MEDICINA CARDIOVASCULAR

Menor marca-passo do mundo é implantado pela primeira vez em BH

Dispositivo do tamanho de uma cápsula de remédio foi implantado em um paciente de 84 anos no Hospital Madre Teresa, na Região Oeste de BH

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Dentro de uma cápsula de apenas 20 milímetros de comprimento e dois gramas está o que há de mais avançado na medicina cardiovascular. Pequeno no tamanho, mas gigante em tecnologia, o Micra – considerado o menor marca-passo do mundo – foi implantado pela primeira vez em um paciente de Belo Horizonte. O procedimento, considerado minimamente invasivo, foi realizado no Hospital Madre Teresa, no Bairro Gutierrez, na Região Oeste da capital mineira, em março deste ano.

A façanha foi conduzida pelo especialista em eletrofisiologia cardíaca Daniel Soares Sousa, que acompanha de perto os primeiros passos dessa tecnologia no Brasil. Aos 84 anos, o paciente que recebeu o dispositivo se tornou o primeiro da capital a carregar no peito o futuro da estimulação cardíaca. “Os marca-passos tradicionais têm benefícios, mas não são isentos de complicações. Agora, temos um novo dispositivo, um procedimento minimamente invasivo, que diminui possíveis complicações”, conta o médico.

Desde a década de 1950, os marca-passos salvam vidas ao estimular o coração que não bate como deveria, condição chamada de bradicardia, que causa sintomas como cansaço, desmaios, falta de ar, fraqueza e até confusão mental. O dispositivo corrige essa falha elétrica no coração, mas, algumas condições de saúde, como era o caso do paciente do Hospital Madre Teresa, tornam arriscado o uso do marca-passo convencional.

O paciente de BH tinha histórico de câncer, imunossupressão e uso de cateter venoso de longa permanência, fatores que tornavam o implante de um marca-passo tradicional um risco de infecção e outras complicações, já que ele precisa ser implantado com fios e uma pequena bateria alojada sob a pele, geralmente perto da clavícula.

“Não é um procedimento para todos os pacientes. A gente precisa saber selecionar bem. Existem situações específicas em que o risco de infecção ou complicações com o marca-passo tradicional é muito alto”, resume Sousa.

Estudos recentes, como o publicado no Journal of the American College of Cardiology (JACC), revista científica dos Estados Unidos referência mundial em cardiologia, mostram que, embora a taxa média de infecção em implantes convencionais seja inferior a 2%, pacientes com comorbidades como disfunção renal podem ter até 50% mais risco de complicações.

A recuperação do paciente de BH foi rápida, e a resposta clínica, visível logo após o procedimento, conta o especialista. Sintomas como cansaço e fraqueza deram lugar a mais disposição, qualidade de vida e, principalmente, segurança. "Ele ficou muito agradecido. Foi um trabalho multidisciplinar, todos se empenharam muito para que esse procedimento acontecesse", acrescenta o médico.

Diferenças entre os marca-passos

O modelo tradicional de marca-passo tem entre 20 e 30 gramas e é um pouco maior que uma moeda de um real. Ele é composto por uma bateria e fios finos que levam os estímulos elétricos até o coração. A implantação é feita por meio de incisões no tórax, e o aparelho fica posicionado entre o músculo do peito e a pele. Essa peça, implantada na região da clavícula, logo abaixo da pele, se conecta ao coração por meio desses fios.

Ali, eles funcionam tanto como sensores quanto como estimuladores. Quando percebem um intervalo anormal entre os batimentos, enviam um impulso elétrico para corrigir o ritmo. “É um método seguro e eficaz, mas que exige cuidados especiais, especialmente em pacientes mais vulneráveis. Há complicações por infecção do dispositivo, como o eletrodo é um fio, pode provocar trombose na veia, por exemplo”, explica médico Daniel Soares Sousa.

O Micra representa uma mudança importante nesse cenário. O dispositivo, desenvolvido pela Medtronic, elimina os fios e a bateria externa. Ele é colocado diretamente no coração por um acesso pela veia da perna. Uma vez lá dentro, se fixa com pequenos ganchos, que mantêm o aparelho estável por até 12 anos, tempo de duração aproximada da bateria. "Ele foi transformado em um dispositivo do tamanho de um comprimido, não ficando com nenhum dispositivo na veia. Não tem incisão, não dá ponto, nem sutura. É um procedimento minimamente invasivo", conta Sousa.

O eletrodo, neste caso, é um pequeno ponto na superfície metálica. Como nos outros marca-passos, ele recebe as informações dos batimentos cardíacos e responde a elas em caso de anormalidades. Essa fixação direta reduz riscos de infecção e complicações vasculares. “O controle é feito eletronicamente, sem necessidade de novas cirurgias. Nos primeiros 12 meses após o implante, o acompanhamento médico é feito a cada três meses. Depois, passa a ser semestral”, explica o médico.

O custo, porém, é cinco vezes maior do que o marca-passo tradicional. O valor do Micra é, em média, R$ 125 mil, por procedimento, contra os R$ 25 mil dos modelos tradicionais. No caso do paciente mineiro, as despesas foram cobertas pelo plano de saúde.

A inovação, além de médica, para Sousa, também é simbólica e combate o estigma ainda presente entre pacientes que associam o uso do dispositivo a limitações na vida dos pacientes. “Ainda temos muitos muitos em relação aos marca-passos. Esse novo desmistifica isso. Ele é imperceptível, ao contrário do tradicional, que é um gerador de pulsos, e quando o paciente passa a mão, ele percebe o dispositivo”, disse. Para ele, ao oferecer um procedimento menos invasivo e com menos cicatrizes, há melhora na saúde física e bem-estar psicológico de quem precisa do dispositivo.

Formação e disseminação da tecnologia

O dispositivo é utilizado em outros países desde 2016 e já teve mais de 300 mil implantes realizados em todo o mundo. No Brasil, o Micra chegou em 2022 e, até o momento, cerca de oito pacientes já receberam o dispositivo. O procedimento realizado em BH se soma aos primeiros passos dessa caminhada.

Por enquanto, o Micra ainda não está incorporado ao rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) nem ao Sistema Único de Saúde (SUS). Apesar da barreira financeira, a expectativa dos especialistas é que, como outras tecnologias inovadoras da medicina, o Micra seja, em algum momento, disponibilizado também no sistema público. “Isso certamente vai acontecer, como já vimos com outras inovações. A tendência é que, com o tempo, o custo caia e mais pessoas possam ser beneficiadas”, acredita Daniel.

O avanço da nova geração de marca-passos no Brasil é acompanhado de perto por um grupo de médicos, entre eles o próprio Daniel Soares Sousa, que além de realizar procedimentos, também tem participado de congressos, cursos e treinamentos para disseminar a técnica no país. 

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Segundo ele, o objetivo agora é fazer com que clínicos, cardiologistas e profissionais de saúde em geral conheçam essa nova possibilidade terapêutica. “Temos promovido cursos em simuladores, além de visitas a cidades onde há pacientes candidatos, para fazer o procedimento assistido. É um trabalho de educação continuada que vai além do consultório”, destaca.

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