Em meio a uma paralisação orçamentária que já dura 3 dias, os Estados Unidos mergulham em um cenário de confusão e prejuízos que vai além das salas de Washington. O shutdown federal, iniciado no dia primeiro de outubro, não é apenas uma briga política entre republicanos e democratas no Congresso: ele paralisa serviços essenciais, fecha portões icônicos e deixa milhões de visitantes – e economias locais – à deriva.

Dentre os impactos mais visíveis e dolorosos, o fechamento parcial ou total dos parques nacionais se destaca como um símbolo do caos, gerando confusão entre turistas desavisados e perdas financeiras que podem ultrapassar bilhões de dólares por semana

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Parques fechados

Imagine planejar meses a fio uma viagem dos sonhos para o Grand Canyon ou o Yellowstone, só para chegar e encontrar barreiras, placas de "fechado" e funcionários inexistentes. É exatamente isso que está acontecendo. Com milhares de funcionários federais em licença não remunerada (furlough), os parques nacionais – que receberam mais de 300 milhões de visitantes em 2024 – operam em regime de emergência.


 Alguns atrativos turísticos, como os que podem ser isolados fisicamente, estão completamente trancados, enquanto outros permanecem parcialmente abertos, mas sem funcionários da segurança para patrulha, manutenção ou orientação. Turistas, vindos de todos os cantos do mundo, relatam frustração nas redes sociais e em fóruns de viagem: famílias americanas cancelam piqueniques no Yosemite, europeus questionam reembolsos de ingressos não utilizados, e grupos de mochileiros asiáticos se veem forçados a redesenhar roteiros inteiros. 




"Chegamos animados e saímos decepcionados – é como se o governo nos expulsasse da própria natureza americana", desabafou um visitante britânico em postagens recentes no X (antigo Twitter). Essa confusão não é só emocional: ela se traduz em filas intermináveis para informações alternativas, hotéis vazios em cidades-gêmeas dos parques e um senso de imprevisibilidade que afasta reservas futuras.




Perdas bilionárias

A Grande Guerra Sioux, ou Guerra de Black Hills, durou dois anos e terminou com o massacre do povo local. A Montanha dos Seis Avôs acabou renomeada pelo governo como Monte Rushmore, em referência ao empresário Charles Rushmore, um dos primeiros a instalar negócios na região, com uma mina de estanho. Domínio Público
No entanto, a descoberta de ouro na reserva de Black Hills fez crescer o olho do governo, que passou a promover campanhas militares para se apossar do território. Mike Tigas/Wikimedia Commons
Com o avanço da colonização para o oeste, essas terras indígenas foram palco de conflitos entre a população nativa e os invasores. Até que em 1868 foi assinado o Tratado de Fort Laramie, em que o governo americano reconhecia a região como reserva indígena. af.mil/Domínio público / commons wikimedia
Chamado de “Montanha dos Seis Avôs”, o local era cenário de homenagens aos ancestrais de diversos desses povos, como os Apaches, os Sioux e os Kiowa. Dorian Wallender/Wikimedia Commons
O território onde está situado o monumento foi objeto de veneração de povos indígenas desde os tempos pré-colombianos. Imagem de Richard Emerson por Pixabay
Inaugurado em 31 de outubro de 1941, o Memorial Nacional de Monte Rushmore recebe mais de dois milhões de visitantes por ano. Domínio Público
No dia 19 de outubro de 1966, o monte foi inscrito no Registro Nacional de Lugares Históricos, que reúne a lista de distritos, edifícios e objetos dignos de preservação nos Estados Unidos. Imagem de Mike Goad por Pixabay
Localizadas na região de Black Hills, as esculturas têm tamanhos que variam de 15 a 21 metros de altura. Imagem de Karlee Heck por Pixabay
A presença das esculturas na montanha fez com que o estado de Dakota do Sul ficasse conhecido como o â??The Mount Rushmore Stateâ? (â??O Estado do Monte Rushmoreâ?).
Na obra foram usadas dinamites e também foi preciso recorrer a uma técnica denominada “favo de mel”, quando em partes mais profundas alguns pedaços de granito são retirados com as próprias mãos. Imagem de Chuck Reisinger por Pixabay
Após a morte de Borglum ainda restavam detalhes para o término das esculturas e coube a seu filho, Lincoln, a tarefa de finalizá-la.
As efígies são de autoria do escultor Gutzon Borglum (1867 - 1941). O artista trabalhou 14 anos na histórica obra. Ele morreu no mesmo ano em que ela foi concluída. Reprodução
Theodore Roosevelt foi o 26º presidente dos Estados Unidos (1901 - 1909). Em 1906, ele recebeu o Nobel da Paz por seu papel na mediação do acordo que deu fim ao conflito entre a Rússia e o Japão. Imagem de pamdavila por Pixabay
Durante o mandato de Lincoln aconteceu a Guerra Civil Americana, entre os estados de Norte e Sul, que teve como pano de fundo a questão da escravidão no país. Domínio Público/Wikimedia Commons
Abraham Lincoln foi o 16º presidente dos Estados Unidos, governando entre 1861 e 1865, quando foi assassinado. Imagem de Mike por Pixabay
Thomas Jefferson foi o terceiro presidente dos Estados Unidos (1801 - 1809) e autor da declaração da independência, em 1776. Imagem de Brigitte Werner por Pixabay
George Washington é um dos chamados “Founding Fathers”, os pais fundadores dos Estados Unidos. Liderança durante a Guerra da Independência, foi o primeiro presidente do país, entre 1789 e 1797. Imagem de Mike Goad por Pixabay
Além disso, o monte já tem fissuras, rachaduras e lascas de vários tamanhos e profundidades, que vêm sendo detectadas por cientistas desde o final dos anos 1980. Já são mais de 100 falhas. Imagem de Mike por Pixabay
Mas geólogos alertam que mexer naquela montanha pode acabar destruindo os rostos que já existem. Como a formação rochosa é mista, uma parte pode não ser apropriada para a obra de arte como outras. Imagem de Frank Wintermeyer por Pixabay
O memorial é um dos mais famosos dos EUA e fica na cidade de Keystone, no estado da Dakota do Sul. Retrata George Washington, Thomas Jefferson, Abraham Lincoln e Theodore Roosevelt. Imagem de Richard Emerson por Pixabay
O presidente dos EUA Donald Trump declarou que quer que seu rosto seja esculpido no Monte Rushmore, monumento que retrata ex-presidentes de peso na história americana. Gage Skidmore/Wikimedia Commons/

Os números, no entanto, pintam um quadro ainda mais sombrio. Diariamente, os parques nacionais perdem até US$ 1 milhão em receitas de taxas de entrada e concessões, enquanto comunidades vizinhas – dependentes do turismo para sustento – enfrentam um rombo de dezenas de milhões. 


Em escala nacional, o setor de viagens como um todo pode amargar US$ 1 bilhão por semana em perdas, considerando não só os parques, mas também interrupções em voos, trens e cruzeiros afetados pela falta de coordenação federal. Ano passado, os visitantes gastaram US$ 29 bilhões em economias locais ao redor dos parques, injetando vitalidade em hotéis, restaurantes e lojinhas de souvenirs.


 Agora, com o shutdown se prolongando, esses ganhos evaporam: proprietários de negócios em lugares como o Alasca ou o Arizona falam em falências iminentes, e associações de turismo alertam que o dano à reputação dos EUA como destino "aberto e acessível" pode durar anos.




Museus parados

Mas o caos vai além dos portões dos parques. A paralisação orçamentária expõe fragilidades sistêmicas: museus como o Smithsonian em Washington estão com exposições paradas, inspeções de segurança em aeroportos atrasadas e até pesquisas científicas em florestas nacionais interrompidas, deixando ecossistemas vulneráveis a incêndios ou invasões.


 Milhares de funcionários federais – de biólogos a administradores – ficam sem salário, forçando famílias a adiar contas e consultas médicas. E o pior: enquanto o debate no Capitólio se arrasta, o risco de vandalismo nos parques sem vigilância cresce, transformando joias naturais em alvos de descuido.


“Esse shutdown não é um evento isolado; é um lembrete brutal de como a polarização política pode paralisar uma nação”. Grupos como a National Parks Conservation Association cobram urgência do Congresso: "Os impactos nos parques são só o começo – urge ação para evitar um colapso maior." Para os turistas, a lição é amarga: verifique atualizações em tempo real e tenha planos B. 

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Para os EUA, o recado é claro: o preço do impasse não se mede só em dólares, mas em oportunidades perdidas e confiança abalada. Enquanto o sol se põe sobre o Monte Rushmore – ironicamente, um dos símbolos da nação em risco –, o mundo assiste a um gigante tropeçando em suas próprias divisões.


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