Atriz Zahy Tentehar apresenta o solo ‘Azira’i’ neste fim de semana em BH
No espetáculo, artista nascida na reserva indígena de Cana Brava usa canções para revisitar as lembranças de sua infância e da relação com a mãe, que foi pajé
compartilhe
SIGA

Nascida no Maranhão e criada na reserva indígena de Cana Brava, Zahy Tentehar se mudou para o Rio de Janeiro aos 19 anos, em busca de novas oportunidades. Foi morar em uma ocupação no Museu Nacional dos Povos Indígenas e, a partir dali, começou a se aproximar do universo artístico – um caminho que, até então, não fazia parte de seus planos. “Nunca sonhei em ser atriz”, conta.
Leia Mais
A primeira grande virada veio em 2019, quando foi convidada para integrar o elenco da adaptação de “Macunaíma” dirigida por Bia Lessa. Logo depois, Zahy mergulhou em um projeto mais íntimo, um solo musical autobiográfico que homenageia sua mãe, Azira’i, falecida em 2021. O espetáculo leva o nome dela e parte da relação complexa entre mãe e filha.
A dramaturgia foi construída por Zahy em parceria com o diretor Duda Rios, com quem já havia contracenado na releitura do clássico de Mário de Andrade. No início, a proposta era narrar a trajetória da atriz, mas, já na sala de ensaio, ficou claro que sua história estava profundamente entrelaçada à de sua mãe. “É uma história de amor por ela. Mamãe foi pioneira”, afirma Zahy.
Mulher pajé
Azira’i foi a primeira mulher a assumir o posto de pajé, alcançando o mais alto nível de domínio espiritual da aldeia, e teve destaque também como cantora. “Na tradição, as mulheres formam o coro e os homens puxam o canto. Mas minha mãe também puxava os cantos. Na ópera tradicional, ela seria considerada uma solista”, explica.
O solo reúne cantos de lamento, ensinados por Azira’i, e composições originais criadas especialmente para a montagem. Em cena, Zahy alterna o português com o Ze’eng eté, sua língua de origem. O espetáculo retorna a Belo Horizonte neste fim de semana com três apresentações no Sesc Palladium, na sexta-feira (3/10) e no sábado.
Apesar de tratar de uma história pessoal, Zahy Tentehar considera que os temas abordados na montagem são universais. “Todo mundo tem uma relação intensa com a mãe, seja de forma positiva, seja negativa. Então, em qualquer lugar do mundo que a gente vá, ele toca as pessoas.”
Estreado em 2023, o espetáculo rendeu à artista o Prêmio Shell de Melhor Atriz. Foi a primeira vez que uma atriz indígena recebeu a honraria. Também já passou pelo Festival de Avignon, na França, onde teve boa recepção. “São muitos os temas presentes no espetáculo. É uma história que fala da relação de mãe e filha, mas também discute o aculturamento dos povos indígenas, maternidade e patriarcado”, afirma.
Segundo a atriz, o texto busca romper com visões eurocêntricas sobre os povos originários. “As pessoas partem do pressuposto de que os povos indígenas vivem apenas em harmonia com a natureza, que são os guardiões da floresta ou um povo que não evoluiu, que não tem um refinamento sobre suas criações”, diz.
“Somos um povo que sofreu o aculturamento, que sobreviveu e se adaptou à cidade e, ainda assim, conseguiu manter tradições milenares. Mesmo diante do apagamento, do genocídio, do extermínio, da escravização e da exposição dos povos indígenas, mais de 200 línguas seguem vivas no nosso país”, ressalta.
“AZIRA’I”
Solo de Zahy Tentehar. Nesta sexta (3/9), às 20h, e sábado, às 16h30 e às 20h, no Sesc Palladium (Rua Rio de Janeiro, 1.046 - Centro). Ingressos para a Plateia 1: R$ 80; Plateia 2: R$ 70 e Plateia 3: R$ 50 (inteira), à venda na bilheteria do teatro e no Sympla .