Mortes e violência sexual preocupam população em cidades do Alto Paranaíba
Grandes cidades da região têm índices mais altos que a média nas duas formas de delitos. Migração e avanço de organizações criminosas são desafio para o combate
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Siga noOs fluxos de imigrantes para atuar como mão de obra do agronegócio e da mineração, ocupando e abrindo mais áreas periféricas, se refletem fortemente na criminalidade das maiores cidades da região mineira do Alto Paranaíba, ao mesmo tempo em que há uma pressão do tráfico de drogas impulsionada pelo crescimento da presença do crime organizado transnacional em Patos de Minas, Patrocínio e Araxá. A análise por especialistas em segurança pública sobre os índices de homicídios e da criminalidade organizada é parte do mapeamento feito pela reportagem do Estado de Minas sobre numeros do banco de ocorrências de 2024 da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), cruzados com dados populacionais do censo de 2022 do IBGE para os 72 municípios de Minas Gerais que ultrapassam 50 mil moradores.
Os crimes sexuais e assassinatos são desafios de segurança mais presentes dentro da chamada criminalidade violenta registrada na região em 2024. Enquanto as 72 cidades com mais de 50 mil habitantes de Minas Gerais registraram, no conjunto, os estupros de vulneráveis como 8,2% dos crimes violentos, no Alto Paranaíba o índice chegou a 17,5%. Lá, as ocorrências de homicídios totalizaram 8,7% de representatividade, contra 6,8% na soma dos grandes centros do estado.
Patos de Minas é o destaque negativo nessa região em relação a homicídios. A cidade de 159.235 habitantes tem uma taxa de assassinatos de 15,7 por grupo de 100 mil pessoas, superior à média das maiores cidades do estado, que é de 13,4 por 100 mil habitantes. Dentro da listagem mineira, é o 31º município onde mais se cometeram assassinatos.
“O que se observa no Alto Paranaíba, sobretudo nas grandes cidades, é o aumento de crimes contra o patrimônio e homicídios, com a chegada de uma organização criminosa transnacional. Chegou em meio a uma realidade de tráfico local fragmentado, e a palavra de ordem para estabelecer seu domínio é matar”, afirma o coronel Carlos Júnior, especialista em inteligência de Estado e segurança pública, com base em informações de chefes e ex-chefes das forças de segurança da região.
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Falta de estrutura e policiamento
As condições de vida precárias nas periferias sem abrangência de infraestrutura social e policiamento condizente também tiveram impactos negativos na criminalidade local. “O agronegócio – como as lavouras de café – ainda não está totalmente mecanizado e precisa de mão de obra barata que vem de outros municípios e de outros estados. Esses trabalhadores vão ocupar periferias desestruturadas, onde o uso e o tráfico de drogas têm disparado. Os crimes passionais continuam em níveis historicamente condizentes. Mas os homicídios e tentativas relacionados ao tráfico e ao crime organizado dispararam. Não se observou ainda o domínio completo do crime organizado, mas há essa pressão, e as lideranças e seus pistoleiros encontram margem para agir mesmo quando detidos, contando com uma estrutura jurídica própria e um sistema de Justiça no qual a regra tem sido a liberdade do criminoso para reincidir”, avalia o coronel Carlos Júnior.
Apesar disso, considerando os três maiores municípios da região, a taxa de crimes violentos chega a 116,9 e a de vítimas de homicídios a 10,2 por grupo de 100 mil habitantes, ambas mais baixas que os índices estaduais. A média de idade das vítimas de homicídios é de 36,6 anos. Os bairros com mais registros de pessoas mortas, todos em Patos de Minas e com 2 mortes cada, são o Distrito Industrial 2, Jardim Esperança, Jardim Paulistano e Nossa Senhora Aparecida. As cenas de crime mais frequentes foram no interior das casas (40,5%) e vias de acesso públicas (37,8%).
Menos habitantes, mais criminalidade
A Sejusp informa que utiliza atualmente dados brutos para registrar ocorrências em municípios com população entre 50 mil e 100 mil habitantes. Seguindo esse critério, a região do Alto Paranaíba tem apenas Patrocínio, com 89 mil habitantes, entre os municípios pesquisados. Cidade que registrou 101 crimes violentos e seis homicídios. As ocorrências violentas e, geral foram 13,6% menos numerosas do que em Araxá (111 mil habitantes), sendo que o número de assassinatos foi o mesmo nas duas cidades em 2024, com seis pessoas mortas.
Nos três municípios do Alto Paranaíba avaliados, os meios de matar mais utilizados foram as armas de fogo (51,4%), armas brancas (37,8%) e enforcamento (5,4%). As razões mais frequentes foram as brigas ou atritos (16,2%), o envolvimento com drogas ou tráfico (10,8%) e motivos passionais (10,8%). A maior parte das vítimas não teria relacionamento com seus assassinos em 36,8% dos casos, mas eram amigos ou conhecidos em 26,3%, cônjuges ou companheiros em 15,8% e avós em 5,3% das ocorrências.
Entre os crimes violentos nos municípios, os mais numerosos foram o roubo (39,8%), estupro de vulnerável (16,1%), tentativa de assassinato (15,7%), homicídio (8,7%) e tentativa de roubo (6,7%). As armas de fogo foram o principal meio de cometimento dos crimes (26,2%), seguidas pela arma branca (18,4%), ameaça (12%) e agressão física desarmada (8,7%).
Os crimes se deram na maior parte das vezes nas vias de acesso públicas (31,9%), nas casas (25,8%) e postos de combustíveis (3,9%). Os bairros com maior quantidade de crimes violentos foram o Cristo Redentor (4%) e a Nova Floresta (2,8%), em Patos de Minas, e o Serra Negra (2,8%) e o Marciano Brandão (2,3%), em Patrocínio.
Monitoramento e enfrentamento
A Sejusp afirma que as forças estaduais de segurança monitoram cotidianamente os índices de criminalidade dos 853 municípios mineiros, “em busca de estratégias integradas que possam reduzir os impactos da ação criminosa em todo o estado, por meio de ações preventivas, repressivas e ostensivas voltadas para coibir homicídios e demais crimes violentos”. Segundo a secretaria, destaca-se a atuação do método Igesp (Integração da Gestão em Segurança Pública), que tem como foco o combate a crimes contra o patrimônio. Análises das estatísticas criminais feitas pelo Observatório de Segurança Pública, identificam as áreas com índices de criminalidade mais altos, conhecidas como “zonas quentes”.
Para enfrentar crimes contra a pessoa, sobretudo os homicídios, a pasta destaca o trabalho repressivo e preventivo realizado pela Polícia Militar, com as Patrulhas de Prevenção a Homicídios e a Gestão de Desempenho Operacional (GDO). “Elas são iniciativas voltadas para o mapeamento de locais de ação de infratores, que têm tendência para o acontecimento de crimes, com o objetivo de promover uma repressão qualificada dos atos criminosos”, informa a Sejusp.
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A secretaria acrescenta que a Polícia Civil de Minas Gerais é responsável pela investigação dos crimes, integrando as forças de segurança, o Ministério Público e o Poder Judiciário. “A criação da Agência Central de Inteligência (ACI) da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública é outra importante iniciativa que veio potencializar e agilizar o compartilhamento de informações para ampliar o cerco ao crime”, afirma a Sejusp. A ACI coordena a inteligência dos órgãos públicos e é a responsável pelo mapeamento de organizações criminosas.
A Sejusp avalia que, na comparação entre diferentes realidades, os municípios devem guardar entre si correlação econômica, social, ambiental, além de ser observada a Região Integrada de Segurança Pública (Risp) à qual cada um pertence. “As Risps são estruturadas com base nos indicadores de criminalidade historicamente acompanhados pela Sejusp, com objetivo de promover um amplo e irrestrito combate à criminalidade no estado, de forma regionalizada.” Outro fato importante é o nível de engajamento municipal na manutenção da segurança pública, com instrumentos como as guardas municipais.