EM MINAS

Análise: 'Devemos, devemos ser amigos'

A reação de Trump ao julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) vai ruindo essa amizade pela cooperação em nível íntimo com a família Bolsonaro

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No ano passado, Brasil e Estados Unidos celebraram 200 anos de uma relação diplomática que surgiu quando, em 1824, o presidente James Monroe recebeu José Silvestre Rebello, encarregado de negócios brasileiros, em Washington, para formalmente reconhecer a independência brasileira. Ao longo de dois séculos, a relação sempre foi marcada pelos princípios basilares que regem o bilateralismo: cooperação e amizade internacional.

Ao falar da relação entre dois países, vale destacar o princípio da amizade. Os gregos acreditavam que os amigos eram indispensáveis para a vida humana, chegando a considerar que uma vida sem amigos não era digna de ser vivida. Aristóteles escreve que a “philia”, amizade entre os cidadãos, era fundamental para o bem-estar da cidade, mas ele não fala em termos de intimidade. Para os antigos, a essência da amizade estava no discurso, ou seja, o intercâmbio constante de conversas era o que unia os cidadãos na pólis.

A filósofa alemã Hannah Arendt (1906-1975), ao interpretar esse conceito, escreve que é no discurso que se revela a importância política da amizade e a qualidade humana própria a ela. Para Arendt, essa conversa amigável entre indivíduos, que contrasta com a conversa íntima em que duas pessoas falam apenas sobre si, refere-se ao mundo comum. Brasil e Estados Unidos cultivaram uma relação bicentenária nesse aspecto.

Agora, a reação do presidente Donald Trump ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no Supremo Tribunal Federal (STF) vai ruindo essa amizade pela cooperação a nível íntimo com a família Bolsonaro. Enquanto isso, o governo brasileiro reage pelos canais diplomáticos para estabilizar essa relação, reconhecendo que, pela separação de poderes, nada pode fazer em relação ao STF e ao ministro Alexandre de Moraes.

Mas o Brasil tem outros amigos internacionais, em especial o Brics. O bloco político com Rússia, Índia, China, África do Sul e outros seis países não é o problema da crise, como disse o governador Romeu Zema (Novo). A relação entre Brasil e China fará 51 anos no dia 15 de agosto. Em meio século, a amizade entre as nações foi fundamental para o desenvolvimento da economias brasileira e mineira.

Na segunda-feira (28/7), o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Guo Jiakun, disse que o país está disposto a trabalhar com o Brics e outros parceiros para, em conjunto, “defender o sistema multilateral de comércio”. Se os Estados Unidos têm um problema com a potência asiática, não cabe ao Brasil escolher entre dois amigos. Porém, se um o rejeita em momento de dificuldade, o outro pode oferecer auxílio.

O poeta e dramaturgo alemão Gotthold Lessing (1729-1781), na peça “Nathan, o sábio”, descreve como o comerciante judeu Nathan, o sultão Saladino e um cavaleiro templário superaram as diferenças entre suas religiões para cultivar uma amizade. “Devemos, devemos ser amigos”, dizia o comerciante. Para Lessing, a amizade não é intimamente pessoal, mas faz exigências políticas enquanto situada em referência ao mundo em que vive.

O mesmo ocorre com as relações diplomáticas. Zema critica o Brics por uma série de motivos que, na verdade, mostram a importância de cultivar a amizade na diferença. Os países do bloco são diferentes, não compartilham a mesma religião, não compartilham o mesmo regime de governo. Como dizia Hannah Arendt, “política se baseia na pluralidade, diversidade e limitação mútua”.

É para a China que Minas Gerais exporta mais de 30% dos seus produtos. É da Rússia que vem um terço do fertilizante usado no agro antes da guerra. A amizade diplomática não impede que o Brasil seja crítico ao autoritarismo das duas nações, mas esses não são aspectos que regulam o comércio entre os países. Afinal, segundo o índice da democracia calculado pela revista “The Economist” em 2024, apenas 25 países são considerados democracias plenas, enquanto o restante são falhas, regimes híbridos, ou autoritários.

No momento em que a soberania nacional é atacada por uma potência que era considerada amiga, e que joga o peso da sua economia para interferir em questões internas, é importante que o Brasil esteja na mesa com outras potências mundiais e amigas históricas. O inteligente é reforçar a amizade, não descartá-la por desejo de terceiros que não são bons amigos.


Tá pago!

O governador Romeu Zema (Novo) anunciou nessa sexta-feira (1º/8) que pagou mais uma parcela da dívida de Minas Gerais com a União, avaliada em mais de R$ 170 bilhões. Segundo o chefe do Executivo mineiro, foram R$ 429,5 milhões quitados. De acordo com ele, desde 2019, já foram mais de R$ 11 bilhões pagos. “Não contraímos um centavo a mais, porém seguimos pagando pela irresponsabilidade de quem colocou Minas no vermelho”, disse.


El Salvador e Zema

O Congresso de El Salvador, controlado por apoiadores do presidente Nayib Bukele, aprovou uma reforma constitucional que permite a reeleição do Executivo por tempo indeterminado e amplia o mandato de cinco para seis anos. Para os críticos do regime, isso coloca em risco a alternância de poder e consolida um sistema autocrático de Bukele. Em discurso no dia 1º de junho, o presidente disse que não se importa de ser chamado de ditador. Em maio, o governador Romeu Zema, que tem criticado regimes autoritários, visitou o país para conhecer o modelo de segurança pública que quase zerou os índices de criminalidade.


Sem café

Integrantes do governo Trump avaliam que os Estados Unidos não pretendem poupar o café importado do Brasil no tarifaço. A Casa Branca julga ter outras opções para fornecer o produto. O grão é o principal produto exportado por Minas Gerais e já teve alta de preço para os americanos. Em maio, o preço médio do quilo de café torrado moído chegou a US$ 7,93. No mesmo período de 2024, o valor era de US$ 5,99, segundo o Departamento de Estatística do Trabalho dos EUA.

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