
Fui a S�o Paulo para uma semana de alegria com as comemora��es da formatura de minha sobrinha em medicina, e cheguei com duas not�cias mais do que tristes, que sufocaram meus dias de alegria: o falecimento de dona Judith dos Mares Guia e do meu querido amigo e colega Son Salvador.
Tive uma longa liga��o com dona Judith, com quem me encontrava praticamente todas as semanas no cabeleireiro. Convers�vamos sobre todos os assuntos de uma �poca que conhec�amos bem, ela contava como � que enfrentava as mudan�as provocadas pelo interesse da fam�lia em sua seguran�a e conforto. Judith tocava Chopin e Beethoven ao piano e tinha devo��o pelos escritores latino-americanos. Pablo Neruda era o preferido – entre n�s, assunto n�o faltava. Quando se mudou da casa onde morou anos com o marido, o conhecido m�dico Jos� Maria, e foi para o apartamento, enfrentou um problema: como continuar com sua distra��o predileta, tocar piano quando tivesse vontade? Como � que os vizinhos iam aceitar “esse barulho”? Enfrentou o problema e venceu: os vizinhos ficaram encantados com sua t�cnica, as m�sicas que escolhia, o prazer de escutar um concerto dos melhores – sem precisar sair de casa.
Quando fez 100 anos e comemorou o anivers�rio na fazenda do filho, Walfrido, fez tanta quest�o de minha presen�a que acabei me aventurando pela estrada de Ouro Preto. Foi um dia de muita amizade e carinho – e entendi a raz�o de me querer l� de qualquer jeito. Fui a convidada escolhida por ela para assentar-se ao seu lado na mesa do almo�o, uma honra e tanto. Continuamos nos encontrando. Nos �ltimos tempos, ela surgia muito animada, na cadeira de rodas. Sem baixar o astral, sempre numa boa. Nos �ltimos meses, tinha not�cias suas pelas funcion�rias do sal�o de beleza de Laura Nunes, que iam � sua casa para os tratamentos habituais. N�o abria m�o de passar por manicures, cabeleireiro, a idade n�o deixou de lado sua vaidade t�o feminina, natural, sem exageros. Dona Judith foi um exemplo das mulheres mineiras que viviam pela fam�lia, mas seguiam os tempos sem deixar de lado sua participa��o.
A outra perda, irrepar�vel, foi de meu colega e amigo Son Salvador, companheiro de reda��o e amizade desde os tempos do Di�rio da Tarde. Quando o DT foi fechado, torci para que ele fosse trazido aqui para o Estado de Minas. Compartilh�vamos os mesmos sentimentos pela profiss�o e o agradecimento e gratid�o por estarmos, h� tanto tempo, trabalhando na mesma empresa. Ele n�o tinha esp�rito de disputa, sabia at� onde iam suas obriga��es e deveres. Estava sempre pronto a atender �s demandas da profiss�o, sem fazer conta do tempo. Acompanhei o nascimento e o crescimento dos dois filhos, a carreira do menino, que tem apelido de Pinduca, que ele guiava com m�os de pai firme, mas compreensivo. E sua preocupa��o com a filha Francis, a dedica��o � mulher, Francisca, que sempre cham�vamos de Chica. Todos os dias, quando vinha trabalhar, passava por minha sala para trocar abobrinhas e mostrar as travessuras dos dois netos, que simplesmente adorava.
Tenho um pesar nos meus dias atuais: n�o fui visit�-lo no hospital, primeiro porque passou muito tempo no CTI e depois por causa de seu delicado estado de sa�de. Antes de viajar para Sampa, liguei para ele brincando, pedindo que deixasse de pregui�a e voltasse a trabalhar. Ele achou gra�a e me contou como estava – e, pelo que via, ia demorar a voltar. Demorou para sempre, deixando em n�s, que conviv�amos com ele, uma saudade eterna.