
S�o Raimundo Nonato (PI) – As �ltimas cores outonais pontuam os caminhos na caatinga, tingindo de ocre, cinza, branco e vermelho a vegeta��o desse bioma �nico no mundo e presente na regi�o do semi�rido brasileiro, de forma especial no Nordeste. Nesses movimentos que a natureza faz e o homem parece copiar h� mil�nios, os tons da terra s�o encontrados tamb�m, magnificamente, nos pared�es e grutas da Serra da Capivara, o colossal conjunto de forma��es rochosas que atrai os olhares maravilhados de visitantes de todo canto. As pinturas rupestres, registro gr�fico daqueles que viveram h� mais de 10 mil anos, n�o s� encantam como transportam homens e mulheres para a pr�-hist�ria com escalas espetaculares nas cenas de dan�a, ca�a, luta, animais e contatos �ntimos, como um poss�vel um beijo.
Vamos, portanto, no embarque imediato em dire��o a um diamante bruto de m�ltiplas facetas, incrustado em cidades onde vivem pessoas espont�neas e acolhedoras, dispostas a trazer, � luz do sol ou das estrelas, hist�rias surpreendentes, e que se sentem extremamente gratas quando o turista diz ter gostado do lugar. “Coment�rios assim nos deixam bem satisfeitos”, diz o taxista Jos� Dias de Santana, o seu Deto, de 70 anos, apaixonado pela terra natal e pronto para fazer “as vontades” dos visitantes, o que se traduz em conduzi-los aos pontos tur�sticos, sem pressa, falar dos atrativos e mostrar suas descobertas. “N�o sou guia, mas sei muito daqui”, orgulha-se.
Antes de iniciarmos a viagem, uma boa not�cia. A partir de 15 de dezembro, come�a a operar comercialmente o Aeroporto Internacional de S�o Raimundo Nonato, que fica a 9,4 quil�metros do Centro da cidade. De acordo com a Empresa de Administra��o Aeroportu�ria (Esaero), contratada pelo governo do Piau�, por licita��o, para administra��o do aeroporto nos pr�ximos quatro anos, ser�o dois voos semanais, da Azul, procedentes de Petrolina e Recife (PE). A expectativa � grande na regi�o, pois a opera��o abre caminho para maior fluxo tur�stico e cria oportunidades de trabalho. “Estamos esperan�osos”, diz um estudante de arqueologia. Atualmente, o indicado � ir de avi�o at� Petrolina (distante 300 quil�metros de S�o Raimundo Nonato) e depois pegar um �nibus, t�xi ou van. Da capital Teresina at� o local s�o 521,9 quil�metros, tornando-se invi�vel essa rota.

DE QUEIXO CA�DO Localizado no Sudeste do Piau�, criado em 1979 e administrado pelo Instituto Chico Mendes de Conserva��o da Biodiversidade (ICMBio), o Parque Nacional Serra da Capivara �, como se diz popularmente, “de cair o queixo”. A paisagem re�ne a beleza das trilhas, o sil�ncio absoluto quebrado apenas pelo canto dos p�ssaros ou vento forte nas alturas dos blocos de arenito, o olhar arisco do moc�, roedor que d� as boas-vindas entre as frestas, e, claro, a marca registrada gravada nas lapas e pared�es.

As pinturas rupestres da regi�o, o maior conjunto desse tipo de arte no mundo, encontram-se presente em cerca de 900 abrigos sob rocha aren�tica, dos mais de 1,4 mil s�tios arqueol�gicos encontrados na �rea (arqueol�gica) da Serra da Capivara, com boa estrutura de visita��o, incluindo acessibilidade, distribu�dos pelos munic�pios de S�o Raimundo Nonato (cidade-polo da regi�o), Jo�o Costa, Brejo do Piau� e Coronel Jos� Dias, o mais pr�ximo do parque.

Em cada canto, paira a figura quase m�tica da arque�loga Ni�de Guidon, de 89, paulista de origem francesa que chegou a S�o Raimundo Nonato na d�cada de 1970 e lutou pela funda��o do parque nacional, sem deixar de lado a quest�o socioecon�mica e melhores condi��es de vidas das fam�lias. Um exemplo est� na produ��o de cer�mica, com os motivos das pinturas rupestres, que fazem a alegria de quem viaja e quer levar uma “lembrancinha” para os amigos.
Entre as obras de Ni�de Guidon, e abertas � visita��o, est�o o Museu do Homem Americano, inaugurado em 1998 em S�o Raimundo Nonato, sob gest�o da Funda��o Museu do Homem Americano (FUMDHAM), e o Museu da Natureza, em funcionamento h� quatro anos, em Coronel Jos� Dias. Instalada no meio da caatinga, a constru��o em forma de espiral avermelhada sobressai sem competir com a beleza dos blocos de arenito.
Reconhecido em 1991 como Patrim�nio Mundial pela Organiza��o das Na��es Unidas para a Educa��o, a Ci�ncia e a Cultura (Unesco) e, dois anos depois, tombado pelo Instituto do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico Nacional (Iphan), o Parque Nacional Serra da Capivara, onde curiosamente n�o h� esse tipo de roedor, se agiganta aos olhos de quem chega pelo potencial arqueol�gico, etnogr�fico e paisag�stico.
O VENTO FAZ A CURVA Imposs�vel conhecer todo o patrim�nio natural em poucos dias, avisa, com simpatia e conhecimento, o arque�logo e nativo da comunidade de Zabel�, Iderlan de Souza, da ag�ncia de turismo Quip�. “O parque nacional � formada pelas serras da Capivara, Talhada, Vermelha e Branca, ent�o precisar�amos de meses para conhecer tudo. Mas o visitante, nos passeios, ter� uma boa vis�o do conjunto”. Vale dizer que, para entrar no parque, � preciso de guia credenciado pelo ICMBio, que mant�m uma rela��o de nomes no site oficial, e tamb�m de t�xi ou motot�xi. “Se n�o for assim, a pessoa ser� impedida de entrar nas portarias”, acrescenta outro guia e conhecedor da �rea, o professor de hist�ria Evair do Nascimento Lima.
No primeiro dia, o turista pode conhecer o Desfiladeiro da Capivara, que inclui as tocas do Paja�, de Entrada do Paja�, do Barro, Inferno, de Entrada do Baix�o da Vaca e do Baix�o do Paraguaio. Os nomes se traduzem por c�nions, boqueir�es e topo das serras, onde parece que o vento faz a curva de t�o forte e revigorante. Em completa harmonia com o meio ambiente, e sempre lembrado pelos guias de que “o sert�o j� foi mar”, o visitante pode imaginar, no desenho dos maci�os, as torres de castelos medievais, catedrais, enfim, tudo est� aberto � imagina��o. Se bateu aquela fome, o almo�o ser� no restaurante Trilhas da Capivara, na comunidade de S�tio do Moc�, em Coronel Jos� Dias, com comidinhas bem saborosas.
No dia seguinte, prepare as canelas e use sapato confort�vel, de prefer�ncia t�nis com refor�o, para conhecer o Circuito S�tio do Meio – Toca do Boqueir�o do Pedro Rodrigues, Toca do S�tio do Meio, com vistas panor�micas – e o Circuito Pedra Furada, com destaque para a Toca do Boqueir�o da Pedra Furada, Tocas da Fuma�a I, II e III, Tocas do Carlindo e a Pedra Furada, um cart�o-postal s�mbolo do parque nacional e que merece fotos e selfies. O almo�o, desta vez, ser� na Cer�mica Artesanal Serra da Capivara, no S�tio Barreirinho, na zona rural de Coronel Jos� Dias. H� uma lojinha com v�rios tipos de pe�as e camisas feitas pelas costureiras da regi�o.
AS ANDORINHAS CHEGARAM O dia termina, em clima tranquilo e inesperado, no S�tio Jo�o Pimenta, reserva particular fora do parque, administrado por Paulo S�rgio dos Santos Silva. L� pelas 17h30, a natureza prepara um belo espet�culo no lusco-fusco. Milhares de andorinhas chegam “para dormir” nas cavidades dos pared�es e impressiona a velocidade do voo. “Nenhuma erra o alvo”, brinca Iderlan, que, diante da paisagem, d� explica��es sobre forma��es geol�gicas, povos pr�-hist�ricos, uso do Carbono 14 para data��o de s�tios arqueol�gicos e, claro, a import�ncia de Ni�de Guidon, que foi sua mestra e deu novo rumo a essa regi�o do Sudeste do Piau�. Atentos, quase j� sob as estrelas, o rep�rter e Paulo S�rgio ouvem e mergulham nas palavras que agu�am ainda mais as belezas e mist�rios da Serra da Capivara.
N�O DEIXE DE VISITAR
» Museu da Natureza
A visita come�a com as origens da Terra e da vida, passa por todo o processo de forma��o da Terra, mostra a evolu��o dos mam�feros, em ambiente virtual e exposi��o de f�sseis encontrados na regi�o. A entrada � por um buraco negro. Pessoas de todas as idades v�o curtir o simulador de voo de asa delta sobre a regi�o. Fica em Coronel Jos� Dias, a 30 quil�metros de S�o Raimundo Nonato.
» Museu do Homem Americano
Durante os �ltimos 50 anos, a equipe cient�fica da Funda��o do Museu do Homem Americano (Fumdham) estudou a regi�o. No local, h� uma exposi��o que mostra a chegada do “Homo sapiens” ao Sudeste do Piau�, e o desenvolvimento tecnol�gico e cultural do povos que a� viveram.
» Pedra Furada
Cart�o-postal, s�mbolo do parque nacional e merecedor de fotos e selfies. Cen�rio de grande beleza, com um anfiteatro e ilumina��o especial � noite. Em julho, o ponto tur�stico tem programa��o cultural,
a chamada �pera da Pedra Furada.
Faz parte do Circuito da Pedra Furada,
em Coronel Jos� Dias.
» Cer�mica Artesanal
Serra da Capivara
Fica no S�tio Barreirinho, na zona rural de Coronel Jos� Dias. H� uma lojinha com v�rios tipos de pe�as e camisas feitas pelas costureiras da regi�o. 0s visitantes podem assistir ao processo de produ��o das pe�as feitas com argila e muita criatividade.
DICAS DE VIAJANTE
Junho e julho s�o os meses mais indicados para fazer os passeios na Serra da Capivara. Os dias s�o mais frescos e chega a fazer um "friozinho" de madrugada. De dezembro a maio tamb�m est� em alta, “pois � �poca de chuva e a vegeta��o est� toda verde”, diz o guia Iderlan de Souza, da ag�ncia de turismo Quip�.
Para contratar um guia na regi�o, procure as indica��es no site do ICMBio. A entrada no parque s� � permitida com um profissional credenciado.
N�o � preciso ser atleta para percorrer as trilhas, mas vale muita disposi��o. Pessoas com defici�ncia t�m acessibilidade garantida, pois h� passarelas adequadas em alguns s�tios arqueol�gicos.
As lojinhas, nas portarias do parque, n�o aceitam cart�o de cr�dito ou PIX. Ent�o � bom levar dinheiro vivo para comprar bon�s, chaveiros, camisetas, canetas e outras lembran�as. Na cer�mica, cart�es e PIX s�o bem-vindos.
Se o viajante for de �nibus de Petrolina (PE) para S�o Raimundo Nonato, o melhor � consultar, com anteced�ncia, hor�rio e valor da passagem no site das empresas.
H� poucos hot�is em S�o Raimundo Nonato. Ent�o � indicado fazer a reserva com anteced�ncia. Em Coronel Jos� Dias, munic�pio mais pr�ximo do Parque Nacional, tem a Pousada e Restaurante Trilhas da Capivara.