CINEMA

"Perfeição é o que se espera do corpo feminino", diz cineasta

Diretora de nova versão de "Emmanuelle" devolve à história seu viés feminista em história sobre mulher que busca ter mais prazer sem se tornar um objeto sexual

Publicidade
Carregando...


Emmanuelle. A simples menção desse nome já sugere sexo. Essa modelo francesa viaja de Paris até a Tailândia para se encontrar com o marido diplomata. Lá, ela tem diversas aventuras amorosas. É essa a “Emmanuelle” do filme de Just Jaeckin que, em 1974, provocou alvoroço mundial. O fenômeno – só em Paris o filme ficou 13 anos em cartaz – foi o horror e a glória de sua intérprete, a holandesa Sylvia Cristel (1952-2012).


O soft porn gerou dezenas de sequências, com graus variáveis de nudez e sexo. Cristel ficou tão marcada pelo papel (que interpretou uma dúzia de vezes) que não conseguiu se desvencilhar dele. Pois essa mulher não interessou em nada a diretora e roteirista francesa Audrey Diwan, que já havia falado sobre direito da escolha da mulher no celebrado “O acontecimento” (Leão de Ouro em Veneza em 2021), drama sobre o aborto.

Para criar uma versão contemporânea da história, ela partiu da personagem original, lançada em livro em 1959 por Emmanuelle Arsan (pseudônimo de Marayat Rollet-Andriane). Com estreia nesta quinta-feira (10/7), no Centro Cultural Unimed-BH Minas e no Ponteio, “Emmanuelle” coloca Noémie Merlant no papel-título.

Ela é agora solteira e viaja até Hong Kong para inspecionar um hotel de luxo que caiu no ranking mundial. O proprietário espera que a consultora entregue a cabeça da gerente-geral, vivida por Naomi Watts.


Hóspede misterioso


A protagonista é apresentada na primeira classe do voo que a leva até a Ásia. Em uma referência ao filme de 50 anos atrás, Emmanuelle faz contato visual com um homem, vai até o banheiro, onde o espera para uma transa rápida e discreta. Na saída, troca olhares com Kei (Will Sharpe), personagem que vai reencontrar no fictício Rosefield Palace Hotel – ela trabalhando, ele como o mais misterioso dos hóspedes.

Não há mais muito que contar, pois a história segue essa personagem em meio a um cenário luxuoso e irritantemente perfeito. Enquanto Kei se faz de difícil, Emmanuelle, nas horas vagas, se diverte, sem culpa, com prazeres rápidos com pessoas que cruzam seu caminho – em especial a acompanhante Zelda (Chacha Huang). O sexo é muito menos abundante do que no original, diga-se.

“Acho que é o momento certo para contar essa história. E acho também que [a busca pelo prazer] é uma grande questão na nossa sociedade, pois é uma experiência comum que tivemos na vida. Me interessam os filmes como uma experiência física”, afirma Audrey Diwan na entrevista a seguir ao Estado de Minas .

“O acontecimento” (2021) foi adaptado do livro homônimo de Annie Ernaux, vencedora do Nobel. Não deixa de ser uma escolha improvável adaptar, logo depois, “Emmanuelle”.

Mas quando o livro foi publicado na França, ele causou uma revolução feminista, já que a história original é sobre uma jovem que tentava ter mais prazer. E ela foi o tema do nosso filme, não a adaptação.

O filme [original] é não feminista, ela se tornou um objeto. Fiquei muito surpresa ao descobrir que o livro era o oposto, ainda mais porque ele foi publicado no final dos anos 1950. Foi revolucionário ter uma garota falando sobre o próprio prazer e pronta para dizer em voz alta que queria ter mais prazer.

Li que você não viu o filme original para fazer o seu. Agora, com ele já lançado, não teve essa curiosidade?

Honestamente, eu tentei. Assisti a uns 15 minutos. Era tão óbvio que pensei: “Ok, tudo bem, entendi”. Aliás, assistir ao filme hoje em dia é uma experiência diferente porque ele é datado. A outra razão [de não terminar de ver o filme] é que eu sabia que terminaria em um estupro.

À exceção de Noémie Merlant, que é francesa, seu elenco principal é todo internacional. Como foi essa escolha?

Tive uma conversa muito interessante com a diretora de elenco, Carmen Cuba, que tentou colocar novos rostos na tela e fazer as pessoas verem atores de diferentes origens. Noémie e Will Sharpe são ambos cineastas.

Foi muito útil, porque, quando você faz um filme sobre erotismo, é tudo sobre enquadramento. Onde você vai terminar o enquadramento para que as pessoas imaginem algo? E eles me ajudaram com isso.

É uma linguagem cinematográfica muito interessante porque quando fizeram o “Emmanuelle” original, a empolgação veio da ideia de ver corpos nus. Estamos em 2025 e já superamos isso. Eu queria estreitar o quadro para ver o quanto as pessoas querem imaginar.

O hotel é quase um personagem. Como foi filmar no St. Regis Hong Kong?

Eu queria que o hotel fosse como o corpo dela. É perfeito, mas tão perfeito que não há passado nem futuro. Você muda um objeto de um lugar para o outro e, no dia seguinte, ele volta ao seu lugar. Esse tipo de perfeição é algo realmente assustador e, ao mesmo tempo, lindo.

Perfeição é também o que se pede e espera do corpo feminino. Então, achei interessante usar o hotel como um espelho. Você tem que criar a imagem perfeita, e a imagem perfeita faz você temer como as pessoas vão te olhar.

Como você pode fazer qualquer conexão, se sente medo da forma como as pessoas estão te olhando? Essa ideia de desconexão, esse tipo de solidão está no meio do filme, pois acho que lindos hotéis são um enorme lugar de solidão.

As pessoas se encontram, mas não dizem nada de real sobre si mesmas. Toda a equipe ficou no hotel. Foi estranho e forte, pois todos os dias era o mesmo cheiro, a mesma perfeição, a mesma música. E nós, perdidos no espaço e no tempo, pensávamos: “Ok, realmente estamos nos sentindo como Emmanuelle”.

EMMANUELLE”
(França/EUA, 2024, 105min.) Direção: Audrey Diwan. Com Noémie Merlant, Will Sharpe e Naomi Watts. O filme estreia nesta quinta (10/7), no Centro Cultural Unimed-BH Minas (18h10) e no Ponteio (Sala 2, 16h25 e 21h15).

Tópicos relacionados:

bh cinema cultura estreia filme

Acesse o Clube do Assinante

Clique aqui para finalizar a ativação.

Acesse sua conta

Se você já possui cadastro no Estado de Minas, informe e-mail/matrícula e senha. Se ainda não tem,

Informe seus dados para criar uma conta:

Digite seu e-mail da conta para enviarmos os passos para a recuperação de senha:

Faça a sua assinatura

Estado de Minas

Estado de Minas

de R$ 9,90 por apenas

R$ 1,90

nos 2 primeiros meses

Aproveite o melhor do Estado de Minas: conteúdos exclusivos, colunistas renomados e muitos benefícios para você

Assine agora
overflay