Vocês já fizeram ou fazem algo para o qual não têm o menor talento, mas, mesmo assim, prosseguiram na intenção de se desafiarem? Eu nunca havia feito isso, mas há cerca de cinco anos, meio sem querer, comecei a dançar. Meu dote para dança é tão pouco que ainda hoje as pessoas vão para um lado e eu para outro, o que faz com que eu rotineiramente me sinta humilhada perante minhas brilhantes companheiras de turma. Mesmo assim, todos os dias eu resolvo permanecer, pois sinto que estou fazendo algo lúdico e feliz, ao mesmo tempo que se abre para mim a possibilidade de incluir novas habilidades ao meu corpo em processo de envelhecimento.
Estudando o tema, achei inúmeras pesquisas afirmando que as atividades nas quais precisamos superar desafios físicos e cognitivos ao mesmo tempo são as que mais trazem benefícios para o envelhecimento. Por exemplo, uma revisão bibliográfica publicada pela Revista Frontiers in Human Neuroscience, no ano de 2022, concluiu que são exatamente as atividades que nos exigem exercício físico e treino mental aquelas que mais apresentam efeitos na preservação das funções executivas e da memória em pessoas idosas, demonstrando que, quando corpo e mente trabalham juntos, o ganho pode ser dobrado.
Em 2025, a Revista Nature publicou um artigo que demonstrou que treinamentos cognitivo-motores interativos, tais como dançar, tocar instrumentos ou jogos de coordenação, produzem tanto melhoria na capacidade física quanto na cognição. E o significado disso é que ao aprendermos algo novo, especialmente se for algo muito difícil para nosso pouco talento, como a dança o é para mim, além de desafiarmos nosso corpo, criamos caminhos neurais inéditos, o que fortalece nosso cérebro contra o desgaste natural que o envelhecimento acarreta. Ao criarmos novas conexões neurais, acontece algo como um rejuvenescimento natural do nosso cérebro.
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Mas não é apenas a ciência que explica os benefícios de nos desafiarmos. Do ponto de vista existencial, aceitar um certo constrangimento de estar ao lado de quase a totalidade da turma fazendo algo melhor que você, é um desafio de humildade e presença. Enquanto danço, renuncio à expectativa de ser excelente em troca de me sentir inteira, de ser pura presença, eis que não há mesmo como estar em qualquer outro lugar enquanto estamos diante de algo que nos desafia. É exatamente na dança, quando a minha performance não entra em questão, que consigo sentir meu corpo com toda a liberdade que consigo dar a ele.
Certamente que não sou mais a mesma pessoa que iniciou a dança há cinco anos, pois cada passo errado me ensinou mais sobre humildade, paciência, sobre a capacidade de rir de mim mesma, de permanecer no processo mesmo quando o resultado é muito pequeno e não sou aplaudida pelo meu esforço. Foram os tropeços e desafios da dança que me mostraram que o impossível nem sempre paralisa, ao contrário, ele pode nos transformar. Afinal de contas, ainda que meu esforço semanal com a dança nunca me leve à perfeição, a criação de novas habilidades e o exercício de humildade já são mais que suficientes para me motivarem a nunca parar.