“Caso isso entre em vigor, realmente pode colapsar o setor. Nós vamos ter o fechamento de muitas indústrias e, com isso, vêm demissões. Todos os investimentos já estão em fase de suspensão. Nós também vamos ter queda na arrecadação de impostos.” O alerta foi dado por Fausto Varela Cançado, presidente do Sindifer (Sindicato da Indústria do Ferro no Estado de Minas Gerais), a respeito do tarifaço de 50% sobre os produtos exportados pelo Brasil para os Estados Unidos a partir de 1º de agosto. A entidade representa as usinas produtoras de ferro-gusa do estado, além do Espírito Santo e Mato Grosso.
Leia Mais
Para se ter ideia da importância das exportações mineiras de ferro-gusa para os Estados Unidos, entre janeiro de 2021 e junho de 2025, a matéria-prima usada para a produção de aço e ferro fundido foi o segundo principal produto da nossa pauta, somando quase US$ 4 bilhões (R$ 22 bilhões), segundo dados do Comex Stat, o sistema oficial para consulta e extração de dados do comércio exterior brasileiro.
Em 2024, Minas Gerais produziu 3,8 milhões de toneladas de ferro-gusa. Desse volume, 68,4% foi exportado, cerca de 2,6 milhões de toneladas. Do total exportado pelo estado, 84,8% foi destinado ao mercado americano, aproximadamente 2,2 milhões de toneladas. Minas Gerais “faturou” cerca de US$ 1,2 bilhão (R$ 6,7 bilhões) com a exportação de ferro-gusa para outros países, sendo que quase US$ 1 bilhão (R$ 5,5 bilhões) vieram dos Estados Unidos.
Nos seis primeiros meses de 2025, a participação da exportação de ferro-gusa está ainda mais significativa: da produção mineira de 1,8 milhão de toneladas da matéria-prima, 70% foi destinada à exportação para outros países, cerca de 1,3 milhão de toneladas. Já a participação do total destinado aos Estados Unidos aumentou para 89%. “São números que impactam significativamente. Veja a dependência que nós temos com a exportação para os Estados Unidos. É o nosso principal comprador”, afirmou o presidente do Sindfer.
Na visão de Cançado, a exportação do ferro-gusa para os Estados Unidos pode ir a zero. “É uma situação nova, nós vamos ver como é que vai ser. Mas, pela suspensão que já deram agora, no curto prazo, a gente pode imaginar o que poderá vir, que é uma suspensão total”, disse o presidente do Sindfer, se referindo à recente suspensão do embarque de ferro-gusa por importadores americanos.
Na análise do representante dos produtores de ferro-gusa, ninguém vai querer pagar 50% de tarifa simplesmente porque não existe margem para repassar isso: “Se, por acaso, essa tarifa entrar em vigor, nós perdemos a competitividade. O nosso produto perde competitividade nos Estados Unidos.”
De acordo com Cançado, o setor gera cerca de 10 mil postos diretos de trabalho, além de 32 mil indiretos, número que chega a 62 mil se considerar a indústria da silvicultura, que fornece carvão vegetal de floresta plantada para os fornos.
“Fala-se muito em redirecionamento do produto. Mas, no nosso mercado, é muito difícil. Ele é muito bem definido, quem vende para quem. Nós não vendemos um produto de massa, um produto de consumo. Nós vendemos uma matéria-prima específica para setores. Não há aumento de demanda lá na frente que possa justificar eles comprarem agora. Eles não vão comprar para fazer estoque”, afirmou Cançado. Para ele, um redirecionamento de curto prazo é praticamente impossível, assim como fazer isso a médio e longo prazo é muito difícil porque o caixa das empresas não suporta esperar.
Setor cafeeiro está mais confiante
O produto mais exportado por Minas Gerais para os Estados Unidos entre janeiro de 2021 e junho de 2025 é o café, que somou cerca de US$ 5,6 bilhões (R$ 31,5 bilhões), segundo dados do Comex Stat. O momento vivido pelo café no mercado global — de produção em queda e demanda crescente — dá mais confiança ao setor.
De acordo com Sérgio Meirelles Filho, presidente do Sindicafé (Sindicato das Indústrias de Café do Estado de Minas Gerais), quem vai pagar por esta tarifa de 50% é o consumidor americano. “Eu acho que os Estados Unidos vão abrir exceções porque ele é o maior consumidor do nosso café”, explicou.
Na safra 2024/2025, os Estados Unidos compraram 16,5% das exportações brasileiras de café. O Brasil exporta 8 milhões de sacas do grão para aquele país, que corresponde a um terço do consumo americano. Para Meirelles, não existe ninguém para fornecer esse volume do grão para substituir as exportações brasileiras. “Outra coisa, o pessoal de lá, os torrefadores, as associações de torrefadores de café dos Estados Unidos, estão apavorados. Seria um aumento muito grande depois de um aumento de preço significativo”, analisou.
Outro aspecto que dá confiança a Meirelles quanto a um acordo para derrubar o tarifaço, pelo menos no setor cafeeiro, é o quanto os Estados Unidos lucram com o beneficiamento do grão: “Com US$ 1 que eles importam de café, fazem no final da cadeia US$ 43. É um ganho enorme. Imagina o que vai ser de inflação, o que vai ser isso de taxação para o exportador, capital de giro, que eleva muito, e já está um produto caro. O café está numa posição muito boa. Claro, vai ser ruim, vai ser estressante.”
O presidente do Sindicafé afirma que vai esperar as coisas acontecerem antes de tomar qualquer medida. “Você não sabe. Quando o Trump falou da taxa de 50%, eu achei que no outro dia o mercado iria cair. A primeira taxa que ele falou para o Brasil foi de 10%. Como o segundo exportador deles é o Vietnã, com taxa de 46%, e a Colômbia, com 10%, estava ótimo para nós. Agora virou tudo. Hoje o Brasil está com 50%, o Vietnã com 20% de taxa e a Colômbia com 10%, ameaçando 25%. Quer dizer, a Colômbia ainda está indefinida, mas, se for 25% na pior das hipóteses, ainda é metade da nossa taxa”, concluiu.
Siga o nosso canal no WhatsApp e receba notícias relevantes para o seu dia