Cigarro eletrônico eleva risco de nova geração dependente
Em alguns países, mais de 25% dos jovens relataram uso nos últimos 30 dias
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Siga noA fumaça do tabaco libera milhares de substâncias, das quais 250 são prejudiciais à saúde e pelo menos 70 são cancerígenas. Fumar causa, agrava e reduz a resposta ao tratamento de diversas doenças, especialmente cardiovasculares, respiratórias e vários tipos de câncer.
O tabagismo é a principal causa de mortes evitáveis e pode reduzir a expectativa de vida em mais de dez anos. A probabilidade de um fumante desde a adolescência chegar aos 80 anos é 50% menor do que a de um não fumante. "O fumo passivo também provoca doenças, sobretudo em crianças e idosos, e prejudica o desenvolvimento do feto quando a gestante mantém o hábito de fumar", destaca Luiz Fernando Ferreira Pereira, pneumologista do Hospital Biocor Rede D’Or e do Hospital das Clínicas da UFMG.
As políticas públicas de controle do tabagismo, incluindo programas gratuitos de tratamento, coordenadas pelo Ministério da Saúde e pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca), fizeram do Brasil um exemplo mundial. A prevalência de fumantes caiu de quase 35%, na década de 1980, para pouco mais de 11% em 2024.
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Novas formas de consumo
Segundo Luiz Fernando, nas últimas décadas, a indústria do tabaco passou a investir em produtos de nicotina sem fumaça, como sachês úmidos (snus) e, principalmente, dispositivos eletrônicos para inalação — conhecidos como cigarros eletrônicos ou vapes.
O que é vape?
O vape possui um reservatório para líquido com nicotina e outras substâncias, uma bateria de lítio e um atomizador que aquece o líquido para gerar aerossol. Não há combustão de tabaco, mas o vapor contém substâncias nocivas, como propilenoglicol, glicerol, material particulado e metais pesados.
Os dispositivos atuais são pequenos, sem odor, recarregáveis ou descartáveis, frequentemente com flavorizantes e de fácil aquisição, inclusive on-line.
O cenário no Brasil
Embora o tabagismo esteja em queda, o uso de vapes cresce, especialmente entre jovens, impulsionado pelas redes sociais e pelo apelo de socialização. Em alguns países, mais de 25% dos jovens relataram uso nos últimos 30 dias.
No Brasil, o consumo aumentou 600%, com estimativa de mais de 3 milhões de usuários. Pesquisa com brasileiros de 14 anos ou mais apontou prevalência de 5,6%, sendo 3,7% de uso exclusivo.
Estudos de alta evidência científica, além de recomendações da Organização Mundial da Saúde e de órgãos nacionais, mostram que os vapes:
- São mais fáceis de inalar, liberam mais partículas finas, nicotina e metais pesados que o cigarro comum
- Podem conter mais de 16 mil tipos de flavorizantes com riscos potenciais
- Causam dependência, com doses de nicotina superiores às de um maço de 20 cigarros
- Aumentam riscos de doenças respiratórias, cardiovasculares, neurovasculares, orais e câncer
- Podem provocar ferimentos e queimaduras graves por explosão da bateria
- Causam intoxicações acidentais em crianças que ingerem o líquido
- Geram sintomas de abstinência, como ansiedade e irritabilidade, após interrupção do uso
- Estão associados a casos graves de doença pulmonar quando acrescidos de derivados de maconha ou vitamina E
- Contribuem para poluição ambiental e risco de incêndio
Em 2024, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por meio da Resolução de Diretoria Colegiada nº 855, manteve a proibição de fabricação, importação, armazenamento, distribuição, comercialização, propaganda e uso de vapes em locais coletivos fechados no país.
A posição da indústria e o contraponto
"A indústria do tabaco defende a regulamentação dos vapes, alegando aumento na arrecadação de impostos e controle de dispositivos com alta nicotina. No entanto, mesmo em países onde a venda é permitida, o comércio ilegal persiste devido ao menor custo e à preferência por produtos mais potentes."
"No Brasil, um terço dos cigarros consumidos é contrabandeado, e a arrecadação tributária com o tabaco não cobre um décimo dos gastos com tratamento de doenças, aposentadorias precoces e perdas econômicas associadas", complementa Luiz Fernando.
Apesar do comércio ilegal, ações de fiscalização, educação, multas e apreensões por parte da vigilância sanitária, Procon e Receita Federal têm se intensificado.
Risco entre jovens e tratamento
O uso de vapes triplica a chance de iniciar o consumo de cigarros comuns e aumenta o risco de uso de outras drogas. O tratamento para fumantes está disponível gratuitamente no SUS, com terapias comportamentais, reposição de nicotina e medicamentos.