Diogo Vilela entrevista Milhem Cortaz sobre "Diário de um louco"
Ator carioca que protagonizou montagem do texto de Gogol em 1997 conversa com o paulistano, que estreia temporada do solo na próxima quinta (17/7), no CCBB-BH
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"Diário de um louco", texto do russo Nikolai Gogol, teve uma bem-sucedida montagem em 1997, protagonizada por Diogo Vilela e dirigida por Marcus Alvisi. A peça se tornou um marco na carreira do ator carioca. Na próxima quinta-feira (17/7), estreia no CCBB-BH nova versão da peça, com Milhem Cortaz no papel de Aksenti Ivanovich Poprischin, sob direção de Bruce Gomlevsky. A peça fica em cartaz até 4 de agosto.
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A convite do Estado de Minas, Diogo Vilela e Milhem Cortaz se entrevistaram mutuamente. A seguir, você confere as respostas de Cortaz para as perguntas de Vilela.
Diogo Vilela - Milhem querido, quando você leu o texto pela primeira vez, o que sentiu?
Milhem Cortaz - Na minha primeira leitura do “Diário de um louco”, terminei completamente angustiado e cansado. Angustiado e cansado não numa sensação ruim, mas numa sensação de que eu tinha acabado de passar por uma odisseia, por uma batalha.
E essa batalha vinha de uma sucessão de raciocínios e de loopings. De pensamentos e questões da vida, o jogo com o amor e com o poder e com as classes. Terminei muito cansado e muito angustiado com a velocidade com que tudo aquilo acontecia.
E o mais legal de tudo é que tive certeza, naquele momento, de que essa história só poderia ser construída com muita sutileza e muita delicadeza. Se eu não conseguisse caminhar por esse lugar, talvez eu cansasse o público, da mesma forma que eu me sinto cansado, e não pelo tempo, por isso, mas pelo excesso de informações e de sentimentos que o texto me reportava.
Diogo Vilela - A personagem Poprischin se apresenta no começo como um simples funcionário. Como você fez a evolução dele para a loucura? O que você sentiu?
Milhem Cortaz - Na verdade, sempre entendi que o Poprischin era um personagem que se colocava como um funcionário público para se aproximar de todas as pessoas que estavam em volta dele, escutando a história dele. Nunca fiz essa divisão do funcionário para a loucura, mas fiz uma divisão que, enquanto ele se relacionava com funcionários, ele se relacionava com a plateia.
Ele tinha uma comunicação muito direta com a plateia. E o que eu vou fazendo, eu vou tirando essa comunicação da plateia e acentuando a loucura dele, ele vai se fechando para ele mesmo. E ele vai ficando dentro do seu próprio corpo, aprisionado e solitário.
Na verdade, a loucura vai deixando ele solitário. E aprisionado dentro dele. Começo a peça sem a quarta parede – conversando com todo mundo, explicando, quase numa conversa com todos e os fatos vão vindo e vão transformando, e esse cara cada vez mais vai ficando distante deles na comunicação, mas cada vez mais fechado dentro dele, e fazendo isso, um espelho da sociedade.
Diogo Vilela - Do que você mais teve receio no texto?
Milhem Cortaz - Como não fizemos nenhuma adaptação, usamos uma tradução do texto literário. Fiquei com um receio danado de que a gente não conseguisse comunicar às pessoas a erudição do texto, porque havia a dificuldade da rapidez com que a comunicação se propõe dentro da dramaturgia do texto.
Fiquei muito preocupado, com receio de que o que a gente estava querendo dizer com a peça não chegasse para as pessoas, mas chegou. Acho que quando a gente quer falar de amor, de alguma forma, todo mundo se identifica. O amor é um sentimento universal, né?
Diogo Vilela - O que você percebe hoje encenando a peça com relação ao público?
Milhem Cortaz - Estamos num período em que as pessoas, todo mundo, de alguma forma, está experimentando algum caso de saúde mental em si mesmo ou em alguém da família. Percebi que este assunto, hoje, em 2025, aproxima muito a peça do público.
As pessoas se identificam demais com o que ele está falando. Eu queria falar de amor. Acho que falar da saúde mental também é falar de amor. Apesar de a peça ter seu lado social, seu lado político, tanto no amor como nas diferenças de classe etc., acho que o que hoje a aproxima das pessoas é a discussão da saúde mental.
Diogo Vilela - Durante quanto tempo você ensaiou desde ter lido o texto até a estreia?
Milhem Cortaz - Nossa, Diogo, foi uma loucura isso que eu e o Bruce [Gomlevsky, diretor] fizemos. A gente teve um mês e meio entre pesquisas, ensaios e etc, até o dia da nossa estreia. O que eu fiz, Diogo, foi não ter medo de estrear e manter o trabalho de pesquisa durante toda essa temporada. Vou fazer desse espetáculo um grande ensaio.
Assim está sendo legal, porque está me libertando, está me tirando um pouco daquele lugar. Ensaio foi até aqui; daqui por diante, apresentação, sabe? Eu estou conseguindo mesclar os dois, não que eu não fizesse isso quando estivesse apresentando, mas esse exercício está sendo bem gostoso, assim, de não ter a vaidade, de querer contar a história e de saber que a história não está na minha mão ainda, que, a cada dia que eu fizer, vou melhorar. É um solo, e eu pretendo fazê-lo a vida inteira. Então, na verdade, foi um mês e meio até o dia da nossa estreia no Rio de Janeiro.
“DIÁRIO DE UM LOUCO”
Texto: Nikolai Gogol. Direção: Bruce Gomlevsky. Com Milhem Cortaz. Estreia nesta quinta-feira (17/7), no Teatro I do CCBB BH (Praça da Liberdade, 450, Funcionários). Sessões de quinta a segunda, às 20h. Até 4/8. Ingressos a R$30 e R$15 (meia), à venda na bilheteria e pelo site do centro cultural. Em 26/7 e 2/8 haverá interpretação em Libras.