas por Ricardo Dar�n), Ocampo (vivido por Peter Lanzani) conseguiu condenar � pris�o perp�tua o general Jorge Videla, presidente de 1976 a 1981, e o almirante Emilio Eduardo Massera, al�m de ter levado outros militares de altas patentes a receberem penas de anos na cadeia --houve uma s�rie de indultos aos generais nos governos seguintes.

"Com uma comunica��o clara, minha m�e acabou virando term�metro do que pensavam as pessoas sobre o julgamento", lembra Ocampo --de fam�lia de militares, percebeu que a opini�o p�blica come�ava a virar quando sua m�e, que ia � igreja com Videla, passou a apoiar o tribunal, em cena retratada no filme.

A elei��o de Ra�l Alfons�n, primeiro civil eleito ap�s a ditadura, depois de prometer que julgaria os crimes militares, era uma mostra de que a popula��o apoiava o tribunal, afirma Ocampo. "Votaram nas elei��es de 1983 para que Alfons�n investigasse o passado, e ele o fez imediatamente. O peronismo se somou, havia um consenso popular." N�o sem tens�o pol�tica, por�m.

"Os militares haviam interrompido a democracia algumas vezes nos 50 anos anterior, ou seja, havia receio de que o fizessem outra vez."

Uma esp�cie de comiss�o da verdade foi instalada, a Conadep (Comiss�o Nacional sobre a Desaparecimento de Pessoas), que juntou depoimentos sobre crimes cometidos por agentes do Estado em todo o pa�s. Estima-se em at� 30 mil o n�mero de mortos e desaparecidos na ditadura argentina.

"Na nossa tarefa como promotores, o desafio foi como transformar relatos em evid�ncia jur�dica, que permitissem mostrar a conex�o entre milhares de crimes de sequestro, tortura e homic�dio e o governo, como conect�-los com os comandantes", conta.

Ao fim do Julgamento das Juntas, em 1985, Ocampo continuou trabalhando como promotor em outros casos envolvendo militares, e em 2003, enquanto dava aulas na Universidade Harvard, nos Estados Unidos, foi eleito primeiro procurador-chefe do Tribunal Penal Internacional.

Na corte, atuou em casos envolvendo Muammar Gaddafi na L�bia e acusou o ent�o ditador do Sud�o Omar al-Bashir por genoc�dio e crimes de guerra, entre outros casos.

Questionado pela Folha se � poss�vel acusar Bolsonaro de genoc�dio, como afirmam seus opositores em rela��o � sua gest�o durante a pandemia de Covid-19, Ocampo afirma que a dificuldade � provar que Bolsonaro tinha a inten��o de provocar mortes, o que � crucial para tipificar o crime. "O ponto � se ele teve a inten��o de matar 700 mil pessoas ou se pelo menos sabia que isso aconteceria e aceitou. � preciso provar isso. Para classificar de genoc�dio, � preciso haver inten��o", explica.

Hoje, Ocampo d� aulas em um curso de cinema em Los Angeles, em uma disciplina que analisa narrativas audiovisuais de guerra, crime e justi�a. Ele se se diz empolgado com o sucesso do filme que protagoniza indiretamente. A obra "fala n�o s� da Argentina em 1985, mas do estado da democracia no s�culo 21", afirma, citando os ataques �s sedes dos Tr�s Poderes no �ltimo fim de semana em Bras�lia.

"A democracia est� sob fogo nos Estados Unidos, no Brasil, na Europa, em muitos lugares. O filme tem justamente um impacto mundial por isso. Estamos vivendo um s�culo 21 onde nossos sistemas democr�ticos precisam revitalizar-se e rejuvenescer", diz.

Para ele, a aus�ncia de julgamento dos crimes da ditadura brasileira implicou em uma transi��o democr�tica incompleta. "O Brasil teve uma Comiss�o da Verdade, mas n�o teve um julgamento. Nos anos 1980, os professores de ci�ncias pol�ticas recomendavam rea��es como a do Brasil ou a da Espanha; acordos, n�o se investigar o passado. O que Alfons�n fez foi revolucion�rio. O julgamento consolidou a democracia", afirma.


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