EM INVESTIGAÇÃO

Caso Alice: mais de 10 pessoas passaram pelo local e não fizeram nada

Mulher trans foi espancada em 23 de outubro após sair de um bar sem pagar. Ela morreu em 9 de novembro depois de ter o intestino perfurado por costela quebrada

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Imagens de câmeras de segurança do local onde Alice Martins Alves, de 33 anos, foi espancada por dois homens na Savassi, em BH, mostram que mais de dez pessoas passaram pelo local durante o ataque e não intervieram. O ataque aconteceu na madrugada de 23 de outubro. A vítima morreu 17 dias depois, por complicações dos ferimentos provocados pelas agressões. Os suspeitos já foram identificados como funcionários do Bar Rei do Pastel. No entanto, até esta terça-feira (25/11), ainda não foram presos.

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As gravações do imóvel mostram que, entre 00h50 e 1h, quatro pedestres passaram pela Avenida Getúlio Vargas, próximo à Rua Sergipe. Duas delas andaram em frente à vítima enquanto ela gritava por socorro. Uma terceira testemunha passou pelo canteiro central e a quarta, pelo outro lado da via. Além disso, enquanto Alice era espancada, oito carros e seis motociclistas passaram pelo local.

As agressões aconteceram por volta de 00h45 e teriam sido motivadas por uma dívida de R$22. O mesmo equipamento de segurança que registrou o ataque também mostra que Alice gritou por socorro 12 vezes. Por volta de 00h40, uma pessoa discute com a vítima. Em determinado momento, a mulher é questionada se irá pagar ou não. Ela, então, questiona o homem se ele irá agredi-la.

No áudio, ainda é possível confirmar que a mulher afirmou ter efetuado o pagamento. Apesar disso, a resposta não foi bem vista pela dupla, que começou a agredi-la. O equipamento de segurança também captou gritos de socorro da vítima e insultos transfóbicos por parte dos homens.

Transfobia

De acordo com a delegada Iara França, do Núcleo Especializado de Investigação de Feminicídios da PCMG, a mulher tinha o costume de frequentar alguns bares da região e era conhecida dos funcionários e comerciantes. No dia dos fatos, Alice teria se sentado sozinha e pedido uma bebida alcoólica. Depois de um tempo, ela se levantou e se esqueceu de quitar a conta.

Apesar de haver indícios de que as agressões sofridas por Alice tenham sido motivadas por uma dívida de R$22, a Polícia Civil também trabalha com a hipótese de que a mulher tenha sido vítima de transfobia. A possibilidade ganha força, segundo a delegada Iara França, pela intensidade da violência. Além disso, Iara França afirma que a mulher já havia relatado que sofria certo preconceito por parte de algumas pessoas, sem especificar se de clientes ou funcionários do bar.

“É um local que ela já tinha o costume de frequentar, local que ela já era conhecida, que ela conhecia as pessoas ali e já havia revelado que sentia um certo preconceito de algumas pessoas, alguns olhares maldosos, alguns olhares preconceituosos”, afirmou a delegada Iara França.

O boletim de ocorrência, que retratou o caso, registrado por Alice, foi feito 13 dias depois do ataque. Ao Estado de Minas, o pai dela já havia afirmado que a demora se deu por medo e pela condição física. Na quarta-feira (12/11), Edson relatou que a filha só foi à delegacia depois que ele insistiu e chegou a fazer uma denúncia pelo 181, canal de denúncias anônimas do estado. “Depois que ela voltou para casa, foi só luta. Ela começou a vomitar, não conseguia se alimentar, perdeu 13 quilos. Estava muito fraca e com muita dor”, comentou o pai.

Além disso, à polícia, Alice relatou que demorou a procurar a Delegacia da Mulher por sentir medo dos suspeitos e também por ter ficado envergonhada. Por isso, durante o registro da ocorrência, ela, inclusive, passou características genéricas de um dos suspeitos, identificando-o apenas como homem branco, de cabelos escuros e usando calça jeans e camiseta preta.

O relato de Edson, durante o velório da filha, gerou comoção nacional. “Será que um homossexual não tem direito a viver?”. O questionamento do pai refletiu o sofrimento e a indignação pela perda da filha, com quem morava no bairro Betânia, também na Região Oeste. “Perdi uma grande amiga, parceira, minha companheira de assistir filmes e tomar uma cervejinha em casa”, relatou.

Agressões

Alice morreu em decorrência de uma infecção generalizada causada pela perfuração de parte do intestino. A informação consta no atestado de óbito da vítima. O documento, enviado ao Estado de Minas, indica que a causa da morte foi: “choque séptico, abdome agudo perfurante, úlcera duodenal perfurada” e uso de anti-inflamatório.

Após o ataque, a mulher perdeu a consciência e foi socorrida pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). Em um primeiro momento, ela foi encaminhada para a Unidade de Pronto Atendimento Centro-Sul. Dez dias depois, em 2 de novembro, foi levada de ambulância para o Pronto Atendimento do Hospital da Unimed, em Betim, na Região Metropolitana. Na unidade de saúde, exames de imagem apontaram fraturas nas costelas, cortes no nariz e desvio de septo.

Em 8 de novembro, os médicos diagnosticaram uma perfuração no intestino, possivelmente causada por uma das costelas quebradas ou, segundo suspeita do pai da vítima, Edson Alves Pereira, agravada pelo uso de anti-inflamatórios após a agressão. Com o diagnóstico, Alice foi submetida a uma cirurgia de emergência, mas não resistiu à infecção generalizada e morreu.

O que disse o bar?

Depois de receber diversos comentários em suas redes sociais, o bar Rei do Pastel, que possui sete unidades em Belo Horizonte, publicou uma nota afirmando que está colaborando com as investigações da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG). O estabelecimento está no centro das apurações sobre o ataque contra Alice, após um áudio divulgado à imprensa afirmar que os dois homens suspeitos das agressões seriam funcionários do local.

Na nota, divulgada na tarde dessa sexta-feira (14/11), o estabelecimento afirmou que, desde que foi procurado pelos investigadores, se colocou à disposição das autoridades e entregou todas as informações solicitadas. “Estamos aguardando e confiantes no trabalho sério e eficiente que bem sendo executado pela polícia, com certeza da correta apuração dos fatos e devida culpabilidade dos envolvidos”.

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A pastelaria também afirmou que não “compactua” com ações discriminatórias referentes à identidade de gênero, orientação sexual, raça ou qualquer outra natureza. “Ressaltamos a nossa solidariedade aos familiares e amigos de Alice”, ressaltou o Rei do Pastel.

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