Os processos licitatórios para o tratamento das águas da Lagoa da Pampulha, em Belo Horizonte (MG), são alvo de uma operação da Polícia Federal (PF) com apoio do Ministério Público Federal na manhã desta terça-feira (23/9). 

A Operação Otacílio apura crimes ambientais e cumpriu três mandados de busca e apreensão, sendo um deles na Diretoria de Gestão de Águas Urbanas (DGAU) da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH).

Segundo a PF, foi determinado o bloqueio de mais de R$ 400 mil em valores em nome de um servidor público investigado. O valor é referente a transações bancárias suspeitas de caracterizarem pagamento de vantagem indevida. O servidor também foi suspenso do cargo.

O inquérito policial investiga ilícitos na execução de contratos firmados com base em uma inexigibilidade de licitação questionada, destinados ao tratamento e recuperação da qualidade das águas da Lagoa da Pampulha, que é patrimônio cultural tombado pelo Iphan.

De acordo com a Polícia Federal, os contratos envolvem o uso de R$ 7,5 milhões em técnicas de biorremediação (limpeza com organismos vivos) combinada com o sequestro de fósforo, cuja eficácia também está sendo investigada. A gestão dos recursos foi de responsabilidade da DGAU/PBH.

Ainda conforme a polícia, são constatados indícios de crimes como organização criminosa, prevaricação, corrupção ativa, fraude à licitação e crimes ambientais.

Contrato sem licitação

O contrato assinado pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) para a limpeza da Lagoa da Pampulha, com um custo anual de R$ 22,5 milhões, foi feito sem licitação, em uma continuidade de serviços que ocorrem desde 2015. O contrato faz parte das investigações apuradas na Operação Otacílio.

Em novembro de 2023, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigou contratos para a limpeza do espelho d'água foi finalizada na Câmara Municipal de Belo Horizonte. O relatório final pediu o indiciamento das prefeituras de Belo Horizonte e Contagem, do diretor de Gestão de Águas Urbanas da Secretaria Municipal de Obras e Infraestrutura (Smobi), Ricardo Aroeira, e do consórcio Pampulha Viva.

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O documento também pedia o indiciamento da Companhia de Saneamento e Abastecimento de Minas Gerais (Copasa), do ex-secretário de Meio Ambiente da capital, Mário Werneck, e o atual secretário de Governo da cidade, Josué Valadão. O texto foi rejeitado em um placar de 4 votos contra 3. No dia seguinte, os vereadores poderiam votar um texto alternativo, modificado por Flávia Borja (Progressistas), mas o relatório foi retirado de pauta.

Uma nova comissão foi solicitada, mas a Prefeitura de Belo Horizonte pediu a suspensão e a Justiça acatou. Em nota, a presidência da Câmara afirmou que é dever do Legislativo defender sua função fiscalizatória e os trabalhos de qualquer CPI. Gabriel Azevedo (à época sem partido) destacou que a casa reitera seu compromisso com a legalidade e a transparência de suas atividades e questionou os esforços da prefeitura para suspender a comissão. 

“A Procuradoria do Poder Legislativo adotará, tão logo seja intimada, as medidas jurídicas apropriadas contra a decisão proferida, de modo a assegurar o dever constitucional de fiscalização desta Casa Legislativa [...] Posto isso, a cidade de Belo Horizonte merece uma conclusão das investigações sobre a Lagoa da Pampulha e estranha a Prefeitura estar tão empenhada em impedir essas apurações”, diz trecho da nota. (Com informações de Bernardo Estillac)

O outro lado

Em nota, a Prefeitura de Belo Horizonte informou que apresentou todos os documentos de que dispunha à Polícia Federal e que continua à disposição para todos os esclarecimentos necessários.

“A PBH prima pela transparência em todos os seus atos e está democraticamente aberta para o escrutínio de todas as instituições do Estado e da sociedade civil”, afirmou a gestão municipal.

Questionada sobre a dispensa de licitação, a gestão disse que a inexigibilidade de licitação é um instrumento previsto no artigo 74 da Lei 14.133/2021, a nova Lei das Licitações.

À reportagem, a PBH também justificou que a empresa contratada é a única autorizada pelo Ibama a usar o produto considerado como o mais eficaz para o tratamento da água da Lagoa da Pampulha, chamado Phosock, de origem australiana.

“Vale lembrar que no período que o contrato foi suspenso - de setembro de 2023 a fevereiro de 2024 - a qualidade da água caiu, segundo análise técnica a partir de dados da Copasa. O que demonstra a importância e eficácia do produto”, diz o comunicado.

Ainda segundo a PBH, o Ministério Público Estadual (MPE), com posterior aval do Ministério Público de Contas, arquivou um pedido de abertura de inquérito civil envolvendo o contrato por não ter encontrado nenhuma irregularidade.

Entre os consorciados, tentamos contato com a direção da empresa Hidroscience Consultoria e Restauração Ambiental, com sede em Florianópolis (SC), e da empresa Enzilimp - Millenniun Tecnologia Ambiental Ltda, com sede em Porto Alegre (RS), mas como os responsáveis não foram localizados, solicitamos os esclarecimentos por e-mail, que também ainda não teve resposta. 

O Estado de Minas não conseguiu contato com Tiago Finkler Ferreira, apontado como o terceiro consorciado da Pampulha Viva. 

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