A polícia do condado de Galway, na Irlanda, começou nesta semana os trabalhos para identificar os restos mortais de 796 bebês encontrados enterrados no quintal de onde funcionava o Lar Materno e Infantil Bon Secours, no começo do século XX. Os corpos foram encontrados por Catherine Corless, historiadora local que alertou sobre a existência dos cadáveres em 2014 – e chegou a ser taxada como louca. 

A instituição era propriedade de uma igreja e era administrada por freiras da ordem Bon Secours. Segundo a historiadora, acredita-se que as crianças foram enterradas no local entre 1925 e 1961, algumas em uma fossa séptica subterrânea desativada. No entanto, somente duas mortes constavam nos registros oficiais de sepultamento. 

O  Lar Materno e Infantil Bon Secours era uma das muitas instituições da Irlanda para onde mulheres grávidas solteiras eram enviadas para dar à luz em segredo. Muitas eram forçadas a trabalhar sem remuneração, e seus filhos frequentemente morriam de negligência, doença ou desnutrição. Aqueles que sobreviviam eram frequentemente adotados, às vezes ilegalmente.

De acordo com os registros oficiais de óbitos analisados por Corless, as causas de morte mais frequentemente citadas foram infecções respiratórias e gastroenterites, além de condições como prematuridade, convulsões, coqueluche, tuberculose, meningite e difteria — apenas um pequeno número foi atribuído a causas como desnutrição.

A questão levantada por ela não era sobre as causas das mortes, mas sim por que os corpos nunca foram devidamente registrados, enterrados ou reconhecidos. Mesmo com um artigo publicado no Irish Mail, a historiadora foi desacreditada. Em 2017, ela conseguiu que o governo realizasse uma escavação no local, confirmando que havia os restos mortais de crianças enterrados sob a propriedade.

A análise forense confirmou que os corpos pertenciam a bebês e crianças pequenas, com idades entre 35 semanas de gestação e três anos. Mesmo assim, Corless continuou sendo desacreditada, tanto por membros da Igreja Católica, quanto por populares.

‘Tão confiável quanto o Papai Noel’

A historiadora chegou a relatar que as pessoas atravessavam a rua para evitá-la e paravam ela e seus parentes no supermercado, reclamando que ela estava dando má fama ao local. Na imprensa, algumas jornais chegaram a questionar o número de corpos envolvidos e até chamá-la de "historiadora amadora".

Em entrevista ao The Irish Times, Corless contou que um homem nos EUA lhe enviou um e-mail com críticas. "Você é tão confiável quanto o Papai Noel. Você é uma vergonha. Espero que essas freiras o levem ao tribunal”, escreveu o homem. 

Desacreditada, Corless financiou toda pesquisa por conta própria. "Todas aquelas criancinhas e bebês adoráveis, essa foi a única coisa que me motivou. Era tudo o que eu tinha em mente: esses bebês em um sistema de esgoto, eles precisam sair", disse.

A Igreja de Santa Maria Assunta, construída no século XV sobre uma antiga estrutura românica, guarda afrescos renascentistas importantes. wikimedia commons/Creative Commons
Durante a Idade Média, Trevignano desempenhou um papel estratégico devido à sua localização privilegiada, e vestígios desse período podem ser vistos nas ruínas do Castelo Orsini, que domina a paisagem da cidade. wikimedia commons/Albarubescens
A cidade tem origens antigas, remontando à época etrusca, como evidenciado pelos achados arqueológicos na área, incluindo tumbas e artefatos que podem ser explorados no Museu Civico local. wikimedia commons/Albarubescens
Com uma atmosfera tranquila, Trevignano é conhecida por seu cenário natural deslumbrante, onde o lago de origem vulcânica se encontra com colinas verdejantes. wikimedia commons/Albarubescens
Com uma população de aproximadamente 5.800 mil habitantes, Trevignano Romano é uma pequena e charmosa cidade localizada na região do Lácio, na Itália, a aproximadamente 40 km ao norte de Roma. reprodução/youtube
O principal argumento dos religiosos que acreditam é: como alguém pode saber qual é o DNA da Virgem Maria? DDP/Unsplash
Segundo a advogada de Cardia, Solange Marchignolio, o DNA encontrado pode ser uma mistura, já que sua cliente "tocou, beijou e mexeu na estátua". pexels/Alba Leader
Eles querem, entre outras coisas, que a mulher devolva as doações que recebeu. steve buissine pixabay
De acordo com a imprensa italiana, alguns peregrinos acusam a vidente de fraude e de ter ganhado dinheiro de forma ilegal. reprodução
Tempos depois, o Vaticano também se posicionou, declarando que o tal "sangue" na estátua não se tratava de um milagre. JEROME CLARYSSE por Pixabay
As proibições incluem missas, orações em grupo, peregrinações e qualquer atividade que pudesse sugerir aprovação oficial da Igreja. Thays Orrico/Unsplash
Segundo ela, o fenômeno "sobrenatural" fazia com que a estátua chorasse lágrimas de sangue em alguns momentos. pexels/Paolo Sbalzer
Desde 2016, a vidente afirmava presenciar aparições de Maria e Jesus em Trevignano, cidade que fica ao noroeste de Roma. reprodução/youtube
O estudo também descartou teorias anteriores de que poderia ser sangue de porco ou mesmo de tinta. Jacques GAIMARD/Pixabay
Segundo a análise, feita pela Universidade de Roma Tor Vergata, o líquido vermelho é sangue humano e tem origem natural. wikimedia commons/Creative Commons
Porém, exames mostraram que o material genético encontrado no líquido é da própria proprietária da estátua, Gisella Cardia, que se apresenta como vidente e organizava as peregrinações. reprodução
Desde 2016, uma estátua da Virgem Maria em Trevignano Romano, na Itália, tem atraído peregrinos por supostamente chorar lágrimas de sangue. Jacques GAIMARD/Pixabay

Com o tempo, seu trabalho ganhou atenção internacional e, por fim, levou a um inquérito estatal e a um pedido formal de desculpas do governo em 2021.

Nova escavação 

A nova etapa dos trabalhos iniciou na última segunda-feira (16/6). Neste primeiro momento, as autoridades irlandesas vão proteger o local – onde hoje funciona um conjunto habitacional – antes de começar uma escavação em grande escala, marcada para iniciar em 14 de julho. Essa etapa deve durar até dois anos.

O objetivo é identificar restos mortais onde possível e oferecer às famílias a chance de finalmente enterrar seus parentes. Corless disse que está muito aliviada por ver o trabalho começar. "Estou apenas começando a entender. Demorei um pouco para assimilar", declarou.

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Daniel MacSweeney, supervisor da operação, contou em entrevista a uma rádio que o trabalho será muito difícil.  "É um desafio incrivelmente complexo devido ao tamanho do local e ao fato de estarmos lidando com restos mortais de crianças, pelo menos no caso dos jardins memoriais, que estão misturados”, confessou.

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