Bruno Pereira - Detectar o Alzheimer antes que os sintomas se agravem sempre foi um dos maiores desafios da medicina. Agora, um estudo realizado por pesquisadores da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), nos Estados Unidos, traz uma nova luz sobre essa questão ao identificar quatro caminhos distintos que podem levar ao desenvolvimento da doença.

A pesquisa, publicada em julho na revista "eBioMedicine", analisou mais de 25 mil registros médicos de sete mil pacientes e revelou que o Alzheimer não surge de um único fator, mas sim de progressões diferentes e complexas que se acumulam ao longo do tempo.

Entre as trajetórias mapeadas estão:

  • Transtornos de saúde mental
  • Encefalopatias (Doenças que alteram o funcionamento ou a estrutura do cérebro)
  • Comprometimento cognitivo leve
  • Doenças vasculares

Segundo os especialistas, entender esses percursos pode ser decisivo para melhorar o diagnóstico precoce e oferecer tratamentos mais eficazes, já que as terapias disponíveis funcionam melhor nos estágios iniciais da doença.

Esses caminhos não são isolados, mas sequenciais, como peças de um mesmo quebra-cabeça que colaboram para que se formem os emaranhados de proteínas no cérebro que acabam levando o órgão a perder suas capacidades funcionais.

"Descobrimos que trajetórias em múltiplas etapas podem indicar maiores fatores de risco para a doença de Alzheimer do que condições isoladas. Compreender essas trajetórias pode mudar fundamentalmente como abordamos a detecção precoce e a prevenção", afirmou o neurologista Mingzhou Fu, pesquisador da UCLA, primeiro autor do artigo, em comunicado à imprensa.

O estudo também constatou que a maioria dos fatores aparece em certa ordem, ressaltando seu efeito em cadeia, como uma trilha de dominó em que a queda de uma das peças empurra a outra. Na pesquisa, por exemplo, aproximadamente 26% das progressões diagnósticas tiveram a hipertensão aparecendo antes de episódios depressivos e do comprometimento cognitivo, por exemplo, mas os pesquisadores ressaltam que diferentes populações parecem ser mais vulneráveis a diferentes rotas do Alzheimer.

Para o neurologista Iron Dangoni Filho, coordenador do Núcleo de Excelência em Memória (NEMO) do Einstein Hospital Israelita em Goiânia (GO), a ideia de quatro caminhos que levam à doença pode permitir entender como o cérebro vai perdendo suas linhas de defesa contra o Alzheimer perante os fatores de risco.

"Estes caminhos funcionam de forma integrada. Por exemplo, um paciente pode ter depressão de longa data, que é parte do caminho psiquiátrico, e ainda sofrer de hipertensão ou de algum problema vascular. A mesma pessoa pode ter traumas intracranianos de repetição, no lado encefalopático, e já estar em fase de esquecimento leve sem perda funcional, o caminho cognitivo. Quando esses fatores se somam, o risco de evolução para demência de Alzheimer aumenta significativamente”, explica o neurologista.

O ator Charlton Heston morreu em 2008, aos 84 anos, após seis anos lutando contra os sintomas da doença. Ela, porém, não foi diagnosticada. Em 1960, viveu seu auge, com o Oscar de melhor ator pelo filme "Ben Hur". Reprodução site Adoro Cinema
Ex-presidente dos EUA, Ronald Reagan morreu em 2004, após dez anos de luta contra a doença. Ele tinha 93 anos e foi mandatário do país de 1981 a 1989. Domínio Público - Wikimédia Commons
Os estudos também apontam que leitura, interação social ou qualquer outra atividade social ajuda a evitar a doença. Eles, porém, também não são conclusivos. Arquivo Agencia Brasil
O tratamento para o Mal de Alzheimer busca retardar o avanço da doença, embora ela vá avançar. A doença foi descrita em 1901 pelo médico alemão Alois Alzheimer. Ela é relativamente recente porque hoje as pessoas vivem mais do que no Século XIX. Freepik
Um paciente com Alzheimer, portanto, dá muito trabalho físico e psicológico aos familiares. A expectativa de vida é pequena: de três a nove anos. As causas ainda são desconhecidas, mas os estudos mostram que é mais provável que ela seja causada por questões genéticas. Marcos Oliveira - Flickr
O desenvolvimento da doença também faz a pessoa esquecer como se fala ou falar coisas sem nexo. Infecções urinárias também podem aparecer. O doente não tem consciência do problema e pode chorar em excesso ou até mesmo tornar-se agressivo. Imagem de Alterio Felines por Pixabay
O Alzheimer começa com perda de memória, mas apenas recente. Depois, o paciente perde até memórias antigas, delira e perde coordenação motora, que tem relação com o cérebro. Tânia Rêgo/Agência Brasil
O Mal de Alzheimer é uma doença degenerativa, ou seja, uma doença que vai destruindo o seu corpo e o leva à morte. O Alzheimer não tem cura e, aos poucos, vai comprometendo as funções cerebrais. - Dominio Publico/freepik
Por outro lado, a Blue Cross Blue Shield (BCBS) destacou que, entre 2013 e 2017, houve um aumento de 200% nos diagnósticos entre pessoas de 30 a 64 anos. Já dos 30 aos 40, o aumento foi de 373%. Assim, há uma clara preocupação das autoridades. Flickr Lola Alzheimer
No Brasil, são cerca de 1,2 milhão de pessoas com Alzheimer. A estimativa é de que 100 mil novos diagnósticos são feitos anualmente. Estudos indicam que de 90 a 95% dos casos são em idosos. Imagem Grátis de Mabel Amber, who will one day por Pixabay
Em 2050, a estimativa da Organização Mundial de Saúde (OMS) é de que o planeta terá 139 milhões de pessoas com demência no mundo. Imagem de Gerd Altmann por Pixabay
Estima-se que o mundo tenha cerca de 40 milhões de pessoas com o Mal de Alzheimer. A doença é a principal causa da demência. Esta, por sua vez, acomete 55 milhões de pessoas. Domínio Público - Wikimédia Commons
Com as dificuldades na memória, ele abandonou a escola, no último ano do Ensino Médio. Agora, a situação serve de laboratório para entender melhor a doença, especialmente em jovens. Imagem de Gerd Altmann por Pixabay
Os exames no jovem identificaram uma atrofia do hipocampo cerebral, além do acúmulo da proteína beta. As duas são características da doença. Também houve um aumento da proteína tau, outra característica. Reprodução
Antes deste, o paciente mais jovem diagnosticado com o problema tinha 21 anos e também era chinês.  Flickr Dr Curtis Cripe
Em janeiro de 2023, um caso publicado na revista Journal of Alzheimer’s Disease teve repercussão, pois informava sobre um caso de Alzheimer num jovem de 19 anos, de identidade não revelada, em Pequim, na China. Site Jad
O Mal de Alzheimer é uma grande preocupação hoje, pois as pessoas que desenvolvem essa doença perdem diversas capacidades e tornam-se um peso para as famílias. É uma enfermidade típica de idosos, embora também acometa pessoas de meia idade ou até jovens, eventualmente. Divulgação
No hospital psiquiátrico de Frankfurt, ela foi tratada por Alois Alzheimer. Nascido em 14 de junho de 1864, em Marktbreit, na Alemanha, ele foi o neuropatologista que acabou batizando a doença. Alois morreu em 19 de dezembro de 1915, aos 51 anos, de insuficiência cardíaca. Domínio público
A primeira pessoa diagnosticada com o Mal de Alzheimer foi Auguste Deter, alemã que morreu em 8/4/1906, aos 55 anos. Nascida em Kassel, em 16/5/1850, ela entrou para a história. Adoeceu em 1901, aos 50 anos, e ficou internada o restante da vida. Domínio público

Quatro vias para a mesma doença

O caminho psiquiátrico envolve transtornos de depressão e ansiedade, que alteram neurotransmissores e aumentam o estresse cerebral. Esse processo leva a inflamação, desequilíbrio hormonal e redução de fatores de proteção neuronal, acelerando a manifestação da demência.

No caminho encefalopático, estão condições que afetam de forma difusa o cérebro, como intoxicações, infecções e traumas repetitivos, que podem ser causados por esportes, idade e até por uso de substâncias tóxicas.

Os sintomas incluem desatenção, lentificação do pensamento e dificuldades de memória e, quando persistem, aumentam a vulnerabilidade para Alzheimer.

Já a via vascular relaciona hipertensão, diabetes, colesterol alto e doenças cardíacas à demência. “Essas condições reduzem a circulação adequada de sangue no cérebro. Isso causa pequenas lesões que, ao longo dos anos, prejudicam as conexões entre os neurônios. Esse processo pode tanto acelerar o Alzheimer quanto gerar uma demência vascular que se mistura com ele, uma das principais causas de demência mistas, ou seja, da presença de mais de um fator que leva ao declínio cognitivo”, ressalta Iron.

O comprometimento cognitivo leve, o último caminho, é a zona de transição entre um cérebro saudável e aquele que está desenvolvendo demência. Neste estado, o paciente apresenta esquecimentos acima do esperado para a sua idade, mas mantém a autonomia. O neurologista ressalta, porém, que este caminho não é irreversível e responde bem às intervenções feitas no momento certo.

“Em um estudo brasileiro chamada PALA, de 2012, com pacientes diagnosticados com comprometimento cognitivo leve, foi visto que 38% dos casos desenvolveram demência, 38% melhoraram e 24% mantiveram-se estáveis. Isso reforça a ideia de o tratamento e a prevenção podem evitar a evolução para quadros demenciais”, completa o neurologista.

Por fim, o especialita reforça que identificar estes padrões tem impacto direto na prática clínica por permitir um diagnóstico sequencial e um acompanhamento clínico atento que anteveja o aparecimento do Alzheimer. 

Iron diz que a partir do momento que se sabe da existência dos quatro caminhos, a atenção para prevenção precoce redobra, uma vez que a maioria se trata de fatores modificáveis.

“Quando identificamos, por exemplo, que um paciente tem hipertensão mal controlada, histórico de depressão e sinais iniciais de comprometimento cognitivo, já buscamos agir cedo. Isso visa atrasar a progressão para demência de Alzheimer, assim como também melhora a qualidade de vida com orientações de tratamento, estilo de vida e acompanhamento especializado.”

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