"SEM JUSTIFICATIVA"

Cadeirante denuncia motorista de Uber por capacitismo

A jornalista cadeirante Bruna Buzette teve sua corrida de Uber cancelada sem explicação e alega discriminação contra as pessoas com deficiência

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A jornalista Bruna Buzette, de 31 anos, denuncia que teve uma corrida cancelada por um motorista da Uber na noite da última quarta-feira (6/8), em Belo Horizonte. Segundo ela, assim que o motorista a avistou de longe em sua cadeira de rodas,  ele parou do outro lado da rua, olhou, cancelou a corrida e foi embora - sem qualquer justificativa ou contato.

O episódio, embora breve, traz à tona uma questão muito mais profunda: o preconceito silencioso e rotineiro que pessoas com deficiência enfrentam diariamente. O capacitismo, termo que define atitudes discriminatórias em relação a pessoas com deficiência, se manifesta, muitas vezes, de forma não verbal, como neste caso. A recusa em prestar o serviço revela uma forma de exclusão e preconceito.

"Ele me viu, fez sinal que iria parar mais à frente e simplesmente foi embora. Não tive chance de me identificar. Só fiquei ali, parada, tentando entender o que tinha acontecido. Eram mais de 22h. E se eu estivesse sozinha?", relata Bruna, indignada. No momento do ocorrido, a jornalista estava acompanhada de um colega de trabalho.

A jornalista explica que denunciou o caso diretamente pelo aplicativo e ainda aguarda retorno da Uber. Segundo Bruna, a denúncia foi feita como usuária da plataforma, e não com a intenção de expor o motorista: "Minha intenção nunca foi punitiva. Não quero linchamento. O que eu quero é provocar reflexão. Alertar. Educar. Mostrar que esse tipo de comportamento precisa acabar. Não dá mais pra fingir que não vemos isso".

A Uber também foi procurada pela reportagem que informou o teor da denúncia com dia, local e horário da ocorrência. No entanto, a assessoria da plataforma de transportes alegou que precisaria dos dados pessoais da passageira para se posicionar sobre o assunto. "Não foi possível verificar o caso porque, até o momento, não foram fornecidas à empresa informações suficientes para confirmar a relação da ocorrência com a plataforma da Uber  e, consequentemente, emitir posicionamento sobre as medidas adotadas", informou a empresa por meio de nota. 

Luta por direitos

Bruna é fundadora do portal Falei, Tô Leve!, um espaço que promove o debate sobre acessibilidade e inclusão. O episódio, que está sendo usado por ela como ferramenta de conscientização, representa apenas uma entre as muitas batalhas que enfrenta cotidianamente, tanto como jornalista quanto como pessoa com deficiência. "Falo porque preciso. Falo por quem não tem voz", afirma.

"Eu trabalho, eu estudo, eu pago meus impostos. Eu mereço respeito. A minha cadeira não me torna inferior. Ela me dá autonomia. É hora da sociedade entender isso". 

De acordo com Bruna, o que mais a preocupa é o quanto essa exclusão é normalizada: "As pessoas veem como algo pequeno. Um cancelamento, só isso. Mas não é só isso. É o direito de ir e vir sendo violado. É o medo de estar sozinha numa calçada à noite. É a humilhação de ser ignorada como se nem existisse".

"Estamos em 2025 e ainda tem gente que desmarca uma corrida só porque vê uma pessoa numa cadeira de rodas. O que dói não é só o cancelamento, mas o que ele representa. Ainda existe uma recusa em lidar com o diferente, como se fôssemos um problema".

Bruna já enfrentou outras situações semelhantes, como motoristas que se recusam a embarcá-la alegando que os veículos usam gás e não têm espaço para a cadeira de rodas - justificativas que, segundo a jornalista, não correspondem à realidade na maioria das vezes.

"Já ouvi de tudo. Que meu corpo não cabe, que a cadeira não vai junto, que o carro não é apropriado. Mesmo na verdade é só uma forma de dizer: 'não quero te levar'".

O que diz a lei sobre as pessoas com deficiência?

A atitude do motorista contraria o que determina o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), que proíbe qualquer forma de discriminação e garante o direito de acesso a bens e serviços, públicos ou privados. Impedir ou dificultar esse acesso, por qualquer motivo relacionado à deficiência, pode ser enquadrado como crime.

O que precisa mudar?

Bruna destaca que as empresas de transporte por aplicativo precisam oferecer treinamentos específicos sobre acessibilidade e respeito à diversidade. Mas não só isso: é preciso que toda a sociedade reveja seus preconceitos enraizados.

"O capacitismo não está só no motorista que me ignorou. Está em quem acha isso normal. Está em quem me chama de guerreira por trabalhar. Eu não sou inspiração. Sou só uma pessoa vivendo minha vida, como qualquer outra".

A mineira segue comprometida em transformar situações de dor em conscientização. Com seu portal, suas matérias e sua presença nas redes e na imprensa, ela acredita que é possível pavimentar um caminho mais inclusivo - para ela e para as gerações futuras.

"Faço isso por mim, mas também por quem está nascendo agora e vai precisar desse espaço. Não quero que ninguém passe pelo que eu passo quase todos os dias".

O caso está sendo acompanhado por entidades ligadas aos direitos das pessoas com deficiência, e espera-se que a Uber se manifeste em breve. Enquanto isso, a luta de Bruna continua dentro e fora das plataformas digitais.

Capacitismo: o que é?

Capacitismo é o preconceito ou discriminação contra pessoas com deficiência, baseado na ideia de que elas são inferiores, menos capazes ou menos valiosas que as demais. Ele pode se manifestar em falas, atitudes ou estruturas sociais que impedem ou dificultam a plena participação dessas pessoas na sociedade.

O que diz a lei?

A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (13.146/2015) determina que toda pessoa com deficiência tem direito ao acesso igualitário a bens, produtos e serviços. Negar esse direito, direta ou indiretamente, pode configurar crime de discriminação, com penas que incluem multa e até prisão.

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Como denunciar?

Plataformas como Uber e 99 possuem canais internos de denúncia para casos de discriminação ou acessibilidade. Além disso, o Ministério Público, a Defensoria Pública e órgãos como a Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos podem ser acionados.

Portal Falei, Tô Leve!

Criado por Bruna Buzette, o Portal Falei, To Leve! reúne informações, relatos e conteúdos sobre acessibilidade, inclusão e direitos das pessoas com deficiência. O espaço também acolhe denúncias e promove debates sobre temas urgentes que afetam essa parcela da população.

*Estagiária sob supervisão da subeditora Jociane Morais 

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