A Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) adota um ritmo próprio para lidar com a tramitação dos projetos relativos ao Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag). Um mês após a retomada dos trabalhos para o segundo semestre, os textos tratados como prioridades pelo Governo de Minas seguem parados enquanto o presidente da Casa, Tadeu Martins Leite (MDB), negocia diretamente com o governo federal uma extensão dos prazos para refinanciamento do débito bilionário do estado com a União.

Apesar das movimentações nos bastidores para que o restante dos projetos relativos ao Propag voltem a tramitar, até ontem, os textos ainda não foram pautados. Uma das matérias mais relevantes é a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 24/2023 que prevê o fim do referendo popular para definir a privatização de Cemig e Copasa. Por quase três meses, a iniciativa do governador Romeu Zema (Novo) está parada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa e não foi pautada na reunião ordinária desta semana.

Desde 2001, durante o governo de Itamar Franco, a Constituição de Minas Gerais determina que a privatização das companhias estatais de energia, saneamento e gás natural - Cemig, Copasa e Gasmig, portanto - deveria ser aprovada pelos eleitores mineiros via referendo.

A lei ainda estabelece um quórum mínimo de três quintos da Assembleia para mudanças estatutárias e de estrutura societária dessas empresas. A PEC 24/2023 foi apresentada por Zema aos deputados para retirar esses trechos da lei do estado.

A queda do referendo abriria espaço para votação de outros dois projetos do governo na Casa: os que se referem especificamente à privatização de Cemig e Copasa. A desestatização das companhias é tratada como prioridade pelo Executivo para aderir ao Propag.

O Propag prevê que estados refinanciem suas dívidas com a União em até 30 anos. No caso de Minas Gerais, o valor devido gira em torno de R$ 170 bilhões. Além disso, o programa estabelece mecanismos para redução dos juros, hoje fixados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mais 4% ao ano.

É possível reduzir os juros apenas à inflação. Uma das formas de retirar dois dos quatro pontos percentuais da cobrança adicional é abater ao menos 20% do estoque da dívida. O governo Zema quer fazê-lo a partir da federalização de alguns ativos estatais e do uso dos recursos obtidos a partir da privatização de outros, e, para isso, precisa da autorização dos deputados estaduais.

A base governista na Assembleia adota o silêncio acerca de quando os textos relativos ao Propag voltarão a tramitar na Casa. Do lado da oposição, há uma postura declarada pela obstrução em relação à PEC do fim do referendo, como disse à reportagem a deputada Bella Gonçalves (PSOL).

“O Governo de Minas tem pressionado bastante a Assembleia para tramitar a PEC do fim do referendo, mas o presidente Tadeu ainda aguarda a solicitação que fez ao Governo Federal pelo adiamento do prazo de adesão ao Propag. A PEC está obstruída na Comissão de Constituição e Justiça e continuará sendo obstruída pela pela oposição. Não existe negociação sobre este tema, vamos lutar para defender as nossas estatais, em especial a Cemig e a Copasa que prestam serviços públicos de relevância para todo o povo mineiro”, disse a parlamentar.

No fim de julho, na segunda reunião do comitê criado pelo Executivo Estadual para debater questões relacionadas ao Propag, o vice-governador e líder do grupo Mateus Simões (Novo) afirmou que o foco do governo para o segundo semestre seria exatamente avançar com a discussão da privatização de Cemig e Copasa.

“O nosso foco total é nesse momento garantir que a Assembleia possa votar os projetos que ainda se encontram lá, inclusive os projetos de Cemig e Copasa, mas também o projeto da MGI (Minas Gerais Participações S/A) e da EMC (Empresa Mineira de Comunicação)”, disse Simões à época.

Tadeu e os prazos

As regras originais do Propag determinam que os estados interessados em aderir ao programa o façam até o último dia do ano e enviem ao Ministério da Fazenda e à Secretaria do Tesouro Nacional (STN) uma lista dos ativos que pretendem envolver nas negociações até outubro.

Os prazos apertados colocam Executivo e Legislativo estaduais sob pressão para aprovação célere das matérias. O presidente da Assembleia, no entanto, assumiu as negociações junto ao governo federal para tentar uma ampliação dos períodos e possibilitar uma deliberação menos urgente na Casa.

Em sua empreitada por novos prazos, Tadeuzinho já afirmou ter recebidos sinais positivos de Gleisi Hoffmann (PT), ministra-chefe da Secretaria de Relações Institucionais do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

“Nós temos um problema instalado. O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) vem a público e diz que só consegue fazer a avaliação das empresas no meio do ano que vem, mas ao mesmo tempo o decreto obriga o governo do Estado a fazer a manifestação e exige a avaliação até o final de outubro. Então, levei esse problema para a ministra, tivemos longas horas de reunião e estou muito confiante com a sensibilidade do governo federal quanto a esse tema”, afirmou o presidente da ALMG em 20 de agosto.

Cabe ao BNDES avaliar os ativos que os estados pretendem envolver na negociação. O banco, porém, já adiantou que só terminará o processo de precificação em 2026, o que implica que os estados decidam sobre a adesão sem saber o quanto exatamente conseguiram abater do estoque da dívida a partir da federalização de empresas estatais.

O que já avançou

No primeiro semestre, cinco projetos do pacote do Propag foram aprovados pela Assembleia e sancionados por Zema. O primeiro foi o PL 3731/2025, texto inicial que autoriza a adesão ao Propag e a consequente saída do Regime de Recuperação Fiscal (RRF).

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O principal avanço na discussão foi a aprovação dos PLs 3734 e 3735, que autoriza que a Companhia de Desenvolvimento Econômico (Codemig) seja envolvida nas negociações. Emendas adicionadas ao texto original determinaram que a empresa de exploração de nióbio só pode ser usada para abater a dívida se for federalizada, excluindo a hipótese de privatização.

Antes do recesso parlamentar, os deputados também aprovaram a concessão de créditos tributários e a compensação de créditos previdenciários para abater o estoque da dívida e, consequentemente, reduzir os juros cobrados no refinanciamento.

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