A sofistica��o da sofistica��o
A v�rgula � uma parada pequena. O ponto, uma pausa prolongada. As retic�ncias s�o sonhos, suspiros apaixonados. A exclama��o e a interroga��o traduzem d�vida ou encantamento. E o ponto e v�rgula? � o sinal mais sofisticado da l�ngua. Pode-se viver sem ele, mas, com ele, vive-se com mais requinte.
Passeie os olhos por jornais e revistas. Raramente voc� ver� o casalzinho. Por qu�? Poucos sabem empreg�-lo. “Nunca o usei e nunca me fez falta”, escreveu Luis Fernando Verissimo. “A Maria Eug�nia � uma mo�a muito inteligente. Ela sabe usar ponto e v�rgula”, concluiu M�rio Quintana.
A duplinha, o sinal mais charmoso da l�ngua, tem dois empregos – separar termos de uma enumera��o e dar banho da clareza ao enunciado. Vamos ao primeiro deles, o mais burocr�tico.
Primeiro
Separar termos de uma enumera��o � arroz de festa de leis, decretos, portarias, medidas provis�rias. At� Deus o usou.
S�o mandamentos do Senhor:
1. Amar a Deus sobre todas as coisas;
2. N�o tomar Seu santo nome em v�o;
3. Guardar os dias santos;
4. Honrar pai e m�e;
5. N�o matar;
6. N�o pecar contra a castidade;
7. N�o furtar;
8. N�o levantar falso testemunho;
9. N�o desejar a mulher do pr�ximo; e
10. N�o cobi�ar as coisas alheias.
Superdica 1
Observe o e no 9º mandamento. Ele vem depois do ponto e v�rgula. A concluir a enumera��o, o ponto pede passagem. Abram-lhe alas.
Superdica 2
O casadinho fica no meio do caminho. No lugar dele poderia estar a v�rgula. Ou o ponto. Por isso, muitos nem se preocupam em lhe dar oportunidade. No aperto, partem pro velho conhecido. E se d�o bem como o Verissimo e tantos outros.
Mas, se derem um passo pra frente, se dar�o muito melhor. Entrar�o no time da Maria Eug�nia. Que tal? A escolha � sua. Lembre-se antes de bater o martelo: a zona de conforto � boa, mas imobiliza. E �gua parada, voc� sabe, cheira mal.
Segundo
Montaigne, h� 400 anos, ensinou que o estilo tem tr�s virtudes – clareza, clareza e clareza. A raz�o � simples. M�rio Quintana a exp�s num texto divertido. Disse ele: “O autor pensa uma coisa, escreve outra, o leitor entende outra, e a coisa propriamente dita desconfia que n�o foi dita”.
Clareza
O ponto e v�rgula � f� da clareza. Da� a import�ncia de saber empreg�-lo e, com isso, facilitar a vida do leitor que se deixar� conquistar pelo enunciado f�cil e sem ambiguidade. Quer ver? Examine esta frase:
Jo�o trabalha no Senado, Pedro trabalha na C�mara, Carlos trabalha no banco, Beatriz trabalha na universidade, Alberto trabalha no shopping.
O per�odo est� correto e compreens�vel. As v�rgulas separam as ora��es coordenadas. Mas h� um sen�o. A repeti��o do verbo torna-o cansativo e denuncia o autor pregui�oso.
O que fazer? H� uma sa�da. P�r em pr�tica uma das regras de ouro do estilo – variar para agradar. A gente mant�m o verbo na primeira ora��o. E mete a faca nos demais. No lugar deles, p�e a v�rgula:
Jo�o trabalha no Senado, Pedro, na C�mara, Carlos, no banco, Beatriz, na universidade, Alberto no shopping.
Ops! Na primeira leitura, o enunciado parece o samba do texto doido. Quem bate o olho no per�odo n�o entende nada. O jeito � recorrer ao ponto e v�rgula. Ele tem lugar – separa as ora��es coordenadas:
Jo�o trabalha no Senado; Pedro, na C�mara; Carlos, no banco; Beatriz, na universidade; Alberto no shopping.
Mais
Chique, n�o? Veja mais dois exemplos:
Eu estudo na USP; Maria, na UnB.
Alencar escreveu romances; Drummond, poesias.
Carlos e Paulo s�o jornalistas. Este trabalha no Correio; aquele, no Estado de Minas.
Moral da hist�ria
Se o casalzinho ponto e v�rgula existe, tem raz�o para estar no mundo e no texto sofisticado. Ele desempenha dois pap�is na frase melhor que v�rgula, ponto e travess�o. Um deles, estende tapete vermelho e recebe a clareza com banda de m�sica e salva de palmas.
"N�o se deve confiar em quem emprega a mes�clise com corre��o"
Tancredo Neves
Leitor pergunta
Os dias da semana se grafam com inicial mai�scula ou min�scula?
.Rafael Santos, Floripa
Com min�scula: segunda-feira, quarta-feira, s�bado, domingo.