
Ir ao Rio de Janeiro sem visitar o Cristo Redentor � como ir a Roma e n�o ver o papa. N�o h� exagero na velha compara��o, caro leitor, afinal o monumento, que completa 90 anos hoje, dia dedicado a Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, se tornou o s�mbolo maior da capital fluminense, cart�o-postal do pa�s, Patrim�nio da Humanidade e uma das Sete Maravilhas do Mundo Moderno. At� o pr�ximo s�bado (16), haver� festa para celebrar a data, com shows, atividades culturais, oficinas e, claro, muitas ora��es aos p�s do Cristo e na Catedral Metropolitana de S�o Sebasti�o do Rio de Janeiro, no Centro da cidade.
As comemora��es come�am �s 7h15, com missa no Santu�rio do Cristo Redentor, no alto do Corcovado, e prosseguem na Catedral Metropolitana, no Centro da cidade, unindo sustentabilidade e solidariedade. Junto � oferta de servi�os e atendimentos gratuitos para a popula��o em situa��o de vulnerabilidade social, a Arquidiocese de S�o Sebasti�o do Rio de Janeiro montou pontos de coleta para receber alimentos, roupas, produtos de higiene e brinquedos para ajudar 300 comunidades no estado. Segundo os organizadores, a meta � arrecadar 500 toneladas de alimentos n�o perec�veis e outros produtos.
Mesmo que n�o seja poss�vel a subida ao topo do monte, de onde se tem uma vista deslumbrante, o visitante pode ver a est�tua do Cristo, de 38 metros de altura, de qualquer ponto da Cidade Maravilhosa. E � fundamental, claro, conhecer um pouco da hist�ria iniciada em 1859, quando chega ao Brasil o padre franc�s Pierre-Marie Bos, primeiro a ter a ideia de se construir a imagem de Jesus Cristo no alto do monte cujo nome, por sua forma, se assemelha a uma corcova. O Morro do Corcovado, onde est� a est�tua do Cristo Redentor, foi visitado, em 2019, por 1,9 milh�o de pessoas.
A ideia foi lan�ada e o tempo passou at� que, em 1885, foi inaugurada a primeira ferrovia de turismo da Am�rica Latina, com a abertura da esta��o do Corcovado e do trecho Cosme Velho-Paineiras. Tr�s anos depois, ap�s a Aboli��o da Escravatura, a Princesa Isabel ordenou a constru��o de uma imagem do Sagrado Cora��o de Jesus – para ela, o “verdadeiro Redentor dos homens”. Com a Proclama��o da Rep�blica (1889), o projeto foi cancelado.
No s�culo 20, o projeto ganha for�a novamente. Em 1921, o C�rculo Cat�lico relan�a a ideia para as celebra��es, no ano seguinte, do centen�rio da Independ�ncia do Brasil. Assim, � eleito o projeto do engenheiro carioca Heitor da Silva Costa: a imagem de Jesus sobre um pedestal segurando uma grande cruz com a m�o esquerda e um globo com a m�o direita. No ano seguinte, cerca de 20 mil mulheres apresentam um abaixo-assinado ao presidente Epit�cio Pessoa pedindo autoriza��o para levar adiante a empreitada. Ocorre, ent�o, uma grande campanha de arrecada��o, coordenada pelo ent�o arcebispo dom Sebasti�o Leme, para se concretizar a proposta.
Cr�ticas e mudan�a no projeto antes da constru��o
Em resposta a cr�ticas da Escola Nacional de Belas Artes ao projeto, dom Sebasti�o Leme solicita a Heitor da Silva Costa a altera��o para que o Cristo pudesse ser visto de longe, com maior simbolismo religioso. “Ajudado pelo pintor Carlos Oswald, Heitor projeta a imagem de Jesus com o tronco ereto e os bra�os abertos, com o mundo a seus p�s”, relata um documento do Santu�rio do Cristo Redentor.Na sequ�ncia, Heitor viaja a Paris, onde contrata o escultor franc�s Paul Landowski, especialista no estilo art dec�. Landowski faz uma maquete e a escultura em tamanho real da cabe�a e das m�os do monumento, cujos moldes em gesso foram enviados ao Brasil em partes numeradas. O engenheiro franc�s Albert Caquot, por sua vez, realiza os c�lculos estruturais. Em cinco anos (1926-1931), o monumento � erguido, unindo engenharia, arquitetura e escultura. O arquiteto Heitor Levy � o mestre de obras da constru��o e Pedro Fernandes Viana, o engenheiro fiscal.
Antes de retornar ao Brasil, Heitor decide que o monumento em concreto armado deve ser revestido por um grande mosaico de pedra sab�o, material bonito, male�vel e resistente ao calor, ao frio e � eros�o. Dom Sebasti�o Leme pede que um “singelo cora��o” seja moldado no peito da est�tua, tornando-a uma imagem estilizada do Sagrado Cora��o de Jesus. E assim � feito, com mat�ria-prima de Minas Gerais (leia na p�gina ao lado).
Finalmente, em 12 de outubro de 1931, Dia de Nossa Senhora Aparecida, o Cristo Redentor � inaugurado, sendo a padroeira do Brasil homenageada com uma capela no monumento. Tr�s anos depois, a Uni�o transfere o dom�nio da �rea no topo do Monte Corcovado � Ordem
Arquidiocesana do Cristo Redentor. J� em 1960, por decreto do ent�o arcebispo do Rio, dom Jaime de Barros C�mara, a Ordem Arquidiocesana do Cristo Redentor � integrada � Mitra Arquiepiscopal do Rio de Janeiro.
At� mesmo Jo�o Paulo II confirmou que visitar o Rio e n�o ir ao Cristo � o mesmo que ir a Roma e n�o ver o papa. Por isso, ele veio pessoalmente. Em 1980, o sumo pont�fice canonizado em 2014, quando se tornou S�o Jo�o Paulo II, esteve no local. Propriedade da Arquidiocese do Rio de Janeiro, o monumento, em meio ao Parque Nacional da Tijuca, � tombado, desde 2008, pelo Instituto do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico Nacional (Iphan) e se tornou um dos locais mais visitados do pa�s.

Rio, porta de entrada do Brasil
N�o h� d�vida de que o Cristo Redentor � o cart�o-postal do Brasil, e o Rio de Janeiro, porta de entrada para turistas do mundo inteiro. De acordo com a Riotur (empresa municipal de Turismo), a Cidade Maravilhosa recebeu, em 2019, 1,64 milh�o de estrangeiros, n�mero abaixo de 2018 (1,66 milh�o) e 2017 (1,7 milh�o). Os dados foram compilados a partir de um cruzamento do Anu�rio Estat�stico e do Estudo da Demanda Tur�stica Internacional, ambos elaborados pelo Minist�rio do Turismo (MTur). Al�m de visitar o Cristo Redentor e passear no bondinho do P�o de A��car, outro destaque carioca, os estrangeiros se esbaldam ao sol nas praias da Zona Sul do Rio e Barra da Tijuca. Ainda n�o h� dados fechados sobre 2020, a nova edi��o do Anu�rio Estat�stico do MTur, com informa��es que englobam o per�odo da pandemia, ainda n�o foi publicada.
O cora��o mineiro do Cristo
Uma das Sete Maravilhas do Mundo Moderno tem o cora��o mineiro e o corpo revestido com mat�ria-prima das Gerais. Cart�o-postal do Brasil e “de bra�os abertos sobre a Guanabara”, conforme a can��o de Tom Jobim, o Cristo Redentor do Rio de Janeiro foi “composto” em pedra-sab�o procedente de Caranda�, na Regi�o Central do estado, a 136 quil�metros de Belo Horizonte. Neste m�s em que a est�tua de 38 metros completa 90 anos, a origem mineira � destacada pelo doutor em teologia Alexandre Pinheiro, coordenador do N�cleo de Acervo e Mem�ria do Santu�rio Cristo Redentor, vinculado � Arquidiocese do Rio de Janeiro.“O cora��o no peito da est�tua representa a devo��o ao amor de Deus. � a �nica parte interna feita com pedra-sab�o na estrutura de concreto armado com a�o por dentro. Externamente, o Cristo � todo revestido com mosaicos do mesmo material, cortados em tri�ngulos de 3 cent�metros. A pedra-sab�o � male�vel, resistente ao frio e ao calor e bonita no seu tom esverdeado fosforescente”, informa Pinheiro. No munic�pio de Caranda�, conforme a prefeitura local, existe a tradi��o oral, mas n�o documentos sobre a remessa da pedra para o Rio.
Em Minas, muitas outras imagens do Redentor, embora sem o mesmo material e algumas demandando cuidados urgentes, foram recriadas para homenagear o original carioca e se tornaram pontos tur�sticos, de conviv�ncia, para simples contempla��o ou caminhada di�ria no entorno. Se para uns n�o s�o exatamente grandes obras de arte, aos olhos e no cora��o das comunidades traduzem a f� e a identidade do povo. Em Belo Horizonte, h� um Cristo Redentor no Bairro Milion�rios, na Regi�o do Barreiro, assim como em Itabirito, na Regi�o Central, Taquara�u de Minas, na Regi�o Metropolitana de BH, e em Po�os de Caldas e El�i Mendes, no Sul de Minas.

ENERGIA E DEVO��O
S�o 8h30 de quarta-feira e as cenas se sucedem aos p�s do monumento com 11,8 metros de altura, feito em alvenaria e destaque na Pra�a Cristo Redentor, na parte alta do Bairro Milion�rios, na Regi�o do Barreiro, em BH. Um casal caminha no espa�o p�blico, dois amigos correm, uma fam�lia conversa � sombra e moradores apertam o passo, mostrando que o local tem apropria��o constante. Da noite anterior, restaram algumas garrafas de bebidas encostadas num canto.Concebido na d�cada de 1950, o monumento teve a pedra fundamental aben�oada em 1955 pelo ent�o arcebispo de BH, dom Ant�nio dos Santos Cabral (1884-1967). “N�o se trata de uma c�pia do Cristo do Rio de Janeiro, mas um desejo de legitimar a profiss�o de f� em Jesus, entendendo-o como o Redentor que abra�a o mundo. Reden��o significa bra�os abertos para a salva��o de todos”, explica o titular da Par�quia S�o Jos� e Jo�o Gabriel Passionista, padre Dinamar Gomes Pinto, tamb�m vig�rio episcopal da Regi�o Nossa Senhora Aparecida da Arquidiocese de BH. Ele conta que o idealizador do monumento foi o imigrante italiano Caetano Pirri, antigo propriet�rio da fazenda que deu origem ao bairro.
Residente no Milion�rios e apaixonada pela regi�o, Maria Aparecida de Souza Gontijo, volunt�ria com atua��o em registros de hist�ria e mem�ria, abre os bra�os na manh� ensolarada e diz que o espa�o, al�m de palco de celebra��es religiosas, a exemplo do Natal e Domingo de Ramos, se tornou um territ�rio livre para lazer, encontros de moradores, exerc�cios f�sicos, j� que h� aparelhos de gin�stica, e momentos de relaxamento. “O Cristo representa muito para n�s, � um bem coletivo. Daqui, temos uma vista maravilhosa em 360 graus de v�rios pontos de BH, principalmente da Serra do Curral”, aponta.
Nem � preciso muito tempo para ver que a est�tua apresenta trincas e o espa�o demanda mais cuidado. Mas h� boa not�cia para a comunidade. A Prefeitura de BH, por meio da Superintend�ncia de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), prev� a conclus�o do projeto de recupera��o e restauro do Cristo Redentor do Barreiro no final do ano. E esclarece em nota: “Ap�s aprova��o do projeto pelos �rg�os do Patrim�nio, a previs�o para licitar o restauro da est�tua � para o segundo semestre de 2022. Em rela��o � recupera��o da pra�a, a Sudecap esclarece que o projeto j� est� finalizado e, no momento, ncontra-se em fase de or�amento. O in�cio das obras na pra�a est� previsto para o primeiro semestre de 2022.”

IMAGEM E SEMELHAN�A
Seguindo pela Travessa S�o Jos� e depois pela Rua Paraopeba, antigo caminho de tropeiros, visitantes e moradores de Itabirito, na Regi�o Central do estado, chegam ao ponto mais elevado da cidade: o Alto do Cristo ou Morro do Cruzeiro Jo�o Pinto. Aqui, diante da vis�o das montanhas de Minas e do casario colonial rodeado de novas constru��es, pontifica o monumento com 12m de altura, inaugurado em 12 de setembro de 1981. “Este alto se tornou ponto religioso e tur�stico de Itabirito”, orgulha-se o padre Miguel ngelo Fiorilo, titular da Par�quia Nossa Senhora da Boa Viagem, ressaltando que no Domingo de Pentecostes, em junho, o morro recebe uma peregrina��o dos integrantes da Sociedade S�o Vicente de Paulo (SSVP). Junto � diretora municipal de Turismo, Rosilene Martins, e tirando a m�scara apenas na hora da foto para esta reportagem, o padre guiou a equipe do EM ao Alto do Cristo, onde, impiedosamente, foi instalada, bem perto, uma antena de TV.Orgulhoso tamb�m sempre fica o motorista Jos� Ant�nio Ferreira, chamado carinhosamente de Cip�, de 79 anos. Na �poca da concep��o do Cristo de Itabirito, ele, ent�o com 38, foi convidado para servir de modelo para as propor��es da est�tua. “Mediram os p�s, os bra�os, falanges, cabe�a, enfim, olharam tudo para fazer as f�rmas. Considero uma honra. O trabalho foi executado em Conselheiro Lafaiete”.
De acordo com os registros da Secretaria Municipal de Patrim�nio Cultural e Turismo, o monumento projetado por Vicente Alves para “homenagear o sentimento crist�o do povo de Itabirito” empregou 2,4 mil quilos de ferro, 83 metros c�bicos de areia, 158 metros c�bicos de brita, 51 metros c�bicos de pedras, 660 sacos de cimento e 1,7 mil kg de chapas para execu��o das f�rmas. O Cristo recebe ilumina��o e est� previsto novo projeto luminot�cnico especial para valoriz�-lo ainda mais.
Segundo a diretora Rosilene Martins, a prefeitura planeja uma s�rie de servi�os de revitaliza��o na �rea pertencente ao munic�pio. Al�m de pintura da est�tua localizada a 4 quil�metros do centro da cidade, h� previs�o de abertura de um restaurante no topo da montanha.

AINDA MAIOR
No Sul de Minas, h� dois Cristos que envaidecem os moradores: eles est�o em Po�os de Caldas, a uma altura de 1.686m, aonde se chega tamb�m por telef�rico, e em El�i Mendes. Nesse segundo munic�pio, a est�tua ainda � maior (1,50m) do que o Redentor da capital fluminense. “O nosso tem 39,5m, enquanto o do Rio, 38m”, diz o diretor de Cultura da Secretaria Municipal de Educa��o e Cultura, Jo�o Paulo Zati.Completando uma d�cada neste ano, o Cristo de El�i Mendes (30 mil habitantes, a 328 quil�metros de BH) � tombado pelo munic�pio e foi constru�do pelo cearense Gen�sio Moura, respons�vel por outros marcos no Sul de Minas, entre eles o Menino da Porteira, de Ouro Fino, e a homenagem a Pel�, em Tr�s Cora��es. “O nosso Cristo est� de frente para a rodovia BR-491”, diz Zati. Ele diz que a inspira��o foi o Cristo Redentor da Cidade Maravilhosa, embora com o toque do artista.
Na tur�stica Po�os de Caldas, o Cristo aben�oa a cidade no topo da Serra de S�o Domingos, onde os visitantes, para chegar, t�m � disposi��o o charme do telef�rico e encontram restaurante e lanchonete, informa o servidor municipal Ailton Santana, do Centro de Informa��es Tur�sticas.
Inaugurado em 13 de maio de 1958 e considerado um dos maiores do pa�s, com 30m de altura (est�tua e pedestal), o monumento foi idealizado e concretizado por Jos� Raphael dos Santos Neto e feito em Campinas (SP). Como a maioria das est�tuas inspiradas no Redentor, que fica no Morro do Corcovado, as demais Minas afora se situam em pontos que fazem bem aos sentidos pelas nuances da paisagem. “Ele se tornou nosso principal ponto tur�stico, podendo-se ver todo o anel da bacia vulc�nica e o Centro da cidade”, observa Santana.

PERTO DO CH�O
J� em Taquara�u de Minas, na Regi�o Metropolitana de BH (RMBH), o Cristo est� bem perto dos moradores, mais exatamente na Pra�a Coronel Jos� Melo, no Centro. Pintada de branco e instalada em 2008, a est�tua tem 5m de altura e 3m de envergadura, com mat�ria-prima diferente – fibra de vidro – , sendo mantida pela administra��o municipal.De acordo com a prefeitura local, h�, na base do monumento, uma fonte iluminada e constitu�da por pedra-lagartixa, muito comum na regi�o. “A principal raz�o para se erguer o monumento foi a religiosidade do povo de Taquara�u de Minas, que tem como padroeiro o Sant�ssimo Sacramento”, afirma o prefeito Marc�lio Bezerra.