“Cheguei aqui (Parque da Cachoeira) com 7 anos. Era uma casinha simples, de telha fina. Lembro que aprendemos a nadar foi nesse corregozinho a�. Hoje, a gente v� s� lama, � brabo. Era mais mato. Casa mesmo existiam s� quatro: do seu An�bal, do seu Joaquim l� embaixo, outro Joaquim, na Rua Iraci, e tinha a do H�lio. Meu pai era o Iraci Laurindo Pereira, fazia casa, era carpinteiro, fazia telhado. Todo mundo conhece ele, dos mais velhos. Decidiram homenagear ele com o nome de uma rua.
Era bom porque a gente brincava muito, tinha um campinho. Hoje, acabou. Tem caminh�o passando l�, acabou com a grama. Antigamente, a gente pegava o �nibus l� embaixo, tinha uma pinguela, n�o tinha ponte, n�o tinha nada. Hoje, os �nibus passam na porta. Foi melhorando. A gente pegava o c�rrego l� em cima, no Cerrad�o, e vinha descendo. Nos po�os mais fundos, a gente bebia �gua at� aprender a nadar. Dos peixes, peguei bagre, piaba, a coisa mais gostosa do mundo. Estragou tudo.
Minha casa era toda acabada por dentro, com cer�mica, tudo. Dois banheiros, quatro televis�es, computador da menina, foi tudo embora. J� tinha uns 10 anos que mor�vamos l�. Mudamos para l� no ch�o ainda. Batemos piso grosso, fomos pondo cer�mica. Comprava material, pagava, depois comprava para os outros c�modos. Moramos em piso grosso e foi arrumando. Trabalhando e arrumando.
Falei para a Lauri: 'Vai correndo com os meninos, que vou l� pegar a menininha'. Foi a hora em que fui l� (na casa ao lado) e peguei ela, a Micaele, de 3 aninhos. Ela estava assistindo � televis�o dentro da casinha dela. Ela e o irm�ozinho, que saiu correndo na frente. Fui l� e peguei ela. Se eu n�o tivesse ido l�, minha sobrinha tinha morrido. Ela abaixou e ficou olhando a lama vindo: 'A �gua t� chegando, tio'. Na hora, falei: 'Micaele, vamos embora'. Sa� correndo com ela no colo.
Eu via a lama vindo, como se fosse daqui na �rvore ali, mais ou menos uns seis, sete metros de altura de lama. Foi a conta de passar pelo port�o. A casa deles, quando olhei para tr�s, ia embora. Quando olhei para tr�s, a rua estava tampada. Foi quest�o de segundo. Tampou tudo atr�s de n�s. S� via casa e �rvore derrubando. Era um barulho tipo bomba, queimando, estourando no fogo. Como se fosse uma moita de bambu. Voc� t� doido, senti muito medo. N�o d� tempo.
A vida da gente foi embora. Muito tempo a gente pelejando para construir. Quest�o de segundo e foi tudo. Voc� gasta 10, 20 anos para construir uma casa, com todo sacrif�cio. Meu carro ficou, uma Parati 2000, a lama jogou no port�o do vizinho. E a laje do outro vizinho caiu em cima dela. A casa, os m�veis, cachorro, porco, os leit�ezinhos. No dia estava fazendo outro chiqueiro para colocar os leit�es separados da m�e. Foi tudo embora. Leit�o, gato, cachorro, passarinho.
N�o tenho nem cabe�a para pensar o que fazer. A Vale me dando a casa de volta t� bom demais. O resto, com a f� de Deus, a gente chega l�. Eu me sinto aliviado de estar vivo, minha fam�lia toda, gra�as a Deus. Quando lembro da casa � triste, voc� vendo dentro de um segundo ir embora. Se tivesse outro lugar, eu n�o estaria brigando com a Vale n�o. J� tinha ido embora, mas n�o tenho condi��o de comprar outra n�o. Complicado.”