BRASÍLIA, DF E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O grupo terrorista Hamas declarou nesta quinta-feira (9/10) o fim da guerra na Faixa de Gaza enquanto o gabinete de segurança do primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, reúne-se para discutir o acordo assinado no Egito na quarta (8).
O principal líder da facção palestina em Gaza disse ter recebido garantias dos mediadores, que incluem a Turquia e o Qatar, e do governo dos Estados Unidos de que o conflito, que completou dois anos esta semana, oficialmente acabou.
Pouco antes da reunião com o gabinete, Netanyahu voltou a defender que o presidente americano Donald Trump deveria ganhar o Prêmio Nobel da Paz pelo esforço para o fim do conflito, indicando o desfecho esperado positivo. O perfil do gabinete do premiê publicou montagem em que Trump aparece com um grande colar com a medalha da láurea ao lado do primeiro-ministro.
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De acordo com o gabinete, Netanyahu e Trump conversaram por telefone após o anúncio do republicano, nesta quinta-feira (8), de que um acordo havia sido alcançado. "Foi uma conversa calorosa e emotiva e os dois líderes se parabenizaram por esta conquista histórica", disse a porta-voz do governo israelense Shosh Bedrosian. O americano é esperado em Jerusalém no próximo domingo (12), e seus negociadores principais, Jared Kushner e Steve Witkoff, devem chegar a Israel nesta quinta.
Diminuindo ainda mais as perspectivas de que Trump vença, o porta-voz do Comitê Norueguês do Nobel, responsável pela escolha entre centenas de indicados todos os anos, afirmou que a reunião final do grupo ocorreu na segunda-feira (6), dois dias antes de o presidente americano anunciar o entendimento entre Tel Aviv e a facção terrorista.
Aprovado o acordo, um cessar-fogo no território palestino entra imediatamente em vigor, e o fim do conflito deve ser anunciado oficialmente por Tel Aviv e o grupo terrorista. O ministro das Relações Exteriores israelense, Gideon Sa'ar, afirmou antes da reunião que o país está comprometido com o plano de Trump.
A expectativa é de que Exército de Israel inicie sua retirada de Gaza assim que a trégua for instaurada. Nas primeiras 24 horas após o anúncio, os militares devem recuar para uma primeira linha que possibilite ao grupo terrorista reunir todos os reféns.
De 48 horas a 72 horas depois do anúncio, todos os sequestrados ainda vivos devem ser libertados pelo Hamas -não há clareza se os corpos dos reféns mortos também serão recuperados no mesmo período. Durante esses três dias, a facção e Tel Aviv precisam negociar a lista de prisioneiros palestinos que serão libertados por Israel.
O Exército afirmou, em comunicado, que já iniciou "preparações operacionais" para a primeira fase do acordo. O chefe do Estado-Maior israelense, Eyal Zamir, instruiu as tropas a permanecerem em suas posições enquanto o pacto era discutido, e novos bombardeios foram realizados em Gaza nesta quinta pela manhã.
O trato não implica a retirada total das tropas de Israel de Gaza num primeiro momento. A segunda fase, ainda a ser debatida a partir das diretrizes do plano anunciado por Trump, prevê a retirada para uma segunda linha de recuo ainda dentro de Gaza apenas após o estabelecimento de uma força internacional transitória de estabilização do território palestino.
Com o acordo eventualmente concluído, Israel ainda manterá uma zona tampão por todo o perímetro de Gaza, inclusive no chamado corredor Filadélfia, área no sul do território palestino que vai da costa até o território israelense.
Ou seja, na prática, a previsão é de que Tel Aviv mantenha o controle da fronteira de Gaza com o Egito, ainda que o plano do presidente americano proponha a entrada de ajuda humanitária no território palestino sem interferências.
Embora a proposta de 20 pontos anunciada por Trump e construída em conjunto com países árabes e muçulmanos seja vantajosa para Tel Aviv, Netanyahu sofre pressão externa e interna para concordar com os termos negociados.
A começar pelo próprio presidente americano, que anunciou na noite desta quarta-feira (8) a conclusão do acordo, antes da deliberação oficial do governo israelense. Trump faz campanha para receber o Prêmio Nobel da Paz, agora endossado por Netanyahu, tem proximidade com países árabes mediadores do conflito e críticos de Israel, e incluiu em seu plano para Gaza menções a um "caminho crível" para o estabelecimento de um Estado palestino. Ainda que nebulosa, a ideia é rejeitada pelo premiê israelense.
Internamente, Netanyahu tenta colher créditos pelo fim de uma guerra que ele próprio estendeu além do que a sociedade israelense parece suportar: poucos meses após o mega-ataque terrorista do Hamas, que deixou 1.200 mortos e deu início ao conflito, Netanyahu passou a ser duramente cobrado por críticos e familiares de reféns pela demora no retorno dos sequestrados -dos 251 levados pela facção palestina, 50 ainda estão em Gaza, e apenas 20 deles supostamente vivos. Em Gaza, mais de 67 mil morreram nos dois anos de guerra, segundo o Ministério da Saúde do território, controlado pelo Hamas.
Nesta quinta, Bredrosian, a porta-voz do premiê, afirmou que "todos os objetivos do primeiro-ministro foram atingidos", referindo-se ao returno dos reféns, à derrota e ao desmantelamento do Hamas e à garantia de que Gaza não será mais uma ameaça para Israel.
Também nesta quinta-feira, a Praça dos Reféns, local em Tel Aviv que se tornou o centro das manifestações pelo fim da guerra, familiares celebraram o anúncio de Trump de que o acordo foi concluído, com faixas de agradecimento ao presidente americano. Opositores de Netanyahu, como Yair Lapid e Benny Gantz, visitaram a praça e tiraram fotos com manifestantes.
A percepção generalizada entre críticos do prolongamento do conflito é que o premiê o fez colocando interesses políticos pessoais acima da população. Antes do ataque do Hamas, Netanyahu era alvo de protestos massivos contra uma reforma judicial controversa que retirava poderes do Judiciário em meio a investigações criminais contra ele por corrupção.
Seu gabinete, o mais à direita desde a criação do Estado judeu, tem integrantes da extrema-direita nacionalista que sustentam a coalizão governista e são contrários a um acordo que termine a guerra sem a destruição completa do Hamas -Bezalel Smotrich (Finanças) e Itamar Ben-Gvir (Segurança Nacional) falam ainda abertamente na anexação dos territórios palestinos.
Por isso, o fim do conflito em termos que não agradam a ala mais extremista do governo pode se transformar em um novo desafio para que Netanyahu, que perde com o fim da guerra o principal elemento para desviar o holofote das críticas, mantenha-se no poder. Antes da reunião, Smotrich, por exemplo, adiantou que não votaria a favor do acordo de paz.