Não é uma exposição, mas uma ocupação. Os 55 anos de história do Grupo Giramundo, criado em 1970 por Álvaro Apocalypse (1937-2003), Terezinha Veloso (1936-2003) e Madu Vivacqua, estão sendo comemorados no Palácio das Artes. A tradicional instituição cultural de Minas Gerais, que também atingiu os 55, apresenta até 26 de fevereiro a Ocupação Giramundo. Além de exposição que reúne mais de 600 bonecos do acervo do grupo, o programa reúne sessões de cinema, atividades pedagógicas e visitas guiadas. Filha de Álvaro e Terezinha, Beatriz Apocalypse é uma das diretoras do grupo. Entrevistada desta semana do “EM Minas”, programa da TV Alterosa em parceria com o Estado de Minas e o Portal Uai, Bia falou não só da ocupação, mas também do futuro do Giramundo.

A exposição do Palácio das Artes tem mais de 600 peças, mas o Giramundo já fez mais de mil bonecos, não é?
Temos, catalogados, 1,7 mil bonecos. Só que alguns se perderam ao longo do tempo por fatores diversos, como gás e cupim. A gente está fazendo agora um tratamento contínuo nas madeiras, então acredito que tenhamos uns 1,2 mil bonecos.

A exposição apresenta desde bonecos pequenininhos até gigantes. Poderia falar sobre eles?
Acho que as borboletinhas são as menores. Tem o “Mini-Teatro Ecológico”, que reúne cinco temas com bonecos muito pequenininhos. Já na entrada do Palácio das Artes a gente colocou um Cavalo de Troia, que vem de um desfile de bonecos gigantes. Chama Torres Andantes, com um boneco de 5 metros de altura que pedala. Os bonecos foram construídos em cima de um chassi de carro.

Você é atriz, manipuladora, mas também está na gestão do grupo. Como é que se divide?
Na direção estamos eu, o Marcos Malafaia e Ulisses Tavares. Agora estamos com um super gestor, o Rômulo Avelar. Ele vem treinando a gente para que, aos poucos, possamos ir para a parte que mais gostamos, que é a criação, o desenho, a oficina. Eu amo o palco, me afastei algumas vezes até para dirigir.

Pois é, recentemente você esteve no elenco de “Alice no País das Maravilhas”...
Eu estava fazendo a iluminação (do espetáculo), mas resolvi ir para o palco manipular, pois isso me traz uma felicidade muito grande. É o que mais gosto de fazer.

O palco traz também toda a história do seu pai, o Álvaro Apocalypse. E hoje traz outra vertente de sua família, que são os filhos...
No palco estivemos eu e mais três filhos: o Mário, Miguel e o Álvaro, o caçula, de 11 anos, que estreou no Palácio das Artes. Tem ainda o Gabriel, que está cuidando da parte de vídeo do Giramundo. Então tem todo o envolvimento da família.

Qual é o grande desafio hoje do Giramundo?
Com esse projeto com o Palácio das Artes, fizemos o laudo técnico com restauradora e museóloga. O maior desafio é restaurar e laudar todo o acervo. Laudar é fazer uma ficha com o material que foi usado, o tipo de pano, quem construiu, como se fosse a carteira de identidade (do boneco). Nós laudamos 400 e estamos pensando em um projeto que permita laudar todo o acervo. Aí vou ficar tranquila.

Conta para a gente um pouco da história do surgimento do Giramundo
Vou contar como meu pai contava para a gente. Desde pequeno, ele tinha contato com bonecos porque a minha avó, mãe dele, era professora de uma escola municipal em Ouro Fino. Ela fazia bonecos recortadinhos no papel, com articulações, para ensinar às crianças diversos temas. Ele os chamava de ‘hominho’. Em 1969, minha mãe ganhou uma bolsa para estudar Belas Artes em Paris. Foi lá que eles tiveram contato com o teatro de bonecos, pois, na época, isso estava fervilhando. Em 1970, quando voltaram, resolveram fazer bonecos para brincar com as crianças. Fizeram ‘A Bela Adormecida’. Então, meu pai, minha mãe e a Madu (Maria do Carmo Vivacqua Martins) criaram o Giramundo. A primeira apresentação foi no quintal de casa, em Lagoa Santa, para mim, os primos e vizinhos. Um amigo que viu, falou: ‘Vamos para Belo Horizonte’. Eles ficaram animados e a primeira apresentação de “A Bela Adormecida” foi no Parque Municipal, em 1971. Esses bonecos, inclusive, estão lindos na exposição.

Você se vê fazendo outra coisa?
Não tive nem tempo de pensar em outra coisa. Às vezes as pessoas me perguntam: ‘Se você não fosse do Giramundo, o que seria?’ Não consigo nem imaginar. Entrei, de fato, para o grupo em 1985 para fazer uma pequena substituição em um espetáculo no Francisco Nunes, “O Auto das Pastorinhas”, espetáculo de Natal. Papai e mamãe falaram: ‘só dessa vez, só este espetáculo’. E estou aqui até hoje.

Siga nosso canal no WhatsApp e receba notícias relevantes para o seu dia


O Giramundo é referência não só em Minas Gerais, mas no Brasil e fora, com uma tradição de confecção de bonecos que alinhavam literatura, história e clássicos. Isso é sensacional...
A gente tem uma história com espetáculos que percorrem vários temas. Desde os clássicos como “A Bela Adormecida”, as óperas “O Guarani” e “A flauta mágica”, até os últimos, que contam um pouquinho da música e da história de Bach e Beethoven. O boneco não tem limite. E ele traz isso para a gente, que se sente fortalecido para criar várias histórias. Temos bonecos muito pequenos, gigantes, leves, pesados. São várias técnicas: marionete, fantoche, boneco habitável, que é como chamamos aquele em que a gente entra, é muita diversidade. Tem técnicas que a gente não sabe nem o nome. Quando estávamos fazendo o laudo dos 400 bonecos, às vezes nos pegávamos pensando: ‘Que técnica é essa?’ Porque são muitas técnicas, mista, de balcão, de chão. E algumas, criadas através de muita pesquisa, tivemos até mesmo que criar o nome. 

compartilhe