O escritor, músico e cineasta João Batista Melo, de 65 anos, toma posse nesta sexta-feira (7/11), às 20h, na Academia Mineira de Letras (AML). Ele ocupará a cadeira número 2, sucedendo a Benito Barreto, morto em março deste ano.
João Batista, que construiu grande parte de sua trajetória profissional nas áreas de marketing e comunicação social da Caixa Econômica Federal, tem produção prolífica e premiada na literatura, cinema e música.
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O escritor recebeu os prêmios Guimarães Rosa (pelo livro “O inventor de estrelas”, em 1989), Paraná (por “As baleias do Saguenay”, em 1995), Cruz e Sousa (“Patagônia”, em 1998) e Cidade de Belo Horizonte (por “As baleias do Saguenay”, em 1995, e “Malditas fronteiras”, em 2014). Sua dissertação de mestrado deu origem ao ensaio “Lanterna mágica: Infância e cinema infantil”, finalista do Prêmio Jabuti em 2010.
Na telona
No cinema, “Tampinha” recebeu o prêmio de Melhor Curta-Metragem no Festival Divercine, no Uruguai, enquanto “Sozinha com sua alma” foi eleito Best Drama no FantaSci International Short Film Festival, em Orlando (EUA).
João Batista também escreveu críticas de cinema para jornais de Belo Horizonte – entre eles o Estado de Minas – e de São Paulo.
Autor de 11 livros, dirigiu seis curtas e compôs dezenas de músicas, algumas utilizadas em seus filmes. Parte dessas composições está reunida no disco “Trilhas curtas”, lançado no ano passado, com participações de Nivaldo Ornelas e Celso Adolfo.
“Há algum tempo noto que a Academia vem tomando rumo muito interessante ao se inserir na sociedade. Foi o que motivou minha candidatura”, afirma Melo. “Esse movimento traz ares de modernidade para a instituição, que, nos últimos anos, contou com o ingresso de expoentes como Conceição Evaristo e Ailton Krenak”, acrescenta o novo imortal.
Quando João Batista foi eleito, o presidente da AML, Jacyntho Lins Brandão, destacou a carreira multifacetada do novo acadêmico e sua produção literária. “O texto dele é impecável, as frases são mágicas. É um menino que teve grande influência de Cortázar, Du Bois e Murilo Rubião”, disse.
A literatura de João Batista vai além do realismo fantástico. Seu romance mais recente, “O veludo das lagartas verdes” (Faria e Silva/ Alta Books, 2024), aproxima-se mais do naturalismo de Aluísio de Azevedo (“O cortiço”) e Adolfo Caminha (“O bom crioulo”) do que do universo extraordinário de Rubião e Cortázar.
Ambientada nas décadas de 1970 e 1980, a trama acompanha Antonio, que decide deixar sua cidade no interior de Minas para ir a Belo Horizonte em busca do filho único, que se mudou para a capital com o desejo de melhorar de vida.
Antonio se hospeda em uma pequena pensão no Bairro Lagoinha, prestes a ser demolida para a construção dos viadutos que hoje formam o complexo da região. Lá, descobre que o filho está envolvido em atividades suspeitas, provavelmente relacionadas ao tráfico, embora o livro não explicite isso. Confuso diante daquele novo e perigoso ambiente urbano, Antonio tenta um encontro com o filho na esperança de convencê-lo a voltar para casa.
Diamantina
Já em “Patagônia” (Rocco), lançado em 1998 e relançado em 2025, João Batista se inspira na literatura western. Conta a história de Otaviano, herdeiro de um fazendeiro diamantinense que descobre o assassinato do irmão, ocorrido durante assalto a trem nos Estados Unidos.
Otaviano parte para a Patagônia argentina, onde os criminosos teriam se refugiado. Lá, sua vida se cruza com interesses de representantes de grandes ferrovias, bancos e agências de detetives norte-americanos, também no encalço dos bandidos.
BH xenófoba
Seguindo estilo completamente diferente, “Malditas fronteiras” (Benvirá/Saraiva, 2014), vencedor do Prêmio Cidade de Belo Horizonte, faz um resgate histórico ao narrar a trajetória de menina cega, filha de imigrantes alemães, em meio à onda de xenofobia que marcou Belo Horizonte no período das guerras mundiais.
Durante a Primeira Guerra Mundial, estudantes da Escola de Medicina de Belo Horizonte (atual Faculdade de Medicina da UFMG) tentaram invadir o Colégio Arnaldo, acreditando que a torre da instituição abrigava um canhão apontado para a sede do governo, na Praça da Liberdade.
Na realidade, o que havia ali era a luneta usada para observar os astros. O boato, motivado unicamente pelo preconceito, surgiu porque os padres do Arnaldo eram de origem alemã. O livro de João Batista leva esses fatos para os anos 1940, durante a Segunda Guerra.
João Batista chega à AML para ocupar a cadeira cujo patrono é Arthur França com o propósito de estreitar laços entre literatura e cinema.
“Gostaria de contribuir. Contribuir como um verbo intransitivo”, afirma. “Minha carreira sempre transitou entre o cinema e a literatura, e vejo que essas duas artes mantêm conexões profundas. Não enxergo diferença entre um texto de teatro e um roteiro de filme. Ambos são peças literárias. É esse tipo de debate que pretendo levar para a Academia”, conclui Melo.
