Os servidores do Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema) afirmam que a corrupção desvendada pela Operação Rejeito não é surpresa para quem atua dentro da secretaria. Há anos, a categoria denuncia irregularidades e alerta para o que chama de um enfraquecimento institucional que, segundo eles, abriu caminho para a corrupção agora escancarada.

De acordo com o Sindicato dos Servidores Estaduais do Meio Ambiente (Sindsema), a operação tornou públicas suspeitas que já vinham sendo comunicadas às autoridades, à Assembleia Legislativa e a diferentes instâncias de controle.

“Os servidores do Sisema participaram, deram contribuição a essa denúncia, ofereceram documentos, relatos, para que a polícia chegasse hoje no lugar que chegou e pudesse continuar fazendo justiça contra a corrupção dentro da nossa estrutura”, disse o presidente da entidade, Wallace Alves, ao Estado de Minas.

A categoria relaciona os casos de corrupção à falta de concursos públicos e à nomeação de dirigentes sem vínculo de carreira. Segundo Alves, essa prática criou um terreno fértil para pressões externas, distorções técnicas e favorecimentos a empreendimentos. “Quando não há servidores estáveis, capazes de denunciar e, sem qualquer amarra, trazer à luz da sociedade os documentos, os desmandos e as ordens dadas sem respaldo científico, abre-se margem para que esse tipo de corrupção aconteça”, afirma Alves.

Perguntado sobre a afirmação do Palácio Tiradentes de que já havia investigações internas em andamento, o presidente do Sindsema afirmou que as medidas anunciadas nos últimos meses não atingiram a cúpula do sistema ambiental nem o núcleo político ligado ao governador.

“Foram lá, pegaram os subalternos do esquema e deram como terminada. A apuração correta não chegou a tempo, e por isso o esquema se prolongou por anos, até ser desvendado agora, com projeção de lucro da ordem de R$ 18 milhões. Não sei se é falta de condições de fiscalização interna, a gente não sabe verificar. Mas o que interessa é que não chegaram a tempo”, criticou.

Entre as propostas discutidas pelos trabalhadores está a criação de uma lista tríplice para a escolha das chefias do Sisema. A ideia é que apenas servidores concursados, com formação técnica e experiência comprovada, possam se candidatar, sendo os nomes submetidos a votação interna e posteriormente encaminhados ao governador para escolha final.

“O alto escalão dos órgãos tinha que ter servidores de carreira, sem ligação com político nenhum. Isso garantiria impessoalidade, coerência e técnica. Não se trata de indicar amigos ou aliados políticos, mas sim gestores preparados para conduzir políticas públicas que cuidam da água, do solo, do ar, das florestas. Estamos falando do futuro da população”, defendeu Alves.

Apoio à operação

Nessa sexta-feira (19/9), um grupo de servidores esteve na porta da Polícia Federal, na Avenida Raja Gabaglia, na Região Centro-Sul de Minas Gerais, em um ato simbólico de apoio à Operação Rejeito. A manifestação também buscou marcar posição em defesa dos profissionais concursados. Para os servidores, a operação evidencia o papel central do corpo técnico no enfrentamento das irregularidades.

“Hoje nós amargamos um momento em que mais de mil servidores saíram da nossa secretaria desde 2016. Estamos diante de um enfraquecimento institucional sem precedentes. Onde há servidor de carreira, a pressão externa não nos abala: temos autonomia para cobrar. É por isso que estamos na porta da Polícia Federal, para afirmar que, ainda bem, contamos com servidores de carreira”, afirma Alves.

Em greve desde o dia 1º deste mês, os servidores cobram, além do fortalecimento institucional, a recomposição do quadro técnico e melhores condições de trabalho. O caso, para o Sindsema, precisa servir de ponto de inflexão na política ambiental mineira. A defesa é de que a secretaria, que completará 35 anos em 2026, seja reconstruída com base em critérios técnicos e na valorização do funcionalismo.

"Estamos há vinte dias parados para alertar que estão acabando com a nossa secretaria. Essa intervenção externa nos impede de ter política salarial, concursos e autonomia. Onde há servidor de carreira, não há espaço para corrupção", resumiu Alves.

Corrupção exposta pela PF

A Operação Rejeito levou à prisão de nomes do alto escalão da área ambiental. O ex-presidente da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam), Rodrigo Gonçalves Franco, está entre os detidos, acusado de receber pagamentos regulares para favorecer empresas em processos de licenciamento. Ele havia sido exonerado pelo governo no último sábado (13/9), poucos dias antes da prisão, sob a justificativa de “burburinho” em torno de sua conduta.

Outros quatro servidores foram afastados ou exonerados nesta semana, após determinação da Justiça Federal. Entre eles estão Breno Esteves Lasmar, então diretor-geral do Instituto Estadual de Florestas (IEF), e Arthur Ferreira Rezende Delfim, diretor de Regularização Ambiental da Feam, também preso na quarta-feira (17/9).

O gestor ambiental Fernando Baliani da Silva, também afastado do cargo nesta semana, é apontado pela PF como peça-chave no esquema, tendo autorizado licenças e acordos que favoreceram mineradoras investigadas, como a Fleurs Global Mine. Já Lirriet de Freitas Libório Oliveira, que ocupava função gratificada na Feam, foi dispensada do cargo.

Em coletiva de imprensa realizada na quarta, o secretário de Comunicação do governo estadual, Bernardo Santos, ressaltou que parte dos servidores já respondia a processos administrativos instaurados pela Controladoria-Geral do Estado, ainda que os indícios fossem preliminares. Esses procedimentos, no entanto, corriam sob sigilo e ainda não haviam produzido responsabilizações efetivas. “A gente só tem poder administrativo e, obviamente, tem que apurar as coisas com a profundidade necessária para não ser injusto com ninguém. Mas o poder de polícia, de investigar e prender as pessoas, só a Polícia Federal tem”, disse.

Ao ser questionado sobre a possibilidade de novos nomes surgirem nas apurações, Santos preferiu não antecipar informações e reiterou que os processos administrativos tramitam em sigilo. Reforçou ainda que o governo não compactua com práticas lesivas ao Estado e que qualquer irregularidade identificada será investigada.

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