Água

Estamos em risco? Represas da Grande BH enfrentam chuva bem abaixo da média

Reservatórios que abastecem a Grande BH fecharam setembro com menos de 60% do volume, como em períodos críticos da série histórica, no 2º ano seguido de baixa

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No início do período que costuma marcar a transição entre a estiagem e a estação chuvosa em grande parte de Minas Gerais, um sinal de alerta vem dos três grandes reservatórios que compõem o Sistema Paraopeba e abastecem a Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH).

Com armazenamento em queda, as represas de Rio Manso, Serra Azul e Vargem das Flores tiveram no conjunto redução de 11,57% no volume de operação apenas no último mês, caindo de 67,4% da capacidade em 31 de agosto para 59,6% no fim de setembro, índice abaixo de 60%, assim como o registrado para o período nos piores anos da série histórica divulgada pela Copasa a partir de janeiro de 2018. As primeiras chuvas da temporada, como a registrada ontem, ainda são insuficientes para mudar o panorama, dizem especialistas.


As piores marcas entre o início de setembro e o começo de outubro em mais de sete anos foram apuradas em 2019, com queda de 58,3% para 51,9%. O segundo pior ano no período foi precisamente o de 2024 (queda de 64,3% para 55,8% no volume armazenado), o que indica que a Grande BH enfrenta em 2025 o segundo ano consecutivo em alerta à espera das chuvas.


O cenário atual, embora consideravelmente melhor do que o visto na crise hídrica enfrentada pela região metropolitana em 2015, ainda preocupa, devido aos índices pluviométricos muito abaixo da média e à previsão meteorológica de pouca chuva, pelo menos a curto prazo. A partir de maio deste ano, quando foi registrado o maior índice de acumulação em 2025, o Sistema Paraopeba viu seu volume despencar em 32,5%, baixando de 88,4% para os 59,6% do fim de setembro. A queda prosseguiu até ontem (14/10), quando o volume fechou em 55,8%.


O Alívio não caiu do céu

Em setembro deste ano, os reservatórios receberam pouca chuva. A média pluviométrica histórica para a área do reservatório Rio Manso é 41,3 milímetros (mm), mas o acumulado no mês foi de 17,9mm. Já na represa de Vargem das Flores, o índice chegou a apenas 6,6 mm, contra a média de 36,7mm. O reservatório Serra Azul fechou o período em 15,6mm, menos da metade da média de 38,7mm.


Em Betim, Vargem das Flores exibe marcas claras da falta de chuvas. Com cerca da metade de sua capacidade, o baixo nível da água revela margens de terra seca, conforme imagens registradas pela equipe do Estado de Minas. Ainda assim, o panorama é melhor que no mesmo período do ano passado, quando o volume da represa atingia 42%.

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O fantasma da crise hídrica

A Grande BH já enfrentou, em 2015, um período de grave escassez de água causado por um volume de chuvas muito abaixo da média histórica. Na época, os reservatórios que compõem o Sistema Paraopeba atingiram volumes extremamente baixos. No auge da crise, no início daquele ano, os reservatórios operavam com média de cerca de 30% da capacidade em alguns momentos. A situação levou à declaração de escassez hídrica na Região Metropolitana de BH. Na época, a Copasa e o governo de Minas fizeram alertas públicos e pedidos por uma economia de 30% no uso de água, para evitar o racionamento, que se tornou uma ameaça real.

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Já o Rio Manso, localizado em Brumadinho, o maior dos três reservatórios, operava ontem (14/10) com 64,3% de sua capacidade – porcentagem 11,43% menor do que os 72,6% registrados na mesma data do mês anterior. Em 1º de outubro deste ano, no entanto, o volume, de 67,7%, estava acima dos 48,6% registrados em 2019, menor índice até então. Da mesma forma, o reservatório de Serra Azul, em Juatuba, trabalhou no início do mês com volume de 48,3%, próximo aos 43,9% do começo de outubro de 2018, quando foi apurado o menor volume. A queda seguiu até ontem, com 44,6%.


Juntas, as três represas do Sistema Paraopeba tinham, até ontem, 154.027,812 de metros cúbicos – 5,70% a mais do que o acumulado na mesma data do ano passado. Já em relação a 2023, quando o total foi de 205.443,210m³, há queda de 25,02%. Apesar da redução diária dos volumes, a Copasa informou, por meio de sua assessoria, que os níveis dos reservatórios que abastecem a RMBH estão dentro do esperado e não há risco de racionamento.


Queda contínua

Ainda assim, a queda no volume dos reservatórios é sentida diariamente por técnicos e gestores que acompanham o sistema. O presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Paraopeba, Heleno Maia, confirma que a redução no nível da água tem sido contínua e progressiva. “Realmente está caindo, está baixando muito. Todo dia o sistema perde um pouco de volume. Em 28 de setembro, o Sistema Paraopeba registrava 60,1%. Já no dia 29, caiu para 59,9% e depois para 59,6%. É pouco a cada dia, mas o acúmulo preocupa muito”, destacou.


A principal causa, segundo ele, é a estiagem. “A escassez hídrica, a falta de chuva, está severa demais. Essas precipitações recentes não foram suficientes para alimentar os reservatórios”, constata. Embora a situação preocupe, Heleno não vê risco de medidas de racionamento a curto prazo. “Ainda temos todos os reservatórios perto de 50%. Acredito que dá para segurar até novembro, quando chegam as chuvas de fato e ajudam a recompor os níveis. A situação é menos grave do que na crise hídrica de 2015”, comparou.

Um olho no céu e
outro na 'caixa d'água'

Se por um lado o quadro é menos preocupante do que na época da crise histórica, por outro a falta de perspectiva de alívio não ajuda. A transição entre a estação seca e a chuvosa mantém o estado de alerta, já que os grandes volumes de precipitação costumam ganhar força só em novembro. Segundo a meteorologista Anete Fernandes, do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), embora haja expectativa de chuva para o mês, ela não deve ser suficiente para resolver o problema.


“Considerando o longo tempo seco e os meses de outono e inverno, é natural que os reservatórios nesta época do ano tenham um volume mais baixo. Estamos em transição, então a expectativa é que tenhamos pancadas de chuva nos próximos dias, mas essas primeiras pancadas não vêm para resolver a questão hídrica. São chuvas rápidas, com pouco volume, que dão o sinal de chegada do tempo chuvoso”, explicou a meteorologista. “A chuva que abastece é aquela contínua, por dias consecutivos, e é comum a partir de novembro”, afirmou.


Clima e uso excessivo

Para o presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Paraopeba, a falta de chuva se deve às mudanças climáticas. “Infelizmente, estamos passando pelo aquecimento global. No futuro, acredito que vamos ter ainda mais aperto com água. O desmatamento não para, a consciência humana não muda. Isso tudo contribui para uma crise hídrica”, alertou.


Outro fator de pressão sobre o Sistema Paraopeba, segundo ele, é o uso intensivo da água pela mineração. “A bacia é muito castigada. Há um consumo gigantesco de água por parte das mineradoras, o que traz um prejuízo maior. Se não houvesse esse gasto excessivo, talvez hoje estivéssemos com 80% de armazenamento em quase todos os reservatórios”, avaliou.


Heleno Maia pondera que o fornecimento não está ameaçado enquanto houver expectativa para as precipitações de novembro. “Mas, se repetirmos o cenário do ano passado, quando as chuvas foram escassas até dezembro, poderemos virar o ano com apenas 20% a 30% de armazenamento. Aí, sim, será inevitável pensar em rodízio de água”, advertiu.


Para mitigar os efeitos da seca, o representante do comitê defende medidas de economia e reúso. “É preciso tornar obrigatório, nos processos de licenciamento ambiental, que as empresas implantem sistemas de reúso da água. A sociedade também precisa colaborar: ainda vemos muito desperdício, como piscinas enchidas semanalmente, carros lavados em excesso. Mas o maior esforço deve vir das empresas, que são as grandes consumidoras”, concluiu.


Cautela no consumo

Com a queda contínua nos níveis do Sistema Paraopeba e a ausência de chuvas significativas no curto prazo, a situação dos reservatórios da Grande BH, embora não seja a ideal, não é considerada “absurda” para o período do ano, conforme análise do professor Luiz Rafael Palmier, do Centro de Pesquisas Hidráulicas e Recursos Hídricos (CPH) da UFMG.


“Essas preocupações (com a queda do nível dos reservatórios) acabam vindo mais para o fim da estação seca. Mas, não é anormal em termos de diminuição”, afirmou o especialista. O membro do CPH explica que a diminuição dos níveis é uma característica do regime hidrológico do Planalto Central do Brasil, que possui uma estação seca e uma estação chuvosa bem definidas.


“É normal que, ao fim da estação seca, esses níveis de água, essas elevações de reservatórios estejam muito baixos. E é exatamente por isso que construímos reservatórios, porque os excessos da estação chuvosa a gente guarda para usar na estação seca”, detalha. A questão crítica, segundo ele, surge quando o volume reservado não é suficiente para garantir o abastecimento durante a estiagem.


Apesar dos níveis estarem diminuindo, porque a entrada de água ainda é inferior ao consumo e à evaporação, o especialista projeta recuperação. “A tendência é que agora comece a chover. O mês de outubro vai chover mais do que choveu em junho, julho e agosto, e a chuva já começa a vir numa quantidade que vai permitir a recuperação desses níveis de reservatório”, afirma.

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No entanto, ele diz que a população não deve baixar a guarda, e faz um apelo quanto à responsabilidade no consumo de água. “É fundamental que haja uma preocupação com o consumo de água. Quando se lava o carro [com mangueira], deixando a torneira aberta, a água está indo direto para o sistema de drenagem sem ser usada de forma inteligente. A pessoa está desperdiçando água, embora esteja pagando por ela”, alerta. 

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